Políticos e religiosos alinhados ao extremismo de direita requentam mentira sobre deportação de filha de presidente do STF

Na tarde deste 30 de julho, o deputado federal autodeclarado cristão Mário Frias (PL-RJ) republicou em suas redes um conteúdo falso sobre a filha do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, Luna Barroso,  ser escoltada e deportada dos EUA. A mentira circula desde o dia 19 de julho passado, depois do anúncio das ameaças de sanções daquele país contra exportações do Brasil e oito ministros do STF. Grupos alinhados e simpatizantes do extremismo de direita espalharam o conteúdo que foi verificado pelo Bereia e demais agências de checagem. 

A “requentada” na desinformação deu fôlego ao conteúdo, impulsionando milhares de compartilhamentos entre perfis de políticos e religiosos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. Estes grupos propagam que o Brasil se renderá diante das ameaças dos EUA pela concessão de anistia dos crimes do militar, que é réu por tentativa de golpe nas eleições de 2022.

Em resposta à agência Reuters, o STF negou que a filha do ministro estude nos Estados Unidos e afirmou que  “também é mentira que ela será deportada. A única filha de Barroso mora no Brasil”.

A desinformação, articulada por perfis de extrema direita, ocorreu um dia após a prisão da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), na Itália, foragida depois de condenada por invadir o sistema digital do STF. A nova circulação também se dá na esteira da imposição formal das tarifas contra exportações brasileiras pelos EUA, acompanhada de sanções mais duras ao ministro do STF Alexandre de Moraes, relator do processo de golpe nas eleições de 2022, anunciadas em 30 de julho.

EUA-Brasil: Mentira sobre filha de presidente do STF ser deportada dos EUA é usada para campanha contra a Corte

Após a notícia da revogação de vistos de ministros do STF e seus familiares pelos EUA, passou a circular nas redes sociais digitais a alegação de que a filha do presidente do STF, Luís Roberto Barroso, Luna Barroso, que estuda nos EUA, seria deportada. 

Tal situação se colocaria no contexto da retaliação dos EUA ao governo federal e ao STF por terem não apenas respondido às exigências ao Brasil, em carta divulgada na internet pelo presidente dos EUA Donald Trump, dirigida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 9 de julho passado, como também imposto medidas cautelares sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, com tornozeleira eletrônica. Entre as exigências consta, principalmente, a anistia a Bolsonaro dos crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado em 2022 e 2023, que lhe foram atribuídos por investigação da Polícia Federal do Brasil e estão em processo de julgamento pelo STF.

Essa informação é falsa.

Luna Barroso não mora nos Estados Unidos e não será deportada. De fato, ela estudou na prestigiada Yale Law School nos anos de 2022 e 2023. Contudo, atualmente vive no Brasil, onde cursa um mestrado na Universidade de São Paulo (USP) e atua como advogada no escritório Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça Advogados, no Rio de Janeiro — conforme consta em seu perfil no LinkedIn e no site do próprio escritório.

Estratégia

Esta mentira integra uma campanha de desinformação coordenada, que tenta explorar a tensão entre o Brasil e os Estados Unidos para desacreditar o STF e inflamar setores da sociedade com mentiras sobre perseguições e retaliações.

Apesar deste conteúdo ser falso, ele se articula com uma conspiração política que tem se configurado, segundo várias análises, e envolve influenciadores brasileiros e interesses estrangeiros. 

As recentes ameaças e sanções dos EUA fazem parte de um movimento mais profundo de pressão geopolítica, segundo estas avaliações mais amplas do caso. O governo Trump estaria usando o caso do julgamento de Jair Bolsonaro para buscar interferir nas eleições de 2026, favorecer candidatos alinhados aos interesses estratégicos estadunidenses e pressionar as instituições brasileiras por um alinhamento às políticas de controle econômico-financeiro daquele país.

Leitura recomendadas:

Linkedin

https://www.linkedin.com/in/luna-van-brussel-barroso-30816417a/?originalSubdomain=br

UOL

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2025/07/19/e-fake-filha-de-barroso-mora-no-brasil-e-nao-sera-deportada-dos-eua.htm

Sobre escritório Barroso Fontelles, Barcellos, Mendonça & Associados

https://www.migalhas.com.br/catalogo/barroso-fontelles-barcellos-mendonca-associados

Terra https://www.terra.com.br/noticias/ameaca-de-tarifas-acende-alerta-sobre-interferencia-dos-eua-nas-eleicoes-de-2026,c252120b783a1be2ef8c639af130bf9f176pvwus.html#google_vignette 

https://www.terra.com.br/noticias/ameaca-de-tarifas-acende-alerta-sobre-interferencia-dos-eua-nas-eleicoes-de-2026,c252120b783a1be2ef8c639af130bf9f176pvwus.html#google_vignette 

The Intercept Brasil https://www.intercept.com.br/2025/07/15/tarifaco-trump-eua-atacam-ameaca-poder-imperialista/

EUA-Brasil: Mentira sobre ataque com bombas dos EUA ao Brasil circula nas mídias sociais

Circula nas redes sociais digitais a informação falsa de que os Estados Unidos (EUA) estariam se preparando para lançar uma bomba em território brasileiro como forma de punição ao governo federal e ao STF. As mentiras se baseiam em falas dos filhos do ex-presidente Jair Bolsonaro, Eduardo e Flavio Bolsonaro, publicadas em seus perfis de mídias sociais.

Tal ação violenta dos EUA, segundo publicações, seria uma forma de retaliação às instituições do Estado brasileiro por terem não apenas respondido às exigências ao Brasil, em carta divulgada na internet pelo presidente dos EUA Donald Trump, dirigida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 9 de julho passado, como também imposto medidas cautelares sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, com tornozeleira eletrônica. Entre as exigências consta, principalmente, a anistia a Bolsonaro dos crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado em 2022 e 2023, que lhe foram atribuídos por investigação da Polícia Federal do Brasil e estão em processo de julgamento pelo STF.

Essa afirmação é infundada e fantasiosa.

Não há qualquer indício de movimentação militar dos EUA contra o Brasil, muito menos ações bélicas anunciadas. Nenhuma autoridade nacional ou internacional confirmou qualquer operação desse tipo. A ideia de um ataque militar direto contradiz princípios básicos da diplomacia internacional e os tratados que regem a convivência entre países democráticos.

Estratégia

A origem desse boato está na declaração metafórica em tom de ameaça feita pelo deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), sobre o Brasil “sofrer uma bomba atômica no mercado financeiro” se confrontasse os interesses dos EUA. Em outra publicação, na sequência, Flávio Bolsonaro reforçou a metáfora, dizendo que “ou cede-se a Trump, ou vem a bomba”.

Essas declarações, feitas em contexto de pressão internacional sobre o Brasil, foram distorcidas e ressignificadas nas redes sociais, onde passaram a circular como se se tratasse de uma ameaça real e literal de ataque militar. O termo “bomba”, usado originalmente para se referir a sanções econômicas, foi transformado em suposta ameaça de bombardeio armado.

Esse tipo de distorção é intencional e faz parte  de uma estratégia promovida por grupos extremistas de direita que espalham pânico e desinformação nas mídias sociais, como Bereia já mostrou em diversas matérias. Estas mentiras se articulam com uma conspiração política que tem se configurado, segundo várias análises, e envolve influenciadores brasileiros e interesses estrangeiros. 

As recentes ameaças e sanções dos EUA fazem parte de um movimento mais profundo de pressão geopolítica, segundo estas avaliações mais amplas do caso. O governo Trump estaria usando o caso do julgamento de Jair Bolsonaro para buscar interferir nas eleições de 2026, favorecer candidatos alinhados aos interesses estratégicos estadunidenses e pressionar as instituições brasileiras por um alinhamento às políticas de controle econômico-financeiro daquele país.

Leituras recomendadas:

Brasil 247 

https://www.brasil247.com/brasil/eduardo-bolsonaro-ameaca-o-brasil-com-bomba-nuclear-dos-eua-sobre-o-mercado-financeiro

UOL

https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2025/07/11/flavio-ou-se-cede-a-trump-ou-vira-bomba-atomica-bolsonaro-e-mais-ameacas.htm

G1

https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/07/21/bullying-de-trump-contra-brasil-esta-saindo-pela-culatra-diz-jornal-dos-eua.ghtml

Agência Brasil

https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2025-07/sancao-de-trump-contra-brasil-e-chantagem-politica-e-mira-o-brics

BBC https://www.bbc.com/portuguese/articles/c8xv9yygx9po 

TERRA https://www.terra.com.br/noticias/ameaca-de-tarifas-acende-alerta-sobre-interferencia-dos-eua-nas-eleicoes-de-2026,c252120b783a1be2ef8c639af130bf9f176pvwus.html#google_vignette

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Imagem de capa: Unplash

EUA-Brasil: Grupos tentam criar pânico sobre navio de guerra estar a caminho de Brasília

Circula nas redes sociais o boato de que um navio de guerra dos Estados Unidos estaria se aproximando da capital do Brasil, para aportar no Lago Paranoá, como forma de intimidação ao governo brasileiro e ao STF. Essa informação é absurda e falsa.

O Lago Paranoá é um lago artificial localizado em Brasília, onde não há ligação com o mar. O lago é inacessível para embarcações de grande porte, como navios de guerra. Além disso, não há nenhum registro oficial de movimentação militar estrangeira rumo ao Brasil — tampouco qualquer comunicado diplomático ou militar que confirme esse tipo de ação.

A imagem de um navio repostada por alguns perfis extremistas é, na verdade, uma foto genérica ou retirada de outros contextos, sem qualquer relação com o Brasil.

A medida seria uma forma de retaliação ao governo federal e ao STF por terem não apenas respondido às exigências ao Brasil, em carta divulgada na internet pelo presidente dos EUA Donald Trump, dirigida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 9 de julho passado, como também imposto medidas cautelares sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, com tornozeleira eletrônica. Entre as exigências consta, principalmente, a anistia a Bolsonaro dos crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado em 2022 e 2023, que lhe foram atribuídos por investigação da Polícia Federal do Brasil e estão em processo de julgamento pelo STF.

Estratégia

Esta mentiras é parte de uma uma onda de desinformações que tentam associar uma presença militar norte-americana fictícia a uma “invasão” ou “ataque” ao Brasil, com o objetivo de gerar medo e instabilidade social. É uma estratégia promovida por grupos extremistas de direita que espalham pânico e desinformação nas mídias sociais, como Bereia já mostrou em diversas matérias. Estas mentiras se articulam com uma conspiração política que tem se configurado, segundo várias análises, e envolve influenciadores brasileiros e interesses estrangeiros. 

Revogação de vistos de ministros do STF, investigações contra aliados de Jair Bolsonaro e ameaças comerciais compõem um cenário mais amplo de interferência externa fazem parte de um movimento mais profundo de pressão geopolítica, segundo estas avaliações mais amplas do caso. O governo Trump estaria usando o caso do julgamento de Jair Bolsonaro para buscar interferir nas eleições de 2026, favorecer candidatos alinhados aos interesses estratégicos estadunidenses e pressionar as instituições brasileiras por um alinhamento às políticas de controle econômico-financeiro daquele país.

Leitura recomendadas:

UOL – https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2025/07/18/antes-de-operacao-eduardo-bolsonaro-ironizou-moraes-com-fala-sobre-porta-avioes-no-paranoa.htm

Carta Capital – https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/eduardo-bolsonaro-sugeriu-acao-dos-eua-com-porta-avioes-em-brasilia-um-dia-antes-de-operacao-da-pf/

Le Monde Diplomatique – https://diplomatique.org.br/uma-decada-de-desestabilizacao-e-guerra-hibrida/

New Yorker https://www.newyorker.com/magazine/2025/04/14/the-brazilian-judge-taking-on-the-digital-far-right ]

BBC https://www.bbc.com/portuguese/articles/c8xv9yygx9po 

Terra https://www.terra.com.br/noticias/ameaca-de-tarifas-acende-alerta-sobre-interferencia-dos-eua-nas-eleicoes-de-2026,c252120b783a1be2ef8c639af130bf9f176pvwus.html#google_vignette 

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Vídeo com fala do deputado Marco Feliciano contra a redução da jornada de trabalho é autêntico 

Voltou a circular nas redes digitais um recorte de vídeo que mostra o deputado federal Pastor Marco Feliciano (PL-SP) discursando contra a redução da jornada de trabalho, que hoje segue a escala de seis dias de atividade e um de descanso. No vídeo, Feliciano afirma: “Democracias sérias e maduras, como os Estados Unidos da América e o Japão, todas as pessoas trabalham até a exaustão, para verem a prosperidade, a riqueza e tudo mais”.

A discussão do tema se intensificou nas redes digitais nos últimos dias, diante da ameaça de parlamentares de oposição ao governo federal de barrarem a proposta governamental de isenção de imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil. Com isso, o corte com a fala de Feliciano voltou às redes. Nas novas postagens, a fala do pastor evangélico é usada como argumento de que deputados como ele atuam no Congresso Nacional para barrar direitos de trabalhadores.

Imagem: Recorte do vídeo da sessão que está circulando pelas redes.

Com a ampla repercussão nas redes, usuários passaram a questionar a autenticidade do conteúdo, e levantaram suspeitas de manipulação por inteligência artificial. Diante da viralização do vídeo e das dúvidas sobre sua veracidade, o Bereia verificou o conteúdo para esclarecer os fatos e confirmar se o material é autêntico.

A autenticidade do vídeo

O vídeo é verdadeiro e é um trecho da gravação de sessão da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, realizada em 5 de junho de 2024, no Anexo II, Plenário 9, durante a discussão de propostas legislativas. No trecho, Marco Feliciano se posiciona de forma contrária a um requerimento da também deputada Erika Hilton (PSOL-SP), referente à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n, 8/2025, apresentada por um grupo de parlamentares liderado por ela, que propõe a redução da jornada de trabalho no Brasil para quatro dias da semana. 

Imagem: Sessão da Comissão de direitos humanos, minorias e igualdade racial, em 05 de junho de 2024.

O contexto da fala

Durante a sessão da comissão, a presidência   anunciou a votação do Requerimento de Retirada de Pauta nº 51/2024, de autoria da deputada Erika Hilton. O pedido solicitava a realização de uma audiência pública para debater, em parceria com o movimento “Vida Além do Trabalho”, a redução da jornada de trabalho no Brasil e o fim da escala de seis dias de trabalho por um de descanso (6×1). Coube ao deputado Marco Feliciano encaminhar a votação do requerimento.

Na fala, o parlamentar afirmou que, embora seu partido, o PL, não tenha objeções a audiências públicas, é papel da oposição utilizar instrumentos regimentais como o “kit obstrução” quando não há consenso. “Todos os assuntos, por mais esdrúxulos que sejam, precisam ser debatidos. Todavia, como não houve acordo, vamos usar aquilo que nós, como oposição, sempre fazemos”, declarou.

Feliciano prosseguiu com críticas diretas ao conteúdo da proposta da PEC: “Pelo que entendo aqui, é propor que esta Câmara dos Deputados se debruce sobre um assunto para diminuir a jornada de trabalho do trabalhador brasileiro, parece que para quatro dias na semana, diminuindo ainda para seis horas de trabalho. Eu acho isso uma excrescência, pessoalmente falando. Acho que o ser humano é digno do seu trabalho, e todo trabalho dignifica o homem. Temos um país que precisa crescer, e só há crescimento se houver trabalho.”

Em seguida, ele cita outros países como exemplo: “Democracias sérias e maduras, como os Estados Unidos da América e o Japão, todas as pessoas trabalham até a exaustão para verem a prosperidade, a riqueza e tudo mais. Para nós, do PL, inclusive, o maior método de ação social que o governo pode oferecer ao ser humano é dar a ele trabalho. Por isso, nos declaramos contra o requerimento e pedimos que seja retirado de pauta”, finalizou o deputado. 

A resposta de Erika Hilton

Logo após a fala do deputado evangélico, a parlamentar autora do requerimento. Erika Hilton. rebateu as críticas, e defendeu a pauta ao criticar a visão que, conforme ela, ainda reforça um modelo opressor de trabalho no Brasil. Ela fez uso do mesmo argumento do colega deputado: “Outros países do mundo, mais desenvolvidos do que o nosso e que entendem a relação do trabalho de uma maneira não escravocrata e opressora, como nós ainda entendemos, já avançaram com essa política”, argumentou.

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Em resposta às suspeitas de manipulação digital, o Bereia confirma que o conteúdo é autêntico e parte de um vídeo, gravação de sessão da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, realizada em 5 de junho de 2024, registrada e publicada no canal do órgão no YouTube. A fala de Marco Feliciano ocorreu de fato, sem indícios de edição ou uso de inteligência artificial.

Referências: 

Youtube.https://www.youtube.com/live/ecI2_TZKKqQ?si=urQqs9X63ZTgyQPe&t=499. Acesso em 07 de julho de 2025. 

Desinformação sobre translado de Juliana Marins circula entre líderes religiosos e portais gospel

A morte da jovem brasileira Juliana Marins, de 26 anos, em 24 de junho, durante uma trilha no Monte Rinjani, na Indonésia, gerou comoção nacional e uma onda de desinformação sobre o traslado de brasileiros mortos no exterior. Opositores do governo federal passaram a compartilhar conteúdos enganosos com alegação de que o Estado teria se recusado a cumprir uma “obrigação” de repatriar o corpo, o que não corresponde à legislação vigente até então.

Bereia identificou que essas mentiras passaram a circular também em grupos de WhatsApp com pastores evangélicos e em portais de notícias gospel.

Entenda o caso

O Decreto nº 9.199/2017, assinado pelo então presidente da República Michel Temer (MDB) e a Lei nº 9.199/2019, aprovada aprovada no primeiro ano do mandato de Jair Bolsonaro (PL) estabelecem que o governo federal não poderia custear sepultamentos ou translado de corpos de brasileiros falecidos no exterior, salvo em situações excepcionais, como missões oficiais. 

Diante dessa limitação jurídica, em 25 de junho, o Itamaraty informou à família da jovem morta na trilha do vulcão que prestaria assistência consular, mas não poderia arcar com as despesas do traslado.

Diante da repercussão e comoção com o caso e do apelo da família, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva telefonou ao pai de Juliana Marins e anunciou a mudança da norma.

O Decreto nº 12.535, publicado neste 27 de junho, prevê agora a possibilidade de o governo federal custear, em caráter excepcional, o traslado de brasileiros falecidos no exterior, desde que haja comoção pública, comprovação de vulnerabilidade econômica da família, inexistência de seguro ou vínculo com missões oficiais.

Apesar da mudança legal, o monitoramento do Bereia aponta que vídeos, postagens e matérias de viés religioso têm atribuído falsamente ao governo uma omissão deliberada, sem contextualizar o marco legal anterior nem a alteração feita por decreto.

Para a editora-geral do Bereia Magali Cunha, o episódio revela como tragédias podem ser instrumentalizadas politicamente: “Há um uso recorrente de desinformação em ambientes religiosos digitais para reforçar discurso de oposição ao governo federal. Mesmo em momentos de luto, a verdade é sacrificada em nome de disputas ideológicas. A oposição é saudável e necessária em uma democracia, porém tal estratégia precisa ser refutada”.

O novo decreto ainda dependerá de regulamentação do Ministério das Relações Exteriores e da disponibilidade orçamentária para ser aplicado a outros casos. Enquanto isso, a família de Juliana Marins aguarda a chegada do corpo e segue em luto, agora com o apoio oficial do Estado brasileiro para que a jovem seja sepultada no país.

Relembre o caso

Juliana Marins, moradora de Niterói, Rio de Janeiro, desapareceu no sábado, 21 de junho, após escorregar de um penhasco durante uma escalada no segundo maior vulcão da Indonésia. Seu corpo foi localizado por um drone dois dias depois e resgatado apenas na quarta, 25 de junho, após sucessivos atrasos causados por terreno íngreme e mau tempo. 

A família afirmou que houve negligência das autoridades locais no resgate, pois a jovem teria sido ouvida com vida horas após o acidente. A tragédia mobilizou apoio popular nas redes e gerou uma campanha pública para financiar o retorno do corpo ao Brasil.

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Imagem de capa: reprodução da internet

Nada será como antes: os desafios da era digital a uma pastoral libertadora

*Artigo publicado originalmente pelo Instituto Humanitas da Unisinos

A era digital – um tempo revolucionário marcado por realizações tecnológicas que, há poucas décadas, eram imagináveis apenas em desenhos animados, como o dos Jetsons, e em filmes de ficção – transformou não só a nossa capacidade de comunicar e de acessar informação.

Este tempo transformou muito fortemente os relacionamentos, o transporte, a medicina, a economia, o trabalho, o lazer, o consumo, a política, as religiões, a educação! Cada vez mais é preciso assumir a consciência de que nada será como antes depois da era digital!

Tivemos a comprovação do que é possível com estas tecnologias digitais no período da pandemia da covid-19, agora vivemos um tempo de euforia e perplexidade diante das novas modalidades de inteligência artificial (IA).

Nada será como antes! Isto significa buscar capacidade, condições de viver estas transformações sem abdicar de elementos fundamentais que formam os valores cristãos, para a coexistência humana e para a sobrevivência também.

Se não podemos negar a contribuição da cultura digital na agilização e na facilitação de várias frentes da cotidiana, ao mesmo tempo, temos densas dimensões críticas do ponto de vista social. Entre elas está a intensa redução dos postos de trabalho que são ocupados por máquinas, gerando alta no desemprego e consequências graves, e o fenômeno da “uberização” – o trabalho por aplicativos explorado ao máximo. Também, o aumento das desigualdades sociais, a partir da distinção entre as pessoas mais e menos qualificadas tecnologicamente, e a fixação das pessoas nas telas com o tempo livre sendo preenchido com conteúdo informativo, de trabalho, de entretenimento.

A concorrência de mercado pelo controle das mídias digitais e para extrair delas mais estímulos para o consumismo, coloca a privacidade em questão. É a algoritmização da relação empresas digitais-usuários, com amplo uso dos nossos dados pessoais – registros, fotos. E isto mexe com um fenômeno que é a sobrecarga de escolhas – nunca fomos submetidos a um cardápio tão grande de opções: de informação, de entretenimento, de serviços. Gasta-se um tempo considerável diante da tela escolhendo – um clique leva a outro, mas ao mesmo tempo temos a demanda da rapidez. Isto mexe com o processo cognitivo e gera incômodos, especialmente para quem não tem recursos financeiros para dar um clique rápido.

É fato que o digital aproximou pessoas e contribuiu com a superação de isolamentos sociais. Porém, ele provocou distanciamentos e novos isolamentos com o fortalecimento da aproximação entre iguais e rejeição dos diferentes – a ideia de bolhas digitais. Resultado disto é o aumento de expressões de violência, com o uso das tecnologias para atacar, ofender, agredir, caluniar, ameaçar. Algumas pessoas se expõem e outras fazem uso de perfis anônimos.

A facilidade do acesso às plataformas digitais se tornou livre acesso para articulações extremistas, em torno do ódio: desde disputas pessoais, grupais, linchamentos públicos, até mesmo grupos nazistas estão ganhando força no país!

A agressividade também se manifesta de outras formas: os cancelamentos. Em questão de minutos, a partir de uma divergência, uma discordância, um desafeto, alguém pode ser exposto negativamente e ser submetido ou submetido a um boicote virtual. Isto é uma punição e pode levar a pessoa julgada ao esquecimento social, ao isolamento forçado. Essa cultura tem provocado impactos significativos, como expressivo número de casos de suicídio.

Isto acontece no Brasil em diversos níveis, sob a capa de “liberdade de expressão”, a ponto de emergirem personalidades do cenário político e cultural, como representantes de quem defende estas expressões abertas de ódio. São fartamente vivenciadas também divisões entre famílias, círculos de amigos e nas igrejas e comunidades religiosas por conta da ampla assimilação desta cultura de violência.

Este tema nos leva à questão da desinformação – o que é popularmente denominado fake news. Mentir em público para defender interesses, sempre existiu, mas a cultura digital intensificou isto. Porém, a grupos cristãos interessa que pesquisadores mostram que são os que parecem ser os mais propensos à propagação. A passionalidade e a propaganda que atingem estes grupos religiosos são intensamente desenvolvidas por meio do pânico moral e da retórica do medo para gerar insegurança.

A gravidade destas situações ocorre também por carência de legislação para regular tais práticas das plataformas, o que avaliza a soberania das empresas de mídias (big techs) que agem livremente. Elas não oferecem transparência e ganham muito dinheiro com engajamento em violência e desinformação. Não são responsabilizadas até por atos de violência física e patrimonial, como os ataques de 8 de janeiro de 2023, por exemplo.

Tudo isto desafia muito a prática pastoral que se pretende libertadora! Já que a cultura digital é um caminho sem volta, é cada vez mais ampliada, e nada será como antes, não nos cabe o simplismo de tão só demonizar este processo, mas trabalhar por processos críticos, educativos e humanizadores.

Uma pastoral libertadora no contexto da cultura digital pode priorizar alguns caminhos:

1 – enfatizar e recuperar o valor da cultura do diálogo, que é parte do sentido do “ser” humano. Isto significa reconhecer os tempos de amplas possibilidades de comunicação, viabilizadas pelas tecnologias digitais, que faz emergir, porém, a incomunicação que alimenta a cultura do ódio.

2 – oferecer educação midiática digital – compreender não apenas como usar as mídias mas como funcionam, como operam as tecnologias.

3 – Orientar sobre a ética de quem se afirma cristão e cristã e da postura teológica para que haja atitudes compatíveis na ocupação das mídias digitais: não ser fonte de desinformação, não contribuir com polarizações e muito menos com o ódio, pacificar, humanizar, evangelizar as redes e não só nas redes. Questionar o isolamento em bolhas, a negação da diferença e da diversidade, o ódio, a violência, a superficialidade, a exacerbação da aparência (o que se quer mostrar ao invés do que se é de fato) e a religião da aparência e do sensacionalismo “caça-cliques”.

Assumir, portanto, a fé cristã em espaços digitais significa evocar uma compreensão de comunicação que seja plena, abrangente, ecumênica, e que vise à inserção cristã nos espaços públicos plurais, o que implica participação de cada cristão/cristã como cidadão.

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Imagem de capa: Unplash

Os dez mandamentos para não se espalhar falsidades pelas redes

Brasil analfabeto midiático crê em tudo o que vem do zap e compartilha fake

por Leonardo Sakamoto

Ao mesmo tempo, muita gente compartilha um conteúdo sem checar a fonte da informação ou a sua veracidade não apenas porque concorda com ela (mesmo que esteja errado), mas porque sabe que ele vai lhe garantir simpatia de amigos, colegas, familiares e conhecidos. O “like” é um lugar quentinho. Quem não gosta de uma chuva de likes? Mas uma tempestade de endosso público por vezes ocorre às custas dos impactos negativos de uma mentira viralizada.

Leia o texto de Leonardo Sakamoto, com colaboração de Artur Vieira, que elenca “dez mandamentos” para usuários das mídias sociais não espalharem desinformação, publicado no portal Uol.

Deputado evangélico Nikolas Ferreira publica mais um vídeo enganoso como estratégia política de oposição

Um vídeo sobre a crise das fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi a mais recente publicação enganosa de grande alcance produzida pelo deputado evangélico Nikolas Ferreira (PL-MG). Bereia verificou que o vídeo publicado no último 6 de maio, além de distorcer informações sobre o caso e de afirmar como verdade que a falsa informação de que o escândalo é “o maior da história do Brasil”, também utiliza as mesmas estratégias adotadas em vídeo anterior de autoria do deputado sobre a taxação do Pix. A publicação viralizou rapidamente e conta com mais de uma centena de milhões de visualizações em apenas uma plataforma. 

No vídeo, Nikolas Ferreira mantém o tom alarmista e usa recursos como envelhecimento de sua imagem, cortes e zoom rápidos, e música dramática ao fundo na edição do vídeo para comover e persuadir os espectadores. Ainda, são projetados gráficos e trechos de notícias de veículos jornalísticos para reforçar e legitimar o discurso do deputado acerca da urgência e da gravidade do conteúdo divulgado

A técnica captura a audiência por mais de seis minutos de duração, acelerando a viralização do conteúdo e gerando engajamento ao solicitar que o público interaja nos perfis dos presidentes das Casas Legislativas federais a favor da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os roubos dos aposentados e pensionistas vitimizados.

Deputado chamou cristãos de “frouxos” 

Na mesma data da publicação, Nikolas Ferreira havia afirmado, em outra plataforma, que as lideranças cristãs foram “frouxas” e sem compaixão por não se manifestarem “frente a todos os escândalos desse Governo”. No texto, o deputado federal apela para a religiosidade como mecanismo para promover a mobilização de seus apoiadores, em especial aqueles que seguem os valores cristãos.

Reprodução: X

Mídias evangélicas demostraram apoio ao pronunciamento viral de Nikolas Ferreira. Como já havia feito em relação ao vídeo sobre o Pix, publicado em janeiro pasado, o site evangélico Pleno.News, por exemplo, enalteceu o novo conteúdo ao utilizar adjetivos como “didático” e  afirmar que o parlamentar explica o escândalo do INSS “com riqueza de detalhes”. 

Imagem: Reprodução Pleno.News

O escândalo no INSS

O escândalo no INSS, veio à tona em 23 de abril deste 2025, em operação deflagrada pela Controladoria-Geral da União (CGU) e a Polícia Federal, denominada “Operação Sem Desconto”. O caso envolve milhares de aposentados e pensionistas, que tiveram parte de seus benefícios descontados sem consentimento, o que levou a Polícia Federal e a CGU a iniciarem a investigação para apurar o caso.

Os órgãos do governo federal levantaram a prática sistemática de desconto de mensalidades associativas sem autorização de aposentados e pensionistas ou sem o seu conhecimento. Segundo a denúncia, algumas associações eram responsáveis pela filiação automática dos beneficiários do INSS. 

Foi descoberto que havia pagamento de propina a servidores, uso de associações de fachada e lobistas. Na investigação, foi demonstrado que o INSS autorizou desbloqueios em lote de descontos em diversos benefícios, sem registros de autorização prévia. Todos os desvios estão registrados em extratos bancários.

A investigação revela que o esquema teria sido possivelmente iniciado em 2019, primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, facilitado por políticas como o desmonte da empresa pública DataPrev, que dá suporte tecnológico à Previdência Social, com o objetivo de privatizá-la e a concessão de empréstimos consignados a aposentados e pensionistas geridos pelo próprio INSS. O relatório da investigação mostra que as fraudes tiveram continuidade durante o governo Lula, e que foi dada ciência de denúncias ao ministro da Previdência Carlos Lupi (PDT/RJ). Pressionado por ter sido responsabilizado pela extensão das fraudes até 2024, Lupi pediu demissão do cargo, em 2 de maio. 

Segundo relatório da investigação, de 2019 a 2024, o esquema de fraudes no INSS envolveu cerca de 6,3 bilhões de reais, com práticas de corrupção, lavagem de dinheiro e falsificação. Além de cinco servidores da alta cúpula do INSS, pelo menos 11 entidades estão diretamente envolvidas na fraude.

Até a publicação desta matéria, como resultado da Operação, por meio da CGU, do Tribunal de Contas da União e da Advocacia Geral da União, o governo federal havia suspendido todos os descontos associativos na folha do INSS;  estruturado um plano de devolução de valores que alcance pessoas lesadas também durante o governo anterior; afastado os servidores envolvidos; criado uma força-tarefa para realizar auditorias internas, reestruturar os procedimentos de autorização, garantir transparência e segurança aos segurados; pedido à Justiça o bloqueio de bens das associações envolvidas para serem usados no pagamento das indenizações.

Governo federal se pronuncia contra a publicação do deputado

O governo federal se pronunciou contra o conteúdo do vídeo de Nikolas Ferreira, por meio da CGU. O órgão publicou um vídeo nas mídias sociais para contrapor este conteúdo, no qual o ministro do órgão Vinicius Marques de Carvalho explica o caso e as providências. Carvalho afirmou nesse pronunciamento, que “não é hora de espalhar medo ou mentira” e “é muito grave usar a mentira ou truques de contexto para enganar o povo ou politizar um tema tão importante para o país, que é o combate à corrupção”. 

Imagem: Reprodução de vídeo publicado pela Controladoria-Geral da União no X

Além do vídeo, o ministro da CGU tem feito vários pronunciamentos e participado de entrevistas para esclarecer a população e evitar enganos e pânico em torno do caso. Ele tem enfatizado que a Operação Sem Desconto buscou defender os aposentados de “uma fraude que acontecia há muitos anos e que as entidades envolvidas fecharam acordos antes de 2023”.

A ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais Gleisi Hoffmann publicou texto em seus perfis de mídias sociais em contraposição ao vídeo do deputado evangélico. Ela afirmou que nada foi feito pelo governo anterior para investigar ou coibir os roubos aos aposentados, o que foi investigado e encaminhado no atual governo. Ela também mencionou que a Medida Provisória (MP) que eliminou a necessidade de autorização individual e confirmada para descontos foi aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro em 2022. Ela disse ainda que “o governo está trabalhando para que o mais rápido possível essas entidades respondam pelo que fizeram e façam o ressarcimento devido aos aposentados. As quadrilhas e as associações fraudulentas terão de devolver tudo que roubaram”. 

Imagem: Reprodução de publicação da Ministra Gleisi Hoffmann, perfil no X

O líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), rebateu o vídeo de Nikolas Ferreira com produção própria em que afirma que “Nikolas mente” e anuncia “jogar luz nessa história”. “Bolsonaro foi avisado da fraude. Por que não agiu? Por que não colocou a CGU? Por que não chamou uma investigação da Polícia Federal?”, questionou. 

Imagem: vídeo do deputado Lindbergh Farias (PT/RJ), perfil do X

Outras lideranças da base do governo federal, como os deputados Paulo Pimenta (PT/RS) e André Janones (Avante/MG) também publicaram conteúdo em contraposição ao material viralizado.

Imagem: Vídeo do deputado Paulo Pimenta (PT/RS), Perfil do X

Vídeo engana ao distorcer, exagerar e omitir dados sobre fraudes no INSS para responsabilizar o atual governo

Bereia verificou que de fato, no novo vídeo, o deputado Nikolas Ferreira, engana com distorções, exageros e omissões sobre o caso das fraudes no INSS.

O deputado engana ao afirmar que um novo relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) teria apurado a movimentação de R$90 bilhões, em 2023, pelo INSS. A CGU explica  e o relatório da investigação demonstra que este valor é o total que a população que aderiu ao crédito consignado movimentou em 2023, e que ele não tem qualquer relação com os descontos associativos que envolveram as fraudes em questão. O ministro da CGU alerta que esta é a manipulação indevida de um número que não consta no relatório sobre as fraudes do INSS. Segundo o ministro da CGU, em entrevista, “quem faz este tipo de caixa não está querendo informar a população, está querendo enganar a população”.i

O deputado federal cria falso alarde com o exagero de tratar das fraudes no INSS como “o maior escândalo da história do Brasil”. Na realidade, esta posição é ocupada pelo chamado “Orçamento Secreto”, instituído em 2020, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) com o então presidente da Câmara Federal Arthur Lira (PP/AL). O mecanismo de emendas de relatoria designou mais de R$46  bilhões até 2022 para gastos indicados por parlamentares, sem transparência sobre autoria ou finalidade. De acordo com a  Transparência Internacional Brasil, o “Orçamento Secreto” é considerado o maior processo de “institucionalização da corrupção” no Brasil, devido à sua escala, falta de fiscalização e impacto nos cofres públicos.

O deputado, ao usar o conteúdo como campanha de oposição ao governo Lula, omite que a fraude tenha tido início, segundo as investigações, como já registrado nesta matéria, durante o governo de Jair Bolsonaro. Nikolas Ferreira faz crer que as fraudes, que envolvem servidores públicos e associações prestadoras de serviços a aposentados, teriam sido planejadas e executadas pelo atual governo. As ações fraudulentas, de fato, se estenderam neste mandato, como mostram as investigações, o que causou a demissão do ministro da Previdência Social, por inação, porém foram iniciadas muito antes, pelo menos, desde 2019.

Além das afirmações enganosas, o deputado evangélico faz uso de imagens com fundo preto, expressões faciais e simulação de sua face envelhecida para apelar às emoções. Tais recursos embalam as distorções de informações verdadeiras com descontextualização e omissões.  

***

Bereia classifica o vídeo do deputado evangélico Nikolas Ferreira como enganoso. Ferreira faz uso de um fato existente – o esquema de fraudes no INSS – tornado público por investigação iniciada pelo atual governo, para distorcer e exagerar conteúdo que tem como objetivo responsabilizar unicamente este mesmo governo pelo caso. Além disso, o deputado usa de discurso e imagens promotoras de pânico para captar atenção à sua campanha de oposição. Na linha de ações frequentemente checadas pelo Bereia, este parlamentar tem feito uso de desinfomação (falsidades, mentiras, enganos) como estratégia política, o que é altamente nocivo à democracia.

Bereia alerta: diante de um contexto democrático, é fundamental se informar por meio de fontes variadas antes de concluir que uma informação é totalmente confiável. Figuras políticas que fazem oposição ao governo vigente são necessárias para a manutenção de debates saudáveis e fiscalização dos governantes. No entanto, a oposição deve ser feita de forma digna e não com base em mentiras e terror verbal.

Por isso, é necessário observar de maneira crítica o conteúdo produzido e divulgado pelos representantes da população no Parlamento, pois podem manipular conteúdos a fim de captar apoio às suas pautas e convencer na destruição de reputações que promovem. É recomendável verificar a procedência das informações antes de compartilhá-las ou criticá-las. Algumas dicas essenciais são:

  • Não acredite automaticamente nas informações utilizadas em vídeos de atores políticos: busque as fontes originais, verifique os fundamentos propagados e mantenha o olhar crítico.
  • Esteja atento aos recursos de cunho emotivo, utilizados para provocar sentimentos como indignação, raiva e medo para gerar engajamento.
  • Pesquise antes de compartilhar: uma busca rápida sobre o que é fato pode evitar a propagação de desinformação.

Referências

Controladoria- Geral da União, Perfil no Instagram https://www.instagram.com/reel/DJZEmGPRCc5/?igsh=MXV3bHRpcXZxMm4zMg== acesso 15 mai 2025

Controladoria-Geral da União, Perfil no Instagram

https://www.instagram.com/reel/DJZEmGPRCc5/?igsh=MXV3bHRpcXZxMm4zMg%3D%3D
acesso 15 mai 2025

G1

https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/08/21/governo-anuncia-plano-para-privatizar-nove-empresas-estatais.ghtml acesso 15 mai 2025

Valor Econômico

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/05/12/inss-pode-perder-papel-de-intermediacao-de-descontos-e-emprestimos-consignados.ghtml acesso 15 mai 2025

Agência Brasil

https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202504/ministro-da-cgu-detalha-acoes-do-governo-sobre-fraude-contra-o-inss acesso 15 mai 2025

EBC na Rede

https://twitter.com/ebcnarede/status/1920258796573634619
acesso 15 mai 2025

Gleisi Hoffmann, perfil X

https://twitter.com/gleisi/status/1920186238444708072
acesso 15 mai 2025

Lindbergh Farias, perfil X

https://twitter.com/lindberghfarias/status/1920231253254557969
acesso 15 mai 2025

Paulo Pimenta, perfil X

https://twitter.com/Pimenta13Br/status/1920869536196424061
acesso 15 mai 2025

Canal Gov

https://twitter.com/canalgov/status/1920265518444912981
acesso 15 mai 2025

Noticias UOL

https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2025/05/08/pf-nao-disse-que-fraude-no-inss-chega-a-r-90-bi.htm acesso 15 mai 2025

Folha de S. Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/blogs/hashtag/2025/05/nikolas-ferreira-repete-formula-e-viraliza-acusando-governo-em-escandalo-do-inss.shtml acesso 15 mai 2025

Congresso em Foco

https://www.congressoemfoco.com.br/coluna/29748/orcamento-secreto-e-o-maior-esquema-de-corrupcao-institucionalizada-da-historia-diz-diretor-da-transparencia-internacional acesso 15 mai 2025

G1

https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/05/07/fraude-no-inss-gera-onda-de-desinformacao-nas-redes-governo-alerta-para-golpes.ghtml acesso 15 mai 2025

Boletim de Fé: iniciativa de Belo Horizonte une Bíblia e checagem para combater fake news em grupos religiosos

Um boletim de áudio semanal, lido por lideranças comunitárias das periferias de Belo Horizonte (MG), vem se tornando uma ferramenta inovadora no enfrentamento à desinformação em ambientes religiosos. O Boletim de Fé é uma iniciativa do Observatório Participativo da Desinformação, da ONG Agência de Iniciativas Cidadãs (AIC), em parceria com o Coletivo Bereia, especializado em checagens de conteúdo religioso.

O programa traz uma reflexão bíblica seguida de uma checagem de informação que circulou nos grupos religiosos. O conteúdo é produzido pela equipe da AIC e veiculado em uma lista de WhatsApp, além de ser disponibilizado em plataformas digitais. Junto ao áudio, os ouvintes recebem um resumo escrito e o link para a fonte confiável da informação. 

A ideia nasceu a partir da percepção, relatada por lideranças ouvidas pelo Observatório, de que a desinformação muitas vezes se apoia em interpretações distorcidas da Bíblia para se espalhar nas comunidades de fé. Na visão do coordenador de projetos Juliano Antunes, se a desinformação muitas vezes chega amparada por uma reflexão teológica, a estratégia de enfrentamento também precisa oferecer esse mesmo suporte.

“No Observatório, temos cada vez mais entendido que a desinformação está sempre muito relacionada a um contexto de ideias e discursos. Em nossa escuta com 21 lideranças evangélicas, muitos apontaram que uma leitura fundamentalista e distorcida da Bíblia tem favorecido a promoção de desinformações sobre várias questões — desde políticas públicas, como a Lei Maria da Penha, até temas relacionados à comunidade LGBTQIA+ e às religiões de matriz africana”, detalha Antunes.

O episódio de estreia do Boletim de Fé tratou de uma checagem do Bereia sobre vídeos e mensagens que alegavam perseguição e mortes em massa de cristãos na Síria. O conteúdo que citava um suposto massacre de 1.800 cristãos foi classificado como enganoso. As informações não foram confirmadas por agências internacionais como ONU, BBC e CNN, e os relatos indicam que os ataques recentes atingiram majoritariamente a minoria alauita e não cristãos.

Imagem: acervo/AIC

A escolha de uma liderança local como a voz do boletim é estratégica: ao reconhecer a força dos laços comunitários, o projeto busca tornar o porta-voz da verdade alguém em quem a audiência já confia. O objetivo é nítido — reduzir o impacto das fake news nas comunidades de fé, muitas vezes mais suscetíveis à desinformação pela própria lógica de confiança e compartilhamento nos grupos religiosos. Para a diretora da AIC e coordenadora do Observatório, Emanuela São Pedro, o engajamento das lideranças religiosas é fundamental nesse processo.

“As lideranças estão próximas das pessoas, convivem com seus desafios e são referências de confiança. Quando falamos de lideranças religiosas, essa relação é ainda mais forte, pois lidamos com as crenças e a fé. Por isso, é fundamental que essas lideranças se comprometam em orientar de forma crítica e segura sobre as informações que circulam, e promovam o crescimento das pessoas, não alimentando informações enganosas ou distorcidas. Achamos que esse é um caminho coerente com a mensagem cristã”, afirma a diretora.

Criado pela AIC em 2022, o Observatório Participativo da Desinformação tem como missão fomentar formas coletivas, colaborativas e criativas de combate às fake news, sempre a partir da escuta e articulação com iniciativas locais. “A partir dessa escuta, temos desenvolvido campanhas que respondem demandas trazidas por lideranças comunitárias no enfrentamento à desinformação. Além disso, já realizamos campanhas sobre o direito à moradia, golpes cibernéticos, eleições municipais, dentre outras”, afirma Emanuela São Pedro. O projeto atua hoje na região Metropolitana da capital mineira e em territórios como o Morro do Papagaio, o Aglomerado da Serra, a Pedreira Prado Lopes e Ribeirão das Neves, mobilizando jovens, coletivos e lideranças comunitárias.

A proposta do Observatório parte da premissa de que a desinformação é uma ameaça concreta ao Estado de Direito, às instituições democráticas e à formulação de políticas públicas. Por isso, aposta em ações enraizadas na comunicação comunitária, buscando enfrentar a desinformação com estratégias próximas, afetivas e de pertencimento.

Quando fé vira alvo da mentira

A relação entre desinformação e religião tem sido objeto de diversas pesquisas. Durante a pandemia, o uso de aplicativos de mensagens por igrejas e comunidades de fé se intensificou. Estudo do Grupo de Estudos sobre Desigualdades na Educação e na Saúde (Gedes) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostrou que 49% dos entrevistados afirmaram ter recebido conteúdos enganosos em grupos religiosos. Quase 30% admitiram ter repassado esses conteúdos, mesmo sabendo que eram falsos, por concordarem com a mensagem.

Outro levantamento, realizado pela Universidade de Brasília, revelou em 2023 que o perfil mais associado à disseminação de fake news sobre vacinas no Brasil é formado por pessoas evangélicas, com idade entre 35 e 44 anos, escolaridade até o ensino médio e pertencentes às classes D e E. Os principais canais utilizados foram o Telegram, o TikTok e o Jornal da Record.

Desinformação: um risco em escala global

A urgência do enfrentamento à desinformação não se restringe às comunidades locais. De acordo com o Relatório de Riscos Globais 2025, publicado durante o Fórum Econômico Mundial, a desinformação está entre as maiores ameaças à estabilidade democrática, à saúde pública e à convivência social no mundo.

Estudos do projeto Cybersecurity for Democracy, da Universidade de Nova York (NYU), mostram que perfis de extrema-direita têm maior alcance nas redes e raramente são penalizados, mesmo propagando informações falsas. Nesse cenário, cresce a importância de iniciativas educativas e de checagem acessíveis à população.

Com iniciativas como o Boletim de Fé, o Observatório aposta na reversão desse quadro. A ideia é simples, mas potente: promover informação de qualidade por meio de vozes em quem as comunidades já confiam — e assim, criar um elo entre fé, cidadania e verdade.

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Vídeo falso anuncia que pastor influenciador vende tratamento para diabetes

Circula nas mídias sociais um vídeo que usa indevidamente a imagem do pastor influenciador midiático e empresário Cláudio Duarte para promover um suposto tratamento contra a diabetes. A peça de desinformação, que acumula quase um milhão de visualizações no Facebook, até o fechamento desta matéria, apresenta evidências claras de manipulação de áudio e vídeo. 

Análises técnicas mostram que se trata de uma montagem grosseira, prática recorrente em golpes que visam explorar a confiança do público religioso para vender produtos ou tratamentos sem comprovação. A publicação já ultrapassa quase um milhão de visualizações na plataforma. O conteúdo foi enviado por leitor ao Bereia, pelo número de WhatsApp do coletivo, para checagem.

O vídeo 

O vídeo compartilhado no Facebook mostra o pastor Cláudio Duarte  aparentemente recomendando um tratamento para o “fim da diabetes”. O material traz sobreposições de texto com apelos religiosos, como “Presença de Deus no tratamento”, e mensagens de incentivo para que os espectadores cliquem em um botão para falar com um “especialista”.

Além disso, o vídeo viralizado é acompanhado de imagens de medicamentos genéricos, seringas e caixas de remédios. Além do vídeo manipulado, a publicação analisada conta com comentários que simulam depoimentos de pessoas satisfeitas com o suposto tratamento para diabetes.
Em um dos exemplos, uma usuária afirma: “Já é a segunda vez que compro, único tratamento que regula a glicose. Consigo comer o que gosto. Recomendo!”, acompanhado de emojis positivos e imagem do produto.

Imagem: reprodução/Facebook

Este tipo de comentário, aparentemente espontâneo, é frequentemente utilizado em mídias sociais para dar falsa credibilidade ao golpe, induzindo outros usuários a acreditarem na eficácia do produto anunciado. A prática é comum em fraudes virtuais e visa manipular o público por meio de falsos testemunhos.

Análise técnica do conteúdo

Para esta verificação do Bereia, foi utilizada a ferramenta InVID-WeVerify, uma extensão de navegador voltada para jornalistas e checadores de fatos. Ela permite analisar vídeos suspeitos, extraindo imagens importantes (os chamados “quadros-chave” ou keyframes) e revela se o material foi editado ou manipulado.

Keyframes são como “fotografias congeladas” retiradas de momentos estratégicos do vídeo, que ajudam a identificar cortes, edições e inserções estranhas que podem passar despercebidas durante a reprodução normal.

 Limitações na análise de vídeos em mídias sociais

Importante destacar que, atualmente, mídias sociais como o Facebook e o X dificultam a análise técnica de vídeos ao restringirem o acesso a informações internas, como metadados e dados originais dos arquivos.


Essas limitações obrigam os checadores a fazer o download dos vídeos e analisá-los manualmente ou por meio de ferramentas alternativas, como o aplicativo usado pelo Bereia. Mesmo assim, sinais visíveis de manipulação, como cortes bruscos, sobreposição de imagens e incoerência de áudio, podem ser identificados com clareza por qualquer pessoa mais atenta.

Quadros-chave revelam montagem

A análise dos quadros-chave mostrou que o vídeo é composto por diversos cortes bruscos, com mudanças de cenário e iluminação entre uma cena e outra — sinais típicos de que diferentes vídeos foram unidos em uma montagem.

Além disso, foram inseridos textos promocionais e imagens gráficas de medicamentos durante o vídeo, tentando passar a falsa impressão de que o pastor recomendava produtos para tratamento de diabetes.

Em alguns trechos, um homem diferente aparece, em outro ambiente, manipulando objetos relacionados a tratamentos de saúde. Isso confirma que imagens de origens distintas foram coladas no mesmo vídeo para criar a falsa narrativa.

Imagem: https://www.invid-project.eu/tools-and-services/invid-verification-plugin/ 

Imagem: https://www.invid-project.eu/tools-and-services/invid-verification-plugin/ 

Imagem: https://www.invid-project.eu/tools-and-services/invid-verification-plugin/ 

Problemas de sincronia labial e gestual

Ao observar a movimentação dos lábios e dos gestos do pastor, fica claro que o áudio não corresponde às imagens. Os lábios não acompanham a fala narrada, e os gestos feitos pelo pastor não se relacionam com o que está sendo dito, evidenciando uma montagem grosseira.

Sobreposição de textos promocionais

Foram adicionadas ao vídeo frases como “PASTOR Cláudio Duarte recomenda tratamento para o fim da diabetes” e “Presença de Deus no tratamento”. Essas mensagens aparecem de forma amadora, sobrepostas à imagem do pastor, acompanhadas de apelos de marketing como “clique no botão e fale com o especialista”. Esse tipo de recurso é usado para induzir o público a  acreditar na falsa propaganda.

Metadados do arquivo

Os metadados são informações técnicas embutidas em arquivos digitais — como a data em que foram criados, o dispositivo usado, o programa de edição, entre outros detalhes. Eles ajudam a identificar a origem e possíveis alterações no material.

No caso do vídeo analisado, os metadados mostram que a data de criação e a modificação do arquivo é registrada como 31 de dezembro de 1903, o que é incompatível com a realidade. Esse tipo de erro é comum em vídeos que passam por manipulações ou edições grosseiras.

Além disso, o arquivo foi “re-exportado” em resolução baixa (360×360 pixels) e compactado, estratégia comum para mascarar sinais de edição e facilitar a disseminação nas redes sociais sem chamar atenção para as falhas visuais.

Imagem: https://www.invid-project.eu/tools-and-services/invid-verification-plugin/ 

Bereia já alertou sobre  fraudes semelhantes

Bereia já alertou anteriormente para práticas semelhantes, em que imagens de líderes religiosos são usadas sem autorização para promover produtos milagrosos ou supostos tratamentos de saúde. Esse tipo de fraude explora a credibilidade de figuras públicas entre o público religioso para vender produtos sem eficácia comprovada, colocando em risco tanto a saúde física quanto a segurança financeira dos seguidores.

Em 2024, uma investigação do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (Netlab) da UFRJ revelou que a imagem do pastor Cláudio Duarte, figura popular nas mídias religiosas, que é também empresário, foi utilizada em 37,6% dos 1.850 anúncios fraudulentos analisados. Esses anúncios, veiculados principalmente no Facebook e no Instagram, promoviam produtos sem eficácia comprovada, como tratamentos para dores articulares e emagrecimento. Muitos desses conteúdos foram manipulados com o uso de inteligência artificial para alterar a voz e a imagem do pastor, criando a falsa impressão de que ele endossava os produtos.

A investigação do Netlab explica que, embora se apropriem das imagens e explorem a popularidade de padres e pastores com conteúdos gerados por inteligência artificial, até o fechamento do relatório, nenhum anúncio havia sido moderado pela Meta (proprietária do Facebook, Instagram e Whatsapp) ou rotulado para sinalizar o uso de IA. 

***

Bereia analisou  o vídeo viralizado em mídias religiosas, enviado por leitor para checagem, e identificou que é manipulado e utiliza indevidamente a imagem do pastor Cláudio Duarte para enganar o público. Não há registros de publicações verídicas em que o  líder religioso promova qualquer tipo de tratamento para diabetes. O conteúdo ora disseminado configura prática fraudulenta, que deve ser denunciada e evitada.

Bereia alerta para que conteúdos desse tipo sejam tratados com desconfiança e recomenda que informações sobre medicamentos e produtos de  saúde sejam sempre buscadas com fontes credenciadas na área, em especial, profissionais de saúde comprometidos com a informação digna.

Referências de checagem:

https://www.invid-project.eu/tools-and-services/invid-verification-plugin/ Acesso em: 26 Abr 2025

https://netlab.eco.ufrj.br/  Acesso em: 26 Abr 2025

https://netlab.eco.ufrj.br/post/a-revela%C3%A7%C3%A3o-chocante-que-pode-mudar-tudo-imagens-de-l%C3%ADderes-religiosos-brasileiros-usadas-em-an%C3%BAn Acesso em: 26 Abr 2025

 https://coletivobereia.com.br/lideres-religiosos-tem-imagem-explorada-em-anuncios-fraudulentos-nas-plataformas-da-meta/   Acesso em: 26 Abr 2025

 https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2024/09/21/fe-no-golpe-de-padre-marcelo-a-malafaia-imagens-de-celebridades-religiosas-sao-usadas-em-fraudes-na-internet.ghtml?utm_source=chatgpt.com Acesso em: 26 Abr 2025

Religiosos e perfis de extrema direta divulgam manchete falsa sobre sucessão do papa Francisco


Páginas ligadas à extrema direita e perfis religiosos nas redes sociais seguem propagando desinformação sobre a sucessão do papa Francisco, mesmo após o conteúdo ter sido desmentido por agências de checagem. O conteúdo foi compartilhado pelo perfil no Instagram “Evangelização para Todos”, autodenominado católico, e por um dos apresentadores da produtora de conteúdo Brasil Paralelo.

Imagem: reprodução/Instagram

Após o anúncio da morte do papa Francisco, em 21 de abril de 2025, começou a circular nas redes sociais uma imagem falsamente atribuída à Folha de S. Paulo, sugerindo que entre os favoritos para suceder o pontífice haveria “apenas dois negros e nenhum LGBTQIA+”. A montagem, que imitava a identidade visual do jornal, foi espalhada em plataformas como X, Threads, Instagram e Facebook. O Bereia também identificou centenas de conteúdos enganosos semelhantes sendo compartilhados em grupos religiosos digitais, ampliando a desinformação no ambiente de fé.

Conforme checagem realizada pela AFP, o título original da reportagem da Folha de S. Paulo foi manipulado digitalmente. A manchete real dizia: “Saiba quem são cardeais apontados como favoritos para suceder papa Francisco; não há brasileiros na lista”. Além da alteração no conteúdo, foram observadas inconsistências gráficas na imagem falsa: a palavra “Papa” aparece com inicial maiúscula (o que contraria o padrão editorial da Folha, que escreve “papa” com minúscula) e há um ponto final no título, algo que o jornal não utiliza em suas manchetes.

A adulteração foi feita por meio de alteração no código HTML da página — técnica que modifica apenas a visualização local do texto, permitindo ao usuário capturar a imagem adulterada. À AFP, a Folha de S. Paulo confirmou que não publicou a manchete falsificada.

Apesar dos desmentidos, Bereia identificou que até o fechamento desta matéria, os perfis e influenciadores seguem mantendo o conteúdo falso no ar.

Deputada federal católica compartilha informação enganosa sobre série Adolescência 

Série da Netflix “Adolescência” criminaliza jovens brancos conservadores: esta é a ideia transmitida pela  deputada federal Bia Kicis (PL-DF) em publicação no Instagram, em 24 de março último. O texto da deputada católica cita os casos que vitimaram as jovens inglesas Ava White e Elianne Andam, em 2021 e 2023, respectivamente, como inspirações para a série e acusa a produção de ter alterado a identidade do assassino de Elianne Andam. Segundo Kicis, era um homem negro e usuário de drogas que foi trocado na série por um adolescente branco de perfil conservador, propositalmente, “para encaixá-lo em uma narrativa específica”.

Imagem: reprodução Instagram

O texto publicado por Bia Kicis questiona “a conexão da trama com a cultura incel” e afirma que a produção audiovisual faz uma “tentativa de encaixar o crime dentro de um discurso ideológico”. Além do texto, a publicação da deputada contém uma imagem manipulada com as fotos de Hassan Sentamu, jovem negro acusado de assassinato, e Owen Cooper, o jovem ator do seriado da Netflix. 

A deputada federal do PL atribuiu os créditos da informação compartilhada ao perfil do programa Informação e Liberdade no Instagram. O programa é apresentado em canal do YouTube, por Lidiane Pacheco. Entre as publicações do perfil está a que foi reproduzida por Bia Kicis. 

Imagem: reprodução YouTube

Em perfil no Instagram, Lidiane Pacheco se define como “americana, brasileira, Relações Públicas e comunicação política”. Há várias publicações elogiosas ao ex-presidente Jair Messias Bolsonaro e ao deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Imagem: reprodução Instagram

Imagem: reprodução Instagram

Publicações como a do canal do YouTube, replicadas pela deputada, foram motivadas pela reação do proprietário da rede X Elon Musk a uma informação sobre a série “Adolescência” publicada na plataforma. Musk reagiu com uma expressão de surpresa à publicação, feita em 20 de março, por Ian Miles Chong, “o comentarista de direita preferido do Twitter”, segundo apuração do jornal indiano em língua inglesa The Times of India

Na informação publicada no X, Chong diz que os autores da série trocaram “a raça do verdadeiro assassino de um homem negro/imigrante para um garoto branco”.

Imagem: reprodução X

A Revista Oeste também fez coro ao discurso com uma publicação ainda em 20 de março, e compartilhou interações de outras contas sobre o assunto na plataforma de mídia social X.

Imagem: reprodução Revista Oeste

Ao verificar o caso, Bereia teve acesso à publicação do núcleo de checagem de fatos do jornal O Estado de S. Paulo, Estadão Verifica, que classificou as informações como enganosas

Do que trata a série Adolescência?

A produção audiovisual da Netflix Adolescência conta a história da investigação de um crime, na qual um garoto de 13 anos é acusado de assassinar uma colega de classe. A série de quatro episódios estreou em 13 de março passado e se mantém como a mais assistida da plataforma de streaming até o fechamento desta matéria. 

Um dos personagens da trama orienta o detetive responsável pelo caso sobre a linguagem das culturas Incel e Redpill nas mídias digitais, e ajuda a elucidar o crime.

O que são as culturas Incel e Redpill?

O termo “Incel” começou a ser usado na década de 1990, e nos dias de hoje se tornou popular em comunidades online. “Incel” é a combinação das palavras involuntário e celibatário, utilizada para indicar um homem que sente insatisfação sexual. Frequentemente, essa expressão é empregada de maneira negativa.

Além do significado direto, este termo traz como partes de sua própria constituição, os debates acerca de gênero, misoginia, agressão e extremismo. Embora esteja associado à misoginia e a grupos majoritariamente masculinos, a origem da palavra “incel” pertence a uma mulher: Alana, que é conhecida apenas pelo primeiro nome.

O termo se tornou mais conhecido nos anos 1990, ao se integrar ao vocabulário que Alana utilizava em seu site, chamado Projeto de Celibato Involuntário de Alana. A jovem se dirigia aos seguidores enquanto compartilhavam mensagens sobre sentimentos de timidez e dificuldades sociais. Atualmente, o termo se popularizou, e adquiriu novos significados.

De acordo com o psicólogo e pesquisador Manoel Antônio dos Santos, o termo designa os homens que se sentem rejeitados por mulheres e acabam assumindo posturas misóginas e atitudes hostis contra elas, utilizando principalmente as comunidades on-line para disseminar seu ódio generalizado e purgar seu ressentimento. 

É no ambiente virtual que se sentem acolhidos em sua vulnerabilidade e usam esse espaço para se manterem anônimos. O espaço virtual viabiliza o encontro entre os pares, que se identificam por meio da troca de mensagens e potencializam sua atuação.

Na série Adolescência, os termos redpill e incel são citados no contexto da trama ao tratar sobre a misoginia. Os redpills são os homens que “acordaram” para a realidade na qual as mulheres são de fato interesseiras, injustas e cruéis com a classe masculina. 

Adolescentes brancos estão sendo criminalizados na série no lugar de negros?

O núcleo de checagem de fatos do Estadão concluiu que publicações como a da deputada federal Bia Kicis, que alegam que a produção da série Adolescência teria optado por um ator branco para retratar um criminoso negro e imigrante são enganosas. 

Na verdade, a produção não teria sido baseada em um único caso, mas a partir de diferentes crimes que circularam nos noticiários, incluindo um cometido por um jovem negro. Tanto o roteirista Stephen Graham como o co-criador da série Jack Thorne já haviam refutado tais acusações e reiteraram que a obra tem como assunto principal a masculinidade. 

Incels e redpills no Brasil

O “Relatório de recomendações para o enfrentamento ao discurso de ódio e ao extremismo no Brasil”, elaborado por um Grupo de Trabalho criado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, em 2023, alerta que a misoginia e o discurso de ódio contra as mulheres deve ser visto como um processo que está naturalizado no âmbito das relações, e no ambiente virtual o impacto acaba sendo muito maior. 

De acordo com o relatório, “o discurso de ódio contra as mulheres está associado às desigualdades de gênero historicamente observadas no Brasil e no mundo, elemento fundante da opressão dirigida às mulheres, que resulta na disseminação e contágio de práticas e crenças misóginas, tratamento violento e indigno às mulheres.” 

É nesse contexto que as comunidades masculinistas – composta pelos denominados incels e redpills – surgem com força violenta e opressora, disseminando discursos misóginos dentro e fora do ambiente virtual.

Para a pesquisadora e editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha, que fez parte da equipe de pesquisadores para elaboração do relatório, o fato de o MDHC ter criado este grupo e produzido o relatório significa muito. Afinal, a cultura de ódio e os extremismos políticos ferem vários direitos cidadãos: o direito de ser e de existir com liberdade e segurança, que desafia a coexistência pacífica em meio às diferenças, à liberdade de opinião e de expressão, que deve ser garantido, mas não significa um direito de ofender e incitar violência; de não haver ataque à honra e à reputação; à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, entre outros. 

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Bereia classifica as informações publicadas pela deputada federal Bia Kicis como enganosas, visto que tem elementos factuais, mas a apresentação deles é feita de forma distorcida para levar as pessoas a crerem que existe um discurso construído que criminaliza jovens brancos conservadores por crimes de violência de gênero. 

A peça desinformativa foi construída para ofuscar dados reais e afastar uma discussão pertinente sobre os efeitos danosos de um discurso conservador misógino e focar, de maneira estrategicamente enganosa, na questão de raça, o que não é o foco do material original.

A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) está entre os perfis religiosos mais checados da política brasileira pelo Bereia. Kicis já compartilhou informações falsas e enganosas sobre diversos assuntos, entre eles, presos do 8 de janeiro, combate ao vírus da covid-19, lei de incentivo à cultura, desmatamento na Amazônia, enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul, em maio de 2024, perseguição cristã no Brasil e antissemitismo.  

Referências

BBC
https://www.bbc.com/news/articles/c2exnexw2gvo Acesso em 07 ABR 25

https://www.bbc.com/news/articles/ckg8ly1wr8ro Acesso em 07 ABR 25

https://www.bbc.com/news/uk-england-merseyside-62119537 Acesso em 07 ABR 25

Times of India
https://timesofindia.indiatimes.com/world/us/who-is-ian-miles-cheong-meet-twitters-favourite-right-wing-commentator/articleshow/111606114.cms Acesso em 07 ABR 25

CNN Brasil
https://www.cnnbrasil.com.br/lifestyle/o-que-e-incel-termo-citado-na-serie-adolescencia/ Acesso em 07 ABR 25

Incels e Misoginia On-line em Tempos de Cultura Digital – Periódicos de Psicologia
https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-428120220 00301081 Acesso em 07 ABR 25

Netflix
https://about.netflix.com/en/news/netflix-reveals-upcoming-us-series-films-and-games-for-2025 Acesso em 08 ABR 25

https://about.netflix.com/en/news/netflix-makes-adolescence-available-to-all-secondary-schools-across-the-uk Acesso em 08 ABR 25

Carta Capital

https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/sobre-a-imperativa-tarefa-de-enfrentar-a-cultura-de-odio-e-os-extremismos/ Acesso em 07 ABR 25

Estadão Verificahttps://www.estadao.com.br/estadao-verifica/serie-adolescencia-netflix-protagonista-branco-criminoso-negro-enganso/ Acesso em 09 ABR 25

Evangélicos voltam a compartilhar mentiras sobre igrejas queimadas na Índia

Voltou a circular em grupos de WhatsApp de lideranças evangélicas uma antiga mentira sobre a suposta queima de igrejas na Índia. O monitoramento do Bereia identificou a circulação neste início de abril e analisou a mensagem, que já havia sido desmentida anteriormente, em 2020 e 2023. A origem desta desinformação remonta a, pelo menos, 2010, tendo sido desmentida ao longo dos anos por diversos veículos.

O texto, sem autoria, menciona supostos ataques a igrejas em “Olisabang”, mas a localização sequer existe na Índia. Com o característico tom alarmista dos conteúdos fraudulentos, o texto enumera uma série de ataques fictícios a missionários e crianças na tentativa de sensibilizar o leitor para orações. A entidade religiosa local India Gospel Leagues negou a veracidade dos ataques ainda em 2010, mas a mentira reapareceu em 2012, 2015, 2020, 2023 e agora novamente em 2025.

Diante da circulação contínua dessa mensagem, a organização estadunidense Portas Abertas, que apoia cristãos em certos contextos de perseguição religiosa, emitiu em 2023 um comunicado confirmando que as informações eram falsas.

Em outras versões, o texto é acompanhado de vídeos falsos, gravados na Síria, em 2013. Segundo o UOL Confere, nesta versão as imagens mostram integrantes da inteligência militar do regime de Bashar al-Assad, e os corpos exibidos não pertencem a missionários indianos ou cristãos no Iraque, mas a vítimas do regime sírio.

Bereia alerta: diante da recorrente disseminação de mentiras que têm cristãos como alvo, é fundamental adotar uma postura crítica ao receber mensagens alarmantes. É recomendável verificar a procedência das informações antes de compartilhá-las. Algumas dicas essenciais:

Não acredite automaticamente em mensagens sem autoria: Informações sem indicação de fonte ou baseadas apenas em testemunhos anônimos têm maior chance de serem falsas.

Verifique se a origem da notícia,  as fontes, são confiáveis: Notícias verídicas costumam ser divulgadas por veículos de comunicação credenciados e por órgãos oficiais. Muitas publicações falsas nem indicam a fonte. 

Desconfie de tom sensacionalista: Textos que apelam para o medo e a urgência sem apresentar provas concretas devem ser analisados com cautela.

Não atenda pedidos de compartilhamento antes de checar a veracidade do conteúdo: uma das estratégias de propagadores de falsidades para alcançar muitas pessoas é pedir que quem recebe compartilhe a publicação. 

Pesquise antes de compartilhar: Uma busca rápida em portais de notícias e plataformas de checagem pode evitar a propagação de desinformação.

Referências:

Coletivo Bereia

https://coletivobereia.com.br/sao-falsas-correntes-de-whatsapp-pedindo-oracao-por-cristaos-perseguidos/ Acesso 08 abr 2025

Know India

https://knowindia.india.gov.in/states-uts/ Acesso 08 abr 2025

India Gospel League

https://www.mnnonline.org/news/e-mail-rumor-spreads-anti-christian-sentiment/ Acesso 08 abr 2025

Boatos.org

https://www.boatos.org/religiao/20-igrejas-queimadas-ontem-olisabang-india.html Acesso 08 abr 2025

UOL Confere

https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2023/04/14/e-falso-o-video-com-imagens-atribuidas-a-massacre-de-cristaos-na-india.htm Acesso 08 abr 2025

Imagem de capa: Freepik

1º de abril: Como notícias falsas alimentam o caos e a violência

Nesse primeiro de abril, dia popularizado como “Dia da Mentira”, Bereia traz um alerta: além de ter se tornado estratégia política na captação de apoios e interferência em temas de interesse público, a mentira pode ter consequências trágicas e irreversíveis. 

O caso mais recente que ocorreu no Acre ilustra isso. Yara Paulino da Silva foi assassinada, em 24 de março passado, após um boato afirmar que ela havia matado sua filha de três meses. A ossada que supostamente pertencia à bebê foi analisada e identificada como sendo de um animal, mas a verdade chegou tarde demais. Seus dois filhos mais velhos, de dez e dois anos, presenciaram o crime, e agora recebem apoio psicológico para lidar com o trauma. 

O Ministério Público do Acre (MP-AC) alertou para os riscos da disseminação de notícias falsas e enfatizou a importância de checar informações antes de compartilhá-las. “Fake news mata”, destacou a instituição em comunicado. O promotor Thalles Ferreira reforçou que a propagação irresponsável de boatos tem gerado uma onda de ódio, linchamentos e execuções injustificadas, comprometendo a segurança e a justiça no país.

A história de Yara, infelizmente, não é um caso isolado. A desinformação tem impactos devastadores na sociedade, levando a linchamentos, morte, impactos na saúde coletiva e até mesmo conflitos étnicos. Bereia fez um levantamento de 13 casos que repercutiram na imprensa no Brasil e no mundo:

Linchamentos baseados em mentiras

  • O caso da “Bruxa do Guarujá” (2014): Fabiane Maria de Jesus foi espancada até a morte por cerca de 100 pessoas após ser falsamente acusada de sequestrar crianças. O boato, originado de uma fake news compartilhada nas redes sociais, desencadeou uma onda de violência.
  • O caso de Las Colonias de Hidalgo, México (2022): Um advogado de 31 anos, Picazo González, foi linchado e queimado vivo por uma multidão após rumores falsos de que forasteiros estavam sequestrando crianças para o tráfico de órgãos. Seu único “erro” foi ter um carro com placa de outra cidade.
  • O caso de Araruama, RJ (2017): Um casal foi atacado por 200 pessoas após serem acusados, sem provas, de sequestrar uma criança. O boato viralizou pelo WhatsApp e, sem a intervenção da polícia, o desfecho poderia ter sido fatal.
  • O caso de Rafael dos Santos Silva (2024): Rafael, de 22 anos, foi espancado até a morte em Suzano, SP, após circular a falsa alegação de que ele matava cães. Sete homens foram presos pelo crime, e investigações mostraram que o boato começou a partir de um vereador local, que insinuou a acusação sem provas.

Mentiras sobre desastres naturais

Durante as recentes enchentes no Rio Grande do Sul, a disseminação de informações falsas complicou os esforços de resgate e causou pânico desnecessário. Circularam mensagens mentirosas sobre “crianças boiando nos rios do Sinos e Gravataí por falta de socorro das autoridades” e sobre o retorno da água em bairros afetados de Porto Alegre, levando moradores a saírem de suas casas antes do momento seguro.

Mentiras sobre saúde pública

  • A desinformação sobre vacinas e a covid-19: Durante a pandemia, notícias falsas sobre a ineficácia das vacinas e teorias conspiratórias sobre o coronavírus resultaram na hesitação vacinal e em milhares de mortes evitáveis. De supostos medicamentos que atenuariam os efeitos do vírus a narrativas negacionistas que minimizaram a gravidade da doença, a desinformação retardou as medidas de contenção e agravou ainda mais a crise sanitária. 
  • Estigmas sobre o HIV: bem antes da pandemia de Covid, a desinformação sobre a Aids resultou em preconceito e estigmas que até hoje são associados à doença causada pelo vírus HIV. Relacionada à “punição divina pela devassidão” e intitulada de “câncer gay” na década de 1980, a doença até hoje é vista como motivo de vergonha para algumas pessoas soropositivas, retardando diagnósticos e o tratamento.
  • Chás milagrosos: a ingestão de chás que prometem desinchar e resultar na rápida perda de peso é frequentemente difundida na internet como alternativa ágil e saudável a medicamentos autorizados e a processos longos de emagrecimento. No entanto, o uso de determinados “chás milagrosos”, que misturam ervas, pode resultar em morte por insuficiência hepática. Foi esse o caso que resultou no óbito de Mara Abreu, em 2022, que faleceu após ingerir cápsulas cuja venda é proibida no Brasil.

Mentiras em casos de repercussão mundial: conflitos e guerras

  • Guerra civil em Mianmar: A guerra no país do sudeste asiático, que completou quatro anos em fevereiro de 2025, teve apoio em notícias falsas e boatos veiculados nas mídias sociais. Segundo um relatório produzido pelo Facebook em 2018, publicações e contas na plataforma incentivaram e ampliaram o tensionamento entre o grupo minoritário rohingya, muçulmano, e a maioria budista do país. De acordo com o documento, isso colaborou com o aumento dos casos de violência no país.  
  • O genocídio dos Tutsi em Ruanda:  impulsionado por teorias da conspiração propagadas por uma emissora de rádio – principal meio de comunicação do país no início da década de 1990 -, o genocídio do grupo étnico Tutsi revela a influência da desinformação e do discurso de ódio para a deflagração de conflitos sangrentos. 

Mentiras que geram danos psicológicos

Para além das consequências físicas imediatas, as vítimas de informações falsas frequentemente enfrentam traumas psicológicos duradouros e transformações significativas em suas vidas cotidianas. O caso da carioca Adriana Rodrigues representa nitidamente esse impacto. Falsamente apontada como a mulher que aparecia em um vídeo portando um fuzil, a dona de casa enfrenta uma rotina de medo e dificuldade para dormir há mais de um ano, apesar de uma investigação da Polícia Civil do RJ ter concluído que a mulher na imagem não era ela.

O impacto na vida de Adriana foi devastador: além de lidar com a morte do filho – morto pela Polícia na chacina do Jacarezinho em 2021, ela teve que mudar de casa quatro vezes devido à repercussão da história, passou a tomar remédios controlados e tentou mudar sua aparência para não ser reconhecida. “Tem chacota na rua, ‘vamos tirar foto comigo, vovó do fuzil?'”, relatou Adriana.

As vítimas de notícias falsas frequentemente enfrentam uma espécie de “morte social” – mesmo quando não há consequências físicas diretas, há uma perda profunda da reputação, da privacidade e da sensação de segurança. Isso pode levar a problemas de saúde mental como ansiedade, depressão e transtorno de estresse pós-traumático.

Há consequências trágicas como os dois casos a seguir:

  • O caso Jéssica Canedo (2023): A jovem de 22 anos tirou a própria vida após ser alvo de ataques nas redes sociais, relacionados a uma fake news que afirmava que ela teria um relacionamento com o humorista Whindersson Nunes. A notícia falsa foi repercutida sem apuração por perfis de fofoca, como a página Choquei. Canedo, que passava por tratamento psicológico antes do ocorrido, não resistiu aos ataques de ódio, alguns deles com incitação ao suícidio.
  • O caso de Mia Janin (2021): a estudante do Jewish Free School, em Kenton, Londres, foi encontrada morta em sua casa em Harrow em 12 de março de 2021. A investigação concluiu que Mia tomou sua própria vida após ser vítima de bullying por parte de outros estudantes. Um grupo formado principalmente por meninos, usava aplicativo de compartilhamento de  mensagens para espalhar fotos manipuladas de meninas, colocando suas faces em corpos de estrelas do pornô.

Referências:

Kenan Institute

https://kenan.ethics.duke.edu/media-manipulation-suppression-and-the-rwandan-genocide/

BBC

https://www.bbc.com/portuguese/geral-43895609


G1

https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2025/03/27/apos-mae-ser-morta-por-conta-de-boato-no-ac-mp-alerta-para-o-perigo-das-noticias-falsas-fake-news-mata.ghtml

https://g1.globo.com/rj/regiao-dos-lagos/noticia/2017/04/multidao-cerca-carro-e-tenta-linchar-casal-suspeito-de-sequestrar-crianca.html

SECOM GOV

https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2023/03/tragica-historia-no-guaruja-e-retratada-em-novo-episodio-da-campanha-brasil-contra-fake

Uol

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2022/06/15/o-chocante-linchamento-de-mexicano-alvo-de-multidao-enfurecida-por-boatos-de-whatsapp.htm

Brasil de Fato

https://www.brasildefato.com.br/2024/05/08/30-noticias-falsas-golpes-e-fraudes-em-andamento-no-meio-das-enchentes-no-rs

Imagem de capa: awmleer/Unplash

Página gospel manipula imagem para associar falsamente Aline Barros a desfile de escola de samba

Bereia recebeu de leitores o pedido de checagem de uma imagem que mostra a cantora gospel Aline Barros caracterizada para um desfile de escola de samba. A publicação circula nas mídias sociais com o título de uma matéria do portal de notícias G1 sobre a participação da cantora no carnaval de Palmas (TO). Bereia checou informações sobre a participação de Aline Barros no carnaval e a veracidade das imagens divulgadas.

Imagem manipulada de Aline Barros em desfile de carnaval

A página Gospel Brasil, no TikTok, descrita como página de notícias da música gospel, publicou em 3 de março último, uma imagem que mostra a cantora evangélica Aline Barros fantasiada, em um desfile carnavalesco. Na foto, Barros aparece com as coxas e a barriga à mostra, em uma fantasia com detalhes em preto e dourado.

A publicação inclui o título de uma matéria atribuída ao Portal G1, em que se lê: “Aline Barros abre programação de carnaval na Praça dos Girassóis nesta sexta-feira, em Palmas”. A postagem também exibe um recorte do rosto da cantora e a legenda: “Cantora gospel Aline Barros abre Carnaval em Tocantins e choca a internet”, com  trecho de uma das canções gravadas pela cantora gospel.  

Entre os 3.698 comentários – até o momento da publicação desta matéria – algumas pessoas criticam a cantora e outras afirmam se tratar de uma montagem. A publicação também registrou mais de 12,5 mil curtidas.

Imagem: reprodução TikTok

A partir de ferramentas de busca de imagens, Bereia identificou que houve manipulação do conteúdo. A fotografia original retrata a atriz Paolla Oliveira, rainha de bateria da escola de samba Acadêmicos do Grande Rio, durante desfile no carnaval de 2024, no sambódromo Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro. 

Imagem: reprodução Instagram

Cantores gospel em programação de carnaval em Palmas 

Conforme foi, de fato, noticiado pelo Portal G1, o show de Aline Barros foi a atração principal do primeiro dia da programação do Carnaval 2025, em Palmas, Tocantins – 28 de fevereiro. 

No mesmo dia, outros cantores evangélicos como Moyses Di Carvalho e Sandro Nazireu também se apresentaram. Já no sábado, 1º de março, a programação incluiu shows dos cantores católicos Padre Fábio de Melo, Adriana Arydes e Turma do Padre Dudu.

Imagem: reprodução G1

A programação, organizada excepcionalmente pelo Governo do Estado do Tocantins, depois do prefeito do município Eduardo Siqueira Campos (Podemos) ter anunciado a suspensão de qualquer programação de Carnaval para 2025, seguiu até terça-feira, 4 de março último, com apresentações de cantores de outros gêneros musicais. 

A Prefeitura de Palmas realiza, tradicionalmente, desde 2015, o evento gospel Capital da Fé, durante os dias do feriado de carnaval. No entanto, em 2025, conforme divulgado pelo portal de notícias regional Gazeta do Cerrado, a Prefeitura cancelou a realização das festividades, em decorrência de uma dívida estimada em R$ 300 milhões.

Desinformação de gênero em um contexto religioso

Apesar de algumas páginas de apoio à Aline Barros terem publicado notas sobre a divulgação de falsas informações e uso indevido de sua imagem, a cantora não se pronunciou oficialmente sobre a peça desinformativa envolvendo seu nome.

Barros fez uma publicação em sua página oficial no Instagram, em 6 de março, sobre a participação no evento. Nos comentários, algumas pessoas levantaram temas como mentira no meio religioso, desinformação e processo judicial em razão da difamação, enquanto outras publicaram mensagens de apoio. 

Imagem: reprodução Instagram

No entanto, além de julgamentos acerca da conduta cristã e do comportamento moral da cantora, surgiram também discussões sobre sua participação, enquanto cantora gospel – em um evento no período de carnaval. Também há registros de acusações de realizar shows por interesse financeiro, em detrimento do propósito religioso, que renderam comentários como “pastora de satanás”.

Para a doutoranda em Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Desigualdades Contemporâneas e Relações de Gênero (NUDERG) e integrante da equipe Bereia Rafaely Camilo, a adulteração na imagem teve o objetivo de expor a cantora gospel pelo viés da sensualidade, um tema valioso para o público evangélico por se tratar de uma pauta que trata da moral e de costumes.

“A imagem parece ter como objetivo causar escândalo no meio cristão evangélico, ao colocar uma figura conhecida do meio, numa posição de constrangimento, ridicularizando sua trajetória”, aponta Camilo.

Segundo a pesquisadora, nesse caso, a desinformação de gênero está assentada na exposição do corpo, algo que não é esperado para uma mulher na posição de Aline Barros, o que provavelmente a cantora não faria. 

“Por muitos anos, Aline Barros foi uma artista que caminhou entre os mundos secular e gospel e recebeu críticas por isso. O uso dessa imagem atende, para o efeito da viralização (caça-cliques), como afirmação de que ela estaria participando da festa ‘do mundo’, caracterizada como tal”, explica a doutoranda em Ciências Sociais.

Carnaval e manifestações religiosas

A atriz Paolla Oliveira é rainha de bateria da Grande Rio desde 2009. Após um hiato de dez anos, voltou a desfilar para a escola em 2020. Em 2022, Paolla Oliveira esteve na Marquês de Sapucaí fantasiada de Pombagira, e em 2023, sua fantasia representou as armas de Ogum. Pombagira e Ogum são entidades espirituais presentes nas religiões de matriz africana umbanda e candomblé. 

Em 2022, a escola de samba Acadêmicos do Grande Rio também foi a campeã do carnaval do Rio de Janeiro, com o samba-enredo que homenageou Exu, outra divindade das religiões de matriz africana.

O jornalista, escritor e pesquisador do carnaval carioca Aydano André Motta, em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos (IHU), afirmou que a visão de que o carnaval é uma festa pagã está equivocada. 

“O carnaval é uma festa completamente religiosa. Na fundação de todas as escolas de samba sempre houve presente um pai de santo ou uma mãe de santo. Várias escolas de samba estão assentadas, nas suas quadras e sedes, em antigos terreiros de candomblé e umbanda, então é uma festa que se move a partir da religião, não existiria sem os preceitos religiosos”, declara o pesquisador. 

Motta esclarece que o carnaval é uma festa extremamente religiosa e que no Brasil tem manifestações do sincretismo religioso. “As baterias das escolas e suas formas de execução estão ligadas a orixás, são batidas escolhidas para reverenciar orixás. A umbanda conecta santos católicos a orixás, então no Rio de Janeiro, Oxóssi é São Sebastião, Oxum se junta a Nossa Senhora da Conceição, São Jorge a Ogum, por exemplo”.

Entretanto, o Carnaval tem origem no Catolicismo ibérico que veio para o Brasil com os colonizadores. No artigo A fé como expressão da vida que pulsa no Carnaval, a pesquisadora da Religião e editora-geral do Bereia Magali Cunha indica a origem cristã da festa na Idade Média. “O Carnaval, criado na Europa medieval pela Igreja Católica, foi uma forma de controlar antigas festas populares, condenadas por ela por representarem uma entrega aos prazeres mundanos”.

Segundo a pesquisadora, a ideia do Carnaval (carnis levale, ou, “retirar a carne”), como um período para cometer todos os “excessos da carne”, surge da tentativa de dar um sentido cristão às festividades. “Com isto foi criado, também, o período da Quaresma, um tempo de 40 dias antes da Páscoa, logo depois do Carnaval, caracterizado pelo arrependimento dos excessos cometidos e pelo jejum (purificação)”.

Outros grupos religiosos, como os evangélicos – tradicionalmente opostos às festividades do Carnaval e habituados ao afastamento dos retiros – intensificaram nos últimos anos, marcados pela polarização política no Brasil, a desqualificação da cultura “secular ou mundana” e, ao mesmo tempo, a disputa pela noção de cultura, conforme apresenta a antropóloga, pesquisadora e coordenadora de religião e política no Instituto de Estudos da Religião (ISER) Lívia Reis, em artigo intitulado Religião como forma de “proteção da cultura”: manifestações culturais e artísticas como campo de disputa.

“Não se trata de um paradoxo, estes segmentos religiosos passaram, também, a disputar a noção de cultura, tentando definir o que seria ou não legítimo de ser considerado como parte dela. Parte desse movimento consiste em promover arte e cultura. Para além da consolidação do segmento gospel, houve um vasto investimento em outras formas de se experimentar a religião através da arte, tais como filmes, teatros, novelas, plataformas de streaming, programas de rádio e mega eventos em espaços públicos”, destaca Reis.

Carnaval, diversidade e tolerância religiosa

A organização do evento Capital da Fé, realizado pelo Estado do Tocantins, reflete estes elementos. O governo destacou as atividades como “uma experiência inclusiva e democrática aos foliões” e que “celebrou a diversidade musical e reforçou o compromisso com uma programação acessível a todos os públicos”. 

Apesar de cancelado em 2025, o evento gospel Capital da Fé, descrito no portal da Prefeitura de Palmas como “o maior evento Gospel do Brasil realizado no período de Carnaval”, ocorre há nove anos e já reuniu em torno de 200 mil pessoas, segundo a organização.

A programação de cinco noites com apresentações de nomes do segmento no cenário nacional é voltada para católicos, evangélicos e apreciadores do estilo musical. O portal afirma que o gospel detém o segundo lugar na preferência musical nacional, atrás apenas do sertanejo.

Imagem: Prefeitura de Sobral

Além de Palmas, outras cidades pelo Brasil também realizam eventos gospel durante o período de carnaval, como Sobral (CE) e Arraial do Cabo (RJ). As iniciativas apontam para uma mudança na participação deste grupo religioso nas comemorações do carnaval.  

A tendência em consolidação é parte do que já ocorre em outras esferas da sociedade. Aline Barros, por exemplo, é considerada a precursora da participação de cantores gospel em canais televisivos não segmentados para este público, por sua participação em atrações como a de Xuxa Meneghel, a partir da década de 90, e que trouxeram maior diversidade à televisão brasileira. 

O artigo de Lívia Reis também mostra que a disputa dos evangélicos pelo espaço público avança até a ocupação da festa de caráter profano e a apropriação de elementos de outras culturas demonizadas por eles. “Apesar de criminalizar o carnaval como uma prática demoníaca, alguns grupos passaram a mobilizar instrumentos musicais, danças e corporeidades de matriz africana, em suas tentativas de disputar a festa”. 

A antropóloga assinala que um movimento semelhante aconteceu com a capoeira, com a festa de Cosme e Damião e com bolinhos de acarajé, que se tornaram “capoeira de jesus”, “saquinhos de jesus” e “acarajé de jesus”, respectivamente. “Em comum a todos esses casos é o fato de que segmentos evangélicos apagam o que seria percebido como o sinal negativo dessas práticas tradicionais e populares, isto é, a ligação com tradições africanas”.

***

Após checar informações sobre o conteúdo que circulou nas redes digitais, Bereia classifica o conteúdo como falso. A imagem que mostra a cantora Aline Barros em uma fantasia de carnaval foi adulterada a partir da imagem original da atriz Paolla Oliveira, rainha de bateria da escola de samba Grande Rio, no carnaval carioca.

Apesar de conter elementos factuais e verdadeiros, como a participação de Aline Barros no carnaval de Palmas, foi feito uso de imagem que não corresponde ao que foi noticiado. É clara a intenção de distorcer a informação para instigar julgamentos negativos sobre a cantora – o que poderia ser considerado enganoso – a fim de se alcançar cliques,  portanto audiência. A imagem foi fabricada e é, portanto, falsa.

O sensacionalismo também foi utilizado como estratégia para captar audiência, por meio da sensação de escândalo, provocada pela falsa associação da mulher evangélica ao corpo sensual e à mostra, como forma de difamação e desvio de conduta esperada pelo meio religioso, o que se classifica como desinformação de gênero. 

Outro elemento falso presente na estratégia desinformativa, e que contribui para o sensacionalismo, é a caracterização de festividade carnavalesca que se relaciona com culturas e religiões de matriz africana – como os desfiles de escolas de samba no Rio de Janeiro, associado à imagem da cantora e que nada se assemelha ao evento do qual Aline Barros participou.

A disseminação de falsidades relacionadas a situações que envolvem temas referentes a gênero são frequentemente observadas nas redes digitais. Bereia alerta para publicações que se valham do sensacionalismo, do pânico moral e da intolerância religiosa como arma de violência contra mulher no contexto digital. No caso em questão, as imagens de duas mulheres foram utilizadas – e manipuladas – para provocar uma reação de indignação que não se sustenta na realidade.

Referências da checagem 

G1

https://g1.globo.com/to/tocantins/noticia/2025/02/28/aline-barros-abre-programacao-de-carnaval-na-praca-dos-girassois-nesta-sexta-feira-em-palmas.ghtml Acesso em: 09 mar 2025

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/carnaval/2024/noticia/2024/02/16/paolla-oliveira-renova-com-a-grande-rio.ghtml Acesso em: 09 mar 2025

https://g1.globo.com/rj/regiao-dos-lagos/noticia/2023/02/17/festival-de-musica-gospel-esta-entre-as-atracoes-do-carnaval-de-arraial-do-cabo-no-rj.ghtml Acesso em: 11 mar 2025

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/carnaval/2022/noticia/2022/04/26/grande-rio-e-a-campea-do-carnaval-2022-do-rio.ghtml Acesso em: 11 mar 2025

Gshow

https://gshow.globo.com/carnaval/2024/noticia/paolla-oliveira-vira-onca-na-sapucai-em-desfile-da-grande-rio.ghtml Acesso em: 11 mar 2025

https://gshow.globo.com/carnaval/2024/noticia/de-cleopatra-a-pombagira-relembre-as-fantasias-de-paolla-oliveira-como-rainha-de-bateria.ghtml Acesso em: 11 mar 2025

Instagram

https://www.instagram.com/p/DGyc1m4yOYs/?igsh=Nm55dWo3YTN1Y3Ri Acesso em: 09 mar 2025

https://www.instagram.com/paollaoliveirareal/ Acesso em: 09 mar 2025

Instituto Humanitas Unisinos

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/159-entrevistas/596668-a-festa-religiosa-do-carnaval-a-resistencia-alegre-dos-povos-perifericos-contra-o-conservadorismo-elitista-entrevista-especial-com-aydano-andre-motta Acesso em: 10 mar 2025

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/159-entrevistas/619912-a-falta-que-a-festa-faz-a-religiosidade-afro-brasileira-e-os-enredos-das-escolas-de-samba-a-dimensao-utopica-de-como-o-mundo-deveria-ser-entrevista-especial-com-renata-de-castro-menezes-e-lucas-bartolo Acesso em: 10 mar 2025

Facebook

https://www.facebook.com/PalmasShowsGospel/photos/est%C3%A1-chegando-a-hora-o-maior-evento-crist%C3%A3o-do-pa%C3%ADs-faltam-apenas-07-dias-para-o/362152127242859/?_rdr Acesso em: 10 mar 2025

Gazeta do Cerrado

https://gazetadocerrado.com.br/tocantins/palmas/dividas-herdadas-podem-chegar-a-r-300-milhoes-em-palmas-e-eduardo-decide-cancelar-capital-da-fe-e-carnaval-este-ano/ Acesso em: 10 mar 2025

https://gazetadocerrado.com.br/tocantins/palmas/palmas-capital-da-fe-tera-este-ano-varias-atracoes-nacionais-e-novidades-veja-quem-ja-esta-confirmado/ Acesso em: 10 mar 2025

Jornal Opção

https://www.jornalopcao.com.br/tocantins/capital-da-fe-chega-a-quinta-edicao-com-atracoes-religiosas-durante-o-carnaval-167826/ Acesso em: 10 mar 2025

YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=DQz_reGSOCI Acesso em: 10 mar 2025

https://www.youtube.com/watch?v=Jtr6g_ohJcg Acesso em: 10 mar 2025

Governo do Tocantins

https://www.to.gov.br/secom/noticias/em-palmas-governo-do-tocantins-promove-carnaval-da-diversidade-musical/2yn3nsnqr9ku#:~:text=Em%20Palmas%2C%20Governo%20do%20Tocantins%20promove%20Carnaval%20da%20diversidade%20musical,-Carnaval%202025%20celebrou&text=Uma%20programa%C3%A7%C3%A3o%20para%20atender%20todos,2025%20na%20Pra%C3%A7a%20dos%20Girass%C3%B3is. Acesso em: 09 mar 2025

Prefeitura de Palmas

https://portal2013.palmas.to.gov.br/conheca_palmas/grandes-eventos/capital-da-fe/ Acesso em: 09 mar 2025

Prefeitura de Sobral

https://www.sobral.ce.gov.br/informes/principais/sobral-de-fe-prefeitura-de-sobral-promove-evento-cristao-no-periodo-de-carnaval Acesso em: 11 mar 2025

Carta Capital

https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/a-fe-como-expressao-da-vida-que-pulsa-no-carnaval/ Acesso em: 12 mar 2025

Religião e Poder

https://religiaoepoder.org.br/artigo/religiao-como-forma-de-protecao-da-cultura-manifestacoes-culturais-e-artisticas-como-campo-de-disputa Acesso em: 12 mar 2025

Áudios falsos sobre vacinas e surto de doenças voltam a circular em grupos de igrejas

Áudios enganosos publicados em grupos de WhatsApp de igrejas voltaram a circular, neste fevereiro, para espalhar pânico e desinformação sobre saúde pública. Bereia recebeu alerta de checagem de dois áudios, por leitores que desconfiaram do material que chegou aos grupos dos quais participam. 

O primeiro áudio fala sobre uma suposta vacina bivalente que misturaria as imunizações contra gripe e Covid-19, enquanto o segundo alerta para um falso surto de covid-19, dengue, chikungunya e zika que estaria sendo “escondido” pela mídia até o término do Carnaval. Ambas as mensagens são falsas e foram amplamente verificadas pelo Boatos.org e demais agências de checagens. 

O que dizem os áudios?

No primeiro, uma voz de mulher que não se identifica, gravado em local e data não registrados, afirma a alguém que a vacina bivalente contra covid-19 estaria sendo aplicada para “exterminar 50% da população mundial”. A mensagem também sugere que o laboratório Pfizer estaria envolvido nesse suposto plano e que a vacina da covid-19 estaria sendo “escondida” na vacina da gripe que deve ser aplicada em breve no Brasil. O áudio também menciona que um médico teria relatado um aumento de pacientes com sequelas causadas pelas vacinas, em contraste com a eficácia do chamado “tratamento precoce”. A gravação traz uma chamada específica para que não se permita que nenhum idoso seja vacinado contra a gripe e não informa a fonte de tais informações oferecidas.

Já no segundo áudio, uma mulher, também não identificada, que alega trabalhar em um hospital não determinado,diz que os casos de covid-19, dengue, chikungunya e zika estão em alta no Brasil, mas que essas informações estariam sendo ocultadas pela mídia até o fim do Carnaval. A gravação, igualmente, não tem local e data registrados e não indica de onde são originadas as informações em questão. Esta gravação também traz apelo específico para que pessoas voltem a usar máscaras.

Sobre as vacinas

A verdade é que não existe vacina bivalente que combine o vírus influenza (gripe) e  Sars-CoV-2 (covid-19). As vacinas bivalentes contra covid-19 (como as da Pfizer e da Moderna) protegem contra duas variantes do coronavírus (a cepa original e a Ômicron), e não contra o vírus da gripe. 

Vale lembrar que embora as vacinas sejam aplicadas separadamente, elas podem ser administradas no mesmo momento. De acordo com a Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI) do Ministério da Saúde, “não há nenhum risco em tomar as duas vacinas ao mesmo tempo. A possibilidade de ofertar estes imunizantes na mesma oportunidade é benéfica para a população, por promover uma proteção mais eficiente”.

Sobre o surto de doenças

Embora os áudios tentem causar pânico, os dados do Ministério da Saúde indicam uma estabilidade nos casos de covid-19, dengue, chikungunya e zika desde o início de 2024. Não há evidências de um aumento alarmante em 2025 e que seja ocultado pela mídia devido ao Carnaval. Além disso, o mesmo áudio já foi compartilhado em outros anos próximo a data da festa popular, o que revela se tratar da disseminação recorrente destas mentiras.

De fato, a positividade para o vírus da covid-19 subiu de 17,1% para 24,1% entre 25 de janeiro e 15 de fevereiro, o maior índice do ano até o momento, de acordo com um levantamento do Instituto Todos pela Saúde (ITpS). Porém, dentro de índices normais, o que não justifica o alarde dos áudios. O aumento está relacionado à circulação de uma nova variante, a JN.1, considerada pela OMS como “digna de monitoramento”, mas com risco global baixo.

Além da covid-19, houve aumento na positividade de testes para influenza A (gripe) e vírus sincicial respiratório (VSR), que afeta principalmente crianças. Esse crescimento é atribuído a uma mudança na sazonalidade desses vírus, causada pelo isolamento social durante a pandemia. É importante, ainda, lembrar que o período do verão é, historicamente, um tempo de propagação de doenças, seja relacionado a períodos de seca como os de muitas chuvas (caso também da dengue).

Em entrevista ao jornal Estado de S.Paulo, o infectologista Igor Thiago Queiroz, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), reforça a importância da vacinação e dos cuidados durante o Carnaval.

“Caso a pessoa tenha sintomas, ela não deve ir para aglomerações. É necessário utilizar máscara e lavar as mãos. Também não deve compartilhar objetos que possam ser colocados nas mãos, no nariz, nos olhos ou na boca. São medidas preventivas”, alerta.

***

Bereia classifica como falsas as informações divulgadas nos áudios que circulam em grupos de WhatsApp de igrejas. Não há vacina bivalente que mistura gripe e covid-19, e não há evidências de um surto de doenças ocultado pela mídia. Embora haja um aumento na positividade de casos de covid-19 e outras doenças respiratórias, as informações estão sendo divulgadas amplamente, e as vacinas continuam sendo a melhor forma de proteção.

As vacinas contra covid-19 e gripe são seguras e eficazes, e a aplicação simultânea é recomendada pelo Ministério da Saúde para garantir proteção ampla e oportuna, especialmente para idosos, gestantes e pessoas com comorbidades.

Bereia alerta para conteúdos que chegam em grupos de WhatsApp por áudios que não têm identificação de quem fala, do local e da data de origem e da fonte das informações oferecidas , pedem compartilhamento indiscriminado, propagam ideias sem fundamento científico ou até mesmo bizarras. Esses elementos são comuns em materiais desinformativos (forjados com falsidades e mentiras), criados deliberadamente para enganar e causar medo.

Pessoas que receberem mensagens como essas, não devem compartilhá-las, e, sim, buscar verificação em veículos de checagem e outras fontes de informação credenciadas. 

Vale lembrar que mentiras sobre temas de saúde e vacinas são um dos conteúdos mais checados pelo Bereia desde sua fundação e observados, inclusive, em períodos eleitorais.

Referências:

Ministério da Saúde https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-com-ciencia/noticias/2023/outubro/posso-tomar-bivalente-e-influenza-no-mesmo-dia 

https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/fevereiro/determinadas-doencas-sao-mais-comuns-durante-o-verao-saiba-quais-sao-e-como-prevenir

Acesso 26-02-25

Boatos.Org

https://www.boatos.org/saude/estao-dando-vacina-bivalente-gripe-e-covid-para-matar-as-pessoas-em-2025.html Acesso 26-02-25

https://www.boatos.org/saude/vacina-bivalente-pfizer-aplicada-junto-vacina-da-gripe-matar-populacao-conta-medica-belo-horizonte.html Acesso 26-02-25

https://www.boatos.org/saude/brasil-esta-com-covid-19-em-alta-que-esta-sendo-escondida-por-causa-do-carnaval.html Acesso 26-02-25

Instituto Todos pela Saúde

https://www.itps.org.br/comunicacao/positividade-para-covid-19-cresce-sete-pontos-percentuais-em-um-mes-e-chega-a-24-a-poucos-dias-do-carnaval Acesso 26-02-25

Estado de S. Paulo

https://www.estadao.com.br/saude/positividade-para-covid-19-aumenta-a-poucos-dias-do-carnaval-indica-levantamento-nprm/ Acesso 26-02-25

Foto de capa: Camilo Jimenez/Unplash

Desinformação é apontada como maior risco global para 2025

A desinformação está se consolidando como uma das maiores ameaças à humanidade, com projeções alarmantes para os próximos anos. Segundo o Relatório de Riscos Globais 2025, publicado durante a reunião do Fórum Econômico Mundial, em janeiro passado, a disseminação de notícias falsas e informações manipuladas pode comprometer a democracia, a saúde pública e a estabilidade global.

Tratando-se do ambiente digital, estudos científicos internacionais, apresentados pelo projeto Cybersecurity for Democracy, da New York University (NYU), revelaram que perfis de notícias de extrema-direita, além de engajarem mais, não são penalizadas pela propagação de desinformação dentro das plataformas sociais.

Diante desse cenário crítico, o Relatório descreve algumas medidas práticas para combater o problema, entre elas, a promoção de educação midiática, apontada como uma das principais soluções para ensinar as pessoas a identificar fontes confiáveis de informação.

Leia o artigo completo no The Conversation.

Foto de capa: Robin Worrall/Unplash

Desinformação, especialmente a que interfere no interesse público, é ‘nociva’, alerta editora-geral do Bereia

A editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha definiu como algo “muito nocivo” a propagação de mentiras e inverdades, principalmente aquelas que afetam o interesse público. Ela participou, em 5 de agosto de 2024, do programa “Espiritualidade na Ação”, apresentado por Frei David, no canal do Instituto Conhecimento Liberta (ICL), que tratou das fake news nas igrejas católicas, evangélicas e as de matriz africana.

Em diálogo do qual também fez parte o pesquisador do Instituto de Estudos da Religião (ISER) e que atua na área de articulação do Projeto Fé no Clima Paulo Sampaio, ela comentou sobre o período de pandemia da COVID-19, em que pessoas deixaram tomar os cuidados com a saúde e até se recusaram a se vacinar por causa de informações falsas que recebiam.

Esse tipo de comportamento, conforme avalia, se baseia em pelo menos dois fatores. O primeiro tem a ver com o que ela chama do lado humano que caracteriza as pessoas, que a fazem acreditar naquilo que provoca medo e riscos, paralisando-as e impedindo-as de pensarem adequadamente.

O segundo se refere à tendência de elas quererem acreditar naquilo que têm como crenças. Nesse caso, conteúdos falsos são aceitos e passados adiante como verdadeiros, sem sequer ter sido checados, pois desejam que assim sejam.

“Nesse raciocínio, grupos religiosos, que são formados por pessoas, estabelecem entre seus integrantes laços comunitários muito intensos, e o senso de pertença é tão forte que quando chega alguma coisa pelo grupo de WhatsApp da igreja, pelo pastor, pelo padre, aquilo bate como verdade. Afinal, como uma comunidade de fé vai apresentar um conteúdo que não é verdadeiro”, analisa Magali Cunha.

A pesquisadora lembra que estudo realizado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) nos anos de 2019 e 2020 para pesquisar como isso ocorre em ambientes religiosos digitais evidenciou isso não apenas no âmbito cristão, mas no de todas as religiões. Como participante do trabalho, ela percebeu que as igrejas são o grupo mais vulnerável.

Magali comenta que dessa pesquisa nasceu o Coletivo Bereia, hoje o único projeto no Brasil e na América Latina que faz uma checagem daquilo que circula nos ambientes digitais religiosos, com prioridade aos grupos cristãos.

A íntegra do programa, que aprofundou esses e outros temas, está disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=tcKzQSSfrkk

Eleições 2024: TSE registra mais de 80 mil denúncias de irregularidades eleitorais em 2024

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), até a véspera das eleições municipais de 2024, em 5 de outubro, registrou 80.684 denúncias de irregularidades eleitorais por meio do aplicativo Pardal. O número representa uma queda de 23,5% em relação ao pleito municipal de 2020, quando foram contabilizadas 105.543 ocorrências. Em comparação com as eleições gerais de 2022, que receberam 38.747 denúncias, houve um aumento de 108%.

Lançado em 2014, o Pardal permite que eleitores denunciem diversas irregularidades durante o período eleitoral, como propaganda antecipada, compra de votos, uso da máquina pública e abuso de poder econômico ou político.

Fonte: Sistema Pardal TSE

Denúncias por estados

São Paulo liderou o ranking de denúncias nos três períodos levantados. Em 2020, o estado registrou 23.323 denúncias, número que caiu para 5.748 em 2022 e subiu para 15.151 em 2024. Minas Gerais e Rio Grande do Sul também estão entre os estados com maior número de denúncias nos três anos, com 12.642 e 7.879 casos em 2024, respectivamente.

No outro extremo, estados como Roraima, Amapá, Acre e Tocantins apresentaram os menores números de denúncias nas últimas eleições. Em Roraima, por exemplo, foram registradas 129 denúncias em 2020, 99 em 2022 e 72 em 2024.

Fonte: Sistema Pardal TSE

Denúncias registradas em 2024

As estatísticas disponibilizadas pelo TSE no sistema Pardal indicam que as denúncias contra vereadores lideram com 41.910 casos, seguidas por denúncias contra prefeitos com 22.567 ocorrências. Partidos, coligações ou federações são alvo de 15.699 denúncias, enquanto vice-prefeitos recebem 508 denúncias.

Quanto aos tipos de irregularidades, o uso de banner, cartaz ou faixa lidera com 14.164 denúncias. Em seguida, vêm as denúncias relacionadas a bem público com 11.599 casos e irregularidades na internet com 9.698 ocorrências. O uso indevido de bem particular resulta em 6.808 denúncias.

Outras categorias incluem o uso de alto-falante/amplificador de som (5.342 denúncias), adesivos (5.283), outdoors (3.751) e confecção, utilização ou distribuição de brindes (2.147). Comícios ou showmícios geram 1.709 denúncias, enquanto a omissão de informações obrigatórias resulta em 1.625 casos.

Folhetos, volantes, santinhos e impressos são alvo de 1.622 denúncias. Irregularidades envolvendo jornal, revista ou tabloide somam 437 casos. A conduta vedada à emissora de rádio/televisão gera 301 denúncias, e problemas relacionados à boca de urna resultam em 47 denúncias.

Como haverá 2° turno neste pleito 2024, em 27 de outubro, para Prefeituras em cidades com mais de 200 mil eleitores, onde não foram alcançados mais de 50% dos votos válidos, Bereia chama a atenção de leitoras e leitores para o papel cidadão com denúncias de campanhas irregulares. Elas podem ser feitas por meio do aplicativo do TSE Pardal Móvel, que pode ser baixado lojas virtuais Apple Store e Google Play.

Na denúncia deverão constar o nome e o CPF do cidadão/cidadã que as encaminhou, além de elementos que indiquem a existência do fato, como vídeos, fotos ou áudios, ficando assegurado ao denunciante o sigilo de suas informações pessoais.

Para acompanhamento das denúncias, acesso a dados estatísticos ou orientações sobre o que é permitido e vedado para propaganda eleitoral, o cidadão poderá acessar o Pardal Web, por meio do endereço https://pardal.tse.jus.br/pardal-web/.

Referências

TSE.

https://pardal.tse.jus.br/pardal-web/pages/estatisticas/dashboard.faces. Acesso: 5 out 2024.

Agência Brasil.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/geral/audio/2024-10/pardal-recebe-mais-de-69-mil-denuncias-sobre-propaganda-irregular. Acesso: 5 out 2024.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2024-08/eleitores-podem-denunciar-irregularidades-pelo-aplicativo-pardal. Acesso: 5 out 2024.

Capa: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Eleições 2024: Pastor e cantor evangélico Waguinho (PL) propaga conteúdo falso em campanha para vereador no Rio de Janeiro

Durante a última semana de eleições, panfletos alarmantes e sensacionalistas foram distribuídos em diversos bairros do Rio de Janeiro, atribuídos a candidatos com identidade religiosa. Um desses materiais, enviado ao Bereia por leitor, intitulado  “Estamos vivendo o tempo dificílimo”, circula na cidade e afirma que todos os partidos de esquerda apoiam a ideologia de gênero, a liberação das drogas e o aborto. 

Imagem: Reprodução do planfleto impresso

A mensagem afirma explicitamente, sem qualquer base factual, que “todos os candidatos de esquerda” querem  erotizar crianças e deslegitimar a autoridade dos pais na educação. O apelo final incentiva que se vote no pastor e cantor da Assembleia de Deus, candidato a vereador, Waguinho (PL). 

Este apelo reflete as falsidades e enganos frequentemente veiculados em publicações políticas alarmantes, que associam a defesa da justiça de gênero e a educação sexual a ameaças à família tradicional e à moralidade cristã. Este tema também foi utilizado nas campanhas eleitorais municipal de 2020 e estadual-nacional de 2022 para convencer  eleitores por meio do pânico,  como Bereia checou, pois são objeto de verificação recorrente.  Todas as checagens foram identificadas como falsas e enganosas.

Bereia  já publicou que  “ideologia de gênero” é um tema amplamente explorado em períodos eleitorais, especialmente em espaços digitais religiosos. O termo surgiu no contexto católico e foi adotado também por grupos evangélicos, com o intuito de deslegitimar a discussão científica sobre identidade de gênero e justiça de gênero. 

O termo é falsamente apresentado como uma estratégia marxista, de grupos de esquerda, supostamente destinada a destruir a “família tradicional” por meio de “escolha do sexo que se deseja” e de uma educação sexual que levaria à depravação, homossexualidade e defesa do aborto e da pedofilia. Tal discurso gera pânico e medo entre os grupos religiosos.

Junto com este tema também é utilizado o pânico em torno da liberação tanto do aborto e das drogas, que também são frequentes objetos de checagem do Bereia. Todas as matérias mostram distorção das abordagens destes temas por lideranças religiosas, com omissão de informações e invenção de outras sobre o que se discute publicamente em torno deles.

***

Bereia afirma que os panfletos distribuídos pelo candidato a vereador Waguinho (PL, Rio de Janeiro), intitulados “Estamos vivendo um tempo dificílimo” contêm conteúdo falso. O candidato, que é pastor e cantor da Assembleia de Deus, usa temas sensíveis como “ideologia de gênero” e as discussões em torno de drogas e do aborto para convencer eleitores que “todos os candidatos de esquerda” ameaçam crianças e seus pais. Waguinho faz campanha com conteúdo negativo contra outras candidaturas, sem oferecer qualquer referência que o justifique. 

Essa estratégia de disseminação de desinformação busca gerar pânico moral e repulsa a opositores entre os eleitores, semelhantemente ao que foi observado em campanhas de pleitos anteriores. Por isso, é crucial que os eleitores desconfiem de candidatos que atuam com conteúdo negativo e não com propostas  verifiquem a veracidade das informações antes de repercuti-las, a fim de evitar a propagação de discursos falsos.

Bereia participa da campanha Bote Fé no Voto. Votar é um direito que alerta sobre este tipo de má-fé nas eleições.  Saiba mais.

Referências: 

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/panico-moral-sobre-ideologia-de-genero-aborto-erotizacao-de-criancas-e-defesa-da-familia-e-usado-para-disputa-eleitoral-com-base-em-desinformacao/. Acesso em: 4 de outubro de 2024.

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/ideologia-de-genero-e-um-dos-temas-explorados-por-quem-produz-desinformacao-em-espacos-religiosos-nestas-eleicoes/.  Acesso em: 4 de outubro de 2024.

Wikipedia. https://pt.wikipedia.org/wiki/Waguinho_(cantor).  Acesso em: 4 de outubro de 2024.

Editora do Bereia defende vigilância constante às instituições para o enfrentamento da desinformação

É necessário que haja uma vigilância constante e pressão às instituições, como Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Congresso Nacional, para que cuidem adequadamente do tema da desinformação e dos desdobramentos dele. A opinião é da editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha, entrevistada do Programa Desinformação & Política da TV GGN, em 10 de setembro de 2024.

Segundo ela comentou, alguns episódios de manipulação da informação e de fortalecimento de fake news nos últimos dez anos no mundo causaram perplexidade e precisam trazer aprendizados. A pesquisadora lembrou de articulações que envolveram o processo do Brexit (saída da Grã-Bretanha da Comunidade Europeia), em 2014, e da campanha eleitoral norte-americana de 2016 que resultou na vitória de Donald Trump. Citou ainda o que ocorreu no Brasil nas eleições presidenciais em 2018 e em 2022, e nas eleições municipais de 2020. Em todos eles a disseminação de conteúdos desinformativos foi intensa, conforme ressaltou.

De acordo com a editora-geral do Bereia, alguns avanços têm sido observados, ainda que existam entraves significativos a serem superados. “Isso [iniciativas] ocorre especialmente no Poder Judiciário, por meio do TSE, que em vista do ocorrido em 2018 e 2020, já tomou uma série de providências para coibir a situação [disseminação de desinformação]”. “Agora chegamos às eleições de 2024 com o aperfeiçoamento dessas medidas, mas é preciso que a preocupação não fique restrita aos períodos eleitorais”, acrescentou.

Magali Cunha fez referência a outras iniciativas da sociedade civil. Ela lembrou de esforços da academia na produção de pesquisas sobre o tema e também da criação e articulação de movimentos pelo país, como a Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNC) e o Coletivo Bereia. 

A íntegra da entrevista, que trata também dos motivos que tornam o segmento cristão o mais vulnerável à desinformação, está disponível em:

Eleições 2024: Candidatos cristãos impulsionam publicações digitais com desinformação sobre a vacina contra covid-19

Candidatos a cargos municipais têm impulsionado publicações com desinformação sobre a vacinação de crianças contra a Covid-19 e disseminam informações falsas de que a imunização seria prejudicial à saúde. Este é o tema de matéria da agência de checagem Lupa, publicada, em 20 de outubro. O conteúdo falso foi publicado em mídias sociais da Meta por candidatos de diferentes regiões do Brasil (Instagram e Facebook), com o alcance de milhares de pessoas.. 

Imagem: Site A Lupa

Os conteúdos foram impulsionados (publicados com pagamento à Meta para alcançar mais pessoas) ilegalmente,pois violam a resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que proíbe a veiculação de informações falsas durante campanhas eleitorais. Apesar de a vacinação ser segura e fundamental para o controle da pandemia, conforme inúmeras checagens já efetuadas pelo Bereia e demais agências, como a própria Lupa, candidatos como Douglas França e Alberto Barreto espalham mentiras sobre supostos riscos. Estas alegações  ignoram dados científicos que comprovam os benefícios da imunização e das medidas sanitárias, como o uso de máscaras.

A matéria publicada pela plataforma de checagem destaca que estudos, como os publicados pelo The New England Journal of Medicine e o Centers of Disease Control and Prévention (CDC), reforçam que a vacinação infantil e as medidas de distanciamento social foram cruciais para reduzir o risco de hospitalizações e salvar milhões de vidas durante a pandemia. 

Segundo o TSE, candidatos que violam as normas eleitorais podem ser multados ou até perderem seus mandatos.

Bereia checou se os candidatos citados na matéria da Lupa têm identidade religiosa.

Douglas do Tiro

O primeiro nome citado na matéria é de Douglas França da Silva, o Douglas do Tiro, da cidade de Gaspar, interior de Santa Catarina, candidato pelo Partido Social Democrático (PSD). De acordo com a matéria da Lupa, o candidato impulsionou um anúncio com alcance estimado em 100 mil usuários, para um vídeo em que se posiciona contra a obrigatoriedade da vacina para covid-19 em crianças.  Bereia já checou mentiras em torno da vacinação de crianças com este imunizante.

O vídeo ainda está no ar e não foi bloqueado pela Meta, empresa que administra as redes, nem há um aviso de “Informação falsa. Checada por verificadores de fatos independentes”. Esta inscrição é aplicada pela Meta em material deste tipo, em cumprimento às normas que ela própria declara assumir.  

Como o próprio nome de urna do candidato já diz, o político é ligado a clubes do tiro e a questões de segurança pública como armar a guarda municipal. O feed de suas redes digitais é repleto de armamentos, instruções sobre como atirar, Douglas é instrutor de tiro e violência. O slogan da campanha dele é “Deus, Pátria, Família, Segurança, Educação e Liberdade”. 

Apesar do acionamento da religião cristã com o uso da palavra “Deus” no bordão e no jingle da campanha, não há referência à Bíblia ou temas religiosos em seus perfis, mesmo  em publicações mais antigas, não há referência à filiação confessional. Há sim, uma ou duas publicações que criticam igrejas pentecostais e a forma delas arrecadarem ofertas.. 

Imagem: Instagram

Alberto Barreto

O candidato a vereador de Taubaté (SP), pelo Partido Renovação Democrática (PRD),  Alberto Barreto, segundo a Lupa, impulsionou um vídeo com alcance estimado de até 500 mil usuários. Barreto criticou as medidas sanitárias adotadas durante a pandemia, como o isolamento social e o uso de máscaras neste material.. 

O vereador é candidato à reeleição e já divulga inverdades sobre vacinas há algum tempo. Ele têm em seu perfil no instagram um destaque com stories sobre a pandemia de covid-19 com muita desinformação, falsidades já checadas e desmentidas por inúmeras agências.

Imagens: Instagram

Em seu perfil nas redes sociais, o político se declara cristão e possui diversos conteúdos em que está realizando ações junto a organizações da igreja católica, ou imagens que remetem ao Catolicismo. Além disso, o candidato se declara conservador de direita, defensor de “Deus, Pátria Família e Liberdade”. Em seus destaques no Instagram, é possível ver conteúdos sobre a pandemia e saúde, além de vídeos que propagam o uso e porte de armas.

Imagem: Instagram

Thiago Xavier Kozak

O candidato a vereador, pelo Novo,  Thiago Xavier Kozak, da cidade de Cascavel (PR), por sua vez, impulsionou um conteúdo, com alcance estimado em 5 mil usuários, que defende o cumprimento da Lei Estadual nº 21.015/2022, que proíbe a exigência da vacinação da covid-19 no Paraná, de acordo com a Lupa. 

Nas mídias sociais, o candidato também se declara conservador de direita e cristão. Têm duas publicações no feed do Instagram com presença na Nova Igreja Batista de Cascavel, quando não estava em campanha. Não há publicações em outras igrejas evangélicas, o que supõe que pertence a essa denominação, mas a ausência de conteúdo sobre isto torna o dado impreciso.

No perfil do Instagram de Kozak, assim como nos dos demais candidatos relatados na matéria da Lupa, é possível encontrar outros conteúdos com desinformação sobre a pandemia de covid-19 e as vacinas, além de outroe relacionados a proibição do aborto e liberação do uso de armas.

Imagem: Instagram

***

Bereia identificou, portanto, que dois dos citados na matéria da Lupa se autoidentificam cristãos, Thiago Xavier Kozak e Alberto Barreto, enquanto um terceiro, Douglas do Tiro, aciona religião em campanha, por meio do mote cristão da direita extremista “Deus, Pátria, Família”.

Bereia alerta leitores e leitoras a atentarem a candidaturas que mobilizam identidade religiosa e são propagadoras de desinformação não apenas para chamar a atenção mas com temas que podem causar mal, como a contestação de políticas públicas de saúde e propagação de violência. 

Referências: 

Lupa
https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2024/09/20/candidatos-propagam-ataques-e-desinformacao-antivacina-em-anuncios-ilegais-na-meta 

https://lupa.uol.com.br/busca/vacina%C3%A7%C3%A3o%20infantil

Leis estaduais
https://leisestaduais.com.br/pr/lei-ordinaria-n-21015-2022-parana-assegura-a-plena-liberdade-e-o-direito-de-ir-e-vir-em-todo-territorio-do-estado-do-parana-e-veda-qualquer-exigencia-de-documento-certidao-atestado-declaracao-ou-passaporte-sanitario#:~:text=de%20uso%20coletivo.-,Art.,vacinar%20contra%20a%20Covid%2D19 

Bereia
https://coletivobereia.com.br/a-descredibilizacao-da-vacinacao-por-governantes-extremistas-no-brasil-os-processos-judiciais-que-denunciam-as-ameacas-a-saude-publica/ 

https://coletivobereia.com.br/?s=Vacina

NEJM
https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2202826 

TSE
https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2024/resolucao-no-23-732-de-27-de-fevereiro-de-2024#:~:text=ou%20difunda%20dados%20falsos%2C%20not%C3%ADcias%20fraudulentas%20ou%20fatos%20notoriamente%20inver%C3%ADdicos%20ou%20gravemente%20descontextualizados%2C%20ainda%20que%20ben%C3%A9ficas%20%C3%A0%20usu%C3%A1ria%20ou%20a%20usu%C3%A1rio%20respons%C3%A1vel%20pelo%20impulsionamento 

Líderes religiosos têm imagem explorada em anúncios fraudulentos nas plataformas da Meta

Imagine um medicamento milagroso que promete a cura para a impotência sexual promovido pelo pastor Cláudio Duarte ou ainda gotinhas que prometem eliminar as dores decorrentes da fibromialgia anunciadas pelo padre Fábio de Melo. Pode parecer estranho, mas foi o que pesquisadores do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (NetLab) da UFRJ encontraram em cerca de 1.850 anúncios veiculados nas plataformas da Meta (Facebook e Instagram), entre 1º e 20 de julho de 2024.

Esses anúncios, além de explorarem a fé dos usuários, utilizaram a inteligência artificial (IA) para falsificar a voz e os vídeos dos líderes religiosos, dando a impressão de que eles apoiam os produtos. Foram identificadas 1.668 propagandas fraudulentas com a imagem de padres e pastores, entre eles Marcelo Rossi, Reginaldo Manzotti, Silas Malafaia e Rodrigo Silva.

As peças promoveram medicamentos sem eficácia científica, como tratamentos para dores articulares, fibromialgia e até produtos para emagrecimento. Além disso, alguns anúncios vendiam o livro “Guia da Mulher Sábia”, falsamente atribuído ao pastor Claudio Duarte.

Chama atenção de pesquisadores o fato de que os conteúdos circulavam livremente, sem qualquer aviso sobre o uso de IA. A Meta não moderou ou rotulou nenhum dos conteúdos, de acordo com o relatório. O caso pode colocar os usuários em risco, tanto financeiro quanto à saúde, ao serem induzidos a consumir produtos ineficazes e potencialmente perigosos.

Outro ponto de atenção está na estratégia de distribuição. Para explorar a confiança que os fiéis depositam nessas figuras religiosas, os anunciantes utilizaram técnicas de microssegmentação da Meta que facilitam a entrega desses anúncios para públicos específicos, como idosos e pessoas com problemas de saúde, alvos frequentes desses golpes.

De acordo com pesquisadores da UFRJ, “a exploração da imagem de padres e pastores sugere que dados sobre crença religiosa dos usuários podem ser usados pela Meta para entregar anúncios”. Esse dado é classificado como sensível devido a seu alto potencial discriminatório, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Contudo, a Meta não disponibiliza os dados da microssegmentação aplicada pelos anunciantes nem do público atingido por esse tipo de anúncio. 

Acesse ao relatório completo do NetLab aqui

Enxurrada de desinformação sobre a taxação de medalhistas inunda as redes digitais

Após as atletas olímpicas conquistarem medalhas nos Jogos em Paris, as redes digitais foram tomadas por uma onda de desinformação sobre as taxações das premiações olímpicas. Entre os desinformantes, estão os parlamentares cristãos.

Aproveitando a comoção nacional em torno das medalhistas brasileiras, a deputada Julia Zanatta (PL-SC), por exemplo, publicou um vídeo para criticar o imposto sobre as premiações dos atletas. Ela disse que o “papai Estado quer ficar com boa parte da premiação”, fazendo crer que se trata de uma ação deliberada do atual governo contra os atletas. Além disso, a parlamentar autodenominada cristã mentiu ao dizer que o governo federal não promove incentivos aos atletas. 

Imagem: Reprodução/X

A ginasta Rebeca Andrade, que emocionou o Brasil com sua performance em Paris, testemunhou sobre o apoio recebido do governo federal por meio do programa Bolsa Atleta. 

“O Bolsa Atleta com certeza é importante para a gente, porque a gente compra nossos materiais para treinamento, ajuda nossas famílias a trazer uma segurança para a gente, que muitas vezes é o que falta. Isso permite que a gente foque no nosso trabalho, sabe? Não deixa que a gente tenha preocupações externa”, celebrou a ginasta durante coletiva de imprensa

Já o deputado federal evangélico Helio Lopes (PL-RJ) parece ter mudado de opinião com relação aos valor dos esportistas olímpicos. Sob o governo de Jair Bolsonaro, o parlamentar assistiu o fim do Ministério dos Esportes, a redução histórica de 17% do orçamento para o Bolsa Atleta, e ainda viu a Receita Federal cobrar os atletas olímpicos naquele ano, mas nada propôs. Agora, no entanto, Lopes declarou nas redes que assinou um Projeto de Lei que propõe isentar os atletas das taxações da Receita.

A enxurrada de falsidades sobre a taxação das premiações foi tão grande que a Receita Federal emitiu um comunicado para desmentir as mentiras. Em nota, publicada em 7 de agosto, a Receita explicou que medalhas e troféus não são taxados e sim premiações recebidas em dinheiro, como será o caso dos atletas medalhistas olímpicos ao desembarcarem no Brasil. 

*Com dados do LupaScan.

Imagem: Reprodução/X

Referências:

X/Twitter da Receita Federal https://x.com/ReceitaFederal/status/1821174124103741568/photo/1 

X/Twitter do Governo Federal https://twitter.com/govbr/status/1821209374649405566

Brasil de Fato

https://www.brasildefato.com.br/2021/08/05/brasil-supera-corte-inedito-no-bolsa-atleta-e-deve-bater-recorde-de-medalhas-em-olimpiadas

Capa: Alexandre Loureiro/COB

Justiça condena Rede Record e Igreja Universal por fake news contra Manuela D’Ávila

O noticiário nacional destacou, nesta última semana de julho de 2024, que a ex-deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) venceu uma ação judicial que moveu contra a Rede Record de TV e a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), por conta da divulgação de uma notícia falsa vinculada à sua imagem e nome, no programa “Entrelinhas”, em 2022.

Imagem: reprodução/Estado de São Paulo

Imagem: reprodução/CartaCapital

Em 29 de maio de 2022, o bispo da IURD Renato Cardoso, genro de Edir Macedo e apresentador de programas religiosos na Rede Record, convidou outros pastores para discutir o apoio à campanha de Jair Bolsonaro (PL). Durante o programa, Cardoso alegou que o então candidato à Presidência da República Lula (PT) teria contratado pastores evangélicos para cuidar de sua comunicação. Afirmou, ainda, que a esquerda apoiava um projeto de lei para a “legalização do incesto”, que permitiria que pais e filhos tivessem relacionamentos sexuais legalmente. A informação falsa já circulava em grupos de WhatsApp desde 2019 e foi reiteradamente desmentida por agências de checagem.

Além de vincular a fake news à campanha do candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o programa exibia uma foto de Manuela D’Ávila, como uma das apoiadoras do projeto.

O Bispo Renato Cardoso disse no programa (minuto 00:07:39 a 00:08:06): “Com relação à família, as propostas da esquerda são caóticas e vão desde a criação de um estatuto  com diretrizes tão amplas que permitem inúmeras interpretações, inclusive, segundo especialistas, se aprovado, poderia dar direito de defender arranjos familiares como trisal, que é o casamento entre três pessoas, e até relações incestuosas, entre pais e filhos ou irmãos” (A imagem de Manuela D’Ávila aparece vinculada a este texto, na minutagem 00:07:46 à 00:07:50). No acesso em 24/07/2024, o link do programa no Youtube contava com 25.022 visualizações  (Transmitido ao vivo em 29 de mai. de 2022), com o seguinte texto: “Esquerda contrata pastores para saber como se aproximar dos cristãos e é aconselhada a enganá-los mudando o seu discurso para não espantá-los. Como o eleitor cristão pode evitar essa armadilha?”

Imagem: Reprodução/Youtube

Manuela D’Ávila declara no livro de sua autoria, “Sempre foi sobre nós: Relatos da violência política de gênero no Brasil”: (Editora Rosa dos Tempos, 2022), que as acusações e desinformações contra as mulheres candidatas sempre foram mais violentas do que as acusações a outros candidatos.

Em 2020 disputei minha oitava eleição. Já fui vereadora, deputada federal e estadual, concorri à Vice-Presidência da República numa eleição marcada por um violento esquema de produção e distribuição de desinformação. Desde 2004 sou vítima de ameaças, minha filha já foi agredida fisicamente e, meu marido, hostilizado. Nada, nada, nada se compara ao que vivi em 2020, concorrendo à Prefeitura de Porto Alegre. Líder das pesquisas, me vi vítima de um jogo sórdido, no qual um candidato laranja usava o fato de ter se relacionado comigo na juventude como elemento legitimador de qualquer tipo de mentira e violência. Afinal, qual legitimidade pode ser maior, diante de uma sociedade machista e de um sistema político misógino, do que ter tido uma relação com uma mulher?

Foi chorando, depois do último debate do primeiro turno, que decidi escrever este livro. Primeiro eu queria escrevê-lo sozinha. Depois percebi que éramos muitas que vivíamos a mesma situação. (“Sempre foi sobre nós”, p. 9)

Ataques contra ela, sua família, e sua filha, já haviam ocorrido quando foi candidata a vice, em 2018, na chapa de Fernando Haddad (PT) à Presidência da República. Foram divulgadas à época, também, várias imagens manipuladas e montagens contra da ex-deputada.

Imagem: reprodução/Facebook

Já em 2021, um ano depois de ter sido candidata derrotada à Prefeitura de Porto Alegre, em entrevista ao UOL, a política gaúcha comentou sobre a virulência das fake news e acusações, e afirmou que as mentiras sobre ela  teriam minado sua candidatura. Por conta desta situação, Manuela D’Ávila desistiu de participar de novos processos eleitorais.

Na decisão sobre a ação que a ex-deputada moveu contra a Record/IURD, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) reconhece que ela sofreu danos morais ao ter sua imagem pública prejudicada pelo conteúdo falso propagado. Na decisão, a juíza Tamara Benetti também observou que  não cabe uma suposta defesa da “liberdade de imprensa”, tampouco de “acesso à informação” – “pois o uso da imagem da autora não informa; ao contrário, desinforma.” Pela sentença, Manuela deve ser indenizada em R$ 12,7 mil por danos morais.  O texto da sentença cita diversas agências de checagem para corroborar a decisão, como pode ser lido no trecho reproduzido aqui:

II.2.3 – PL nº 3.369/2015 e Fake News

É inegável que a temática aqui posta é sensível, pois já veiculada como fakenews (diversas vezes desmentida), como indicado pela autora na petição inicial e nãorefutado pela parte contrária.

Seguem links informativos acessados nesta data (15/04/2024,16:55):

https://www.estadao.com.br/estadao-verifica/boato-falso-diz-que-projeto-de-lei-na-camara-quer-legalizar-o-incesto

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2020/08/20/verificamos-casamento-pais-filhos

https://www.boatos.org/politica/manuela-davila-lei-poliamor-casamento-pais-filhos.html

https://noticias.uol.com.br/comprova/ultimas-noticias/2019/08/23/projeto-de-lei-nao-pretende-legalizar-incesto.htm

https://www.e-farsas.com/o-pcdob-quer-legalizar-o-poliamor-e-o-incesto.html

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2024/04/12/e-falso-que-projeto-de-lei-propoe-legalizar-relacoes-sexuais-entre-pais-e-filhos

A disseminação de informações falsas sobre o PL nº 3.369/2015 são recorrentes e já foram alvo de verificações da Lupa.

Em abril de 2023 , por exemplo, circulou nas redesum vídeo de um discurso do ex-deputado federal Aroldo Martins sobre o projeto. Apublicação afirmava que o projeto poderia legalizar o casamento entre pais e filhos. Oque é falso.

Já em junho de 2022,viralizou uma postagem afirmando que a proposta foi apresentada pelo PT, quando, na verdade, o autor é Orlando Silva, do PCdoB-SP.

Em agosto de 2020, um post com uma interpretação enganosa do projeto utilizava uma foto da ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) e do deputado Orlando Silva. O boato foi desmentido.

Em agosto de 2019, um outro post com a foto do deputado Túlio Gadelha (então no PDT-PE, hoje, filiado à Rede-PE), ex-relator do projeto, circulou sugerindo que ele seria um “mensageiro do apocalipse” por relatar uma proposta de “Lei do Incesto”, o que é falso.

A IURD e a Rede Record já recorreram da decisão. Porém, até o momento do fechamento desta matéria não houve nota oficial, ou entrevista sobre a decisão judicial.

***

Bereia classifica como verdadeira a notícia do ganho de causa de Manuela D’Ávila contra a Rede Record/IURD por propagação de conteúdo falso caluniador, e alerta leitores e leitoras para uso político de discursos a favor da “liberdade de expressão” absoluta e “liberdade de imprensa” para divulgação de material desta natureza. Estas abordagens são enganosas pois liberdade de expressão e de imprensa não significa liberdade de mentir e caluniar.

Bereia também chama a atenção para falsas alegações de perseguição judicial à IURD, dona da Record, já identificadas em comentários sobre este caso em mídias digitais. A decisão judicial foi proferida de acordo com a legislação do país e as igrejas, assim como quaisquer outras instituições do país, devem responder por atos praticados.

Referências de checagem:

UOL, https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2021/03/01/manuela-davila-violencia-politica-de-genero.htm). Acesso em: 23 jul 2024

TERRA, https://www.terra.com.br/amp/noticias/brasil/politica/record-e-universal-sao-condenadas-a-pagar-indenizacao-por-fake-news-contra-manuela-davila,64ac7f06c971757ab8a9d189f5660583vzd8u49c.html / Acesso em: [23 jul 2024

CARTA CAPITAL, https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/justica-condena-record-e-igreja-universal-por-divulgacao-de-fake-news-contra-manuela-davila/ Acesso em 23 jul 2024

ZERO HORA, https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/rosane-de-oliveira/noticia/2024/07/por-fake-news-record-e-igreja-universal-sao-condenadas-a-indenizar-manuela-d-avila-clyxemim1009r0162f2pc1ju6.html – Acesso em 23 jul 2024

MÍDIA NINJA, https://midianinja.org/justica-condena-record-e-igreja-universal-por-fake-news-sobre-manuela-davila/ – Acesso em 23 jul 2024

Instituto “E Se fosse você?”, https://www.esefossevoce.org/ Acesso em 23 jul 2024

Livro “Sempre foi sobre nós”, violência política de gênero contra candidatas (Manuela D’ Ávila e outras autoras), https://www.researchgate.net/publication/376220291_Sempre_foi_sobre_nos_violencia_politica_de_genero_no_Brasil. Acesso em 23 jul 2024

JUSBRASIL, https://www.jusbrasil.com.br/processos/nome/33430259/manuela-pinto-vieira-d-avila  Acesso em 23 jul 2024

Brasil de Fato, https://www.youtube.com/watch?v=vHeh7IGi06s – Acesso em 23 jul 2024

Veja, https://veja.abril.com.br/coluna/me-engana-que-eu-posto/manuela-davila-nao-publicou-que-aborto-evita-criar-filho-de-vagabundo#google_vignette – Acesso em 23 jul 2024

YouTube, https://www.youtube.com/watch?v=CEbwbx7PaRs.  Acesso em 23 jul 2024

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Foto de capa: Flickr Manuela D’Ávila

Para defender projeto contra o aborto, deputado evangélico mente e espalha o terror

* Matéria atualizada 19/06 para correção de informação.

O deputado federal evangélico Sóstenes Cavalcante (PL/RJ) publicou uma série de mentiras usadas por teorias de conspiração ao redor do mundo, em reação à reportagem do Fantástico que tratava sobre o Projeto de Lei 1904.  O PL qualifica como homicídio qualquer forma de aborto após 22 semanas de gestação, incluída a permitida por lei, como nos casos de vítimas de estupro.

Cavalcante é um dos 32 parlamentares autores do texto que causou controvérsias por conta da criminalização de mulheres e de profissionais de saúde, e acabou apelidado do “PL do Estupro”. A aprovação da urgência do projeto, conseguida com o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), para que fosse direto para votação ao plenário sem passar pelas comissões temáticas da casa, também gerou indignação popular.

Mulheres realizaram atos em várias cidades do país contra o PL 1904, entre 13 e 16 de junho, indignadas com a criminalização e a retirada de direitos já concedidos em relação aos seus corpos, em especial de crianças e adolescentes, as maiores vítimas de estupros no Brasil. Milhares delas foram às ruas empunhando placas com dizeres como “Criança não é mãe”, “Não ao PL do estupro” e “Não ao PL da gravidez infantil”. Entre elas estavam mulheres de diferentes igrejas cristãs, católicas e evangélicas.

O vídeo, publicado em suas mídias sociais, em 17 de junho passado, viralizou em diversos grupos de pastores, conforme monitoramento do Bereia. Sóstenes Cavalcante publicou o vídeo no contexto dos protestos públicos contra o PL, cuja apresentação ocorreu sob sua liderança. 

Atos na Cinelândia, no Rio, Avenida Paulista, em São Paulo, e Jaraguá, em Maceió. Imagens: Reprodução das mídias sociais

No vídeo gravado, o parlamentar declara que “há uma indústria mundial, liderada por um senhor chamado George Soros, um milionário americano que patrocina mundo afora o aborto, o assassinato de bebês indefesos”. Para o autor da PL, a campanha contra a votação do projeto seria uma “cortina de fumaça de movimentos ‘abortistas e esquerdistas’”. 

Contudo, por se tratar de mentiras já amplamente checadas, diversos veículos de comunicação e agências de checagem publicaram o desmentido. Por isso, Bereia traz aqui um compilado de apurações para leitores e leitoras.

Comprova, Folha e Aos Fatos desmentem conteúdo do vídeo

A Folha de São Paulo repercutiu a checagem do Projeto Comprova, parceiro do Bereia em 2020. O Comprova explica que o bilionário húngaro, de origem judaica, que atua em causas filantrópicas, George Soros é frequentemente envolvido em teorias conspiratórias, principalmente produzidas pela extrema-direita, com conotações antissemitas. Para se ter ideia, o filantropo já foi acusado incorretamente de promover a “crise” migratória na Europa e nos Estados Unidos, de ser um ex-combatente nazista e de participar de grupos como os Maçons e os Illuminati. No Brasil, circularam boatos de que Soros financiaria o PSOL e o movimento #EleNão contra Jair Bolsonaro, ambos desmentidos.

Quanto à mentira sobre fetos humanos serem utilizados em cosméticos, a Folha explica que o deputado fez uma montagem para enganar o público. Ele utilizou de uma imagem do livro “Babies for Burning”, de 1974, cujo autor propagava o boato. Porém, o deputado omitiu que a informação foi desmentida poucos anos depois. Ainda, para engrossar a mentira, o integrante da Bancada Evangélica utilizou vídeos manipulados e já desmentidos, sobre a venda de órgãos de fetos abortados que nunca existiu.

A plataforma jornalística Aos Fatos também publicou um desmentido. Ela afirma que o deputado se baseia em reportagens antigas e denúncias falsas sobre organizações de direitos reprodutivos no Reino Unido e nos Estados Unidos para sugerir que existe uma indústria mundial que utiliza fetos abortados na produção de cosméticos. 

Estas ações nasceram de um site ligado a grupos que utilizavam a desinformação para obter vantagens políticas. Antes mesmo do parlamentar soltar o vídeo mentiroso, Ao Fatos apurou que o texto do “PL do aborto” foi copiado, na íntegra, do site Alfarrabios que divulga conteúdos negacionistas e que teve como um dos sócios dois ex-alunos de Olavo de Carvalho.

Sóstenes Cavalcante “inaugura” o site do Bereia

Não é de hoje que o deputado e pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, liderada pelo pastor Silas Malafaia, utiliza falsidades em sua atuação política. Cavalcante foi objeto de checagem no dia do lançamento do site do Bereia, em 31 de outubro de 2019. Ele “estreou” quando passou adiante um vídeo enganoso que atacava a ONG Greenpeace na ocasião de um vazamento de óleo no litoral nordestino. Desde então, ele é figura em 15 checagens feitas pelo Bereia.

Em 2023, o parlamentar se notabilizou pela atuação contra o Projeto de Lei 2630/2020, que tratava da regulação das plataformas sociais e com isso impedir a farta disseminação de notícias falsas. Para Sóstenes Cavalcante, responsabilizar as empresas de tecnologia pela circulação de conteúdo falso e de ódio seria uma espécie de censura. Na ocasião, como líder da bancada evangélica na Câmara, Cavalcante celebrou o adiamento da votação e arrancou aplausos da base evangélica e da extrema-direita.  No início deste ano, o político publicou uma montagem enganosa sobre desfile da escola de samba paulistana Vai-Vai com críticas enganosas sobre a Lei Rouanet, uma das mais utilizadas como desinformação pela extrema-direita.

Referências

Bereia https://coletivobereia.com.br/sostenes-cavalvante-retuita-postagem-com-declaracao-falsa-atribuida-a-ong-greenpeace/ Acesso em 18 junho de 2024

Fantástico https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2024/06/16/pl-sobre-aborto-em-tramitacao-acelerada-na-camara-provoca-debate-intenso-e-divide-opinioes.ghtml Acesso em 18 junho de 2024

O Globo https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2024/06/14/pl-do-aborto-mobiliza-a-sociedade-e-leva-protestos-as-ruas-em-meio-a-silencio-do-governo-lira-sinaliza-recuo.ghtml Acesso em 18 junho de 2024

Folha 

https://www1.folha.uol.com.br/webstories/cultura/2020/07/quem-e-george-soros Acesso em 18 junho de 2024


Lupa

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2023/05/02/oposicao-trata-adiamento-de-votacao-do-pl-2-630-como-vitoria-contra-governo Acesso em 18 junho de 2024

Projeto Comprova

https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/entenda-por-que-o-nome-de-george-soros-aparece-em-diversas-teorias-da-conspiracao Acesso em 18 junho de 2024

Aos Fatos

https://www.aosfatos.org/noticias/pl-do-aborto-sostenes-recicla-mentira-fetos-industria-cosmeticos Acesso em 18 junho de 2024

Foto de capa: Pedro Valadares/Câmara dos Deputados

Deputada alinhada à extrema direita engana ao alegar manipulação do número de mortes pelas enchentes no Sul

A deputada federal e líder da minoria na Câmara Bia Kicis (PL/DF) levantou uma questão polêmica em sua conta pessoal no X (antigo Twitter) em 26 de maio, viralizada repercutido nas redes. A parlamentar  questionou se o governo estaria escondendo o número verdadeiro de mortes causadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul, por meio do compartilhamento de um vídeo com supostas graves denúncias. 
De acordo com o conteúdo do vídeo, o governo não estaria contabilizando corretamente o número de mortos na tragédia do Rio Grande do Sul, com o registro das mortes por afogamento como “indeterminadas” nas certidões de óbito. 

Na denúncia, há um trecho da TV Jovem Pan  e outro de vídeo anônimo. As denúncias mencionadas, caso fossem verdadeiras, seriam de extrema gravidade. Segundo as alegações, a esfera pública estaria mascarando o motivo das mortes relacionadas à catástrofe, a fim de não revelar a verdadeira proporção da mortalidade decorrente das enchentes. De acordo com números oficiais, foram contabilizadas 169 mortes, até o fechamento desta matéria, com outras 63 pessoas ainda desaparecidas.

Imagem: reprodução/X

Conteúdo do vídeo da deputada

Imagem: reprodução/Facebook

O vídeo compartilhado por Bia Kicis apresenta dois relatos para embasar a denúncia.

O primeiro é um trecho de uma entrevista do ornal 3 em 1, da TV Jovem Pan, veiculado em  14 de maio de 2024. O jornalista Bruno Pinheiro, que acompanhava a situação da cidade de Canoas, a maior da região metropolitana de Porto Alegre, largamente afetada pelas chuvas, com mais de 10 mil pessoas desalojadas, de acordo com o prefeito Jairo Jorge (PSD/RS). Este local ganhou destaque na imprensa nacional por conta de um cavalo ter ficado ilhado em um telhado 

No trecho em questão, retirado do programa ao vivo, foi veiculada a entrevista em que um homem de nome Alex (não é mencionado sobrenome na entrevista) afirma que resgatou o corpo do pai afogado e preso a fiações, mas que este teria brevemente desaparecido do IML. O homem afirma que para sua surpresa, a causa da morte consta na certidão como indeterminada. Os jornalistas e comentaristas do programa não teceram comentários em relação a isto, e restringiram-se reconhecimento  da tristeza e da terrível situação vivida pelo entrevistado. 

O segundo relato, originado de um vídeo amador, mostra um anônimo que afirma que sua irmã morreu devido às enchentes em Eldorado do Sul. Ele alega que, no IML de Porto Alegre, para onde o corpo teria sido levado, os servidores estariam impedindo os familiares de reconhecerem os corpos e obrigando-os a assinar um termo com a declaração da morte por causa indeterminada, e não por afogamento decorrente das chuvas. O homem menciona ainda que é o governo da capital gaúcha, liderado pelo prefeito Sebastião Melo (MDB/RS), que estaria adulterando os atestados de óbito e obrigando os familiares a atestarem que as causas das mortes foram indeterminadas.

Identificação de óbitos das enchentes Rio Grande do Sul

A identificação de vítimas após grandes desastres é uma atividade complexa. Primeiramente, por conta da quantidade de corpos que são resgatados, o que sobrecarrega os Institutos Médicos Legais (IML), responsáveis pela execução e produção de necropsias e laudos cadavéricos de cada Estado brasileiro.

Em segundo lugar, o estado de decomposição dos corpos influencia diretamente na velocidade e na forma de identificação. Após o falecimento, naturalmente, esse processo ocorre de forma muito rápida, porém, quando se trata de corpos que estavam submersos, cobertos de matéria orgânica por um grande período de tempo, o uso das digitais para verificar as informações pessoais da pessoa morta, método mais usado de identificação, torna-se cada vez mais difícil.

Dessa maneira, os peritos conseguem fazer um tratamento para melhorar a qualidade da impressão, processo que demora de dois a três dias. Caso ainda não seja possível, é necessário recorrer ao reconhecimento pela arcada dentária ou por exames de DNA. Porém, não são métodos infalíveis e há grande possibilidade de pessoas não serem identificadas.

Desde  6 de maio, um mutirão com todos os 120 servidores do estado que são médicos legistas  atua para suprir a demanda. No entanto, com a descida do nível das águas, a possibilidade de encontrarem mais corpos ainda é grande. Equipes dos estados do Paraná e de Santa Catarina foram enviadas para o Rio Grande do Sul para  ajudar.

Atuação do governo do Estado sobre a tragédia do Rio Grande do Sul

A Defesa Civil do Rio Grande do Sul, afirma que está atuando de forma eficaz para atender a população afetada e garantir a segurança de todos. Diariamente, pela manhã e ao final da tarde são divulgadas as ações de resgate e os últimos números da tragédia no estado. Até 28 de maio, 169 pessoas foram vítimas das enchentes, enquanto ainda há  ao menos, 53 desaparecidos, tendo sido mais de 77 mil pessoas resgatadas em 469 municípios afetados. 

Além disso, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado, mantém atualizações de hora em hora sobre o nível do Guaíba, lago localizado na região metropolitana de Porto Alegre, que alcançou níveis históricos no mês de maio. O governo do Estado do Rio Grande do Sul, em parceria com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema (ONS), também está monitorando a situação das demais barragens gaúchas.

Bia Kicis e o compartilhamento de notícias falsas

Imagem: reprodução/X

Beatriz Kicis Torrents de Sordi (PL/DF) foi eleita deputada federal em 2019, ocupou os cargos de vice-líder do governo Jair Bolsonaro (PL) na Câmara, além de ter sido eleita presidente da Comissão de Constituição e Justiça também em 2019. Com identidade católica declarada, a deputada frequentemente se envolve em casos de compartilhamento de notícias falsas, tanto nas mídias digitais quanto em discursos públicos, como Bereia já checou em várias matérias. 

 Imagens: reprodução site Bereia

Desde 2020, Kicis está na lista dos parlamentares investigados no Inquérito n° 4781, mais conhecido como Inquérito das Fake News, no Superior Tribunal Federal (STF). Ela é  acusada de disseminação de notícias falsas ou/e distorcidas sobre a pandemia de covid-19, tendo apregoado contra medidas de isolamento social, atacou opositores do governo Bolsonaro e convocou seguidores para as manifestações antidemocráticas que ocorreram no auge da pandemia.  

Em outro episódio, Bia Kicis teve que se desculpar depois de afirmar, da tribuna da Câmara dos Deputados, que uma idosa, presa por ter participado dos ataques de 8 de janeiro de 2023, teria falecido nas dependências do presídio. A idosa não existia.

Hoje, Bia Kicis é a líder da Minoria da Câmara dos Deputados, e continua a fazer uso da máquina desinformativa para atacar opositores. Mais recentemente, a deputada católica afirmou, de forma mentirosa, que a cidade de Farroupilha (RS) foi retirada da lista de alvos de calamidades do governo federal após uma discussão entre o prefeito Fabiano Feltrin (PL) e o recém-empossado ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul Paulo Pimenta (PT) por telefone, divulgada por Feltrin.

Coincidências com a pandemia de Covid-19

A notícia de possíveis adulterações nas causas de óbitos da população durante uma grave crise, como as chuvas  de maio no Rio Grande do Sul, traz à tona lembranças recentes para os brasileiros. Isso porque, em 2021, em meio à pandemia de covid-19, o então presidente Jair Bolsonaro, também do PL, fez uma afirmação semelhante.

Na época, Bolsonaro alegou que um suposto relatório “paralelo” do Tribunal de Contas da União (TCU) indicava que cerca de 50% das mortes atribuídas à pandemia, em 2020  não foram causadas pela doença. No entanto, no mesmo dia, o TCU desmentiu a informação, e afirmou que o documento era falso. Apesar disso, a deputada Bia Kicis (PL/DF), então presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara, repostou o vídeo das declarações de Bolsonaro.

É importante ressaltar que essa notícia sobre a adulteração de dados da covid-19 era comprovadamente falsa, tendo sido desmentida por diversas instituições e órgãos. O próprio TCU negou a autenticidade do relatório mencionado por Bolsonaro, e os números oficiais das Secretarias de Saúde Estaduais, aferidos pelo Consórcio de Veículos de Imprensa, contradisseram a afirmação do ex-presidente. Além disso, investigações conduzidas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Pandemia e pelo Ministério Público Federal também comprovaram a falsidade da alegação. 

Imagem: reprodução/O Globo

Imagem: reprodução/Carta Capital

Imagens: reprodução/Veja

Bereia verificou que o vídeo compartilhado pela deputada católica Bia Kicis é enganoso pois distorce informações verdadeiras com o objetivo de afetar o governo federal e o ministro Paulo Pimenta. Os estados da federação são os entes que têm a atribuição e a gerência dos Institutos Médicos Legais. O governo do Estado do Rio Grande do Sul esclareceu em nota, que a causa da morte é determinada pelo médico legista no momento do exame e caso não haja evidências suficientes para atestar que a vítima, de fato, morreu de afogamento, a causa é indeterminada, até que os exames complementares requisitados sejam recebidos pelo IML.

Ou seja, por mais que seja verdadeira a informação compartilhada no vídeo, essa prática não é uma ação deliberada  do governo do Rio Grande do Sul para mascarar o número de óbitos decorrentes das enchentes. Está sendo obedecido um padrão para casos em que os médicos legistas necessitam de mais informações para aferir corretamente a causa mortis. Ademais, o governo federal não tem responsabilidade nesta ação, como deve ser de conhecimento de uma agente pública, como a parlamentar. Portanto, há indícios de que a deputada está, deliberadamente, propagando um engano.

Referências de checagem:

UOL. Temos 10 mil pessoas dormindo no chão, diz prefeito de Canoas (RS). UOL, 08 maio 2024. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/08/temos-10-mil-pessoas-dormindo-no-chao-diz-prefeito-de-canoas-rs.htm. Acesso em: 27 maio 2024.

PODER 360. Auditor do TCU diz que relatório sobre mortes por Covid foi alterado. Poder 360, [s.d.]. Disponível em: https://www.poder360.com.br/governo/auditor-do-tcu-diz-que-relatorio-sobre-mortes-por-covid-foi-alterado/. Acesso em: 27 maio 2024.

O GLOBO.

Teorias conspiratórias mobilizam bolsonarismo com explicações simplórias da realidade. O Globo, [s.d.]. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/teorias-conspiratorias-mobilizam-bolsonarismo-com-explicacoes-simplorias-da-realidade-1-25072853. Acesso em: 27 maio 2024.

Presidente da CCJ, deputada Bia Kicis é condenada a pagar R$ 418 mil por fake news contra Jean Wyllys. O Globo, [s.d.]. Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/sonar-a-escuta-das-redes/post/presidente-da-ccj-deputada-bia-kicis-e-condenada-pagar-r-418-mil-por-fake-news-contra-jean-wyllys.html. Acesso em: 28 maio 2024.

FORUM. Vídeo: Paulo Pimenta desmonta fake news de Bia Kicis: “mal intencionada”. Revista Fórum, 16 maio 2024. Disponível em: https://revistaforum.com.br/politica/2024/5/16/video-paulo-pimenta-desmonta-fake-news-de-bia-kicis-mal-intencionada-158952.html. Acesso em: 27 maio 2024.

AGÊNCIA BRASIL. Sobe para 83 número de mortes no Rio Grande do Sul pelas fortes chuvas. Agência Brasil, 28 maio 2024. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2024-05/sobe-para-83-numero-de-mortes-no-rio-grande-do-sul-pelas-fortes-chuvas. Acesso em: 28 maio 2024.

CARTA CAPITAL. A fábrica de fake news de Bia Kicis. Carta Capital, [s.d.]. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/politica/a-fabrica-de-fake-news-de-bia-kicis/. Acesso em: 28 maio 2024.

VEJA.

Por nova fake news, Bia Kicis tem conta bloqueada no YouTube. Veja, [s.d.]. Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/radar/por-nova-fake-news-bia-kicis-tem-conta-bloqueada-no-youtube. Acesso em: 28 maio 2024.

Bia Kicis volta a mentir, agora na tribuna da Câmara. Veja, [s.d.]. Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/maquiavel/bia-kicis-volta-a-mentir-agora-na-tribuna-da-camara. Acesso em: 28 maio 2024.

COLETIVO BEREIA.

https://coletivobereia.com.br/video-de-kicis-sobre-conferencia-em-ny-volta-a-circular-com-desinformacao/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-bia-kicis-usa-recorte-de-video-para-acusar-psol-de-agir-contra-mulheres-na-politica-a-direita/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-bia-kicis-classifica-parlamentar-da-alemanha-em-visita-ao-brasil-como-conservadora/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/a-deputada-bia-kicis-e-a-desinformacao-sobre-o-voto-impresso/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/publicacao-de-bia-kicis-com-relato-de-syllas-valadao-contem-informacoes-enganosas/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-catolica-dissemina-enganos-sobre-uso-dos-lucros-extraordinarios-com-acoes-da-petrobras-pelo-governo/. Disponível em 29 de maio de 2024.

JOVEM PAN NEWS. Disponível em: https://www.facebook.com/watch/?v=1209648273745302. Acesso em: 28 maio 2024.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Deputada Bia Kicis. Câmara dos Deputados, [s.d.]. Disponível em: https://www.camara.leg.br/deputados/204374. Acesso em: 27 maio 2024.

DEFESA CIVIL RS. Defesa Civil atualiza balanço das enchentes no RS – 28/5 9h. Defesa Civil RS, 28 maio 2024. Disponível em: https://www.defesacivil.rs.gov.br/defesa-civil-atualiza-balanco-das-enchentes-no-rs-28-5-9h. Acesso em: 28 maio 2024.

YOUTUBE.

https://www.youtube.com/live/iuCq63qP_t4?si=4BQrkNj31Jn7yosH&t=4395. Acesso em: 27 maio 2024.

https://www.youtube.com/watch?v=mmIpwgW_jhQ. Acesso em: 28 maio 2024.

https://youtu.be/Ud_NGY9eUZk?si=2S04U-q4NWqSTj8U. Acesso em: 28 maio 2024.

GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. É fake que o Posto Médico-Legal de Canoas está atestando que a causa da morte de vítimas das enchentes é indeterminada. Governo do Estado do Rio Grande do Sul, [s.d.]. Disponível em: https://estado.rs.gov.br/e-fake-que-o-posto-medico-legal-de-canoas-esta-atestando-que-a-causa-da-morte-de-vitimas-das-enchentes-e-indeterminada. Acesso em: 28 maio 2024.

UOL. Cada minuto importa: enchentes atrapalham identificação de vítimas no RS. UOL, 22 maio 2024. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/22/cada-minuto-importa-enchentes-atrapalham-identificacao-de-vitimas-no-rs.htm. Acesso em: 29 maio 2024.

METRÓPOLES. Peritos travam guerra contra o tempo na identificação dos corpos no RS. Metrópoles, [s.d.]. Disponível em: https://www.metropoles.com/brasil/peritos-travam-guerra-contra-o-tempo-na-identificacao-dos-corpos-no-rs. Acesso em: 29 maio 2024.

EBRADI. Instituto Médico Legal. EBRADI, [s.d.]. Disponível em: https://wp.ebradi.com.br/coluna-ebradi/instituto-medico-legal/. Acesso em: 24 maio 2024.

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Foto de capa: Flickr/Governo do Rio Grande do Sul

Propagação de fake news é intensificada em anos eleitorais, alerta editora-geral do Bereia

Os anos eleitorais recentes têm sido palco da intensificação da propagação de fake news, segundo avaliou a editora-geral do Bereia e pesquisadora Magali Cunha em reportagem publicada em 20 de março pela Agência Brasil intitulada “Entenda como a nova onda de fake news influencia a guerra digital”.

A pesquisadora chamou a atenção para as eleições ocorridas recentemente. “Os anos de 2018, 2020 e 2022 foram muito intensos com desinformação nos ambientes digitais. Já entre 2019 e 2021, houve deliberadamente uma política de desinformar, promovida pelo governo [do presidente Jair] Bolsonaro (PL). Mas desde outubro do anos passado, é cada vez mais alta a intensidade e quantidade de notícias falsas”, afirmou Magali Cunha.

Na opinião da editora-geral do Bereia, essa guerra digital das fake news é estimulada por diversos atores. “O nosso monitoramento de grupos de influenciadores religiosos aponta um verdadeiro bombardeio de conteúdos falsos, que depois acaba sendo alimentado pela própria grande mídia, com notícias com títulos enganosos que podem induzir leitores a construir pensamentos e ações negativas sobre determinadas pautas”, destacou. Ela acrescentou que “muitos políticos também têm seu papel negativo nesse ecossistema, porque municiam a desinformação com conteúdo não verdadeiro, que depois é trabalhado por esses grupos”.

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Foto de capa: Agência Brasília/Flickr

Editora de Bereia analisa fake news e eleições municipais em congresso de comunicação

Você relacionaria fake news com estratégias de campanha eleitoral de candidatos com identidade religiosa? Esse foi o esforço empreendido por Magali do Nascimento Cunha, pesquisadora e editora-geral do Coletivo Bereia, em trabalho apresentado durante a 46ª edição do Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, promovido pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação (Intercom).

A análise, que focou as eleições municipais de 2020,  se baseou em dados quantitativos e qualitativos resultantes de pesquisa do Instituto de Estudos da Religião (ISER). Os discursos contidos em materiais de campanha foram examinados, com a identificação dos principais conteúdos falsos e enganosos que circularam nos pronunciamentos de tais candidatos.

Magali Cunha concluiu que três núcleos temáticos de concentração de desinformação e fake news foram predominantes: ideologia de gênero, pânico em torno da educação e cristofobia.

Clique aqui e confira na íntegra o artigo, intitulado “Fake news como estratégia de campanha de candidatos com identidade religiosa: um olhar sobre as eleições municipais de 2020”.

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Foto de capa: Element5 Digital/Pexels

Boatos e fake news no tempo do apóstolo Paulo: uma lição para cristãos e cristãs hoje

Podemos nos perguntar se no início do Cristianismo já havia perturbação nas comunidades causada por falsas notícias e documentos apócrifos.

A Segunda Carta de Paulo aos Tessalonicenses dá a entender que esse fenômeno já existia. Paulo alerta:

“A respeito da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo e de nossa reunião junto a ele, nós vos pedimos, irmãos, não vos perturbeis tão depressa, nem vos alarmeis por causa de uma revelação profética, de uma afirmação ou carta, apresentadas como se procedessem de nós e que vos fariam crer que o dia do Senhor chegou. Que ninguém vos engane, de maneira alguma”. (2 Ts 2,1-3a)

De fato, a comunidade de Tessalônica se situava numa região atravessada por diferentes culturas e religiões, por ser uma cidade portuária, de grande movimento comercial. Havia um ambiente de agitação e conflitos religiosos e políticos, sob o domínio implacável do império romano. Os cristãos, recém convertidos e batizados, sofriam perseguição da Sinagoga local, aliada aos poderosos da cidade, que exploravam os trabalhadores.

Nesse ambiente, a volta do Cristo glorioso e o juízo final apareciam como o restabelecimento da justiça e a conquista da recompensa para os cristãos. Mas, ao mesmo tempo, espalhavam o medo. Então surgiam notícias e falsas profecias sobre o fim do mundo, com fenômenos apocalípticos, que deixavam as pessoas inquietas e ameaçadas. Mais ainda, circulavam falsas cartas atribuídas a Paulo. Por isso, ele vai alertar para que as pessoas não se deixassem levar por essas mentiras e nem dessem crédito às cartas falsamente atribuídas a ele e seus companheiros.

Por esse motivo, Paulo vai terminar sua carta tomando ele mesmo a pena e redigindo do próprio punho a despedida:

“A saudação é de próprio punho, minha, de Paulo. Assim é que assino todas as cartas. Esta letra é minha.

Que a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com todos vós.” (2Ts 3,17-18)

Lendo a Segunda Carta aos Tessalonicenses podemos ver que, já desde o início do Cristianismo, o fenômeno das falsas notícias, boatos e cartas apócrifas circulavam nas comunidades. A emoção provocada por tais boatos é sobretudo o MEDO, o temor, a inquietação – os mesmos sentimentos que estimulam a propagação de fake news nos dias de hoje.

Paulo vai responder a esse problema alertando para que os cristãos não se deixassem perturbar ou alarmar “tão depressa”. Que não se deixassem enganar de forma nenhuma. E antes de terminar sua carta ele pede: “Que o Senhor da paz vos dê a paz sempre e em tudo” (2 Ts 3,16).

**Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia.

***Foto de capa: Peter H/Pixabay

Conteúdo busca enganar católicos sobre evento na Catedral de Brasília para criticar governo federal

Bereia recebeu de leitor um vídeo com alto nível de circulação em grupos católicos no WhatsApp, que alardeia que o altar da Catedral Católica de Brasília “virou terreiro de Umbanda”, em evento promovido “pela ‘1ª´(sic) dama Janja”. O texto afirma ser uma grave profanação de um templo católico e atribui o caso à “situação geral do país” que “piora a cada dia”. A publicação ainda pede que quem recebe o conteúdo envie “para amigos católicos que fizeram o L ou foram isentões”.

Tela de celular com publicação numa rede social
Descrição gerada automaticamente com confiança média

O radar do Bereia identificou nesse conteúdo elementos comuns a falsidades que circulam pelas mídias sociais: 1) não tem identificação do autor ou autora da postagem nem data; 2) não tem fonte (de onde veio o vídeo); 3) é um recorte de 23 segundos de um vídeo sem  o contexto do ocorrido; 4) há o pedido de compartilhamento para mais pessoas (estratégia para que a desinformação viralize de forma espontânea e orgânica).

Bereia verificou que o mesmo recorte de vídeo foi divulgado na conta do X/Twitter do ex-presidente da Fundação Palmares (nomeado durante o governo de Jair Bolsonaro) Sérgio Camargo, e teve centenas de milhares de visualizações, com milhares de curtidas e compartilhamentos. Na publicação Camargo atribui a cerimônia na Catedral a o “governo petista” e cobra que católicos exijam “posicionamento da CNBB, caso a entidade seja contrária ao que se viu”.

Imagem: X/Twitter

Outros perfis de mídias sociais divulgaram protestos com o uso do mesmo recorte de vídeo, alguns com centenas de milhares de visualizações.


Interface gráfica do usuário, Site
Descrição gerada automaticamente

Imagem: x/Twitter

Imagem: Youtube

A noite na Catedral 

Bereia checou que o evento, acolhido na Catedral Católica de Brasília, foi realizado em 9 de novembro de 2023, como parte da programação do III Congresso Internacional de Direito do Seguro e IX Fórum de Direito do Seguro José Sollero Filho, realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS). O congresso foi sediado no Superior Tribunal de Justiça, sob a coordenação do ministro Paulo Dias Moura Ribeiro.

A noite cultural do evento do IBDS/STJ, na Catedral Católica de Brasília, foi a apresentação da Orquestra Mundana Refugi. O grupo é formado por 22 músicos brasileiros e imigrantes refugiados vindos do Irã, Guiné, Congo, Turquia, Cuba, China, Síria, Venezuela, França e Palestina. A orquestra apresenta repertório com composições próprias, músicas tradicionais e homenagens a compositores brasileiros, lançando mão de instrumentos entre os tradicionais piano, saxofone, flauta e bateria até os mais diferentes como bouzouki, kanun árabe, alaúde e rebab. 

Tela de celular com publicação numa rede social
Descrição gerada automaticamente com confiança média

Imagem: cartaz eletrônico de divulgação da apresentação da Orquestra Mundana Refugi na Catedral de Brasília.

O evento, com entrada franca, lotou a Catedral e foi noticiado pela revista eletrônica Metrópoles, pelo Correio Brasiliense, pelo Jornal de Brasília, pelo Portal Terra e pela Agência Brasil. Segundo a matéria do Metrópoles “os brasilienses ficaram encantados com o talento do grupo e conheceram um pouco dos ritmos e estilos de diferentes países. Duas obras do fotógrafo Sebastião Salgado foram expostas ao lado do palco e chamaram atenção por representar a luta pela proteção dos povos originários”.

O programa teve participação do cantor Renato Braz e do acordeonista Toninho Ferragutti, indicado três vezes ao Grammy Latino. Entre os presentes estiveram autoridades como o ministro do STJ Moura Ribeiro e o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar Paulo Teixeira. 

Com dois integrantes da orquestra originários da Palestina, o show em Brasília foi oportunidade de expressão de um pedido pela paz no Oriente Médio, para que cessem os ataques e que sejam devolvidos os reféns judeus, o que constou dos discursos proferidos. 

Bereia verificou, portanto, que a programação na Catedral não tem qualquer relação com o governo federal ou com a esposa do presidente da República Rosângela da Silva (Janja).

Altar profanado?

Na programação, de fato, ocorreu um momento, ao final, com uma dança relacionada à cultura africana. Porém, tanto a Arquidiocese quanto o maestro da Orquestra Mundana Refugi Carlos Antunes, explicaram, respectivamente, em nota oficial e carta, que ela ocorreu de forma imprevista, fora da programação, espontaneamente, da parte de duas pessoas africanas que estavam na audiência, como forma de agradecimento. 

A Arquidiocese também corrigiu as postagens críticas à Igreja e nega que haja “elementos concretos que caracterizem, moralmente e canonicamente, profanação do templo”.

Diz a nota da Arquidiocese de Brasília:

1- Nosso objetivo, ao aceitar o evento na Catedral, foi sensibilizar a comunidade de Brasília a respeito dos refugiados e migrantes, uma vez que a orquestra Mundana Refugi é um grupo musical composto por músicos brasileiros e por imigrantes e refugiados. Seu nome faz referência ao fato de acolher instrumentistas e vocalistas de todas as partes do mundo (“mundana”), refugiados no Brasil (“refugi”);

2- O acordo do evento em questão, previa somente a apresentação de coro e orquestra, algo comumente presente em nossas igrejas, com temas tradicionais de diversos países. No entanto, mesmo no fato ocorrido inesperadamente, não há elementos concretos que caracterizem, moralmente e canonicamente, profanação do templo;

3- Ao final da apresentação, ocorreu uma manifestação espontânea por parte de uma pessoa presente na plateia, surpreendendo não só a nós, mas, também, aos organizadores e ao maestro responsáveis pelo evento, gerando o episódio divulgado (cf. nota em anexo);

4- Reafirmamos que, em todo momento, a Catedral de Brasília conduziu com a devida prudência o que foi previamente acordado.

A carta do maestro Carlos Antunes, entre outros pontos, detalha o ocorrido:

Não havíamos programado realizar qualquer ato de dança como parte da apresentação musical, pois todos sabíamos que essa regra fora estabelecida como condição fundamental pela Catedral. Assim, com relação à dança espontânea que ocorreu ao final da última música, por parte de dois expectadores (sic) africanos, somente podemos imaginar, e isso foi dito por ambos ao se despedirem, que o fizeram em agradecimento ao espetáculo pois para eles ouvir música de seu país naquele templo espetacular foi muito emocionante, alegre e inesquecível. 

Suas manifestações foram feitas sem o nosso conhecimento. Isso faz parte da sua cultura e não demonstra, de forma alguma, desrespeito para com a religião católica. Tenho inúmeros amigos dançarinos africanos da religião católica e eles mencionaram-me suas boas emoções com o ocorrido. Acho importante reiterar que não havíamos combinado a dança, embora ela ocorra ocasionalmente nas nossas apresentações, como outras intervenções espontâneas do público.

(…)

Quando fomos surpreendidos pela dança dos expectadores (sic), ao final da música, fiz um sinal para a Mariama, nossa integrante, cantora africana, para que fosse lá, educadamente, e ocupasse o lugar deles, para que não continuassem ocupando o espaço e voltasse para cantar.

Ela de forma respeitosa fez exatamente isso. Chegou, fez alguns movimentos e ele se retirou. Ela em seguida voltou para cantar e terminamos a canção. Foi exatamente isso que ocorreu. O primeiro senhor que entrou para dançar, de forma muito cordial, me abordou e disse, ao final, que estava muito feliz por estarmos ali naquele momento”.

***
Bereia classifica a publicação que circula em grupos católicos de WhatsApp e em mídias sociais sobre o evento cultural, ocorrido na Catedral de Brasília, em 9 de novembro como ENGANOSO. Anonimamente, como, propagadores de desinformação agem frequentemente, e sem dados que permitam às pessoas verificarem o ocorrido de forma honesta, foi utilizado um vídeo do final da apresentação da Orquestra Mundana Refugi, para criticar a Arquidiocese de Brasília, a esposa do presidente da República Rosângela da Silva (Janja) e o governo federal. 

Como checado pelo Bereia: 

1) a apresentação musical não tem qualquer relação com o governo federal ou com a esposa do presidente da República. Foi parte da programação de um evento realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS), sediado no Supremo Tribunal de Justiça; 

2) o recorte do vídeo, divulgado sem explicação do que trata, refere-se ao final da apresentação musical da Orquestra Mundana Refugi, momento em que pessoas da plateia, de origem africana, espontaneamente se digiram à frente para dançar em agradecimento ao que presenciaram; 

3) a palavra oficial da Igreja Católica em Brasília é que, ancorada na moral e nos Cânones da Igreja, não houve profanação do templo com a manifestação espontânea das duas pessoas africanas.

Bereia alerta para o uso da fé cristã e do cuidado que fiéis têm com suas igrejas para se fazer política e atacar instituições religiosas, outras instituições e governos. Alerta também para a intolerância religiosa estimulada com a propagação do vídeo, sem a devida explicação do que foi uma dança da cultura africana, porém com as observações maldosas, por escrito e em vídeos, de que o altar da Catedral foi “transformado em terreiro de Umbanda” e “profanado”. Há outro aspecto em curso com a publicação, que é o racismo, uma vez que a dança foi realizada por pessoas negras, africanas, e as acusações que foram proferidas têm relação com este perfil.

Referências

Supremo Tribunal de Justiça https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Institucional/Educacao-e-cultura/Eventos/III-Congresso-Internacional-de-Direito-do-Seguro.aspx Acesso em 20 nov 2023

Youtube https://www.youtube.com/watch?v=IwZDDe1hlFA&pp=ygURZGlyZWl0byBkbyBzZWd1cm8%3D Acesso em 20 nov 2023 

IBDS https://www.ibds.com.br/18719-2/ Acesso em 20 nov 2023

Instagram https://www.instagram.com/omrefugi/ Acesso em 20 novv 2023

Metrópoles https://www.metropoles.com/colunas/claudia-meireles/orquestra-mundana-refugi-se-apresenta-em-show-emocionante-na-catedral Acesso em 20 nov 2023

Correio Brasiliense  https://www.correiobraziliense.com.br/diversao-e-arte/2023/11/6653001-catedral-recebe-orquestra-mundana-refugi-nesta-quinta-9-11.html Acesso 20 nov 2023

Jornal de Brasília https://jornaldebrasilia.com.br/entretenimento/eventos/orquestra-mundana-refugi-se-apresenta-na-catedral/ Acesso em 20 nov 2023

Portal Terra https://www.terra.com.br/esportes/orquestra-que-reune-brasileiros-e-refugiados-se-apresenta-em-brasilia,0ffcbbaf88502674cbab95f8f6195cbdll9vnvw7.html Acesso em 20 nov 2023

Agência Brasil https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-11/orquestra-que-reune-brasileiros-e-refugiados-se-apresenta-em-brasilia Acesso em 20 nov 2023 

Arquidiocese de Brasília https://arqbrasilia.com.br/nota-de-esclarecimento-2/ Acesso em 20 nov 2023Carta do Maestro Carlos Antunes https://arqbrasilia.com.br/wp-content/uploads/2023/11/Nota-de-Esclarecimento-Apresentac%CC%A7a%CC%83o-Mundana-Refugi.pdf  Acesso em 20 nov 2023

Foto de Capa: reprodução do Youtube

Parlamentares de extrema-direita articulam desinformação sobre banheiros unissex em oposição ao governo federal

*Atualizado 10:27 para correção de redação.

Nos últimos dias de setembro, as redes digitais foram tomadas por discursos que atribuem ao presidente da República e ao ministro dos Direitos Humanos a decretação de uma medida que supostamente implementaria, obrigatoriamente, banheiros unissex nas escolas do país.

Entre os maiores disseminadores dos conteúdos estão parlamentares com identidade religiosa evangélica, como os deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG) e Filipe Barros (PL-PR), e o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR). Bereia checou informações sobre o caso.

O discurso sobre banheiro unissex

O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) publicou, em 22 de setembro, um vídeo em seu perfil do Instagram em que afirma que o ministro de Direitos Humanos Silvio Almeida “instituiu o banheiro unissex para todas as escolas do Brasil”. 

Ferreira faz a leitura de uma cláusula em texto apontado por ele como oficial. Ao final do vídeo, inclui trechos de entrevistas e falas do presidente Lula da Silva sobre banheiros unissex e embates entre pessoas LGBTs e outras contrárias ao uso dos banheiros conforme identificação de gênero. 

Imagem: reprodução Instagram

No mesmo dia, o deputado federal Filipe Barros (PL-PR) também publicou um vídeo na mesma rede digital, onde afirma em tom alarmante: “Lula acaba de instituir o banheiro unissex no Brasil, é isso mesmo que você ouviu!”. Barros segue dizendo que o Ministro dos Direitos Humanos de Lula “editou e publicou a resolução” que institui a medida, “inclusive para menores de idade”.

Da mesma forma que Ferreira, o deputado paranaense utiliza cortes de vídeos com declarações do atual presidente sobre o tema, durante a campanha eleitoral de 2022. Um dos trechos que viralizou nas mídias sociais mostra Lula da Silva, falando em tom de indignação sobre as falsas informações acerca da criação de banheiros unissex em seu governo, ainda no período eleitoral. A fala transcorreu durante encontro de Lula com evangélicos em São Paulo, conforme mostrou o portal UOL, no YouTube.

No entanto, um recorte do trecho do vídeo, com apenas uma frase, que diz “só pode ter saído da cabeça de satanás a história de banheiro unissex”, tem sido usada por líderes religiosos para construir a falsa noção de que Lula tenha atribuído à figura do mal, a ideia de criar banheiros unissex e agora estaria, ele próprio, tomando esta iniciativa.

Imagem: reprodução Instagram

Barros também incita preocupação ao citar um trecho do texto que diz condenar. Segundo ele, o documento obrigaria pais contrários à decisão de um filho, de utilizar o banheiro de acordo com o gênero que se identifica, a se justificarem à escola. O deputado encerra o vídeo afirmando ter protocolado um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para revogar a resolução. 

Imagem: reprodução Instagram

Já o senador Sérgio Moro (União Brasil – PR), utilizou a mídia digital X para acusar o presidente de impor “banheiros unissex para todas as escolas públicas do país”. Conforme publicação em seu perfil na rede digital, com mais de 330 mil visualizações, Moro afirma que Lula teria tomado uma espécie de decisão arbitrária. 

Imagem: reprodução X

O jornal Gazeta do Povo publicou, ainda em 22 de setembro, matéria com o título ‘Governo orienta escolas a permitir uso de banheiro de acordo com identidade de gênero’ bastante compartilhada. O jornal afirma que o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania publicou documento com orientação a todas as escolas do país para permitirem o uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero e complementa, “abrindo brecha para que uma pessoa que se considere mulher, mesmo tendo nascido homem, use o banheiro feminino”. 

Imagem: reprodução Gazeta do Povo

Documentos utilizados pelos parlamentares como base do discurso


Os documentos que os parlamentares utilizam para desinformar são, na verdade, resoluções do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ (CNLGBTQIA+), publicadas em 22 de setembro. O órgão, que havia sido extinto no.governo.anterior e foi restabelecido este.ano, sob o novo governo, é composto por 19 representantes do governo federal e 19 representantes da sociedade civil. O conselho existe com o intuito de fortalecer o diálogo com a sociedade e assegurar a participação social na formulação de políticas voltadas às pessoas LGBTQIA+.

Durante o governo de Jair Bolsonaro, foram adotadas medidas que enfraqueceram a participação social nos temas associados à causa LGBTQIA+. Uma delas foi um decreto, de 2019, que extinguiu conselhos de políticas públicas voltadas para a população LGBTQIA+. Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal (STF) limitou os efeitos do decreto. Em 2021, o governo Bolsonaro fez nova investida contra órgãos semelhantes, extinguindo o Departamento de Promoção dos Direitos de LGBT, como demonstra o panorama de políticas públicas para a população LGBTQIA+ produzido pelo Nexo Jornal. O restabelecimento do CNLGBTQIA+, em 2023, se deu na esteira da retomada de políticas específicas para a população.

Como informou a Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal, as resoluções nº 1 e nº 2, utilizadas para promover a desinformação, foram elaboradas sem a participação do ministro dos Direitos Humanos e do Presidente da República. As resoluções, que não têm caráter vinculante, ou seja, não são de cumprimento obrigatório, têm o caráter de recomendação, e foram assinadas pela presidente do Conselho Janaína Barbosa de Oliveira.

Além de os documentos não terem sido editados por Lula ou pelo ministro Silvio Almeida, não consta menção a “banheiro unissex”, como diversas publicações nas redes querem fazer crer. As resoluções abordam, essencialmente, a questão do uso de banheiros, vestiários e outros espaços segregados por gênero em escolas de acordo com a identidade de gênero dos estudantes.

Entre as orientações previstas na Resolução nº 2 estão, ainda, a implementação de ações que busquem minimizar os riscos de possíveis violências e discriminações. Para tanto, a resolução sugere que, para além dos banheiros masculinos e femininos já existentes nos espaços públicos, sejam instalados também “banheiros de uso individual, independente de gênero”. O termo “unissex” não é utilizado, apesar de ser prática comum a muitos espaços como ônibus para percursos longos, aviões, alguns estabelecimentos de serviços e universidades, como demonstrou, em 2018, matéria da Folha de São Paulo.

Apesar dos discursos que buscam mobilizar pânico moral na sociedade, tem crescido, nos últimos anos, o entendimento acerca da utilização de banheiros de acordo com a identidade de gênero. Em 2015, o então Procurador-Geral da República (PGR) Rodrigo Janot defendeu o uso de banheiros em respeito à identidade de gênero, sob a alegação que “impedir que alguém que se sente mulher e se identifica como tal de usar o banheiro feminino é, sem dúvida, uma violência.” No mesmo ano, o ministro do STF Luís Roberto Barroso deu voto favorável ao uso de banheiros de acordo com a identidade de gênero

Novos incidentes têm gerado decisões judiciais favoráveis à utilização de banheiros de acordo com a percepção individual de gênero. Um deles é o caso do recente entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que declarou inconstitucional uma lei que proibia a instalação de banheiros unissex no município de São Bernardo do Campo.

Informações divulgadas pela imprensa esclarecem sobre as resoluções

Após as publicações enganosas que acusam o governo federal de ter implementado banheiros unissex nas escolas terem viralizado nas redes digitais, diversas agências especializadas realizaram checagem sobre o caso. Aos Fatos, Lupa e Reuters caracterizaram o conteúdo como “falso”. Além disso, o Projeto Comprova produziu conteúdo informativo sobre o tema, explicando o caráter das resoluções e aspectos relacionados.

Como destacou o Estadão, a viralização de publicações desinformativas relacionadas a banheiros unissex “ocorreu na mesma semana em que foram reveladas uma das informações mais fortes sobre a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência da República”. Porém, outros indícios apontam para o uso do tema como estratégia política.

Desde 2020, Bereia vem publicando uma série de checagens e artigos que indicam a mobilização de pânico moral na política brasileira. Em janeiro daquele ano, durante sua própria gestão à frente do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a então ministra Damares Alves afirmou que havia risco de a pedofilia ser legalizada no Brasil. A alegação era falsa.

Em novembro de 2020, outra checagem apontou como enganosa informação segundo a qual uma ação, supostamente proposta pelo PSOL, obrigaria o ensino de “ideologia de gênero” nas escolas. A chamada “ideologia de gênero” é um dos temas que mais mobilizou desinformação em espaços religiosos nas eleições de 2022. 

O discurso envolvendo “banheiro unissex” também não é uma novidade. A ferramenta Google Trends, que reúne dados relativos ao uso da internet, aponta um pico de pesquisas sobre o termo durante a campanha eleitoral de 2022. Bereia já mostrou a mobilização do tema associado a contextos escolares.

O próprio deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), em março deste ano, durante discurso na Câmara dos Deputados, fez alusão a banheiros unissex e promoveu outras mentiras. À época, o discurso foi considerado enganoso por Bereia e o parlamentar foi acusado de transfobia.

Reação do ministro dos Direitos Humanos e consequências aos parlamentares

O ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida enviou um ofício à Advocacia Geral da União (AGU), na sexta-feira, 22 de setembro, solicitando a responsabilização dos propagadores das falsidades. O texto requer a “tomada das providências cabíveis em âmbito administrativo, cível e criminal, inclusive com o pedido de retirada das postagens das redes sociais”.

No documento, o ministro aponta que os deputados propagaram fake news com o claro motivo de causar “pânico moral”. Em seu perfil no X, Silvio Almeida voltou a citar o discurso de ódio contra minorias.

Imagem: reprodução X

Em nota, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) esclareceu as competências da Resolução publicada e do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ (CNLGBTQIA+). Segundo o portal de notícias Poder360, a AGU informou, por meio de comunicado, o recebimento do ofício que tratava o caso como fake news e crimes contra o ministro e o presidente, e determinou à Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD) que seja feita análise do caso. 

A chefe da Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do MDHC secretária Symmy Larrat também se manifestou contra as fake news e esclareceu a função da resolução em vídeo que foi divulgado pelo perfil do MDHC no X. 

Imagem: reprodução X

Durante audiência pública realizada, na última terça-feira, 26, pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, com ministro Silvio Almeida, o deputado Filipe Barros (PL-PR) trouxe o assunto à tona. Barros se referiu ao ofício enviado à AGU sobre a sua conduta, e ao questionar o líder da pasta sobre as convicções do ministro acerca de identidade de gênero. 

Apesar do assunto não ser pauta da audiência, Silvio Almeida afirmou que se tratava de uma oportunidade para esclarecer a confusão em torno do assunto. Durante a fala, Almeida explicou a incoerência contida na ação do parlamentar ao protocolar um PDL para um documento que não tem caráter vinculante, e sim consultivo. O ministro ainda reforçou as justificativas que o levaram a tomar a medida junto a AGU. 

Em sua tréplica, o deputado adotou tom agressivo e fez o uso de ofensas ao acusar o ministro de ser abusador, covarde e insinuar que fosse analfabeto. Ao tentar responder, Silvio Almeida foi interrompido diversas vezes, até que o deputado André Janones (Avante-MG) reivindicasse o silêncio de Filipe Barros.  Em decorrência dos extremismos, sucederam-se xingamentos, empurrões, uma expulsão e a sessão teve que ser suspensa por alguns minutos. 

***

Bereia classifica os conteúdos checados como enganosos. As declarações em vídeo e texto publicadas por parlamentares nas redes digitais não têm substância factual, como uma lei instituída, decretos ou outros documentos de força legislativa, assinados pelo presidente Lula da Silva ou pelo ministro dos Direitos Humanos e Cidadania Silvio Almeida, que obriguem o estabelecimento de banheiros unissex. 

Portanto, tais afirmações se constituem como conteúdo enganoso. As informações reunidas e apresentadas pelas autoridades, pelas checagens, tanto do Bereia como de outras agências, contradizem com clareza o que foi apresentado pelos políticos de extrema-direita, ficando classificado, então, como desinformação. 

Conforme apresentado pela imprensa, o assunto ficou entre os mais comentados no X, por perfis de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, após o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) se tornar réu por transfobia e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro afirmar, em delação, que o ex-presidente se reuniu com as Forças Armadas para orquestrar uma intervenção militar e anular as eleições de 2022. 

Outro aspecto que corrobora a prática de deturpação de informações no âmbito deste tema é o uso do fragmento do vídeo de um discurso de Lula, durante campanha eleitoral. Na ocasião, o então candidato se posicionava com indignação contra falsas informações que associavam seu possível mandato à instituição obrigatória de banheiros unissex para a população LGBT. A manipulação intencional da frase do atual presidente constrói a imagem de um traidor que prometeu algo em campanha, mas depois de eleito mudou de ideia.

Ambas as estratégias, de sobrepor um assunto e destruir a imagem de um político de oposição, estão pautadas pelo objetivo de causar pânico moral e ganhar visibilidade com sensacionalismo. Bereia reafirma que oposição é importante em uma democracia, que precisa de uma oposição para o papel crítico e de pressão a governos eleitos. Porém, tal postura é relevante quando praticada com dignidade e não com mentiras e enganos. 

Referências da checagem

Gov.br

https://www.gov.br/secom/pt-br/assuntos/obrasilvoltou/respeito-e-dialogo/criacao-do-conselho-nacional-dos-direitos-das-pessoas-lgbtqia Acesso em: 26 set 2023

https://www.gov.br/secom/pt-br/fatos/brasil-contra-fake/noticias/2023/3/governo-federal-nao-determinou-instalacao-de-banheiros-unissex Acesso em: 26 set 2023

Diário Oficial da União

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-n-1-de-19-de-setembro-de-2023-511737512 Acesso em: 26 set 2023

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-n-2-de-19-de-setembro-de-2023-511744372 Acesso em: 26 set 2023

Aos Fatos

https://www.aosfatos.org/noticias/falso-banheiros-unissex-escolas/ Acesso em: 26 set 2023

Lupa

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2023/09/25/e-falso-que-lula-instituiu-banheiros-unissex-em-escolas Acesso em: 26 set 2023

Reuters

https://www.reuters.com/article/factcheck-banheiros-unissex-escolas/checagem-de-fatos-governo-lula-no-determinou-criao-de-banheiros-unissex-em-escolas-idUSL1N3B129I Acesso em: 26 set 2023

Estadão

https://www.estadao.com.br/politica/aliados-jair-bolsonaro-polemica-banheiro-unissex-nikolas-ferreira-reu-delacao-mauro-cid-nprp/ Acesso em: 26 set 2023

Com Ciência

https://www.comciencia.br/panico-moral-de-stanley-cohen-e-as-fake-news/ Acesso em: 26 set 2023

Poder 360 https://static.poder360.com.br/2023/09/Oficio-MDHC-AGU-nikolas-ferreira-banheiro-unissex.pdf Acesso em 27 set 2023

https://www.poder360.com.br/justica/governo-aciona-agu-e-acusa-deputados-de-fake-news-por-banheiro-unissex/ Acesso em 27 set 2023

YouTube https://www.youtube.com/watch?v=b30F7gJ8L5Y&t=2659s Acesso em 27 set 2023

Decreto nº 9.759/2019

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/d9759.htm Acesso em: 29 set 2023

Agência Brasil

https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-06/stf-limita-decreto-do-governo-que-extingue-conselhos-federais Acesso em: 29 set 2023

https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-11/stf-relator-vota-favor-de-transexual-usar-banheiro-feminino Acesso: 29 set 2023

Nexo Jornal

https://pp.nexojornal.com.br/linha-do-tempo/2022/Pol%C3%ADticas-para-LGBTI-no-governo-federal-ascens%C3%A3o-e-queda Acesso em: 29 set 2023

JusBrasil

https://www.jusbrasil.com.br/noticias/pgr-transgenero-nao-pode-ser-proibido-de-usar-banheiro-do-genero-com-o-qual-se-identifica/245528133 Acesso em: 29 set 2023

Folha de São Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/07/banheiros-unissex-ganham-espaco-em-universidades-do-pais.shtml Acesso em: 29 set 2023

IBDFAM

https://ibdfam.org.br/noticias/10787/TJSP+derruba+lei+que+proibia+banheiro+unissex+em+munic%C3%ADpio Acesso em: 29 set 2023

Desinformação de gênero: violência política em perspectiva

De acordo com a pesquisa publicada no site no Departamento de Estado dos Estados Unidos da América, a desinformação de gênero vem ganhando cada vez mais espaço nas mídias, sendo um ataque direto à democracia de uma nação.

Ao definir a desinformação de gênero, o estudo refere-se à junção de abuso misógino e violência contra mulheres, que se utiliza de falas falsas ou enganosas, e narrativas com base em sexo onde muitas vezes são usadas estrategicamente pretendendo impedir mulheres de participar da esfera pública.

Essa lógica perversa também tem sido perpetrada por atores estatais estrangeiros e não estatais, usando coordenadamente a desinformação de gênero com o objetivo de silenciar as mulheres, desestimular o discurso político on-line e moldar as percepções em relação ao gênero e ao papel da mulher nas democracias.

A pesquisa Malign Creativity How gender, sex, and lies are weaponized Against Women online [Criatividade Maligna. Como gênero, sexo e mentiras se tornam armas on line contra mulheres] elencou algumas conclusões relevantes sobre o tema. São elas:

  • Dentre os perpetradores de desinformação de gênero voltada contra mulheres estão atores estatais estrangeiros; 
  • A desinformação muitas vezes tem como alvo mulheres com identidades interseccionadas; 
  • Os perpetradores costumam disseminar desinformação de gênero por meio de atividades coordenadas de redes sociais que são espontâneas ou pré-mediadas em várias plataformas; 
  • Atores estatais estrangeiros mobilizam a desinformação de gênero a fim de atingir uma variedade de indivíduos, grupos e legislação; 
  • O objetivo final da desinformação de gênero é baseada no ataque à identidade, desencorajando o exercício da liberdade de expressão e minando a democracia.

Violência Política no Brasil

Neste mês de julho, a agência Lupa publicou uma reportagem na qual reflete a temperatura na qual as parlamentares brasileiras estão inseridas.

A bola da vez foi a senadora evangélica Eliziane Gama (PSD-MA) , que atualmente exerce a função de relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito de 8 de janeiro. Na reportagem, relata-se que a senadora é frequentemente chamada de ‘burra’ e ‘analfabeta’, como forma de descredibilizar sua competência e logo, o lugar que ocupa.

Essa prática, que aqui chamamos de Desinformação de Gênero, não é nova e podemos identificá-la ao longo da História, mas a roupagem que tem usado é recente e vem ganhando força com o alcance cada vez maior das mídias por todo o mundo.

Em matéria publicada pelo Coletivo Bereia, foram mostradas as ofensivas em ambientes digitais religiosos contra a ex-presidente Dilma, como tentativa para justificar o golpe sofrido.

Além desse episódio, o Coletivo Bereia também identificou o ataque do deputado federal evangélico Nikolas Ferreira (PL-MG), que profere um discurso misógino, em que diz para que as mulheres “retomem sua feminilidade, tenham filhos, amem a maternidade, formem a sua família porque, dessa forma, vocês colocarão luz no mundo e serão, com certeza, mulheres valorosas”. A fala foi proferida pelo deputado quando usava uma peruca loira. Nikolas Ferreira valeu-se do Dia Internacional da Mulher para, ditar às mulheres como proceder em suas vidas, a partir de suas crenças pessoais.

Em janeiro desse ano, a ministra do Meio Ambiente Marina Silva, também evangélica, foi hostilizada em um restaurante de Brasília, por pessoas que se opunham ao governo do presidente Lula. No local, a ministra foi defendida e aplaudida por clientes.

É de extrema importância que o tema da desinformação de gênero seja amplamente discutido e que haja meios de identificá-la. Além de contribuir para a corrosão da democracia, as fake news – popularmente chamadas – impedem o avanço dos direitos das mulheres e da sociedade em geral.

A desinformação já é vista como um problema crônico com o qual as sociedades têm lidado com dificuldade. A violência de gênero na política vislumbra a piora do cenário, onde a pouca representatividade no legislativo, a dissonância das bancadas sobre temas importantes, o tradicionalismo e fundamentalismo da maioria dos parlamentares, entre outros fatores, corroboram para que a desinformação se torne uma prática cada vez mais comum.

Referências:

Departamento de Estado dos Estados Unidos da América. https://www.state.gov/gendered-disinformation-tactics-themes-and-trends-by-foreign-malign-actors/desinformacao-de-genero-taticas-temas-e-tendencias-de-atores-estrangeiros-malignos/  Acesso em 20 JUL 2023

Coletivo Bereia.

https://coletivobereia.com.br/genero-politica-e-desinformacao-as-mulheres-sob-ataque/ Acesso em 20 JUL 2023

https://coletivobereia.com.br/deputado-federal-evangelico-nikolas-ferreira-promove-desinformacao-em-discurso-na-camara-dos-deputados/  Acesso em 20 JUL 2023

Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2023/01/5063318-marina-silva-e-atacada-em-restaurante-mas-e-defendida-por-clientes-veja.html  Acesso em 20 JUL 2023

**Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia.

***Foto de capa: Pixabay

Conteúdo falso sobre Fórum Econômico Mundial proibir a Bíblia repercute em meios religiosos

Matéria publicada pelo site Tribuna Nacional repercutiu nas mídias sociais digitais religiosas nos últimos dias. Intitulado “WEF ordena que o governo proíba a Bíblia e publique a versão ‘verificada’ sem Deus”, o texto afirma que o professor israelense Yuval Noah Harari declarou que “a Bíblia é uma notícia falsa e cheia de discurso de ódio, e as elites podem usar IA para substituir a Bíblia e criar uma ‘religião unificada que é realmente correto’.”

A matéria foi publicada na área do site destinada aos conteúdos relacionados  à Nova Ordem Mundial – suposta conspiração das elites globais para dominar o mundo. 

Yuval Noah Harari é historiador, filósofo e autor de best-sellers como “Sapiens: Uma breve história da humanidade” e “Homo Deus: Uma breve história do amanhã”. De acordo com as informações publicadas por Tribuna Nacional,  Harari “atuaria como braço direito” de Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial (WEF na sigla em inglês). 

Imagem: reprodução do site Tribuna Nacional

Além disso, Harari teria declarado que o poder da Inteligência Artificial ​​poderia ser aproveitado e usado para remodelar a espiritualidade na visão globalista do Fórum Econômico Mundial. Ela seria“uma nova religião mundial chegou e une toda a humanidade em adoração no altar da ciência climática, tecnocomunismo oculto e eugenia”.

A publicação afirma que o Fórum Econômico Mundial está se “tornando cada vez mais hostil ao cristianismo e às principais religiões e está claro que Klaus Schwab está tentando suplantar Jesus”. Diz ainda “a pandemia de Covid foi um ensaio geral para as elites transformarem o globo em uma prisão digital”.

Vídeo de Yuval Harari é descontextualizado 

Bereia checou as informações e o conteúdo da matéria publicada pela Tribuna Nacional é a transcrição de um vídeo publicado pelo canal THE PEOPLE ‘S VOICE. O vídeo apresenta alguns trechos de entrevistas do  professor Yuval Harari. Praticamente todo o conteúdo publicado pelo site Tribuna Nacional vem desta página. 

Imagem: reprodução do canal The People’s Voice, na plataforma Rumble

O primeiro fragmento com falas do professor foi retirado de uma entrevista na Fundação Francisco Manuel dos Santos, em Portugal. Nessa entrevista, Harari reflete sobre os avanços da humanidade, as suas grandes ameaças e a forma como a inteligência artificial tem de ser regulada para evitar que se torne um monstro  que destruirá a humanidade como a conhecemos.

Harari explica que ao longo dos anos as religiões sonharam com um  livro escrito por uma inteligência sobre humana ou não-humana e dentro de alguns anos poderão existir religiões com livros sagrados escritos por inteligências artificiais Ele alerta que mesmo uma nova Bíblia, por exemplo, poderia ser escrita por Inteligências Artificiais. 

Yuval Harari utilizou este exemplo para ilustrar o poder e os perigos desta nova tecnologia, que ainda estaria no estágio de “ameba”, mas em “desenvolvimento extremamente veloz”. O escritor não fez qualquer referência a mudanças na Bíblia ou mesmo críticas a qualquer passagem do livro sagrado. 

Nos trechos seguintes divulgados por Tribuna Nacional, diversos fragmentos de entrevistas são editados e retirados de seu contexto. O apresentador do vídeo, replicando um âncora de jornais televisivos convencionais, conduz a narrativa, desorienta e apresenta falsas informações “corroborando” as falas retiradas de contexto e editadas. 

 ***

Desta maneira, Bereia classifica os vídeos como enganosos, pois de fato existiram e foram manipulados, e a matéria publicada pelo site Tribuna Nacional como falsa. O professor Yuval Harari não disse que a Bíblia é uma notícia falsa e cheia de discurso de ódio, nem que as elites podem usar IA para substituir a Bíblia e criar uma “religião unificada que é realmente correto.”

As entrevistas e palestras do escritor foram editadas e retiradas do contexto para servirem como pano de fundo para teorias da conspiração envolvendo o Fórum Econômico Mundial. A perseguição religiosa mais uma vez é utilizada como ferramenta para criar pânico e espalhar notícias falsas, como Bereia já tem reportado em diversas checagens.

Referências de checagem:

Yuval Harari. https://www.ynharari.com/pt-br/ Acesso em 26 JUN 2023

Fórum Econômico Mundial.

https://www.weforum.org/about/klaus-schwab Acesso em 26 JUN 2023

https://www.weforum.org/about/world-economic-forum Acesso em 26 JUN 2023

YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=oQMxYU6EYZQ Acesso em 26 JUN 2023 

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/?s=cristofobia Acesso em 27 JUN 2023 

Perfis religiosos repercutem conteúdo falso sobre morte de Lula

*Matéria atualizada no dia 13/12/2022 para correção de informações. Na primeira versão do texto, que repercute matéria de Aos Fatos, constava que os conteúdos relativos a contatos com alienígenas havia sido também compartilhados por perfis religiosos, o que não ocorreu.

Circula em mídias sociais religiosas conteúdo falso alegando a morte do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os conteúdos produzidos vão da morte do futuro presidente, até trocas de corpos, e pedidos de intervenção alienígena.

A desinformação a respeito da morte de Lula tem ganhado popularidade após a vitória do líder do Partido dos Trabalhadores (PT). Em pouco mais de 30 dias a falsa morte de Lula tornou-se um dos principais assuntos pesquisados na ferramenta de busca Google, atingindo o top cinco nacional. Com esta “notícia”  vieram também dúvidas sobre seu estado de saúde e teorias da conspiração envolvendo um sósia dele. 

Imagem: Google Trends

De acordo com pesquisa realizada pela a Agência Aos Fatos, a produção de conteúdo falso sobre a morte de Lula começou a ganhar força após o presidente eleito ter tirado cinco dias de férias em Porto Seguro (BA). Na ocasião, perfis de influenciadores digitais bolsonaristas alegaram que Lula teria sofrido um infarto durante o voo e morrido no avião, ou, ainda, que ele havia sofrido um AVC e morrido poucos dias antes de sua viagem. Surgiram ainda outras informações sobre a sua morte baseando-se em um agravamento do quadro clínico do presidente eleito, uma vez que o mesmo se encontraria com um caso avançado de câncer na laringe. 

As falsidades sobre a morte de Lula dividiram opiniões entre influenciadores evangélicos. De um lado ficaram os produtores de conteúdo que defendiam que, de fato, o presidente havia morrido – como é o caso dos que compartilharam publicações do advogado Marcelo Suave. Em live, Suave afirmou que lula havia morrido graças a complicações do câncer na laringe. 

Já outros influenciadores e canais conservadores que afirmaram que essa era uma estratégia de marketing envolvendo Lula, o PT e comunistas, para confundir a população e desorganizar o movimento bolsonarista denominado “patriótico”. Vídeos do canal Mundo Polarizado News e  do jornal Gazeta do Povo reforçam esta noção.

Após aparições do presidente eleito em matérias jornalísticas, entrevistas, e eventos públicos (dentre eles COP27 – Conferência do Clima das Nações Unidas -, no Egito), passou-se a divulgar que um sósia havia assumido o lugar de Lula e imagens foram manipuladas para encobrir algumas falhas na prótese usada pelo sósia. 

Entre influenciadores que ganharam mais seguidores com o tema, está o pastor da Igreja Porto de Cristo (em São João Batista/SC) Sandro Rocha, que incluiu o caso em suas lives no YouTube, com trechos em vídeos curtos nas redes do TikTok, Kwai e Helo. Em 15 de novembro, o pastor apoiador da campanha de Jair Bolsonaro à  reeleição, exibiu fotos antigas de Lula  para comparar e insinuar que não se trata da mesma pessoa. “Você pensa o que você quiser, eu só vou te mostrar as fotos”, diz ele na live que, segundo Aos Fatos, chegou a 344 mil visualizações no YouTube e mais de dois milhões em trecho no TikTok. .⁸

Imagem: reprodução do YouTube

Ao publicarem capturas de tela, vídeos de análise de imagens e especialistas em edição e manipulação de fotografia, os influenciadores passaram a,  não apenas a produzir conteúdo sobre a falsa morte de Lula, como também alegar que seu corpo estaria escondido e ele foi substituído por um sósia que usava uma máscara de silicone com o rosto do presidente morto. Uma das “provas” era que a pessoa que aparecia nas imagens possuía dez dedos (já  que é de conhecimento notório que Lula tem nove dedos, uma vez que ele perdeu um  em um acidente de trabalho décadas atrás).

Bereia lembra que a produção de conteúdo falso sobre Lula e apoiadores é campo fértil e em constante transformação, não se restringindo apenas ao período de disputa eleitoral.  A desinformação produzida por perfis alinhados a uma campanha bolsonarista têm sido verificadas pelo Bereia, e suas abordagens se estendem desde embates religiosos e suposta ameaça comunista, até acusações de satanismo, entre outras variações alinhadas a disputas que envolvem grupos extremistas da direita política. Os que mais fazem uso destes recursos para convencer e captar apoiadores. 

Bereia lembra também que suas mídias sociais encontram-se disponíveis para sugestão de checagens de conteúdos que gerem suspeita ou desinformação.

Referências de checagem:

Aos Fatos. https://www.aosfatos.org/noticias/bolsonarismo-teoria-conspiratoria-lula-morto/ Acesso em 09 de dez 2022

Uol. https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2022/11/29/teoria-conspiratoria-diz-que-lula-morreu-e-foi-substituido.htm Acesso em 09 de dez 2022

Folha de S. Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/11/exame-de-lula-aponta-manchas-na-laringe-que-requerem-acompanhamento-medico.shtml Acesso em 09 de dez 2022

Estado de Minas.

https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2022/11/28/interna_politica,1426823/bolsonaristas-espalham-fake-news-que-lula-morreu-e-foi-trocado-por-um-sosia.shtml Acesso em 09 de dez 2022

Youtube.

https://www.youtube.com/watch?v=JWTcFlbVLas Acesso em 09 de dez 2022

https://youtube.com/shorts/FvbapSd-lOY?feature=share Acesso em 09 de dez 2022

Revista Forum. https://revistaforum.com.br/politica/2022/11/8/cad-lula-presidente-eleito-tem-agenda-intensa-em-meio-fake-news-bolsonarista-de-que-morreu-127133.html Acesso em 09 de dez 2022

Poder 360. https://www.poder360.com.br/brasil/humorista-brinca-sobre-troca-de-corpo-entre-lula-e-bolsonaro/ Acesso em 09 de dez 2022

Google Trends. https://trends.google.com.br/trends/explore/RELATED_TOPICS/1670527800?hl=pt-BR&tz=180&date=today+1-m&geo=BR&q=lula&sni=3 Acesso em 09 de dez 20222

Jornal do Commercio. https://jc.ne10.uol.com.br/colunas/saude-e-bem-estar/2022/11/15124972-lula-esta-de-alta-apos-passar-por-cirurgia-para-retirar-lesao-na-laringe.html Acesso em 09 de dez 2022

Bereia.

https://coletivobereia.com.br/site-gospel-usa-video-de-participante-de-reuniao-do-pt-para-alimentar-desinformacao-sobre-perseguicao-a-igrejas-pelo-novo-governo/ Acesso em 09 de dez 2022

https://coletivobereia.com.br/?s=lula Acesso em 09 de dez 2022

https://coletivobereia.com.br/video-manipulado-que-liga-o-ex-presidente-lula-ao-satanismo-viraliza-entre-evangelicos/ Acesso em 09 de dez 2022

https://coletivobereia.com.br/comunismo-e-ameaca-comunista-vs-patriotismo-e-argumento-que-embasa-temas-com-mais-desinformacao-em-espacos-religiosos-nas-eleicoes/Acesso em 09 de dez 2022

Ex-deputado e ex-presidente do PTB Roberto Jefferson é evangélico

Por conta do caso que levou o ex-deputado federal e ex-presidente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Roberto Jefferson à prisão por tentativa de homicídio, Bereia checou postagens que passaram a circular nas mídias sociais, em crítica ao político, que afirmam ser ele evangélico.

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O caso

Jefferson, de 69 anos, estava em prisão domiciliar, desde janeiro passado, como consequência do inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre ações criminosas contra o Estado Democrático de Direito. Desde então, descumpriu várias medidas, como a realização de contatos com dirigentes do PTB, recebimento de visitas, concessão de entrevista e postagens em mídias sociais com discursos de ódio, inclusive, e divulgação de mentiras contra o STF e seus ministros, tendo ofendido a ministra do órgão, Carmen Lúcia, em 21 de outubro. 

Tais posturas levaram à revogação da prisão domiciliar e à determinação da condução do ex-deputado ao regime fechado. No domingo 23 de outubro, a Polícia Federal foi à casa dele cumprir a ordem de prisão, mas foi atacada por Roberto Jefferson com granadas de efeito moral e tiros de fuzil. Além de não ter o direito de portar armas, na condição de preso, o acesso a granadas não é permitida a civis. No ataque dois agentes foram feridos. 

Depois de um controverso processo de negociação de rendição, o ex-deputado foi preso, agora sob acusação de tentativa de homicídio.

O ex-deputado federal e ex-presidente do PTB se destacou na política nacional por ter por tido envolvimento no esquema de corrupção chamado de “Mensalão”. Em 2012, ele foi cassado e condenado pelo STF a sete anos de prisão, mas teve a pena reduzida por ter sido um delator nas investigações. Além de ser investigado pelo STF, desde 2021 Jefferson também é objeto de uma denúncia da Procuradoria-Geral da República por crimes de homofobia, calúnia e incitação ao crime de dano contra o patrimônio.

Batismo na Assembleia de Deus

Em maio de 2021, vários sites evangélicos de notícias informaram que Roberto Jefferson, quando ainda presidente do PTB, foi batizado pelo pastor de uma congregação da Assembleia de Deus. 

Imagem: reprodução do Instagram

No ato, “prestigiado por correligionários do partido e autoridades religiosas evangélicas”, segundo o pastor Serra, Jefferson foi recebido como membro da igreja. O pastor ainda afirma em sua publicação que pode “observar atentamente o envolvimento espiritual do mandatário do partido que é coluna política do presidente Jair Bolsonaro”. Serra acrescenta que a “Nova República Federativa do Brasil vai contar com o que há de melhor na defesa da vida, pátria, das liberdades e da família tradicional brasileira”.

Imagem: reprodução do Instagram

Em pesquisa nas mídias sociais de Roberto Jefferson, Bereia identificou que, antes de ser recebido como membro da Assembleia de Deus do Campo de São Cristóvão, os primeiros registros públicos de expressão religiosa do ex-deputado remontam a julho de 2020, com a postagem a seguir:

Imagem: reprodução do Instagram

As publicações de tom religioso se intensificam nos primeiros meses de  2021, com publicação de versículos bíblicos, de participação em igrejas diferentes e de interação com lideranças religiosas diferentes:

Imagens: reprodução do Instagram

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Bereia classifica como verdadeiras as postagens que afirmam que o ex-deputado federal e ex-presidente do PTB Roberto Jefferson é evangélico. Ele se tornou membro da Assembleia de Deus do Campo de São Cristóvão no Rio de Janeiro, depois de ser batizado nas águas. O político de 69 anos está preso sob investigação de participar de uma rede que ameaça o Estado Democrático de Direito e, há alguns dias, também sob a acusação de tentativa de homicídio.

Referências de checagem:

Supremo Tribunal Federal. https://portal.stf.jus.br/listagem/listarNoticias.asp?termoPesquisa=roberto%20jefferson Acesso em: 27 out 2022

Uol. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2022/10/25/o-que-e-a-granada-de-efeito-moral-lancada-por-roberto-jefferson-contra-pfs.htm Acesso em: 27 out 2022

G1. https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/10/24/de-delator-do-mensalao-aos-tiros-contra-a-pf-conheca-a-trajetoria-de-roberto-jefferson.ghtml Acesso em: 27 out 2022

Gospel Mais. https://noticias.gospelmais.com.br/roberto-jefferson-batizado-aguas-assembleia-deus-146629.html Acesso em: 27 out 2022

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Foto de capa: reprodução do Instagram

Pânico moral sobre “ideologia de gênero”, aborto, erotização de crianças e defesa da família é usado para disputa eleitoral com base em desinformação

Na disputa político-eleitoral de 2022, o principal embate é travado no território da da linguagem. Uma das estratégias mais utilizadas neste conflito informacional é o pânico moral e o ataque à cognição (a forma de raciocínio e assimilação de conteúdo) dos eleitores via mídias sociais. Nas diversas declarações e notícias checadas pelo Bereia em processos eleitorais, temas como “ideologia de gênero”, aborto, erotização de crianças e defesa da “família tradicional” são temas recorrentes. 

O pânico moral pode ser compreendido “numa acepção mais abrangente, como o consenso, partilhado por um número substancial de membros de uma sociedade, de que determinada categoria de indivíduos estaria ameaçando a estrutura social e a ordem moral”. Esta ideia é explicada pelo professor associado de Direito Civil da UFMG César Fiúza e da doutora em Direito Privado pela PUC-MG, Luciana Poli.

Na guerra de discursos pela internet, este estado de pânico é desencadeado com terror verbal com falsas acusações a líderes políticos, partidos e formadores de opinião que não partilham das mesmas opiniões ou são uma ameaça à hegemonia dos grupos que estão atualmente no poder. 

A recente declaração em vídeo da ex-ministra de Estado e senadora eleita  Damares Alves sobre as criancinhas que teriam seus dentes arrancados por pedófilos, sob investigação do Ministério Público, segue uma cartilha já conhecida e bastante utilizada pela senadora eleita: falta de fontes ou provas; combinação e reconfiguração de temas anteriormente explorados; forte apelo à emoção e a fé; discurso exaltado; inimigo a ser combatido.

Segue uma seleção as checagens do Bereia sobre  declarações, publicações e mensagens que exploraram o pânico moral e  “viralizaram” nas mídias sociais religiosas:

Fake news sobre livro de educação sexual infantil nas escolas volta a circular – https://coletivobereia.com.br/fake-news-sobre-livro-de-educacao-sexual-infantil-nas-escolas-volta-a-circular/ 

Em vídeo que volta a circular, ministra propaga pânico sobre erotização em desenhos animados e universidades  – https://coletivobereia.com.br/em-video-que-volta-a-circular-ministra-propaga-panico-sobre-erotizacao-em-desenhos-animados-e-universidades/ 

Ministra Cármen Lucia é acusada em mídias digitais de assinar carta pró-aborto  – https://coletivobereia.com.br/ministra-carmen-lucia-teria-assinado-carta-pro-aborto/

Site religioso afirma que LEGO vai lançar brinquedos com “ideologia de gênero” – https://coletivobereia.com.br/site-religioso-afirma-que-lego-vai-lancar-brinquedos-com-ideologia-de-genero/ 

Site gospel repercute afirmação falsa de Bolsonaro contra STF e ministro Barroso – https://coletivobereia.com.br/site-gospel-repercute-afirmacao-falsa-de-bolsonaro-contra-stf-e-ministro-barroso/ 

Site evangélico diz que pediatra defende masturbação infantil – https://coletivobereia.com.br/site-evangelico-diz-que-pediatra-defende-masturbacao-infantil/ 

Deputado afirma que cartilha de escola em Palmas promove “ideologia de gênero” – https://coletivobereia.com.br/deputado-afirma-que-cartilha-de-escola-em-palmas-promove-ideologia-de-genero/ 

Unicef é contra pornografia para crianças: portais desinformam com interpretação distorcida de estudo do organismo – https://coletivobereia.com.br/unicef-e-contra-pornografia-para-criancas-portais-desinformam-com-interpretacao-distorcida-de-estudo-do-organismo/ 

Portais de notícias religiosas desinformam quanto a suposto projeto comunista para crianças.
https://coletivobereia.com.br/portais-de-noticias-religiosas-desinformam-quanto-a-suposto-projeto-comunista-para-criancas/

Mensagem anônima que circula em mídias sociais usa pânico moral contra partidos de esquerda
https://coletivobereia.com.br/mensagem-anonima-panicomoral/

As mentiras que circulam em ambientes religiosos no Brasil
https://coletivobereia.com.br/as-mentiras-que-circulam-em-ambientes-religiosos-no-brasil/

Referências de checagem:

CUNHA, Magali do Nascimento. Do púlpito às mídias sociais: Evangélicos na política e ativismo digital. Curitiba: Prismas, 2017.

Carta Capital. Artigo: Evangélicos foram alvo privilegiado de mentiras na campanha do 1º turno; veja as principais. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/blogs/dialogos-da-fe/evangelicos-foram-alvo-privilegiado-de-mentiras-na-campanha-do-1o-turno-veja-as-principais/ Acesso em 17 OUT 2022

Artigo. Direitos políticos, liberdade de expressão e discurso de ódio. Volume V – organização de Rodolfo Viana Pereira – Brasília: IBRADEP, 2022. Disponível em: https://abradep.org/wp-content/uploads/2022/06/Direitos-Politicos-Liberdade-de-Expressao-e-Discurso-de-Odio-volume-V.pdf#page=171 Acesso em 17 OUT 2022

Artigo. FIÚZA, Cesar e POLI, Luciana Costa. Famílias Plurais o Direito Fundamental à Família. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, n. 67, 2015, p. 151-180. Disponível em: https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/1730-3302-1-sm.pdf Acesso em 17 OUT 2022

G1. https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2022/10/17/termina-nesta-segunda-feira-prazo-para-ministerio-dar-explicacoes-a-procuradoria-do-mpf-apos-relatos-de-damares-sobre-supostas-torturas-contra-criancas-no-marajo.ghtml Acesso em 17 OUT 2022

Revista Questão de Ciência. 

https://revistaquestaodeciencia.com.br/index.php/apocalipse-now/2018/12/05/ameaca-nossos-filhos-cuidado-com-o-panico-moral Acesso em 17 OUT 2022

JN.

https://www.jn.pt/opiniao/david-pontes/panico-moral-6234400.html Acesso em 17 OUT 2022

Uol.

https://noticias.uol.com.br/colunas/carlos-madeiro/2022/08/29/panico-moral-como-ala-evangelica-pro-bolsonaro-cresce-e-domina-as-redes.htm Acesso em 17 OUT 2022

Poder 360.

https://www.poder360.com.br/poderdata/poderdatacast-29-bolsonaro-deve-acionar-panico-moral-em-eleicoes/ Acesso em 17 OUT 2022

Ponte.

https://ponte.org/artigo-bolsonaro-e-o-panico-moral/ Acesso em 17 OUT 2022

Revista Eletrônica Internacional de Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura.

https://brapci.inf.br/index.php/res/v/158606 Acesso em 17 OUT 2022

Fundação Maurício Grabois.https://grabois.org.br/2022/08/26/o-retorno-do-panico-moral-na-disputa-pelo-voto-evangelico/ Acesso em 17 OUT 2022

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Foto de capa: Pexels/Samer Daboul

Igreja Luterana em Joinville é usada em mentira sobre religião na campanha eleitoral pró-Jair Bolsonaro

* Com colaboração de André Mello. Matéria atualizada às 12:43 e às 15:40 para complementação de informações.

Passou a circular com intensidade nas mídias sociais, na noite deste 18 de outubro, postagens com imagens de suposta invasão de militantes de esquerda ao templo da Paróquia da Paz da Igreja Evangélica de Confissão Luterana (IECLB), em Joinville (SC).

Imagem: reprodução do Twitter
Imagem: reprodução do Twitter

Imagem: Uma das postagens em mídias sociais e os comentários em apoio

O portal evangélico Gospelmente publicou matéria sobre a suposta invasão, com as imagens acusatórias ao Partido dos Trabalhadores (PT) e à Central Única dos Trabalhadores (CUT), com base em postagens em mídias sociais, incluindo menção ao Instagram da igreja, sem apuração.

Imagem: reprodução do site Gospelmente

O site GP1, cuja aparência é semelhante à do portal G1, da Globo, também repercutiu:

Imagem: reprodução site GP1

A notória veiculadora de desinformação, revista Oeste, também publicou matéria, sob a vinheta “Eleições 2022”, com base nas postagens em mídias sociais, incluindo menção ao Instagram da igreja, sem apuração. 

Imagem: reprodução Revista Oeste

Ambas matérias dizem que os militantes invadiram a paróquia, interromperam o culto e tocaram o sino da igreja. Estas matérias estão sendo repercutidas nas mídias sociais com discursos de campanha eleitoral antipetistas, antiesquerda e pró-candidatura do presidente Jair Bolsonaro.

Bereia checou o episódio que gerou as imagens que foram base para tais publicações e ouviu lideranças da paróquia sobre o ocorrido. O presidente (leigo conforme a organização da IECLB)  Álvaro Kleper Filho explicou que a Igreja da Paz e o Instituto Educacional Luterano de Santa Catarina (Faculdades IELUSC) dividem o mesmo espaço, um pátio. Ele conta que houve um protesto de alunos do curso de Jornalismo contra a demissão de uma professora com o apoio de outros grupos da cidade. A manifestação ocorreu no horário das aulas, mesmo momento em que acontecia um culto na igreja. Os discursos por megafone, segundo o presidente da paróquia, de fato, atrapalharam o culto que ocorria e, depois, a saída das pessoas ao término, mas diz que não houve qualquer tipo de invasão à área interna da igreja. As imagens em que aparecem pessoas dentro de um espaço, de acordo com Álvaro Kleper Filho, não são da igreja mas das faculdades, do IELUSC.

O IELUSC, instituição de ensino superior com dez cursos de graduação, mais oito de especialização e um mestrado, é parte da Associação Educacional Luterana Bom Jesus IELUSC, em Joinville, à qual está integrado o Colégio Bonja.  O culto na Igreja da Paz, ao lado da instituição, estava sendo dirigido pela pastora Camila Faber Kerber. O outro pastor da paróquia Cleo Martin declarou:
Não entraram na Igreja. Apenas ficaram do lado de fora durante o culto com megafone, apitos, algazarra. A Pastora Camila conduziu o culto até o fim, mas de fato terminou com 15 minutos, pois as pessoas ficaram apreensivas.  Entraram sim, na Deutscheschulle [termo usado na tradição alemã luterana para “escola alemã~] e obstruiram a saída das pessoas que estavam no culto no portão principal. Os integrantes do coral não puderam entrar no estacionamento. Essa situação durou uns 20 minutos, até a chegada da  Polícia Militar, esta liberou o trânsito. A manifestação foi basicamente contra a demissão de uma docente do Colégio Bom Jesus que se posicionou contra a motociata do presidente em Joinville. A manifestação foi de alunos e de agremiações políticas.

A direção da instituição divulgou esclarecimento sobre o fato para a liderança da igreja:


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Mensagem por WhatsApp enviada pela direção do IELUSC à paróquia

Imagens enviadas ao Bereia pela liderança da Paróquia que mostram o momento da manifestação. A concentração de pessoas, na foto à esquerda, está no espaço do IELUSC. A foto à direita mostra a igreja, dividindo o mesmo pátio, sem concentração de pessoas à frente.

Extrato do vídeo enviado pela liderança da paróquia ao Bereia afirmando que esta é uma parte interna do IELUSC e não da igreja

A Paróquia da Paz divulgou nota oficial sobre o assunto afirmando que não houve invasão:

Bereia também ouviu dois professores do IELUSC que não querem ser identificados, por conta da perseguição que está sendo imposta a docentes mais críticos na instituição. Eles declararam ao Bereia

“Eu estava lá ontem à noite e ninguém invadiu nada! Aqui saiu a notícia falsa de que a CUT e o PT haviam invadido a igreja e tocado o sino! Rir para não chorar, pois os sinos aqui são automáticos e tocam a cada meia hora e, também, inteira! É impressionante como mentem. Foi tudo pacífico! A manifestação foi por conta da demissão de uma colega professora que desabafou nas redes sociais contra os bolsonaristas! Foi tudo pacífico! Fizeram a manifestação e depois se aquietaram e foram para as aulas!”

“Eu estava lá… um monte de mentiras está sendo contado. Primeiro que os estudantes não invadiram nada. Eles foram fazer uma manifestação em solidariedade à professora que foi demitida por se posicionar contra o presidente Bolsonaro. Segundo, não invadiram igreja nenhuma, não pararam o culto e não tocaram o sino… o sino toca automaticamente na Paróquia da Paz. Terceiro, a CUT e o PT não ajudaram. Fizeram a manifestação depois se aquietaram e foram para as aulas. Tudo pacífico, ordeiro. Eu estava lá! É rir para não chorar”.

*** 

Bereia classifica como FALSAS as publicações que afirmam que houve uma invasão à Igreja da Paróquia Luterana da Paz em Joinville na noite de 18 de outubro. Como apurado por nossa equipe o que ocorreu foi uma manifestação de estudantes contra a demissão de uma professora por conta de posicionamento político. 

O Estado de Santa Catarina é apontado em pesquisas eleitorais como reduto da campanha pela reeleição do presidente Jair Bolsonaro (alcança 63% de apoio do eleitorado, conforme pesquisa do IPEC divulgada neste  18 de outubro).


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Fonte: G1 https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/eleicoes/2022/noticia/2022/10/19/ipec-com-eleitores-de-sc-bolsonaro-tem-63percent-no-estado-e-lula-27percent.ghtml 

As postagens falsas foram produzidas por apoiadores de Jair Bolsonaro para acirrar os medos em torno do fechamento de igrejas, recurso de convencimento com cristãos utilizado nestas eleições, como Bereia já tratou em matéria especial. Este é o tema com mais incidência de mentiras nesta campanha eleitoral. 

Veículos como sites gospel e outros propagadores de desinformação, como o Gospelmente e a revista Oeste têm explorado a temática. Neste caso de Joinville, os dois veículos chegaram a forjar que o caso foi divulgado no Instagram da Igreja da Paz, o que é mentira. Gospelmente, na certeza de que seus leitores não checam desinformação, chegou a indicar um nome de perfil no Instagram, que, checado por Bereia, não existe: 

Imagem da menção ao Instagram da Paróquia da Paz na matéria do site Gospelmente

O site Gospelmente já se declarou apoiador da campanha de Jair Bolsonaro como registrado em matéria publicada pela revista Piauí intitulada “Louvor, fofoca, notícia e fake news”. 

Referências de checagem:

Igreja da Paz no Instagram https://www.instagram.com/paroquiadapazjoinville/ Acesso em 19 out 2022

G1, https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/eleicoes/2022/noticia/2022/10/19/ipec-com-eleitores-de-sc-bolsonaro-tem-63percent-no-estado-e-lula-27percent.ghtml Acesso em 19 out 2022.

Revista Piauí, https://piaui.folha.uol.com.br/eleicoes-2022/louvor-noticia-e-fakenews Acesso em 19 out 2022.

Instagram. https://www.instagram.com/paroquiadapazjoinville/ Acesso em 19 out 2022

Comunismo e “ameaça comunista” vs. patriotismo é argumento que embasa temas com mais desinformação em espaços religiosos nas eleições

Levantamento do Bereia a partir de suas checagens no período eleitoral iniciado em 2021 até o primeiro turno realizado em 2 de outubro passado, mostra que cinco temas  estiveram entre as postagens com mais conteúdo falso e enganoso circulante em espaços digitais religiosos. Os temas apresentados em matérias-coletânea pelo Bereia são: perseguição a cristãos, covid-19, “ideologia de gênero”/moralidade sexual, supostos feitos do presidente Jair Bolsonaro, tópicos específicos referentes às eleições (Tribunal Superior Eleitoral, urnas, pesquisas). 

Na pesquisa sobre o que foi checado no período eleitoral, Bereia identificou que o velho temor do comunismo e do marxismo permeia todos os cinco principais temas citados acima. É utilizado como base para a ideia de perseguição a cristãos, como explicação para a China ter supostamente criado o coronavírus em laboratório para a China ter supostamente criado o coronavírus em laboratório. O seu enfrentamento é colocado como motivação para as ações do governo Bolsonaro e como justificativa para a suposta tentativa de alteração de resultados nas urnas eletrônicas. Comunismo e a noção inventada de “marxismo cultural” são apresentados como fundamento para a constituição da “ideologia de gênero” e da doutrinação de crianças e jovens por professores em escolas.

A “ameaça comunista” é um tema que vigora desde os anos de 1920 nas disputas políticas expressas pela imprensa brasileira, voltou a ganhar força em campanhas eleitorais desde as eleições de 2018 e faz uso de um imaginário de inimigo muito antigo. O uso do termo “comunismo” cresceu em importância durante o regime militar  de 1960, e passou a ter múltiplos significados na sociedade brasileira, acompanha as mudanças  sociais e políticas que se sucederam desde então.  

Jornalistas e especialistas mostram que esta justificativa usada até hoje esconde documentos do próprio Exército que mostram que a “ameaça comunista” no país não era real. 

Pesquisa do UOL Confere diz:

“[Nos anos 1960] O mundo vivia em meio ao contexto da Guerra Fria, cenário de polarização internacional que teve, entre outros elementos, embates sobre capitalismo, socialismo e comunismo. A agenda reformista do então presidente João Goulart levou alas conservadoras a temerem uma proximidade com regimes comunistas implementados em outros países, como Cuba. Mas um informe do SNI (Serviço Nacional de Informações) já citava o desgaste do comunismo na Europa Ocidental. Os militares também analisaram que não havia clima para a instalação do comunismo por conta das contradições “por demais violentas” do Brasil e que o povo não aceitaria “pacificamente as influências externas”.

A ditadura durou 21 anos no Brasil. Em 1968 foi decretado o AI-5 (Ato Institucional nº5), que endureceu a repressão, cassou mandatos, fechou o Congresso, e ampliou perseguições, torturas e mortes de opositores. A Ditadura usou imprensa e ameaças à “ordem” e à “moral” para impor o AI-5.

Historiador e professor da UFRJ, Carlos Fico disse à BBC, em 2019, que tentativas de implantar o comunismo no Brasil partiram de movimento tímidos e sem apoio da maioria da população. Ele também avaliou que mesmo as ações armadas de movimentos de esquerda não foram suficientes para ameaçar os militares.

Em 2018, o “ressurgimento” do tema emergiu como pauta de campanhado então candidato à presidência Jair Messias Bolsonaro. Associado frequentemente a adjetivos pejorativos, ser “comunista”, tornou-se um sinônimo do posicionamento políticode esquerda, da corrupção e de degradação moral.O comunismo tornou-se um assunto frequente em produções midiaticas, sobretudo fake news, que circulam em mídias sociais a partir daquele ano.  

Quando associado à religião, nota-se que a  “ameaça comunista” assume uma interpretação para além da economia e da política, ese torna um ponto de enfrentamento moral/espiritual. A partir detemas como direitos sexuais e reprodutivos, perseguição religiosa, supostos malfeitos presidenciais e outros temas, o combate à “ameaça comunista” é um mote frequentemente mencionado. Esta lógica acompanha a compreensão imaginária mais generalizada construída pela extrema-direita que associa “ser comunista” a qualquer defensor/a da justiça e dos direito.

Na maioria, as fake news produzidas pela junção dos temas comunismo +religião abordam o comunismo como uma ameaça à família, à Igreja, à economia e ao bem-estar individual. Criou-se, com isso, uma oposição do comunismo às religiões cristãs, instrumentalizado pela direita e pela extrema-direita no imaginário popular, especialmente em períodos eleitorais.  

As checagens do Bereia realizadas a partir de desinformação sobre este tema em ambientes digitais religiosos centram-se em dois polos: o patriotismo nacional – sob a imagem de Bolsonaro (um defensor dos valores morais da família cristã); a ameaça comunista – sob a imagem do Partido dos Trabalhadores (PT) e Lula, muito especialmente, mas também toda a esquerda política. Termos como “máfia esquerdista”;  “demônios vermelhos”; “esquerdopata”; “petralhas”;  “esquerda  bandida”, são usados ainda hoje como parte do vocabulário para se referir ao comunismo. 

Seguem as principais matérias dos últimos quatro anos sobre o tema que ganharam relevância nas mídias:

Desinformação sobre comunismo no Brasil

Argumento de ameaça comunista para justificar golpe militar em 1964 é falso
https://coletivobereia.com.br/argumento-de-ameaca-comunista-para-justificar-golpe-militar-em-1964-e-falso/

Os bichos-papões que assombraram os eleitores religiosos em 2020
https://coletivobereia.com.br/os-bichos-papoes-que-assombraram-os-eleitores-religiosos-em-2020/

Possível repressão de Igreja Presbiteriana do Brasil a “esquerdismo” repercute em noticiários: Bereia verificou
https://coletivobereia.com.br/possivel-repressao-de-igreja-presbiteriana-do-brasil-a-esquerdismo-repercute-em-noticiarios-bereia-verificou/

Bolsonaro fala de proibição da Bíblia pelo STF, comunismo no Brasil e fim da corrupção em discurso
https://coletivobereia.com.br/bolsonaro-fala-de-proibicao-da-biblia-pelo-stf-comunismo-no-brasil-e-fim-da-corrupcao-em-discurso/

Reportagem aponta articulação conservadora entre Europa e Américas https://coletivobereia.com.br/reportagem-aponta-articulacao-conservadora-entre-europa-e-americas/

Arcebispo de Aparecida é chamado de comunista em mídias sociais
https://coletivobereia.com.br/arcebispo-de-aparecida-e-chamado-de-comunista-em-midias-sociais/

Deputado da Bancada Evangélica faz postagem falsa para exaltar desfile de tanques militares em Brasília
https://coletivobereia.com.br/deputado-da-bancada-evangelica-faz-postagem-falsa-para-exaltar-desfile-de-tanques-militares-em-brasilia/

Mentes e corações: estratégias das narrativas neoconservadoras no Brasil
https://coletivobereia.com.br/mentes-e-coracoes-estrategias-das-narrativas-neoconservadoras-no-brasil/

O fogo que queima reputações nas Assembleias de Deus
https://coletivobereia.com.br/o-fogo-que-queima-reputacoes-nas-assembleias-de-deus/

O diabo na campanha das eleições municipais no Brasil

https://coletivobereia.com.br/o-diabo-na-campanha-das-eleicoes-municipais-no-brasil/

Mensagem anônima que circula em mídias sociais usa pânico moral contra partidos de esquerda
https://coletivobereia.com.br/mensagem-anonima-panicomoral/

É imprecisa notícia que Governo Chinês ordena morte de recém-nascidos de minorias religiosas
https://coletivobereia.com.br/e-imprecisa-noticia-que-governo-chines-ordena-morte-de-recem-nascidos-de-minorias-religiosas/

O fantasma do Marxismo Cultural
https://coletivobereia.com.br/o-fantasma-do-marxismo-cultural/

É imprecisa a notícia sobre demissão de professores cristãos na China
https://coletivobereia.com.br/e-imprecisa-a-noticia-sobre-demissao-de-professores-cristaos-na-china/

A Covid-19 e a desinformação que mata
https://coletivobereia.com.br/a-covid-19-e-a-desinformacao-que-mata/

É enganosa a ideia de que há um plano comunista sendo instalado no Brasil
https://coletivobereia.com.br/e-enganosa-a-ideia-de-que-ha-um-plano-comunista-sendo-instalado-no-brasil/

O Partido Comunista Chinês não avança no Brasil, mercado chinês, sim
https://coletivobereia.com.br/o-partido-comunista-chines-nao-avanca-no-brasil-mercado-chines-sim/

Não há missionários comunistas na Amazônia nem defesa do fim da conversão religiosa para indígenas por católicos
https://coletivobereia.com.br/nao-ha-missionarios-comunistas-na-amazonia-nem-defesa-do-fim-da-conversao-religiosa-para-indigenas-por-catolicos/

Senador distorce dados sobre títulos de posse de terras para propagar supostos feitos do governo federal
https://coletivobereia.com.br/senador-distorce-dados-sobre-titulos-de-posse-de-terras-para-propagar-supostos-feitos-do-governo-federal/

Mídias religiosas repercutem afirmação de Bolsonaro de que acabou com o Movimento Sem Terra
https://coletivobereia.com.br/midias-religiosas-repercutem-afirmacao-de-bolsonaro-de-que-acabou-com-o-movimento-sem-terra/

Protesto em igreja de Curitiba é classificado em vídeo enganoso como crime religioso
https://coletivobereia.com.br/protesto-em-igreja-de-curitiba-e-classificado-em-video-como-crime-religioso/

Cristofobia, projeto de poder e as resistências da luta cristã
https://coletivobereia.com.br/cristofobia-projeto-de-poder-e-as-resistencias-da-luta-crista/

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Imagem de capa: reprodução da internet

Supostos feitos de Jair Bolsonaro configuram um dos temas com mais desinformação em espaços religiosos

Levantamento do Bereia a partir de suas checagens no período eleitoral iniciado em 2021 até o primeiro turno realizado em 2 de outubro passado, mostra que supostos feitos do governo Jair Bolsonaro estiveram entre os temas com mais conteúdo falso e enganoso circulante em espaços digitais religiosos. 

Desde 2019 circulam diversos conteúdos desinformativos em mídias e meios religiosos a respeito de realizações do governo de Jair Bolsonaro. Desde execução de obras públicas à gestão da pandemia, passando pela criação de mecanismos financeiros como o Pix, foram várias falsidades publicadas a respeito de ações do Poder Executivo.

Pronunciamentos do presidente da República em eventos ou à imprensa contendo desinformação também foram reproduzidos nos meios religiosos. 

Bereia oferece aqui uma seleção de checagens sobre supostos feitos de Jair Bolsonaro no comando da nação:

Realizações do governo

Vídeo atribui a Bolsonaro obras em estradas no MT feitas também por outros governos
https://coletivobereia.com.br/video-atribui-a-bolsonaro-obras-em-estradas-no-mt-feitas-tambem-por-outros-governos/

É enganoso que trecho de ferrovia em GO seja obra do governo Bolsonaro
https://coletivobereia.com.br/e-enganoso-que-trecho-de-ferrovia-em-go-seja-obra-do-governo-bolsonaro/

Mídias religiosas repercutem afirmação de Bolsonaro de que acabou com o Movimento Sem Terra
https://coletivobereia.com.br/midias-religiosas-repercutem-afirmacao-de-bolsonaro-de-que-acabou-com-o-movimento-sem-terra/

Apoiadores do governo mentem sobre Pix ser de Bolsonaro, causar prejuízo a bancos e ser ameaçado por Lula
https://coletivobereia.com.br/apoiadores-do-governo-mentem-sobre-pix-ser-de-bolsonaro-causar-prejuizo-a-bancos-e-ser-ameacado-por-lula/

Presidente Jair Bolsonaro não criou lei que transformou o 31 de Outubro de Dia das Bruxas em Dia do Evangelho
https://coletivobereia.com.br/presidente-jair-bolsonaro-nao-criou-lei-que-transformou-o-31-de-outubro-de-dia-das-bruxas-em-dia-do-evangelho/

Deputado da Bancada Evangélica afirma que apenas Bolsonaro comprou vacinas
https://coletivobereia.com.br/deputado-da-bancada-evangelica-afirma-que-apenas-bolsonaro-comprou-vacinas/

Governo Bolsonaro não criou cinco universidades federais
https://coletivobereia.com.br/governo-de-jair-bolsonaro-nao-criou-cinco-universidades-federais/

É verdade que Bolsonaro interfere na Receita Federal para tentar beneficiar igrejas
https://coletivobereia.com.br/e-verdade-que-bolsonaro-interfere-na-receita-federal-para-tentar-beneficiar-igrejas/

Ministro apresenta números descontextualizados sobre redução de violência no país em 2021
https://coletivobereia.com.br/ministro-apresenta-numeros-descontextualizados-sobre-reducao-de-violencia-no-pais-em-2021/

É falso que ‘novo presidente’ da Petrobras tenha demitido 300 funcionários da companhia
https://coletivobereia.com.br/e-falso-que-novo-presidente-da-petrobras-tenha-demitido-300-funcionarios-da-companhia/

Vídeo engana ao comparar dois trechos diferentes da Transamazônica para elogiar governo Bolsonaro
https://coletivobereia.com.br/video-engana-ao-comparar-dois-trechos-diferentes-da-transamazonica-para-elogiar-governo-bolsonaro/

Deputado Pastor Marco Feliciano infla lucro das estatais
https://coletivobereia.com.br/deputado-pastor-marco-feliciano-infla-lucro-das-estatais/

Pastor e deputado Marco Feliciano desinforma ao falar de inflação
https://coletivobereia.com.br/pastor-e-deputado-marco-feliciano-desinforma-ao-falar-de-inflacao/

Diretor da OMS elogia gestão brasileira no andamento da vacinação, segundo deputado evangélico
https://coletivobereia.com.br/diretor-da-oms-elogia-gestao-brasileira-no-andamento-da-vacinacao-segundo-deputado-evangelico/

PIB não cresceu 20% em 2019 e fala de Senador Humberto Costa ainda será avaliada
https://coletivobereia.com.br/pib-nao-cresceu-20-em-2019-e-fala-de-senador-humberto-costa-ainda-sera-avaliada/

Tweets de Onyx Lorenzoni enganam sobre enfrentamento da pandemia e CPI da covid-19
https://coletivobereia.com.br/tweets-de-onyx-lorenzoni-enganam-sobre-enfrentamento-da-pandemia-e-cpi-da-covid-19/

Pronunciamentos do presidente

Bolsonaro distorce informações na Cúpula do Clima
https://coletivobereia.com.br/bolsonaro-distorce-informacoes-na-cupula-do-clima/

Bolsonaro repete mentiras em pronunciamento com tom religioso
https://coletivobereia.com.br/bolsonaro-repete-mentiras-em-pronunciamento-com-tom-religioso/

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Foto de capa: Antônio Cruz/Agência Brasil

Vídeo manipulado que liga ex-presidente Lula ao satanismo viraliza entre evangélicos

* Matéria atualizada em 06/10/2022 às 21:25 após novas informações surgirem após a publicação

Bereia recebeu de leitores indicação de checagem de um vídeo de um influencer digital que se identifica como “satanista”, que faz a previsão de uma vitória de Lula no primeiro turno das eleições brasileiras de 2022. O vídeo viralizou, especialmente entre cristãos, com acusações a Lula de ser vinculado e ter o apoio de satanistas e causou muitas reações nas mídias digitais. 

Imagem: reprodução da internet

O homem que fala no vídeo é Vicky Vanilla, influenciador digital, com quase 1 milhão de seguidores no TikTok e que se apresenta como “mestre e líder da Igreja de Lúcifer do Novo Aeon”. 

No vídeo que viralizou, Vanilla aparece em local com bandeira de Lula ao fundo, fala sobre suposta união de diferentes religiões, de segmentos satanistas e do ocultismo em nome da vitória do ex-presidente no primeiro turno de 2 de outubro.

O conteúdo foi publicado na sexta-feira, 30 de setembro, dois dias antes do pleito, e passou a ser compartilhado nas redes bolsonaristas no domingo, quando o resultado se encaminhava para definição por um segundo turno.

O Portal de Notícias da Record R7 e sites gospel como o Pleno News deram destaque ao vídeo.

Imagem: reprodução do R7
Imagem: reprodução do Pleno News

Vídeo falso, conteúdo manipulado

Antes mesmo que Bereia concluísse a pesquisa deste conteúdo, vários projetos de checagem de conteúdo, como Aos Fatos, e veículos jornalísticos, como o Correio Braziliense,  já haviam publicado uma verificação indicando a falsidade de tal material. 

Na tarde do dia 3 de outubro, a campanha de Lula publicou nota intitulada “Lula é cristão. Não existe qualquer relação com satanismo”. No texto, a campanha afirma: “A verdade, como já repetimos antes, é que Lula é cristão, católico, crismado, casado e frequentador da igreja. Não existe relação entre Lula e o satanismo” (…) Quem espalha isso é desonesto e abusa da boa-fé das pessoas. O vídeo circulou em muitos canais do Telegram e grupos de WhatsApp e comprova como os apoiadores de Bolsonaro abusam da boa-fé das pessoas”.

O próprio envolvido no conteúdo, Vicky Vanilla, publicou um vídeo para desmentir o caso e declarar que foi feita uma montagem a partir de imagens tiradas de contexto e chama a publicação que viralizou de “fake news”. “Está sendo espalhado como uma fake news tanto a meu respeito, quanto a respeito do candidato Lula, que não tem qualquer ligação com a nossa casa espiritual”, completou Vanilla. O influenciador disse ainda que recebeu diversas ameaças depois que o material foi espalhado: “o bastante para fazer um boletim de ocorrência e entrar com representação judicial contra meus agressores”, destacou. 

No perfil de Vicky Vanilla no TikTok, são encontrados conteúdo pró-Lula e anti-Bolsonaro. Porém há postagens em que ele ataca o candidato do PT de forma intensa e chega a associá-lo ao nazismo.

Viralização

Além de ter sido divulgado pelo Portal da Rede Record R7, por sites gospel e mídias sociais de lideranças e fiéis religiosos, o vídeo falso foi publicado pela deputada federal reeleita Carla Zambelli (PL-SP), que o utilizou para chamar seguidores para uma “guerra espiritual” no segundo turno das eleições, “do bem contra o mal”. Ainda na terça-feira, 4 de outubro, mesmo depois do desmentido da campanha de Lula e do próprio Vicky Vanilla,  o senador eleito Cleitinho (PSC-MG) divulgou o material falso para convocar o voto “dos mais de 40 milhões de brasileiros que se abstiveram no primeiro turno por Jair Bolsonaro” (na verdade, foram cerca de 32 milhões de abstenções).

Imagem: reprodução do Instagram

Até o momento em que esta matéria foi concluída o conteúdo falso ainda estava visível em todos estes espaços digitais.

ATUALIZAÇÃO: O Tribunal Superior Eleitoral determinou que o vídeo fosse tirado do ar nesta quinta, 6 de outubro.

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Bereia reafirma o que já foi publicado por agências de checagem e veículos de mídias: o vídeo que ainda circula vinculando o ex-presidente Lula a uma seita satânica é FALSO. Além de tal vinculação ter sido negada pela campanha do candidato, o próprio envolvido no conteúdo desmentiu sua participação e denunciou a montagem.

Bereia alerta seus leitores e leitoras para materiais divulgados durante o processo eleitoral para destruir a imagem de candidatos. Quem receber este tipo de conteúdo não deve compartilhar sem antes verificar a veracidade. 

Referências de checagem:

Aos Fatos. https://www.aosfatos.org/bipe/falsas-ligacoes-de-lula-e-bolsonaro-com-satanismo-viralizam-e-geram-explosao-de-buscas/ Acesso em: 4 out 2022.

Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/10/5041843-lula-desmente-fake-news-sobre-satanismo-que-viralizou-entre-bolsonaristas.html Acesso em: 4 out 2022.

Site oficial de Lula. https://lula.com.br/a-verdade-sobre-lula-e-o-satanismo/ Acesso em: 4 out 2022.

Uol. https://www.uol.com.br/ecoa//videos/?id=influenciador-satanista-vicky-vanilla-desmente-apoio-a-lula-04020D9C3264C0897326 Acesso em: 4 out 2022.

TSE. https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Outubro/100-das-secoes-totalizadas-confira-como-ficou-o-quadro-eleitoral-apos-o-1o-turno Acesso em: 4 out 2022.

Portais de notícias religiosas desinformam quanto a suposto projeto comunista para crianças

Circula em portais de notícias religiosas um vídeo com uma fala descontextualizada da advogada Laura Astrolabio, sobre um suposto projeto político da “esquerda comunista” que visa infiltrar-se em igrejas evangélicas, para a cooptação de crianças em prol das políticas comunistas. 

Imagem: reprodução do Instagram

Em evento da Revista Fórum, intitulado “Mulheres no poder em um momento bolsonarista!, transmitido ao vivo no domingo, 11 de setembro de 2022, a advogada e estudante de Mestrado em Direitos Humanos (UFRJ) Laura Astrolabio dialogou com a candidata a deputada estadual, Benny Briolly (PSOL, RJ), que se destaca como primeira vereadora transsexual do Rio de Janeiro, e a ativista política e candidata a deputada estadual Chirley Pankará (PSOL, RJ), que é liderança indígena do povo Pankará, sob a mediação do jornalista Anderson Morais. 

Imagem: reprodução site Revista Fórum

O grupo de debatedoras abordou temas ligados às pautas feministas, etnicidades, patrimônio sociocultural, intolerância religiosa, gênero e sexualidade. Tais temas tiveram como fio condutor o combate às pautas políticas conservadoras da extrema-direita. O trecho do debate que vem ganhando repercussão nos meios de comunicação religiosos, por meio de vídeo, é um fragmento da fala de Astrolábio, em que ela afirma.    

“[…] Acho que a gente precisa conversar coletivamente, No mestrado eu cheguei a falar uma vez que a gente tinha que se infiltrar nas igrejas. Outro dia eu encontrei uma amiga minha da época em que eu era da igreja, porque eu fui cristã durante 30 anos, eu já fui até para Jerusalém, no dia em que contar o que foi essa viagem, eu acabo com o Cristianismo no Brasil”, disse, e continuou, “eu falei ‘amiga, vamos voltar pra igreja’, porque hoje eu sou candomblecista, não tenho um terreiro que eu vá frequentar, porque eu não sou religiosa, mas eu amo os orixás, agora, que nós temos que voltar para a igreja, ou ir para ela, a gente tem. Ela [e a amiga] disse que eles (fiéis) não iriam permitir, e eu disse ‘quem disse que a gente vai falar pra eles? a gente vai para a escolinha dominical’. O que mais a igreja quer é pegar uma irmãzinha pra tomar conta das crianças. Enquanto eles estão no culto, tem uma sala de aula cheia de crianças. Aí você pega a Bíblia e começa a falar que Jesus amava os pobres e que os ricos não entrarão no Reino dos céus…”, explicou a advogada. 

Imagem: reprodução do Youtube

A fala em questão ocorre após a participante ser questionada sobre a existência dos “pobres de direita”. Na resposta que abordou a  integração entre política e religião,  a advogada deu um exemplo  para ilustrar como esquerdas podem enfrentar o conservadorismo da extrema-direita: “infelizmente essa pessoas [os pobres de direita] não têm acesso a esses debates, a essas discussões, os debates feitos dentro dos partidos políticos não chega a essas pessoas […], então eu acho que temos que pensar em estratégias para fazer esse debate chegar lá, a eles”, disse. 

O trecho selecionado do discurso de Laura Astrolábio, usado para denunciar planos da “esquerda comunista para ocupar as igrejas”, segundo várias postagens em mídias sociais,  refere-se a possíveis estratégias de enfrentamento da extrema-direita. Na concepção da advogada, as pessoas devem se “armar” (simbolicamente) de seus direitos constitucionais e lutar por suas demandas, “o Estado é laico e a gente tem que cobrar”. Para ela,  a extrema-direita deve ser combatida por meio de ferramentas de reeducação cívica e militância organizadas. 

Ouvida para avaliar o caso, a pesquisadora em Comunicação e Religiões e editora-geral do Bereia Magali Cunha pondera:

Ao falar para um público de esquerda (seguidores da revista Fórum), a advogada Laura Astrolabio opta por usar as igrejas evangélicas em exemplo, por meio de um discurso crítico, com expressões exageradas como ‘eu fui cristã durante 30 anos, eu já fui até para Jerusalém, no dia em que contar o que foi essa viagem, eu acabo com o cristianismo no Brasil’, e de oposição, como ‘hoje eu sou candomblecista, não tenho um terreiro que eu vá frequentar, porque eu não sou religiosa, mas eu amo os orixás’. Ela introduz a fala sobre o processo educativo com ‘a gente tinha que se infiltrar nas igrejas’ e segue com o discurso crítico e o exemplo do espaço importante das escolas dominicais com as crianças”. 

Magali Cunha considera que “não há qualquer problema em alguém enxergar que as  igrejas, por meio das escolas dominicais e do trabalho com crianças, sejam vistas como espaço em que a educação para a realidade da desigualdade social (pobres x ricos) deveria ser praticada. Porém, o que vemos neste caso é que o uso do exagero, “eu acabo com o Cristianismo”, junto com “a gente tinha que se infiltrar”, mais o termo “criancinhas” como alvo de uma possível ação educativa para a crítica, formam um conjunto de expressões inadequadas em um discurso público pela internet, que certamente geram desconforto justificável em pessoas das igrejas evangélicas, e são um ‘prato cheio’ para produtores de desinformação e de pânico moral contra candidaturas de esquerda nestas eleições, tendo como alvo os o segmento evangélico”. 

A professora acrescenta que “na era digital, produtores de conteúdo e participantes de espaços de debate precisam usar de sabedoria com o que expressam publicamente. A máxima hoje é ‘tudo o que você disser pode ser usado contra você e contra seus pares’, afinal, tudo pode ser manipulado e sempre há quem acredite no que se produz deliberadamente para enganar”.

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Bereia classifica o conteúdo disseminado em vídeo em espaços digitais religiosos, com trecho da fala da advogada Laura Astrolábio, em evento da revista Fórum, como enganoso. 

O discurso em questão, que contém termos críticos e exagerados sobre as igrejas, foi recortado, descontextualizado e relativizado para tornar possível a defesa de uma proposta de intervenção política organizada por uma suposta “esquerda comunista”. A fala completa da advogada diz respeito a políticas de militância e enfrentamento ao racismo e misoginia, atuação política baseada em um regime de Estado laico e democrático.  

Referências de checagem:

Bereia. https://coletivobereia.com.br/desinformacao-e-intolerancia-religiosa/ Acesso em: 16 de set. 2022

Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=swbub6ep0Y8 Acesso em: 16 de set. 2022

Documentos Revelados. https://documentosrevelados.com.br/wp-content/uploads/2015/08/carlos-marighella-manual-do-guerrilheiro-urbano.pdf Acesso em: 16 de set. 2022

A tenda das candidatas. http://atendadascandidatas.org/campanhas/a-conta-nao-fecha Acesso em: 16 de set. 2022

CNN Brasil. https://www.cnnbrasil.com.br/politica/vereadora-trans-benny-briolly-diz-ter-recebido-ameaca-de-morte-por-e-mail-de-deputado/ Acesso em: 16 de set. 2022

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Foto de capa: frame de live da Revista Fórum

Blogs produtores de conteúdo falso caluniam pastor que atua na campanha pela eleição de Lula

* Matéria atualizada em 15/09/2022 às 09:50 para complementação de informações

Um blog de notícias sem referências, com o nome “Folha da Política”, publicou, em 11 de setembro de 2022, matéria  com suposta denúncia contra o pastor vinculado à Comunidade Cristã Reformada Ariovaldo Ramos, um dos líderes da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito. A matéria com o extenso título “URGENTE: PASTOR esquerdista que lidera apoio evangélico a Lula recebeu R$ 6.000.000 Milhões de reais por ONG presidida por ele no governo do PT. A ONG tem também contratos com a PETROBRAS” , passou a circular em ambientes digitais religiosos depois que o pastor participou de um evento da campanha de Luis Inácio Lula da Silva à Presidência da República. O ato, que reuniu lideranças e fiéis de igrejas evangélicas, ocorreu na cidade de São Gonçalo. no último 9 de setembro. Ramos fez um pronunciamento no evento e proferiu a bênção final.

Imagem: reprodução da internet

A matéria é, na verdade, uma reprodução de outra, com pequenas atualizações introdutórias referentes ao ato pró-Lula, em São Gonçalo, em 9 de setembro. O texto original é da Revista Sociedade Militar, com data de publicação de 16 de setembro de 2021, e título diferente:

Imagem: reprodução da internet

O texto  usa como fontes “líderes evangélicos”, como o pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia que, segundo o veículo, “advertem quanto à ONG gerenciada por Ariovaldo e as vultosas verbas que recebeu do governo federal, dando a entender que ha (sic) interesse financeiro por trás desse apoio tão aguerrido”. São usados vídeos de Malafaia como base para a acusação.

A Revista da Sociedade Militar diz também ter tido “acesso a algumas notas de empenho e documentos que mostram que as acusações de Malafaia são bem fundamentadas”. A matéria cita a ONG Visão Mundial como instituição que seria liderada por Ariovaldo Ramos, e teria recebido do governo federal quantias qualificadas no texto como “gigantescas”. São apresentadas imagens de trechos de documentos baixados do Portal da Transparência do Governo Federal que indicam que o Executivo teria liberado verba, em 2017, para uma pesquisa que teria custado, segundo o texto “a exorbitante quantia de 2 milhões de reais [aos cofres públicos]”. O texto segue afirmando que “a ONG recebe recursos desde o ano de 2000, ainda no governo FHC, totalizando mais de 6 milhões de reais em valores recebidos do governo federal”.

A Revista da Sociedade Militar também aponta para outra matéria, com data de 18 de outubro de 2018, com a afirmação de que “o braço israelense da ONG Visão Mundial foi acusado de direcionar dinheiro de doações para o financiamento do terrorismo, por meio do Hamas”. A revista, na verdade, recuperou uma história superada em 2016, quando o governo de Israel, acusou a Visão Mundial Internacional que tem programas na Faixa de Gaza, de apoio ao partido Hamas, associando-a com a Visão Mundial no Brasil. A desinformação foi usada a propósito da campanha eleitoral do Brasil em 2018.

A Visão Mundial e o recebimento de recursos públicos

A World Vision [Visão Mundial] é uma organização evangélica fundada nos Estados Unidos, em 1950, para atuar em defesa dos direitos de crianças e adolescentes e pela proteção de populações vulneráveis em diversos lugares do mundo. Em sua apresentação por website, afirma ser a maior organização não-governamental cristã do mundo, com presença em mais de 100 países. Declara, ainda, trabalhar para auxiliar pessoas sem distinção de credo, etnia ou gênero. 

A organização está presente no Brasil desde 1975, é filiada à Associação Brasileira de ONGs (ABONG). Atua com foco nas crianças e adolescentes em situação de maior vulnerabilidade, por meio de programas e projetos nas áreas de proteção à vida, educação, crises humanitárias e emergências, como catástrofes naturais e crises migratórias. 

Em nota oficial, a Visão Mundial afirma “que, diferente do que foi mencionado equivocadamente nos respectivos sites, Ariovaldo Ramos deixou o Conselho Diretor e todos os órgãos de governança da Visão Mundial em 2018, não tendo nenhuma ligação com a organização”. E que “Todo financiamento público recebido pela Organização se dá por meio de editais abertos, auditáveis e cujos contratos são disponibilizados no Portal da Transparência. No âmbito federal, esses contratos se estendem até o atual governo”. O diretor nacional da ONG, Thiago Crucciti, também se pronunciou: “Estão tentando sequestrar a Visão Mundial para um paralelo partidário, mas a instituição não entrará nessa questão”. Reforçou que a organização mantém bom relacionamento com governantes diversos, a despeito de suas ideologias. “Não temos vínculos políticos. As crianças e os adolescentes são nossa prioridade”, completou.

Bereia consultou o Portal da Transparência do Governo Federal e verificou o registro de 124 convênios e outros acordos firmados entre o governo federal e a Visão Mundial desde 1975.  As parcerias foram firmadas desde a ditadura militar, com o governo de Ernesto Geisel e foram realizadas, ao todo, com dez mandatos no governo federal, por meio dos protocolos de convênio de relações governamentais com organizações da sociedade civil, regulamentados por lei. A referência é a Lei 13019, conhecida também como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil. Não há, portanto, ilegalidade em parcerias de ONGs com o governo federal. Seja qual for o valor do financiamento dos projetos, há protocolos a serem seguidos.

Bereia levantou, no site da Visão Mundial, relatos de projetos desenvolvidos, iniciativas, prestação de contas, editais e parcerias públicas, com demonstração de atendimento a todas as exigências indicadas em lei. As contas foram aprovadas pelos órgãos de controle do governo federal, como Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU). 

O último registro no Portal da Transparência  de convênio entre o governo federal (Ministério da Educação) e a Visão Mundial é de dezembro de 2019, firmado, portanto, no atual governo. 

A Visão Mundial conta também com outras parcerias com o poder público nos âmbitos  municipais e estaduais, bem como com entidades privadas nacionais e internacionais, além de doações e voluntários. O teor dos projetos e das parcerias pode ser localizado também nas mídias sociais da organização, como Twitter, Instagram e Youtube. 

Os documentos sobre parcerias com o governo federal caracterizados como denúncia, apresentados na matéria da Revista da Sociedade Militar, republicada pela Folha da Política, constam no Portal da Transparência do Governo Federal e não há indicativo de irregularidades. Bereia não encontrou também pareceres do Tribunal de Contas da União ou qualquer outra auditoria que indique ações ilegais referentes aos valores utilizados nos projetos.

A estrutura da Visão Mundial é composta por um grupo executivo de quatro diretores (Nacional, de Operações, de Marketing e de Advocacy e Relações Internacionais) e por um Conselho Diretor com presidência, duas tesourarias, duas secretarias e uma coordenadoria do conselho fiscal. Bereia obteve da organização a informação de que o pastor Ariovaldo Ramos presidiu o Conselho Diretor em quatro mandatos, de 4 de abril de 2002 a 19 de dezembro de 2018 (conforme atas nos. 57, 67, 105 e 113).

Bereia apurou por meio de bibliografia em governança que Conselhos Diretores de ONGs comumente têm caráter consultivo quanto às diretrizes da organização e não lidam com atividades executivas como editais e assinaturas de contratos. 

A matéria republicada pela Folha da Política, que passou a circular nos últimos dias, altera o título para acusar Ariovaldo Ramos de ter recebido seis milhões de reais de contratos com o governo Dilma Rousseff, por meio da Visão Mundial. A afirmação não tem fundamento nos próprios documentos oficiais apresentados na matéria. Eles dizem respeito aos valores recebidos regularmente pelas parcerias institucionais e ali se mostram todos lícitos e com registro de situação “adimplente”, “concluído” e “arquivado”. 

Ouvido pelo Bereia, o pastor Ariovaldo Ramos declarou que nunca recebeu tais recursos destinados a projetos da Visão Mundial.

Folha da Política e Revista da Sociedade Militar

Bereia verificou os blogs que veicularam a matéria com a suposta denúncia contra o pastor Ariovaldo Ramos, a Folha da Política e a Revista da Sociedade Militar. 

A Folha da Política é um blog que se pretende informativo, de notícias, com o lema “Compromisso com a verdade”, com contas no Facebook, no Twitter, no Youtube e grupos no Telegram e no WhatsApp. Nenhum destes espaços, no entanto, oferece informações básicas sobre o veículo: a proposta, quem coordena, meios de contato. É, portanto, uma mídia anônima, que expõe matérias de caráter noticioso e um excessivo número de anúncios do Google de todo tipo: de medicamentos a cosméticos, de viagens a práticas fitness, de truques para solucionar dificuldades domésticas a “fotos picantes de casamento”.

Não há data de publicação nas 739 matérias arquivadas no blog. Bereia deduz que o espaço digital foi criado entre 2016, data de criação do canal do Youtube e 2017, quando aparecem os primeiros comentários (estes datados) na primeira matéria sobre política. Curiosamente, as seis primeiras matérias publicadas não trataram de política mas de curiosidades sobre superação de atletas, OVNIs e fantasmas. A primeira com abordagem política, a que obteve os primeiros comentários, teve o título “Apoiadora do MST, ex- candidata a Presidente Luciana Genro tem uma de suas fazendas invadida por sem-terras”, já caracterizando o conteúdo alinhado ao conservadorismo. 

Quando se analisa a coleção de matérias oferecidas pela Folha da Política, ele é 100% voltado à política nacional de tendência conservadora, alinhado à direita. As mais recentes têm inserções favoráveis à campanha de reeleição do presidente Jair Bolsonaro e de seus seguidores, e negativas em relação à de Lula, ao PT e apoiadores. 

Imagem: reprodução da internet

O blog tem todas as características de espaço digital veiculador de desinformação: traveste-se de veículo jornalístico, fazendo parecer que oferece notícias, e lança mão de jargões jornalísticos. No entanto, as matérias são mal construídas, com títulos muito extensos, uso de expressões em maiúsculas para chamar a atenção, adjetivação, opinião inserida no corpo do que deveria ser informativo e muitos erros de português. 

Já a Revista da Sociedade Militar é publicada no mesmo formato de blog da Folha da Política, com características visuais muito similares. Diferentemente, tem uma seção “Sobre” no menu, em que se apresenta fundada em 2011, atualizada diariamente e “voltada principalmente para a publicação de notícias e discussão de assuntos relacionados à Segurança Pública, Militares, Política e Geopolítica”. 

Constam no “Sobre” o nome da empresa que alimenta o conteúdo do blog, com CNPJ verificado pelo Bereia, nome do editor, com e-mails e número de celular para contato e endereço comercial no centro do Rio de Janeiro. O público alvo e os colaboradores, segundo a página, é formado por militares das Forças Armadas Brasileiras. No menu, porém, há material destinado a polícias e segurança pública.

A Revista da Sociedade Militar tem intensa inserção de publicidade, semelhante à da Folha da Política. É oferecido espaço a anunciantes com valores em dólares dos EUA.


Imagens: reprodução da internet

O conteúdo da Revista da Sociedade Militar mistura artigos de opinião e material informativo, alguns contêm assuntos de interesse de militares, outros de abordagem política, com linguagem semelhante ao que é publicado na Folha da Política. É observado que várias matérias da revista são republicadas pela Folha da Política, como foi o caso do texto acusatório ao pastor Ariovaldo Ramos. Isto leva a inferir que as duas publicações estão conectadas. Os textos caracterizados como informativos têm elementos semelhantes: mal elaborados, títulos muito extensos,expressões em maiúsculas para chamar a atenção, adjetivação, opinião mesclada com informação e erros de português.

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Bereia classifica o conteúdo da matéria publicada pela Revista da Sociedade Militar em 2021, republicado e divulgado nos últimos dias pelo blog anônimo Folha da Política, como FALSO. Membros do Conselho Diretor da Visão Mundial não recebem recursos destinados a projetos da organização e o ex-presidente citado na matéria, pastor Ariovaldo Ramos, declara nunca ter recebido tais valores mencionados no texto.

Os veículos envolvidos com esta informação falsa travestida de notícia se caracterizam por publicarem material de campanha política. Neste caso específico, o incômodo com as atividades de cunho progressista da ONG Visão Mundial e do pastor Ariovaldo Ramos parece ter motivado a produção do texto de 2021. A matéria foi recuperada neste momento como reação à presença do pastor em ato a favor de Lula, em São Gonçalo (o que consta na introdução do que foi republicado), consequentemente, contra a reeleição de Jair Bolsonaro apoiada pelos veículos. 

Bereia alerta leitores e leitoras para o recorrente uso de desinformação (calúnia) com a intenção de atacar opostos e destruir reputações, especialmente em períodos eleitorais.

Referências de checagem:

Portal da Transparência. https://www.portaltransparencia.gov.br/busca?termo=vis%C3%A3o%20mundial Acesso em: 13 set 2022.

Visão Mundial.

https://visaomundial.org.br/nossa-historia Acesso em: 13 set 2022.

https://visaomundial.org.br/publicacoes Acesso em: 13 set 2022.

https://issuu.com/visaomundialbr/stacks/5d6c666c40c1491ebb7ed6a5b6ccaa06 Acesso em: 13 set 2022.

https://visaomundial.org.br/noticias Acesso em: 13 set 2022.

Governo Federal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.htm Acesso em: 13 set 2022.

Abong. https://abong.org.br/quem-somos/ Acesso em: 13 set 2022.

Tese Governança em ONGs: um estudo sobre a coerência da governança deste tipo de organização, de  Ivan Barreto de Lima Rocha. https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/24851/1/TESE%20Ivan%20Barreto%20de%20Lima%20Rocha.pdf Acesso em: 14 set 2022.

Carta Capital. https://www.cartacapital.com.br/politica/cristao-vota-sim-no-pt-o-tom-do-encontro-de-lula-com-evangelicos-no-rio/  Acesso em: 13 set 2022.

Planalto. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13019.htm  Acesso em: 14 set 2022.

Twitter. https://twitter.com/visaomundialbr Acesso em: 13 set 2022.

Instagram. https://www.instagram.com/visaomundialbr/ Acesso em: 13 set 2022.

YouTube. https://www.youtube.com/user/visaomundial Acesso em: 13 set 2022.Google Drive. https://drive.google.com/file/d/1MI1AwTbqyO3Lw2_vI6OH1DZYJJWqF9os/view  Acesso em: 13 set 2022.

Comunhão. https://comunhao.com.br/nao-temos-vinculos-politicos-enfatiza-thiago-crucciti/ Acesso em: 15 set 2022.

Mensagem da CNBB ao povo brasileiro sobre o momento atual

*Publicado originalmente no site da CNBB

“Se nos esforçamos e lutamos,
é porque pusemos a nossa esperança no Deus vivo,
que é o salvador de todos” (1 Tm 4,10).”


Reunidos no Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, de
28 de agosto a 2 de setembro, para a etapa presencial da 59ª Assembleia Geral da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, nós, bispos católicos, em colegialidade e comunhão, nos
dirigimos a todos os homens e mulheres de boa vontade.

Como pastores, temos presente a vida e a história de nossas comunidades, o rosto de
nossa de gente, marcado pela fé, esperança e capacidade de resiliência. Nossas alegrias e
esperanças, tristezas e angústias (cf. Gaudium et Spes, 1) são as mesmas de cada brasileira e
brasileiro. Com esta mensagem, queremos falar ao coração de todos.

Nossa fé comporta exigências éticas que se traduzem em compaixão e solidariedade
concretas. O compromisso com a promoção, o cuidado e a defesa da vida, desde a concepção
até o seu término natural, bem como, da família, da ecologia integral e do estado democrático
de direito estão intrinsecamente vinculado à nossa missão apostólica. Todas as vezes que esses
compromissos têm sido abalados, não nos furtamos em levantar nossa voz. “A Igreja é
advogada da justiça e dos pobres, exatamente por não se identificar com os políticos nem com
os interesses de partido” (Bento XVI, Discurso Inaugural da Conferência de Aparecida).

Com a esperança que nos vem do Senhor e que não nos decepciona (Cf Rm 5,5),
reconhecemos o tempo difícil em que vivemos. Nosso País está envolto numa complexa e
sistêmica crise, que escancara a desigualdade estrutural, historicamente enraizada na sociedade
brasileira. Constatamos os alarmantes descuidos com a Terra, a violência latente, explícita e
crescente, potencializada pela flexibilização da posse e porte de armas que ameaçam o convívio
humano harmonioso e pacífico na sociedade. Entre outros aspectos destes tempos estão o
desemprego e a falta de acesso à educação de qualidade para todos. A fome é certamente o maiscruel e criminoso deles, pois a alimentação é um direito inalienável (cf. Papa Francisco, Fratelli Tutti, 189). Segundo relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO, 2022), a quantidade de brasileiras e brasileiros que enfrentam algum tipo de
insegurança alimentar ultrapassou a marca de 60 milhões.

Como se não bastassem todos os desafios estruturais e conjunturais a serem enfrentados,
urge reafirmar o óbvio: Nossa jovem democracia precisa ser protegida, por meio de amplo pacto
nacional. Isso não significa somente “um respeito formal de regras, mas é o fruto da convicta
aceitação dos valores que inspiram os procedimentos democráticos […] se não há um consenso
sobre tais valores, se perde o significado da democracia e se compromete a sua estabilidade”
(Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 407).

Ao comemorarmos o bicentenário da Independência do Brasil, é fundamental ter
presente que somos uma nação marcada por riquezas e potencialidades, contudo, carente de um
projeto de desenvolvimento humano, integral e sustentável. Vítimas de uma economia que
mata, celebramos as conquistas desses 200 anos de independência conscientes de que condições de vida digna para todos ainda constituem um grande desafio. É necessário o compromisso autêntico com a verdade, com a promoção de políticas de Estado capazes de contribuir de forma efetiva para a diminuição das desigualdades, a superação da violência e a ampliação do acesso a teto, trabalho e terra. Comprometidos com essas conquistas e inspirados pela cultura do diálogo e do encontro, podemos ser uma nação realmente independente e soberana.

É motivo de preocupação a manipulação religiosa e a disseminação de fake news que
têm o poder de desestruturar a harmonia entre pessoas, povos e culturas, colocando em risco a
democracia. A manipulação religiosa, protagonizada por políticos e religiosos, desvirtua os
valores do Evangelho e tira o foco dos reais problemas que necessitam ser debatidos e
enfrentados em nosso Brasil. É fundamental um compromisso autêntico com o Evangelho e
com a verdade.

A corrupção, histórica, contínua e persistente, subtrai o que pertence aos mais pobres.

A Lei da Ficha Limpa, que proíbe que condenados por órgãos colegiados possam se candidatar
a cargos políticos, é uma conquista popular e democrática, que deve ser promovida, juntamente
com outros mecanismos de controle que garantam a ética na política.

Mesmo com todos esses desafios, a dinâmica da democracia nos coloca, mais uma vez,
num processo eleitoral. Tentativas de ruptura da ordem institucional, veladas ou explícitas,
buscam colocar em xeque a lisura desse processo, bem como, a conquista irrevogável do voto.Pelo seu exercício responsável e consciente, a população tem a capacidade de refazer caminhos, corrigir equívocos e reafirmar valores. Reiteramos nosso apoio incondicional às instituições da República, responsáveis pela legitimação do processo e dos resultados das eleições.

Assim, conclamamos, mais uma vez, toda a sociedade brasileira a participar ativa e
pacificamente das eleições, escolhendo candidatos e candidatas, para o executivo (presidente e
governadores) e o legislativo (senadores e deputados federais, estaduais e distritais), que
representem projetos comprometidos com o bem comum, a justiça social, a defesa integral da
vida, da família e da Casa Comum.

Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, nos ajude a buscar sempre a melhor
política, uma das formas mais eminentes da caridade.

Aparecida – SP, 31 de agosto de 2022.

***

Foto de capa: CNBB/Divulgação

Desinformação, fake news e os caminhos do demônio

*Publicado no Observatório das Eleições 2022 e no site da Carta Capital

Em um culto em Belo Horizonte para homenagear um pastor, no começo de agosto, a primeira-dama Michelle Bolsonaro, ao lado do marido, disse que há no Brasil uma “guerra do bem contra o mal” e que o Palácio do Planalto já foi um lugar “consagrado aos demônios”.  

Também em agosto, o pastor bolsonarista Marco Feliciano disse que o PT é expressão do mal e que, se Lula ganhar, vai fechar templos e igrejas e calar os pastores.

O jornal Folha Universal, no ano passado, fez vários editoriais comparando o ex-presidente Lula ao demônio e ao mal.

Em janeiro deste ano, circulou pelas redes sociais um vídeo editado para simular que o ex-presidente Lula conversava com o demônio.

A ideia do demônio, como vemos, volta com força à cena nacional e ao processo eleitoral, por vários atores. Uma ideia forte que se alinha muito bem ao potente sistema de desinformação que sacode o Brasil com intensidade desde as últimas eleições, em 2018. Nesse contexto, eu quero convidar vocês a percorrerem o caminho da construção discursiva do demônio no escopo do ecossistema das fake news para entendermos por que, de fato, ele é um “personagem” importante.  

Um poderoso ecossistema

O Brasil vivencia, com as eleições de 2018, a intensificação de um processo de desinformação que se torna pouco controlável a partir de 2020, com a pandemia de Covid-19. É um processo bem estruturado, que não se restringe ao Brasil, um fenômeno mundial que solapa democracias de Norte a Sul. Nesse contexto, a desinformação precisa ser entendida como um fenômeno estruturado, intencional, que se consolida nas sociedades contemporâneas e que tem fortes impactos em vários contextos – social, político, econômico, de saúde –, o que compromete seriamente o funcionamento da esfera pública, como ressalta Carlsson (2019).

Partindo desse sistema macro, eu situo o ecossistema brasileiro de fake news, que tem características bem marcantes: aporte e sustentação do poder público e de setores do empresariado, grande financiamento, produção intencional e profissional de conteúdo falso envolvendo diversos atores (por exemplo, sites com estrutura de produção de conteúdo, influenciadores que recebem benesses, representantes do poder público, entre outros) e enorme capilaridade para disseminar o conteúdo. Esse ecossistema, que nada tem de aleatório ou casual – pois é muito bem estruturado –, encontrou no país um campo bastante fértil para se desenvolver (lembrando que a capilaridade envolve a interface com outros sistemas – portanto, não se trata somente de “espalhar conteúdo” pela internet).

É um ecossistema que, com essas características, tem conseguido causar enormes estragos ao Brasil, em vários setores. Recentemente, está contribuindo para tumultuar bastante o processo eleitoral, colocando em xeque instituições já consolidadas em sua atuação e processos exitosos, como é o caso do sistema eleitoral brasileiro, além de propagar ataques a atores institucionais, como ministros do STF e do TSE.  

O fenômeno das fake news, em seu ecossistema brasileiro, não se esgota, portanto, apenas na disseminação das notícias falsas ou falseadas – há um processo de produção profissional de conteúdo que envolve muitos atores e financiamento. Além disso, esse  ecossistema se retroalimenta e está em interface com outros sistemas, como o de informação (tradicional – mídia corporativa) e o religioso, numa capilaridade gigantesca.

E então voltamos ao demônio da primeira-dama e seu papel nas eleições. 

O demônio é o inimigo a combater

O demônio, como construção discursiva, liga-se à ideia de um inimigo poderoso e que precisa ser combatido. Nós, ao nos comunicarmos, não pronunciamos palavras somente – pronunciamos verdades ou mentiras, coisas boas ou más, certezas inquestionáveis, pois a palavra comporta valores e crenças e visões de mundo. Portanto, o demônio trazido à tona recentemente pela primeira-dama e por outros atores funciona muito bem nesse ecossistema de fake news, já que  o termo cristaliza a ideia de um inimigo a combater a partir de um apelo a valores cristãos e num cenário de disputas polarizadas.

Essa ideia se consolida e se espalha por várias instâncias, numa retroalimentação que envolve vários sistemas – o demônio como ideia não se restringe à fala de Michelle naquele momento no culto, mas se espalha pelas redes sociais, pelos sites bolsonaristas, pela pregação do pastor na igreja, pelos artigos no jornal de maior circulação no país (que é da igreja). Portanto, não é uma expressão aleatória e nem um demônio qualquer – é uma entidade capaz de provocar os eleitores religiosos ainda indecisos, ou que estavam migrando para outros candidatos que não Bolsonaro, e interpelar fortemente esse eleitor naquilo que é sua crença ou seu medo. 

As categorias religiosas não são levadas aleatoriamente para o discurso num país bastante religioso como o Brasil. Elas dialogam de perto com as crenças, os valores, os medos, as incertezas das pessoas, e por isso são tão presentes no escopo das fake news – vale lembrar que a visão de mundo dos indivíduos não é racional todo o tempo. E em tempos de incertezas, medo do futuro, precarização da vida, a ideia de um demônio a combater pode ser efetiva sim.    

E no bem estruturado ecossistema brasileiro de fake news, essas construções discursivas encontram um caminho para se consolidarem, para se dissiparem, para se reproduzirem, para alcançarem mais e mais pessoas, fortalecendo-se contra os desmentidos e provocando a manifestação apenas reativa e tardia dos atingidos.

Portanto, é imperioso entendermos o demônio de Michelle no contexto desse ecossistema brasileiro de fake news no cenário de um acachapante sistema de desinformação – estruturado e estruturante. Uma ideia de bem contra o mal, de combate ao inimigo que destrói famílias; ideia que é trazida por uma mulher jovem, que defende a família, que se posta ao lado do marido presidente, aquele que perdeu uma parte expressiva do eleitorado feminino exatamente por ser abertamente machista e misógino.

Sobretudo, o discurso que traz o demônio à cena nacional serve muito bem para consolidar a agenda ultra-conservadora da extrema-direita e para tirar o foco de temas e pautas que realmente interessam ao país e que deveriam estar sendo muito discutidas: fome, desemprego, economia estagnada, aumento acentuado da depressão na população, corte de verbas públicas para a educação e a saúde, entrega da Petrobras, privatização da Eletrobrás, entre tantos outros.  

Mas, por ora, metaforicamente ou não, o capeta está roubando a cena no Brasil de Bolsonaro.

***

Foto: Marcelo Casal Jr./Agência Brasil

Fake news sobre livro de educação sexual infantil nas escolas volta a circular

Voltou a circular entre mídias sociais de grupos religiosos que teria sido distribuído em escolas públicas em governos do PT o livro “Aparelho Sexual e Cia – Um guia inusitado para crianças descoladas”. Segundo um dos vídeos, o livro foi entregue para turmas de crianças pequenas, como uma que segura um exemplar enquanto é filmada.

Imagem: reprodução de WhatsApp

Fake news “requentada”

“Aparelho Sexual e Cia – Um guia inusitado para crianças descoladas”, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, de autoria dos educadores da Suíça e França, Phillipe Chappuis, com o codinome ZEP e Hélène Bruller, surgiu na cena pública há quatro anos. Foi quando o então candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro afirmou, em entrevista ao Jornal Nacional, que o livro foi comprado pelo Ministério da Educação, durante a gestão de Fernando Haddad, e distribuído nas escolas.

Conforme Bereia já checou, o livro nunca foi comprado pelo Ministério da Educação, nem foi distribuído em escolas. A obra publicada pela Companhia das Letras é destinada  a crianças e jovens de 11 a 15 anos, e não para crianças a partir de 6 anos, como circulou nas mídias sociais e foi reforçado por Jair Bolsonaro na entrevista. 

Não à toa, o conteúdo falso volta a circular às vésperas de novas eleições. A “ideologia de gênero” uma noção inventada como estratégia discursiva e arma política continua sendo utilizada para a mobilização dos votantes. 

Bereia pontua que, novamente, as campanhas de desinformação buscam mobilizar grupos de eleitores alinhados a pautas conservadoras contra  líderes de esquerda. A estratégia de voltar às pautas morais exploradas na campanha eleitoral de 2018 (e retomadas também no pleito municipal de 2020) é uma tentativa de repetir êxitos e surpresas daquele ano.

Referências de checagem:

Companhia das Letras. https://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12264 Acesso em: 16 ago 2022

Coletivo Bereia.

https://coletivobereia.com.br/nao-ha-duvida-a-existencia-de-um-kit-gay-organizado-por-fernando-haddad-e-falsa/ Acesso em: 16 ago 2022

https://coletivobereia.com.br/ideologia-de-genero-estrategia-discursiva-e-arma-politica/ Acesso em: 16 ago 2022

***

Foto de capa: Companhia das Letras

Imprensa desinforma sobre acordo do Tribunal Superior Eleitoral com religiosos

Ao contrário do que foi divulgado em pelo menos três matérias publicadas na Folha de São Paulo, o acordo assinado por lideranças de diferentes religiões com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pretende promover a paz e a tolerância nas Eleições Gerais de 2022 – e não combater as fake news, como publicado pelo jornal. 

Imagem: reprodução das matérias publicadas pela Folha de S. Paulo nos dias 2, 6 e 26 de junho, respectivamente

Segundo o Termo de Cooperação disponibilizado no site do TSE, os signatários do documento declararam a intenção de promover por meio dos seus meios de comunicação “ações de conscientização relacionadas com a tolerância política, legitimação do pensamento divergente e a consequente exclusão da violência” para preservação da paz social. Não há, no documento, menção sobre combate às fake news, notícias falsas ou a desinformação. 

Imagem: primeira folha do Termo assinado por uma das entidades signatárias. Reprodução/site do TSE

Entretanto, a Folha não ficou sozinha na divulgação da desinformação. Com exceção de alguns veículos da imprensa como Estadão, O Globo e CNN, a maioria dos veículos propagaram a notícia do suposto “acordo contra as fake news”, entre eles:  Gazeta do Povo, Correio Braziliense, O Antagonista, Diário do Centro do Mundo, Portal Comunhão, Brasil 247, Jornal GGN, Jornal do Comércio, Revista Forúm.

A questão da verdade apareceu no processo, contudo, foi mencionada apenas durante a cerimônia de assinatura do Termo, em 6 de junho no Salão Nobre do Tribunal, no discurso do atual presidente do TSE, Edson Fachin. “Defender a democracia é negar a cólera, fugir das armadilhas retóricas, fiar-se no valor da verdade”.

Acordo: sucesso ou fracasso

Para organizar o evento, o TSE convidou o desembargador William Douglas, do TRF (Tribunal Regional Federal) da 2ª Região, pastor ligado à igreja Batista. Em entrevista concedida ao Bereia, o desembargador federal declarou que foi procurado pelo TSE pelo fato de possuir experiência em magistratura e trânsito inter-religioso. 

Para o evento de solenidade foram convidadas 33 pessoas, no entanto, apenas 12 assinaram o documento. O desembargador federal atribuiu o fato à desinformação veiculada na imprensa, “[…] a imprensa noticiou, mais de uma vez, como sendo um projeto sobre combate às fake news. Não é o caso: neste projeto não há qualquer menção a fake news”. Segundo sua análise, o assunto foi politizado levando, assim, a discussão para temas que não estavam propostos no Termo de Cooperação.

Imagem: representantes posando para foto após assinatura do Termo de Cooperação. Reprodução/site TSE)

Outro ponto do evento que chamou a atenção foi a ausência de representantes de denominações históricas como Metodistas, Anglicanos e Luteranos para a assinatura do acordo. “A seleção [dos convidados] foi baseada em presença exemplificativa do segmento. O que se quis foi um rol exemplificativo e não exaustivo” explicou o desembargador, pontuando sobre a dificuldade da representação devido ao tamanho do segmento evangélico. 

Para o desembargador, o fato do evento não ter uma representatividade maior não configura um problema, “não se espera de nenhuma liderança alguma postura de ciúme em relação a outras, o que não é bíblico”, conclui o desembargador que, apesar de ser pastor, assinou o Termo na condição de escritor.

Bereia também ouviu a secretária-geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), a pastora luterana Romi Bencke. A organização cristã que representa a Aliança de Batistas do Brasil, as Igrejas Episcopal Anglicana do Brasil,Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Presbiteriana Unida, entre outras, não foi convidada para o evento. “Fizemos contato informando nossa disposição em participar, no entanto, as pessoas que nos representariam não foram procuradas pelo TSE. Desde uma perspectiva de laicidade do Estado, creio que a participação deveria ter sido o mais plural possível, sem discriminação”, reclama a secretária-geral. 

Romi Bencke conta que nas últimas eleições, para prefeitos e vereadores, em 2020, o CONIC foi convidado para apoiar as campanhas do TSE por eleições democráticas. “O TSE tem e deve ter o nosso nome em seu banco de dados. Após o encontro, fomos questionados por algumas organizações que estiveram presentes, por que não estávamos lá. A resposta foi: porque não fomos convidados ou informados. Por isso, pergunto pelos critérios considerados para deixar organizações de fora. Cabe ao TSE responder esta pergunta”, finaliza a pastora. 

Independente de estar ou não presente no evento, o CONIC tem apoiado as campanhas do órgão por eleições limpas e divulgou uma nota de apoio ao processo eleitoral, de repúdio à violência e a FakeNews. 

Imagem: nota divulgada pelo CONIC em seu site oficial. Reprodução/site do CONIC

O evento pela Paz e Tolerância não sofreu apenas com a desinformação e com a ausência de entidades importantes como o CONIC. Apesar dos esforços para agregar os diferentes religiosos, o pastor Silas Malafaia, apoiador do governo Bolsonaro, atacou a reunião e pediu boicote ao evento.

“Eu só acredito que um líder religioso vá aparecer na reunião hoje se ele for alienado, está por fora desses fatos ou é esquerdopata. Um líder religioso que sabe das coisas não vai cair nesse jogo. Nós não vamos ser usados por esses interesses mesquinhos”, disse o pastor em um vídeo publicado em seu canal no Youtube, no mesmo dia do evento.

Assinou, não assinou

A lista de convidados foi composta, na sua maioria, por pessoas e entidades ligadas à fé evangélica e oito ligadas às demais religiões como. A relação a seguir onde constam os nomes dos convidados foi obtida pelo jornal Folha de São Paulo mediante a Lei de Acesso à Informação (LAI): 

Abner Ferreira, presidente da Assembleia de Deus (Madureira/RJ). 

Teo Hayashi, pastor na Zion Church e líder do movimento “The Send”, checado pelo Bereia.

Samuel Câmara, presidente da CADB (Convenção da Assembleia de Deus do Brasil)

Roberto Brasileiro, presidente da Igreja Presbiteriana do Brasil

Hilquias Paim, presidente da Convenção Batista Brasileira, conta com 8 mil igrejas e em torno de 1,7 milhão membros.

Jesus Aparecido, presidente da Convenção Batista Nacional, atualmente conta com 2.700 igrejas com mais de 400 mil membros.

Thiago Rafael Vieira, presidente do IBDR (Instituto Brasileiro de Direito e Religião)

Eduardo Bravo, presidente da Unigrejas (União Nacional das Igrejas e Pastores Evangélicos)

Edna Zilli, presidente em exercício da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos)

Ismael Ornilo, presidente da Aliança das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil

Girrad Mahmoud Sammour, presidente da Anaji (Associação Nacional de Juristas Islâmicos)

Thiago Crucitti, diretor-executivo da Visão Mundial, 

Claudio Lottenberg, presidente da Conib (Confederação Israelita do Brasil)

Juliane Penteado Santana, presidente da AJE-Brasil (Associação Jurídico Espírita do Brasil)

Augusto César Rocha Ventura, presidente da Associação Educativa Evangélica, mantenedora de instituições de ensino superior e colégios baseados em Goiás.

Stanley Arco, a Aneasd (Associação Nacional de Entidades Adventistas do Sétimo Dia) – é preciso explicar estas associações desconhecidas. Arco também é o atual presidente da Igreja Adventista do Sétimo Dia na América do Sul. 

Walmor Oliveira de Azevedo, presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

Sóstenes Cavalcante, deputado federal e presidente da bancada evangélica

Antônio Carlos Costa, presidente da ONG Rio de Paz

Davi Lago, pastor e escritor

Paschoal Piragine Jr., presidente da Primeira Igreja Batista de Curitiba

Márcio de Jagun, fundador do Instituto Orí

Nilce Naira, coordenadora da Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde

Augusto Cury, escritor

Cláudio Duarte, pastor e escritor

Carlos Wizard, empresário e escritor.

David Raimundo Santos, fundador da ONG Educafro

William Douglas, escritor e desembargador federal do TRF 2 e organizador do encontro.

Aaron Inácio Silva Freitas, presidente do Igreja Assembleia de Deus Ministério Internacional do Guará, sediada no Distrito Federal, conta com aproximadamente 1.500 igrejas pelo Brasil.

Coen Roshi, monja budista, primaz fundadora da Comunidade Zen Budista Zendo Brasil (2001).

Ademar Kyotoshi Sato, monge budista do Templo Shin Budista Terra Pura, em Brasília-DF.

Keizo Doi, monge regente do Templo Shin Budista Terra Pura, em Brasília-DF.

Luzia Lacerda, diretora do Expo Religião, organização que promove seminários, congressos e feiras inter-religiosas. Lacerda também é jornalista e apresentador do programa Expo Religião transmitido na TV Alerj.

Dessa lista, apenas 11 instituições foram as signatárias, além do desembargador federal William Douglas, que assinou na condição de escritor e pensador:

Instituto Orí

Rede Nacional de Religiões Afro-brasileiras e Saúde (Renafro),

Templo Shin Budista Terra Pura

Organização Não Governamental (ONG) EducAfro

Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

Associação Jurídico-Espírita do Brasil (AJE-Brasil)

Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure)

Associação Nacional de Entidades Adventistas do Sétimo Dia (Aneasd)

ONG Visão Mundial

Confederação Israelita do Brasil (Conib)

Associação Nacional de Juristas Islâmicos (Anaji)

O pastor Antonio Carlos Costa, presidente da ONG Rio de Paz, publicou no dia 29 de junho, em sua conta no Twitter, uma nota, declarando que não assinou o Termo, pois não havia recebido em tempo. Após o recebimento comprometeu-se a assiná-lo.

………..

Bereia classifica como enganosa a notícia sobre o acordo contra fake news veiculada no jornal Folha de S. Paulo e demais veículos da imprensa. O acordo proposto pelo TSE referia-se à promoção da paz e tolerância nas Eleições Gerais de 2022. Como está demonstrado nesta matéria, o Termo de Cooperação não faz qualquer menção à desinformação. O combate às fake news deve ser prioridade em um processo eleitoral e não pode ser utilizado como chamariz de assuntos. Ele se faz com informação de qualidade, apurada com rigor jornalístico em busca da verdade. Como Bereia prediz em sua Metodologia de Checagem, deve-se buscar, sempre que possível, as fontes originais da informação. 

Referências de Checagem:

TSE.

https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Junho/eleicoes-2022-tse-assina-acordo-com-liderancas-religiosas-para-a-promocao-da-paz-e-da-tolerancia-no-pleito Acesso em: 9 jul 2022.

https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Junho/tse-e-liderancas-religiosas-firmam-parceria-em-prol-do-dialogo-e-da-paz-nas-eleicoes-2022? Acesso em: 9 jul 2022.

Folha de S. Paulo.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/06/tse-busca-pacto-com-lideres-religiosos-contra-fake-news-e-resistencia-as-eleicoes.shtml Acesso em: 9 jul 2022.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/06/acordo-contra-fake-news-tem-adesao-de-menos-da-metade-de-religiosos-convidados-pelo-tse.shtml Acesso em: 9 jul 2022.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/06/tse-faz-acordo-com-liderancas-religiosas-em-meio-a-ataques-de-malafaia.shtml Acesso em: 9 jul 2022.

G1. https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/06/06/tse-se-reune-com-lideres-religiosos-e-firma-acordo-para-promover-eleicoes-pacificas-em-outubro.ghtml Acesso em: 9 jul 2022.

CONIC. https://www.conic.org.br/portal/conic/noticias/nota-do-conic-em-defesa-do-processo-eleitoral-brasileiro Acesso em: 11 jul 2022.

Foto de capa: Divulgação/TSE

Direita e esquerda no Brasil: o imaginário, o digital, o caos

Novas formas de ativismo passaram a compor o cenário político brasileiro, traduzindo as mudanças significativas na organização e mobilização política  na era das novas tecnologias, mídias sociais, influenciadores digitais, disparos de mensagens em massa etc, conferindo à esfera pública digital e à opinião pública um papel fundamental sobre as mediações que realiza entre os cidadãos e o Estado. 

A pesquisa “Cara da Democracia no Brasil” realizada pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação fornece algumas pistas para tentar compreender estas e outras  importantes mudanças no comportamento, nas atitudes, nas crenças e valores dos cidadãos brasileiros com relação à democracia, temas que dominam o debate público desde a eleição de Jair Bolsonaro, como legalização do aborto, descriminalização das drogas e direitos das chamadas minorias. 

De acordo com a pesquisa, o dobro dos brasileiros se diz mais à direita do que  à esquerda no espectro político. Entretanto, devemos levar em conta que a compreensão do significado do que é pertencer à direita ou esquerda não alcança a maioria da população, e muitas percepções mudam ao longo do tempo. 

Direita e esquerda

Os termos direita e esquerda no campo político surgiram no turbulento período da Revolução Francesa de 1789. Durante os acalorados debates na Assembleia Constituinte a respeito do poder que o rei Luís 16 deveria ter a partir daquele momento, o grupo conservador, favorável à manutenção dos poderes da monarquia, ficaram à direita; enquanto os progressistas ou revolucionários, que defendiam diminuir os poderes do rei, sentaram-se à esquerda. 

Com o passar dos anos, as diferenças entre os grupos evoluíram para outros temas, além dos poderes da monarquia, que pouco tempo depois chegou ao fim. Com a direita em busca de uma república vinculada à Igreja e um Estado com mercado liberal e a esquerda lutando por um Estado laico e regulador na economia. Em alguns países os termos progressistas e reacionários, conservadores e liberais ou democratas e republicanos nomeiam esses espectros políticos opostos. No Brasil, mais de 200 anos depois das discussões na França,  os campos da esquerda e direita, com diversos tons entre os extremos de cada lado, continuam polarizando o debate político. 

A pesquisa “A Cara da Democracia”, para tentar compreender onde cada brasileira está posicionado neste debate, apresentou um questionário no qual os entrevistados deveriam marcar de 1 a 10, sendo 1 o máximo à esquerda e 10 o máximo à direita. 

Imagem: reprodução de O Globo

Entretanto, chama atenção na pesquisa – para além de uma direita sedimentada que convive com algumas opiniões progressistas pontuais – o grande número de brasileiros que acreditam em teorias da conspiração. Apresenta-se como um desafio compreender de que maneira essas bizarras teorias ocuparam o imaginário social, o conjunto de crenças, de parte da população.

É espantoso que 20% dos entrevistados acreditam que a Terra é plana, 21% que a cloroquina cura a covid-19, e 27%  não acreditam que o ser humano pisou na lua. No aspecto “ideológico” das conspirações, os números são ainda maiores,  49% acreditam que a China criou a covid-19 e uma das teorias mais difundidas pelo bolsonarismo, o globalismo (ideia de que  a globalização econômica passou a ser controlada pelo “marxismo cultural”), é acolhida por 44% dos entrevistados, que acreditam em uma conspiração global da esquerda para tomar o poder no mundo. O falecido guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho e o ex chanceler Ernesto Araújo difundiram o globalismo incansavelmente. 

Imagem: reprodução de O Globo

Como explica a jornalista e doutora em Ciências da Comunicação Magali Cunha, em seu artigo O lugar das mídias no processo de construção imaginária do “inimigo” no caso Marco Feliciano, “os seres humanos vivem de imagens, vivem de imaginação socialmente construída, o que forma e reforma suas crenças, sua linguagem e suas atitudes frente às demandas da vida e do outro”. 

Desta maneira, “o imaginário é, portanto, um componente da existência humana como experiência marcadamente social, que dá sentido à vida coletiva e é ressignificado por ela. Imaginário é a elaboração coletiva da coleção de imagens formada pelo ser humano, de tudo o que ele apreende visualmente e experencialmente do mundo.” 

O cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Leonardo Avritzer, afirma que Bolsonaro adota uma tática para (des)governar que está relacionada à ampla base constituída nas redes sociais e degrada as instituições a partir de uma rede impressionante de geração de fake news.   Especificamente a respeito da pesquisa “A Cara da Democracia” e número de brasileiros que acreditam em teorias da conspiração, Leonardo Avritzer destaca que há os dois caminhos para entender a adesão de brasileiros aos apelos conspiratórios: “Há, primeiramente, o nível baixo de escolaridade, especialmente em questões como se a terra é plana. Em outros temas, há um amplo processo de desinformação nas redes sociais, especialmente quando recebem informações das estruturas de confiança delas, como instituições religiosas, família, ou local de trabalho. 

Na campanha eleitoral de 2018, Jair Messias Bolsonaro reuniu os discursos conservador tradicional, neoliberal, populista e religioso em uma nova combinação e elaborou uma retórica sem precedentes no Brasil. Tal rearticulação discursiva materializa um projeto hegemônico para a constituição de uma nova base e agenda política, liberal na economia e conservadora nos costumes, que é uma das facetas de um projeto político mais amplo de reestruturação da hegemonia do bloco centrado na elite econômica e financeira do país em novas condições. 

De acordo com o sociólogo Jessé Souza, “distorcer o mundo social é parte do projeto das classes dominantes para subjugar os demais segmentos da sociedade e se apropriar da riqueza nacional e só a percepção adequada da dimensão cultural e simbólica da vida social nos permite uma compreensão mais profunda e verdadeira da vida que levamos como indivíduos”.  No Brasil de Bolsonaro, as pautas morais e o inimigo comunista alimentam o imaginário de grande parte da população. As mídias sociais são o caminho.

“Engenheiros do Caos”

Na obra “Os Engenheiros do Caos: Como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições, Giuliano da Empoli (2019) refaz os caminhos percorridos por figuras como Gianroberto Casaleggio _ cofundador do partido italiano Movimento Cinco Estrelas e um dos primeiros a utilizar a internet e as redes sociais para fazer política, Steve Bannon – guru de Donald Trump e um dos principais nomes da ultradireita no mundo, Milo Yiannopoulos – comunicador e “blogueiro” inglês, apoiador convicto da “liberdade de expressão” e crítico feroz do “politicamente correto” e Arthur Finkelstein – conselheiro de Viktor Orban, presidente ultraconservador da Hungria, que juntos “estão em vias de reinventar uma propaganda adaptada à era das selfies e das redes sociais, e, como consequência, transformar a própria natureza do jogo democrático”. Esses são os Engenheiros do Caos. 

O engajamento técnico: curtidas, comentários e compartilhamentos, tão buscados pelos executivos de marketing e publicidade das grandes empresas, é também o objetivo desses “profissionais” da esfera pública digital. Assim, colocam os algoritmos das redes sociais digitais ao seu favor, pois se os programadores do Facebook ou Instagram, por exemplo, trabalham para atrair e prender a atenção dos usuários pelo maior tempo possível, os algoritmos e ferramentas dos Engenheiros do Caos têm a mesma finalidade, capturar a razão dos indivíduos, neste caso, através da emoção, com iniciativas como o projeto Brasil Paralelo, produtora de conteúdo de extrema-direita, inspirado nas ideias de figuras como Olavo de Carvalho. Buscam “recontar” a História do Brasil,  e as teorias da conspiração são a matéria prima de suas produções e documentários. Um projeto que à primeira vista pode parecer independente e feito por alguns jovens conservadores com “uma ideia na cabeça”, é parte de um movimento bem orquestrado, organizado e muito bem financiado.                          

Não importa se as posições apresentadas são absurdas, mentirosas ou fantasiosas, pois estão pautadas em uma questão numérica de engajamento e não são baseadas em valores éticos. A meta é identificar e hackear as aspirações e os temores dos usuários das mídias sociais digitais e fazer com que interajam com outros que defendem as mesmas posições e com as páginas ou perfis que apresentam estes conteúdos.

Magali Cunha explica que exércitos precisam de inimigos e a Teologia de um Deus guerreiro e belicoso sempre esteve presente na formação fundamentalista dos evangélicos brasileiros, compondo o seu imaginário e criando a necessidade de identificação de inimigos a serem combatidos, através dos tempos estes inimigos foram, em maior ou menor grau, a Igreja Católica, as religiões afro-brasileiras, os comunistas e mais recentemente, a população LGBTQIA+. Parte das estratégias no quadro das disputas político-ideológicas baseadas no enfrentamento de inimigos estabelecidos simbolicamente é criar uma “guerra” pela visibilidade, que comumente envolve números e exposição nas mídias. 

As consequências na política nacional

 Jair Bolsonaro e os seus próprios Engenheiros do Caos deram ainda uma nova roupagem a esse discurso, unindo a ameaça aos valores tradicionais da família e da ameaça comunista. Esses temas não são novos, mas a utilização das redes sociais digitais é a novidade.

Jessé Souza afirma que “colonizar o espírito e as ideias de alguém é o primeiro passo para controlar seu corpo e seu bolso”.  De nada adianta os Engenheiros do Caos proclamarem as virtudes do governo atual e demonizar os governos de esquerda se ninguém acreditar nisso. E essa lavagem cerebral, ou melhor, privação sensorial, é turbinada pelas notícias falsas, teorias da conspiração, manipulação de dados e desinformação, turbinados pelas mídias sociais digitais e legitimadas por políticos, religiosos e influenciadores digitais. Algumas vezes, um indivíduo representa tudo isso, como o pastor presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia. 

Nessa bolha sinistra que comporta as mais inusitadas ideias e conspirações, os indivíduos em busca de acolhimento, reconhecimento e alguma explicação para seus anseios, parecem cada vez mais presos e hipnotizados. As teorias da conspiração, preconceitos e ódio sempre estiveram entre nós, no entanto, as redes sociais digitais conectaram pessoas com interesses em comum, inclusive os mais negativos. Os Engenheiros do Caos perceberam este poder das mídias sociais digitais e a utilizaram para manipulação da informação com fins políticos. 

Derrotar Jair Bolsonaro é, para muitos analistas, fundamental para estancar esse processo do que podemos chamar de privação sensorial. Temos o componente religioso e conservador, um grande número de evangélicos e católicos representados por líderes políticos e influenciadores digitais nada cristãos, além de um grande contingente, independentemente de classe social ou nível de escolaridade, que lê cada vez menos, escreve cada vez menos, interpreta cada vez menos e tem nas mídias sociais digitais sua única fonte de informação. 

Contudo, mesmo derrotando o atual presidente nas urnas, esse grupo extremista e seus métodos continuarão em atuação na esfera pública, buscando provocar uma ruptura no sistema democrático. Estes seres não estão mais nas sombras, são métodos e táticas são debatidos em artigos, livros e documentários, mas como um espectro sinistro, são difíceis de abalar ou capturar.

Imagem de capa: Gerd Altmann por Pixabay

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