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O site de notícias Gospel Mais publicou, em 20 de junho, matéria intitulada: “Evangélicos rejeitam união gay em espaço de eventos e são condenados”. A informação provocou reações divergentes entre leitores, sobretudo os evangélicos.
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Segundo a matéria, uma empresa localizada na cidade de Campinas (SP) teria sido processada por um casal homoafetivo por rejeitar sediar o evento de união homoafetiva. Os proprietários, evangélicos, teriam alegado também que a recepção seria contrária aos princípios filosóficos e religiosos da família do dono do local, o que poderia ser caracterizado ato discriminatório.
A questão foi levada à 1ª Vara do Juizado Especial Cível de Campinas, que decidiu condenar os responsáveis à frente do estabelecimento, impondo ainda o pagamento de indenização.
A publicação ainda apontou que o casal “repetiu uma estratégia que é usada por ativistas LGBT nos Estados Unidos, e processaram os proprietários, como no caso do confeiteiro Jack Phillips, que já foi processado três vezes por recusar produzir bolos para cerimônias de união entre pessoas do mesmo sexo”.
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Outros sites também noticiaram o caso, como o portal R7.
De acordo com informações do portal Conjur , a juíza Thais Migliorança Munhoz, à frente do caso, afirmou, na sentença, que levou em conta as circunstâncias da causa, o grau de culpa e a condição socioeconômica do autor da ação para estipular o valor da indenização por danos morais em R$ 28 mil.
Entenda a sentença
A sentença foi liberada nos autos em 20 de maio de 2020, a juíza citou, entre outros, o Código de Defesa do Consumidor, o Código Civil e a Carta Magna.
“O nó górdio da presente reside sobre a necessidade de se apurar se a recusa da empresa requerida em recepcionar o casamento dos autores, sob argumento de que iria de encontro aos princípios filosóficos e religiosos do proprietário e sua família, caracteriza ato discriminatório e, por conseguinte, merece reparação civil. Pois bem. A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe, em seu artigo 5º, caput, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O artigo 3º, inciso IV, da Carta Magna, prescreve, ainda, que constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
Afirma ainda:
“A reprovação do ato de recusa do requerido em recepcionar o casamento homoafetivo dos autores mostra-se adequada para se alcançar o fim almejado, qual seja a salvaguarda de uma sociedade pluralista, onde reine a tolerância. Assegura-se a posição do Estado, no sentido de defender os fundamentos da dignidade da pessoa humana (artigo 1°, III da Constituição Federal), do pluralismo político (artigo 1°, V, CF), o princípio do repúdio ao terrorismo e ao racismo, que rege o Brasil nas suas relações internacionais (artigo 4°, VIII), e a norma constitucional que estabelece ser o racismo um crime imprescritível”,
Para a juíza, não se contesta a proteção conferida constitucionalmente à liberdade de crença e de expressão do dono da empresa de Campinas. “Todavia, é inegável que essa liberdade não pode alcançar o campo da discriminação e da homofobia. Há inúmeros outros bens jurídicos de base constitucional que estariam sacrificados na hipótese de se dar uma amplitude absoluta, intangível, à liberdade de expressão, de consciência e crença etc., na espécie”, afirma na sentença.
Dessa forma, a juíza entende que a condenação da empresa é necessária para salvaguardar uma sociedade pluralista, em que reine a tolerância, sob o pressuposto de ausência de outro meio menos gravoso e igualmente eficaz para tanto.
Ressalta que a Lei 7.716/89 estabelece que são puníveis os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, sendo vedada a recusa ou impedimento de acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador (artigo 1º e 5º).
E lembra que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), recentemente, entendeu pelo enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989) até que o Congresso Nacional edite lei sobre o tema. O caso foi julgado na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 e no Mandado de Injunção (MI) 4733.
A magistrada também cita parte da ementa do julgamento da ADI 4.277, de relatoria do ministro Ayres Britto, em maio de 2011, que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar.
Por fim, ela julga ilícita a conduta da empresa em se negar a recepcionar o casamento homoafetivo, sob argumento de incompatibilidade com a política de atuação instituída dentro de convicções filosóficas e religiosas. Segundo a juíza, estão presentes todos os elementos ensejadores da responsabilidade civil: “ação ou omissão do agente (falha na prestação dos serviços, deixando de cumprir o pactuado); dano (ofensa íntima ao autor em evento de extrema importância pessoal); nexo de causalidade e culpa”.
Discussões se estendem desde maio
A notícia, que veio novamente à tona em junho, já havia sido publicada em outros sites a partir do dia 22 de maio. No site paulopes.com.br, destinado a fatos sobre religião, ateísmo e ciências, em entrevista, Wilson Lima Barreto, responsável pela casa de eventos, disse que o empreendimento é familiar e cristão, estando registrado no nome de um dos filhos. Em sua defesa, a casa citou, nos autos, a sentença da Suprema Corte dos Estados Unidos que inocentou um confeiteiro que recusou pedido de um bolo de casamento de um casal gay, garantindo ao profissional o direito de crença.
De acordo com a matéria, na Suprema Corte, a multa foi derrubada porque, segundo entenderam os julgadores, a comissão que aplicou a multa violou o dever do Estado sob a Primeira Emenda de não basear leis ou regulamentos na hostilidade a um culto ou ponto de vista religioso. Isto porque um dos membros da comissão havia feito comentários “hostis” em relação à religião. Ou seja, a Suprema Corte não adentrou ao mérito da questão, e deu ganho de causa ao confeiteiro por uma questão processual.
Por outro lado, a advogada do casal afirma que “homofobia é uma violação do direito humano fundamental de liberdade de expressão da singularidade humana, revelando-se um comportamento discriminatório” e que “a negativa de locar o espaço aos requerentes pelo simples fato de serem um casal homoafetivo já constitui homofobia”.
Wilson Barreto afirmou durante o processo que “a gente trabalha só em família e todos nós somos evangélicos, está lá pra qualquer um ver. Dessa forma, falamos para eles procurarem outro lugar, porque não iria ficar bom se fizéssemos”.
A empresa ainda apontou que “não impede homossexuais de visitar suas instalações ou realizarem qualquer outro tipo de evento (confraternização, aniversário, baile de debutante etc.)”
Em contraponto, a matéria apresenta a fala da advogada do casal homoafetivo, que acusou a prática de homofobia, o que fica confirmado, segundo ela, com “a negativa de locar o espaço aos requerentes pelo simples fato de serem um casal homoafetivo”. Ela considerou também que a partir do momento que a organização se dispõe a locar um espaço ao público, não cabe aos donos distinguir os locatários pela orientação sexual. Ressaltou que o casal se preparava para um dia especial e, ao receber a negativa, tiveram de lidar com a tristeza de serem discriminados pela sua orientação sexual.
Na sentença, a juíza Munhoz argumentou que não está em questão a liberdade de crença e de expressão dos donos do estabelecimento, mas, sim, a preservação de uma sociedade pluralista e, portanto, tolerante.
Na ocasião, o site Jota fez uma cobertura ampla do caso. Logo no primeiro parágrafo, apresenta a fala de um dos contratantes do serviço de buffet:
“Conversei com Wilson, né, que é o proprietário, e você tinha até comentado comigo no telefone, né, quando eu falei para você vir visitar e você falou que viria com ele, no caso comigo no telefone, e eu conversei com ele e ele falou assim que eles aqui no espaço não fecham contratos para celebração de casamento, ou seja, recepção de convidados que seja de pessoas do mesmo sexo, né…”.
A partir daí, a reportagem traz os apontamentos já evidenciados em outros conteúdos, finalizando com a afirmação de que a casa de eventos iria recorrer à decisão e apresentando o número da tramitação no Tribunal de Justiça de São Paulo.
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As abordagens da matéria causaram reações divergentes no Twitter @JotaInfo
Bereia conclui que a matéria publicada no site Gospel Mais é enganosa, pois apresenta um fato ocorrido com abordagem não-informativa, opinativa e tendenciosa, já no título que vitimiza “evangélicos”, apresentados no texto como uma “família”. Também por levar leitores a se revoltarem com uma a “falta de liberdade” da empresa em negar a realização de um evento, o que disfarça a atitude de homofobia, explicitada na sentença da juíza. Ainda, com a classificação da reivindicação do casal homoafetivo, legítima diante da justiça, como “estratégia usada por ativistas LGBT nos Estados Unidos”. Por fim, há na matéria do Gospel Mais a ocultação de informações sobre os direitos garantidos à população LGBTI+ em casos como este.
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Referências da Checagem
JM Notícia– Juíza condena evangélicos por não aceitarem casamento gay em seu espaço de eventos. Disponível em: https://www.jmnoticia.com.br/2020/06/16/juiza-condena-evangelicos-por-nao-aceitarem-casamento-gay-em-seu-espaco-de-eventos/
Paulopes– Eventos Alvorada terá de indenizar gays por negar locação por motivo religioso. Disponível em:https://www.paulopes.com.br/2020/05/homofobia-eventos-alvorado.html#.XvFCrGhKiUk
R7 – Espaço de eventos vai indenizar casal gay após recusar festa. Disponível em: https://noticias.r7.com/sao-paulo/espaco-de-eventos-vai-indenizar-casal-gay-apos-recusar-festa-12062020
JOTA – Casa de eventos deve indenizar casal gay por recusa a celebrar casamento. Disponível em: https://www.jota.info/coberturas-especiais/liberdade-de-expressao/casa-de-eventos-deve-indenizar-casal-gay-por-recusa-a-celebrar-casamento-22052020
Conjur – Processo Digital nº: 1041244-74.2019.8.26.0114. Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/decisao-espaco-eventos.pdf