Mulheres no Jornalismo: Bereia em meio aos desafios e avanços em um cenário de desigualdade

Enquanto a presença feminina no jornalismo avança em algumas frentes, a desigualdade de gênero ainda persiste, especialmente em cargos de liderança. Dados recentes do Reuters Institute for the Study of Journalism, publicados em 2024, revelam que apenas 24% dos editores-chefes em 240 veículos de notícias ao redor do mundo são mulheres, mesmo que, em média, 40% dos jornalistas nesses mercados sejam do sexo feminino. No entanto, iniciativas como o Coletivo Bereia provam que é possível construir um ambiente mais justo e inclusivo, com presença feminina em posições-chave.

A pesquisa do Instituto Reuters, que analisou 12 mercados em cinco continentes, incluindo países como Estados Unidos, Reino Unido, Brasil e Japão, aponta que a desigualdade de gênero no jornalismo é um problema global. Em todos os mercados estudados, a maioria dos editores-chefes são homens, mesmo em países onde as mulheres representam uma parcela significativa dos jornalistas. Por exemplo, no Japão, nenhuma mulher ocupa o cargo de editora-chefe nos veículos analisados, enquanto nos Estados Unidos, o país com a maior representação feminina, menos da metade, apenas 43% dos editores-chefes, são mulheres.

A pesquisa Reuters também destaca que não há correlação entre a igualdade de gênero na sociedade e a representação de mulheres em cargos de liderança no jornalismo. Isso sugere que as barreiras à ascensão das mulheres na indústria de notícias são específicas do setor e não refletem necessariamente as tendências sociais mais amplas.

Bereia: um raro exemplo de equilíbrio e representatividade

Em contraste com esse cenário global, o Coletivo Bereia se destaca como um exemplo positivo de representatividade feminina no jornalismo. Com 19 integrantes, o grupo conta com dez mulheres, representando 52,6% do total. A editoria-geral é ocupada por uma mulher, Magali Cunha, o que já coloca o Bereia à frente de muitos veículos de notícias no mundo, onde a liderança feminina ainda é uma exceção.

Além disso, a Equipe de Checagem do Bereia é majoritariamente feminina, com cinco mulheres em um total de seis integrantes. Essa forte presença feminina na verificação de fatos, área que exige alta assertividade em meio a velocidade da produção de matérias, demonstra que é possível construir equipes diversas, inclusivas e eficientes, mesmo em setores tradicionalmente dominados por homens.

A editora-geral do Bereia Magali Cunha vê a experiência do projeto como uma inspiração: “Como se diz na linguagem da religião cristã, a equidade de gênero na equipe Bereia é um testemunho importante. É uma inspiração para que veículos que, como o Bereia, que defendem o direto humano à informação digna e coerente com os valores da justiça, honrem sua vocação na forma como desenvolvem o trabalho”, afirma a jornalista.

Quem são as mulheres que fazem o Bereia

O Bereia é formado por um coletivo de mulheres talentosas, formadas em diversas áreas do conhecimento, unidas pela paixão pelo jornalismo e pela missão de levar mais verdade nos ambientes religiosos. Conheça um pouco mais sobre elas:

Representatividade é também qualidade

A presença de mulheres em cargos de liderança e em equipes técnicas não é apenas uma questão de igualdade, mas também de qualidade do jornalismo. O estudo intitulado “The Impact of Sexual Harassment on Job Satisfaction in Newsrooms” (O Impacto do Assédio Sexual na Satisfação no Trabalho em Redações), da Universidade de Londres, publicado em 2023, demonstra que a diversidade de gênero nas redações contribui para uma cobertura mais abrangente e sensível a questões que afetam as mulheres e outros grupos sub-representados. 

No caso do Bereia, a forte presença feminina na equipe de checagem pode trazer perspectivas únicas e necessárias para a análise de informações, especialmente em um contexto onde a desinformação afeta desproporcionalmente as mulheres.

Referências:

Blumell, L., Mulupi, D. & Arafat, R. (2023). The Impact of Sexual Harassment on Job Satisfaction in Newsrooms. Journalism Practice, pp. 1-20. doi: 10.1080/17512786.2023.2227613 Disponível em https://openaccess.city.ac.uk/id/eprint/30825/1/The%20Impact%20of%20Sexual%20Harassment%20on%20Job%20Satisfaction%20in%20Newsrooms.pdf 

Intervozes

https://intervozes.org.br/publicacoes/desinformacao-direitos-humanos-contribuicao-onu/#:~:text=Al%C3%A9m%20disso%2C%20a%20desinforma%C3%A7%C3%A3o%20afeta,em%20pa%C3%ADses%20como%20o%20Brasil.

Balanço Janeiro 2025: Mentiras sobre o Pix como estratégia de oposição política

O ano de 2025 teve início com agitação nas redes digitais sobre o Pix, refletida em matérias da grande imprensa, provocada por viralização de conteúdo que contrapôs medida anunciada pela Receita Federal, em 2024, com vigência a partir de 1 de janeiro do novo ano.

A Instrução Normativa 2.219/2024, da Receita Federal, publicada no Diário Oficial da União, em 18 de setembro de 2024, dispunha sobre “a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras de interesse da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil na e-Financeira”. A medida ampliava o monitoramento de transações financeiras no país, que alcançava apenas instituições financeiras tradicionais, como bancos e cooperativas de crédito, com a obrigação de prestar essas informações.

Com a norma, que vigoraria a partir de 1 de janeiro de 2025, transações via Pix e cartões de crédito, acima de R$ 5 mil para pessoas físicas e de R$ 15 mil para empresas, passariam a também ser reportadas por administradoras de cartão de crédito, bancos digitais e instituições de pagamento à Receita Federal. O órgão afirmou em nota que o objetivo era reforçar o combate à evasão fiscal e a promoção da transparência. Foi enfatizado, ainda, que a medida estaria alinhada aos compromissos internacionais do Brasil, para aumentar o controle sobre operações financeiras e facilitar a fiscalização.

A agitação com consequências

A agitação em torno da medida da Receita Federal foi promovida por dois parlamentares evangélicos de Minas Gerais nas redes: o senador Cleitinho (Republicanos) e o deputado federal Nikolas Ferreira (PL). Dias depois de iniciado o período de aplicação da nova norma, em 6 de janeiro de 2025, Cleitinho publicou um vídeo em seus perfis de mídias sociais com a legenda “Urgente! Governo Lula fazendo o povo de palhaço. Receita Federal irá tomar conta dos seus gastos do seu cartão de crédito e pix”.

Imagem: reprodução/Instagram

Com um minuto e meio de duração, em tom alarmista, o vídeo do senador ganhou forte repercussão ao anunciar que a cada seis meses, pessoas comuns, usuárias do Pix, teriam que informar suas operações financeiras ao governo federal. O senador assumiu o papel de “defensor” dos usuários do Pix e fez uma série de novas postagens sobre o tema, diante da repercussão do alarme, incluindo o anúncio de autoria de um “Decreto Legislativo para impedir o monitoramento do Pix”.

Em curto tempo, outros políticos e influenciadores digitais alinhados à direita política passaram a repercutir a ideia que passou a ser ampliada com outra, a de que o Pix seria taxado pelo governo federal.

O ápice da disseminação de desinformação baseada em pânico ocorreu em 14 de janeiro, quando foi lançado nas redes digitais um vídeo do deputado Nikolas Ferreira. Com o mesmo tom alarmista, no discurso verbal e visual, o deputado afirmou “o governo quer saber como você ganha R$ 5 mil” e fez uso da mentira sobre a taxação do Pix, mantendo-a viva com a frase: “Não, o Pix não será taxado, mas é bom lembrar que a comprinha da China não seria taxada. Não ia ter sigilo, mas teve. Você ia ser isento do Imposto de Renda, não vai mais. Ia ter picanha, não teve. O Pix não será taxado, mas não duvido que possa ser”. O deputado ainda afirmou que o “governo quer tratar os trabalhadores informais como sonegadores”. Em 16 de janeiro a publicação no Instagram ultrapassou a marca de 275 milhões de visualizações.

Imagem: reprodução/Instagram

Nikolas Ferreira também foi publicado na rede X, com versão com legendas em inglês, e chamada em que marca Elon Musk, proprietário da rede.

Imagens: reprodução/X

Os vídeos de Nikolas Ferreira seguem nas duas redes e continuam com milhões de visualizações.

Líderes e veículos religiosos repercutiram amplamente a desinformação e o tom de pânico que a embasou. O missionário R. R. Soares, foi um dos que fez uso de espaços religiosos para ampliar a disseminação das falsidades. No programa Show da Fé, em horário de TV pago na Rede Bandeirantes, que foi ao ar em 13 de janeiro, gravado com a presença de centenas de fiéis da Igreja Internacional da Graça, no momento em que pedia ofertas, Soares afirmou: “Está acontecendo uma campanha contra o pix, só porque a pessoa ajuda um parente, um amigo e é de graça, já querem cobrar imposto. Eles cobram imposto de tudo da gente. É uma maldade que querem fazer”. O missionário ainda fez um apelo público ao governo federal para que desse “um basta” na taxação do Pix. Matérias sobre o caso foram publicadas pela Folha de S. Paulo e pelo jornal O Globo.

O site evangélico de notícias Pleno.News deu espaço aos pronunciamentos de políticos com identidade religiosa com base nas falsidades, mesmo quando já circulavam amplos desmentidos oficiais e por parte de mídias noticiosas, um deles publicado pelo próprio veículo.

Imagens: reprodução/Pleno.News

Ações de comunicação do governo federal foram realizadas para confrontar as falsidades sobre a normativa da Receita e a grande imprensa também agiu com veiculação de informações corretas sobre as novas regras. A Federação de Bancos do Brasil (Febraban) e a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP) também divulgaram notas com desmentidos de que a normativa não afeta usuários de Pix e de cartões de crédito. “Os clientes que utilizam o Pix para pagamentos e transferências não precisam tomar qualquer providência, nem passarão a ser cobrados”, divulgaram a organizações.

Influenciadores digitais comprometidos com a informação tiveram papel importante em comunicações de desmentidos, como Gil do Vigor e Nath Finanças que se destacaram nas redes. A deputada federal Erika Hilton (Psol/SP) produziu vídeo, veiculado em 18 de janeiro em seus perfis de mídias sociais, que contrapôs o de Nikolas Ferreira e teve alcance também na casa dos milhões.

Imagem: reprodução/Instagram

Ainda assim, o alcance da enxurrada de material desinformativo em todas as redes digitais nos primeiros quinze dias de janeiro teve efeitos fortes. Houve redução no volume de transações realizadas por Pix, diante da insegurança, em especial em bom número de pequenos comerciantes, que passaram a recusar pagamentos por este sistema e demandar dinheiro em espécie, e houve abusos de outros que passaram a aplicar taxas de até 10% sobre pagamentos por Pix.

Em 15 de janeiro, o Ministério da Economia do Brasil anunciou a revogação do ato normativo que estendeu o monitoramento das transações financeiras. Segundo o ministro Fernando Haddad, o governo editará uma medida provisória (MP) para proibir a cobrança diferenciada por transações em Pix e em dinheiro. Ele explicou que a MP também reforçará princípios garantidos pela Constituição nas transações via Pix, como o sigilo bancário e a não cobrança de impostos nas transferências pela modalidade, além de garantir a gratuidade do Pix para pessoas físicas.

O ministro indicou que, com a edição da MP, nenhum comerciante poderá cobrar preços diferentes entre pagamentos via Pix e em dinheiro, prática detectada como consequência das falsidades disseminadas neste janeiro de 2025. Haddad ainda negou que a revogação do ato seja o reconhecimento da derrota para as fake news. “Pelo contrário. Isso é impedir que esse ato [a instrução normativa] seja usado como justificativa para não votar a MP. Estamos lançando uma medida provisória e queremos que ela seja discutida com sobriedade pelo Congresso Nacional”, justificou.

Criação de caos como estratégia

Um estudo do NetLab da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) oferece compreensão sobre como as mentiras sobre a economia popular, que geraram o caos nas transações via Pix e pânico na população, foram propagadas com ajuda da Meta, empresa proprietária das redes Facebook, Instagram e WhatsApp. A pesquisa mostra como a Meta foi paga para impulsionar a divulgação de anúncios fraudulentos sobre o tema para alcançar um número extenso de usuários.

Além de um vídeo falso em que o ministro da Economia do Brasil Fernando Haddad afirmava que taxaria o Pix, entre 10 e 21 de janeiro de 2025, 1.770 anúncios fraudulentos foram impulsionados no Facebook e no Instagram para promover informações falsas contra programas governamentais, mais golpes e desinformações sobre o Pix (falsa taxa a pagar) e supostos valores a receber. Os anúncios foram pagos por 151 perfis de anunciantes (que podem ser também fraudulentos) e direcionaram os usuários para 85 sites falsos para aplicação de golpes financeiros.

O estudo do Netlab indica: “(1) o número de golpes e fraudes em anúncios da Meta cresceu 35% após a revogação das novas regras pelo governo; e 2) o uso de deepfakes do deputado federal Nikolas Ferreira (PL/MG), protagonista da campanha pela revogação da norma, aumentou 234%”.

Em nota enviada ao veículo Olhar Digital, a Meta afirmou que não permite “atividades que tenham como objetivo enganar, fraudar ou explorar terceiros”. A empresa disse estar sempre aprimorando a sua tecnologia para combater atividades suspeitas, porém, não respondeu qual o destino do dinheiro recebido pelos anúncios fraudulentos.

As postagens com conteúdo falso e enganoso da parte de políticos, influenciadores e outros usuários seguem no ar em todas as plataformas digitais.

Bereia identifica há cerca de um ano, a estratégia de notórios propagadores de desinformação com criação de pânico com falsidades em torno de temas de interesse público com foco na economia. Tais conteúdos circulam amplamente em espaços digitais religiosos. Há várias matérias publicadas pelo Bereia em 2024, como as que trataram da regulamentação do trabalho por aplicativos, do uso dos lucros extraordinários com ações da Petrobrás, do projeto de taxação de offshores, entre outras.

Esta tendência observada pelo Bereia em 2024, foi objeto de matéria do jornal O Globo com o título “Oposição muda a tática: ‘esquece’ agenda de costumes e tenta desgastar governo Lula com pauta econômica”. Tal conteúdo pode ser observado nos conteúdos enganosos circulantes em espaços digitais religiosos, como os acima citados, e em materiais que exploram o pânico com abordagens infundadas, como este publicado em vídeo em setembro passado:

Matéria do jornal O Globo trouxe à tona em 16 de janeiro, após a revogação da medida da Receita Federal sobre a ampliação do monitoramento de movimentações financeiras, que o vídeo de Nikolas Ferreira, peça importante na disseminação de desinformação e pânico na economia popular, foi articulado pelo Partido Liberal (PL). A estratégia para explorar o tema foi traçada pelo marqueteiro responsável pela campanha eleitoral de Jair Bolsonaro à reeleição para presidente da República em 2022, Duda Lima.

Mais informações sobre o caso das mentiras sobre o Pix podem ser acessadas aqui.


Bereia alerta leitores e leitoras, como recorrentemente registra, que é muito importante em uma democracia que haja oposição a governos. Eles precisam ser cobrados, pressionados, o que é saudável em um Estado democrático de direito. Um espaço político sem oposição é um espaço que nega a diversidade de ideias, de opiniões e tende a um regime de exceção. Porém, a oposição deve ser feita de forma digna, ancorada na honestidade e na justiça, em discursos e em ações. O uso de mentiras, falsidades e enganos para contrapor governos e para convencer e ganhar aliados para causas de determinados grupos não é coerente com os princípios de oposição política democrática e deve ser denunciado, bem como seus agentes.

Referências de checagem:

Receita Federal.

http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=140539 Acesso em: 11 fev 2025.

https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/receita-atualiza-regras-da-e-financeira-e-amplia-obrigatoriedade-para-novas-entidades Acesso em: 11 fev 2025.

Folha de S. Paulo. https://f5.folha.uol.com.br/colunistas/outro-canal/2025/01/rr-soares-usa-horario-comprado-na-band-para-espalhar-noticia-falsa-sobre-pix.shtml Acesso em: 11 fev 2025.

O Globo.

https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/01/14/pastor-rr-soares-difunde-fake-news-sobre-o-pix-ao-pedir-doacao-a-fieis-na-tv-cobram-imposto-de-tudo-video.ghtml Acesso em: 11 fev 2025.

https://oglobo.globo.com/blogs/sonar-a-escuta-das-redes/noticia/2025/02/09/oposicao-muda-a-tatica-esquece-agenda-de-costumes-e-tenta-desgastar-governo-lula-com-pauta-economica.ghtml Acesso em: 11 fev 2025.

https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/01/16/video-de-nikolas-fez-parte-de-acao-coordenada-de-marqueteiro-de-bolsonaro-sobre-pix.ghtml Acesso em: 11 fev 2025.

Netlab/UFRJ. https://netlab.eco.ufrj.br/post/danos-causados-pela-publicidade-enganosa-na-meta Acesso em: 11 fev 2025.

Febraban. https://portal.febraban.org.br/noticia/4246/pt-br/ Acesso em: 11 fev 2025.

Fecomércio. https://www.fecomercio.com.br/noticia/medida-provisoria-reforca-seguranca-do-pix-e-encerra-fake-news-sobre-cobranca Acesso em: 11 fev 2025.

ICL Notícias. https://iclnoticias.com.br/fake-news-pix-influenciadores-no-debate-publico/ Acesso em: 11 fev 2025.

Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2025-01/receita-revoga-ato-normativo-que-previa-fiscalizacao-do-pix Acesso em: 11 fev 2025.

Olhar Digital. https://olhardigital.com.br/2025/02/07/pro/meta-foi-paga-para-divulgar-fake-news-sobre-pix-diz-estudo/ Acesso em: 11 fev 2025.

Bereia.

https://coletivobereia.com.br/deputado-evangelico-publica-falsidade-sobre-a-regulamentacao-do-trabalho-por-aplicativos/ Acesso em: 11 fev 2025.

https://coletivobereia.com.br/deputada-catolica-dissemina-enganos-sobre-uso-dos-lucros-extraordinarios-com-acoes-da-petrobras-pelo-governo/ Acesso em: 11 fev 2025.

https://coletivobereia.com.br/deputado-catolico-mente-sobre-projeto-de-lei-de-taxacao-de-offshores/ Acesso em: 11 fev 2025.

Instagram. https://www.instagram.com/reel/DF5f1GYRI06/?igsh=MWhja2h1bDRzOXlmcw%3D%3D Acesso em: 11 fev 2025.

Com dados do Bereia, reportagem de ‘O Globo’ destaca perfil religioso de candidatos a prefeito nas capitais brasileiras

Levantamento feito pelo Bereia sobre os candidatos a prefeito das 26 capitais brasileiras nas eleições de 2024 revelou que 43% se dizem cristãos. Dos 192 postulantes, 83 estão vinculados à fé. Esses e outros números fazem parte de reportagem publicada no jornal carioca “O Globo” em 27 de agosto.

A matéria destacou ainda, com base nas informações de Bereia, que 55% dos candidatos desse grupo são católicos, 19% evangélicos e 25% não especificam a qual igreja estão vinculados. Sob o ponto de vista ideológico, 41 (49%) pertencem a partidos de direita e 21 (25%) estão ao centro do espectro político.

A editora-geral do coletivo Magali Cunha destacou a importância do trabalho de fact-checking focado no universo religioso realizado por Bereia. “Somos hoje a única iniciativa no Brasil que se volta para analisar a desinformação no ambiente religioso digital, e nos juntamos a diversos outros projetos que, em diferentes áreas, combatem também conteúdos falsos, enganosos e imprecisos disseminados nas mídias sociais”.

Vínculo nas igrejas

As checagens feitas pelo coletivo ao longo do tempo – Bereia foi fundado em 2019 – vêm mostrando que o apelo à vinculação religiosa é estratégico na busca por votos. No segmento do Cristianismo, há o movimento de candidatos se dizerem cristãos, ainda que não de forma determinada.

“Identificamos pessoas com vínculo nas igrejas, seja católica ou evangélica, mas que se autodeclaram cristãs para ter um trânsito na comunidade”, destacou Magali Cunha.

O jornal carioca destacou a postura, identificada pelo Bereia, do candidato à prefeito de Fortaleza Eduardo Girão (Novo). Apesar de conhecido por sua vinculação ao Kardecismo, passou a se apresentar como cristão nas eleições.

De acordo com a pesquisadora, o tema dos valores cristãos ganhou força especialmente durante o governo de Jair Bolsonaro, por isso é abraçado pelos postulantes.

A íntegra da reportagem está disponível no site do jornal.

Conteúdos analisados por Bereia inspiram produção de documentário sobre ‘narcopentecostalismo’

“Terra prometida, terra conquistada” é o título do documentário dos estudantes de jornalismo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Yago Godoy, Kaio Magalhães e Laura Berg, vencedores do 16º Prêmio Jovem Jornalista 2024, concedido pelo Instituto Vladimir Herzog. Conteúdos disponibilizados pelo Coletivo Bereia forneceram insumos relevantes para pesquisa, roteirização e produção do documentário.

O vídeo aborda uma nova forma de dominação que envolve tráfico, fé, intolerância religiosa e disputa por território, e traz depoimentos de figuras importantes do mundo da religião, como o teólogo Ronilso Pacheco, o babalaô Ivanir dos Santos e a professora Christina Vital, além de pastores e pesquisadores.

Godoy enviou mensagem de agradecimento ao Bereia com destaque para a qualidade das informações obtidas por meio dos conteúdos trabalhados pelo coletivo. “Algumas das análises publicadas [pelo coletivo] serviram como uma base fundamental para questões que discutimos na produção – como o uso do termo ‘narcopentecostalismo’, por exemplo”.

Para a editora-geral do Bereia Magali Cunha, o coletivo também desempenha um papel educacional. As checagens feitas, os conteúdos que dissemina e as pesquisas que realiza para subsidiar o enfrentamento da desinformação constituem um conjunto essencial de saberes.

“É muito gratificante quando tomamos conhecimento de que nossos esforços e nossas investigações resultam em produções relevantes e necessárias como a do documentário ‘Terra prometida, terra conquistada’”, comentou ela.

A íntegra do documentário está disponível no YouTube.

Cultura digital desafia a educação teológica, diz editora-geral do Bereia

O que significa para a vida das pessoas a cultura digital e quais são os desafios que ela impõe às igrejas, à teologia cristã e à pastoral? Essa foi a tônica da palestra da editora-geral do Bereia Magali Cunha durante o Simpósio ASTE 2024 que ocorreu em 11 e 12 de dezembro em formato virtual, organizado pela Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE).

A pesquisadora destacou que os inúmeros recursos tecnológicos cada vez mais disponíveis estão decretando um cenário em que nada será como antes. Ela apontou que a cultura digital contribui de maneira significativa no cotidiano das pessoas, “tornando possível maior aproximação de pessoas e, delas, a produções informativas, educacionais e culturais, de diferentes partes do mundo”. E lembrou que esses benefícios alcançam também áreas de saúde, meio ambiente, educação e produção de bens e serviços.

Magali Cunha, porém, chamou a atenção para os perigos dessa era digital. Se, por um lado, as mídias digitais aproximam pessoas e favorece a superação de isolamentos sociais – ainda que também os criem –, por outro, afetam as relações sociais, a existência e a coexistência, muitas vezes estabelecendo um clima de ódio e intolerância.

“Muitos que não têm uma arma nas mãos para desferir contra desafetos, inimigos, acabam recorrendo a palavras e imagens como armas, usando a tecnologia para atacar, ofender, agredir”, critica, acrescentando que “por trás de uma tela, pessoas e grupos passaram destruir outras: calúnia, agressões verbais, ameaças”.

A editora-geral do Bereia lembrou que a disseminação da desinformação é outro componente desafiador. Segundo ela, as fake news ameaçam instituições, destroem reputações e põem em risco a democracia. E alerta: grupos cristãos parecem ser os mais inclinados a propagá-las.

“Cristãos estão propensos não só a assimilar as notícias e ideias mentirosas que circulam pela internet, coerentes com suas crenças, como também a fazer a propagação, uma espécie de ‘evangelização’, espalhando notícias e ideias a fim de converter pessoas ao mesmo propósito”.

Magali Cunha citou pesquisa desenvolvida pelo Instituto Nutes de Educação em Ciências e Saúde, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, cujo objetivo foi compreender como grupos religiosos se apropriam de modo intenso do WhatsApp e fortalecem redes de desinformação.

Segundo ela, o estudo concluiu que “a desinformação circula facilmente no segmento religioso da população não só porque se adequa mais a crenças e valores e menos a fatos propriamente ditos, mas porque elementos relacionados à prática da religião terminam por interferir mais fortemente na propagação de desinformação”.

Desafios

Magali Cunha aponta que no contexto da era digital a educação teológica precisa “trabalhar por processos críticos, educativos e humanizadores” na formação de pastores, teólogos e lideranças. Em sua opinião, isso passa pelo oferecimento de uma educação midiática digital, pela ênfase e recuperação da cultura do diálogo e pela ética do pastorado, da liderança cristã e da postura teológica “para que haja atitudes compatíveis na ocupação das mídias digitais”, como não ser fonte de desinformação, não estimular polarizações nem promover o ódio.

A íntegra da palestra está disponível no YouTube.

Bereia participa de mesa-redonda sobre mitigação da desinformação

Como é possível enfrentar a desinformação, que provoca efeitos danosos à sociedade? Essa foi a tônica da mesa-redonda promovida pela Rede Brasileira de Jornalistas e Comunicadores de Ciência (RedeComCiência) realizada em 10 de dezembro e que teve a participação da editora-geral do Bereia Magali Cunha.

O debate fez parte da programação que marcou os cinco anos da organização e tratou do papel das associações de ciência, da checagem de fatos, da relação entre religião e ciência e da percepção pública de ciência.

Em sua apresentação, Magali Cunha destacou a importância do evento e lembrou que o Coletivo Bereia nasceu no contexto de uma pesquisa científica realizada no Instituto Nutes de Educação em Ciências e Saúde, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “O estudo ‘Caminhos da desinformação’ foi o nosso ponto de partida e desde então temos a preocupação de sempre valorizar a pesquisa e ouvir especialistas, além de oferecer um diferencial em relação a outros projetos de checagem, que é dialogar com estudiosos em religião”.

A editora-geral explicou que o Bereia conta em sua equipe com especialistas nessa área e que busca ampliar o leque ao estreitar o contato com pesquisadores de ciências da religião, da sociologia da religião e da antropologia da religião. Há também a participação de pastores e pastoras, biblistas e pessoas que estão imersas no universo religioso, tanto no contexto cristão quanto em outros como Espiritismo e Islã, “que nos auxiliam a qualificar o conteúdo que é checado”.

Ela lembrou que o trabalho de fact-checking feito no coletivo inclui bibliografia científica e outros materiais que balizam aquilo que é analisado para além dos fatos e do caráter meramente informativo.

Preconceito e sensacionalismo

Outra preocupação da pesquisadora se refere ao preconceito e ao sensacionalismo em torno do protagonismo de grupos religiosos no momento atual, especialmente os evangélicos. “Infelizmente isso ocorre dentro do próprio ambiente acadêmico, e representa um grande desafio a ser superado”. Magali Cunha argumentou que há muita precipitação no trato de alguns temas, e dentro da academia não se valoriza o que é desenvolvido cientificamente sobre religião.

A editora-geral do Bereia destacou ainda que, além dos ambientes digitais religiosos, o trabalho do coletivo alcança a grande mídia, identificando seus equívocos, incorreções, exageros e o credenciamento de personagens do mundo religioso como se fossem porta-vozes da religião.

A intolerância religiosa é um problema grave no Brasil. O que fazer?

A intolerância religiosa é um problema estrutural que afeta profundamente a sociedade brasileira e aponta para desigualdades históricas e sociais. De janeiro a junho de 2024, o Brasil registrou um aumento alarmante nos casos de intolerância religiosa. O Disque 100, canal de denúncias do Ministério dos Direitos Humanos, contabilizou 1.227 ocorrências no primeiro semestre, um salto de mais de 80% em comparação ao mesmo período de 2023, quando foram registradas 681 denúncias. Esse número já representa quase o total de registros de todo o ano passado (1.482), com a média preocupante de quase sete casos por dia.

As denúncias refletem um padrão recorrente de vítimas: a maioria é composta por mulheres e pessoas negras. Dos casos registrados no primeiro semestre de 2024:

  • 60,5% das vítimas eram mulheres;
  • 32,4% eram homens;
  • 0,24% eram intersexo;
  • 6,84% não informaram ou não declararam o gênero.


As raízes do problema

A origem do problema está diretamente ligada ao período colonial e ao processo de colonização europeia, particularmente no contexto das Américas e do Brasil, de acordo com a análise da pesquisadora do ISER Carolina Rocha. Durante esse período, as populações africanas escravizadas e suas práticas culturais e religiosas foram hierarquizadas e inferiorizadas em relação aos valores europeus, predominantemente cristãos.

No verbete “Racismo Religioso”, a pesquisadora explica que a Igreja Católica Apostólica Romana desempenhou um papel crucial nesse processo, ao demonizar e criminalizar as práticas religiosas de matriz africana, associando-as à bruxaria e à idolatria. Esse enquadramento religioso e cultural serviu para justificar a exploração econômica, a violência e a desumanização das pessoas negras. 

Contudo, o termo “racismo religioso” ainda é objeto de construção e debate acadêmico. Pesquisadores como Carolina Rocha destacam que, embora a expressão seja frequentemente usada para descrever o preconceito e a violência direcionados contra adeptos de religiões de matriz africana, é preciso um esforço maior na produção de conhecimento sobre este conceito.

O fato é que mesmo com a formalização da liberdade religiosa na Constituição de 1891, as religiões afro-brasileiras continuam enfrentando perseguição e preconceito, muitas vezes intensificados por discursos de ódio promovidos por setores religiosos hegemônicos no país.

Outros grupos religiosos também sofrem com a intolerância

Embora as religiões de matriz africana sejam as mais afetadas, outros grupos também sofrem. Islâmicos, especialmente mulheres muçulmanas, frequentemente enfrentam agressões físicas e verbais. Judeus e sinagogas são alvos de atos de vandalismo e discursos antissemitas. Cristãos evangélicos, por sua vez, lidam com generalizações que os desqualificam como “alienados”, “ignorantes”, e os associam exclusivamente a práticas ultraconservadoras e charlatanismo, desconsiderando a diversidade interna do segmento e sua contribuição histórica para ações sociais e a defesa dos direitos humanos. Católicos também sofrem com a profanação de templos e imagens sagradas, muitas vezes usados como símbolos de resistência política e cultural.

Nos últimos anos, a intolerância religiosa tem sido intensificada pela instrumentalização política da religião, especialmente por movimentos de extrema-direita. Líderes religiosos de diferentes tradições se aliaram a pautas antidemocráticas, usando a retórica da “liberdade religiosa” para promover exclusivismo e atacar minorias. Este cenário, descrito pela pesquisadora e editora-geral do Bereia Magali Cunha aqui e aqui, representa uma ameaça à pluralidade religiosa e à convivência democrática.

Caminhos para a transformação

O aumento das denúncias é um alerta e, ao mesmo tempo, uma oportunidade para mudanças. Políticas públicas voltadas à educação religiosa e ao respeito à diversidade cultural são essenciais para enfrentar a intolerância.

Datas do calendário cívico ajudam a reforçar o compromisso com a pluralidade, a diversidade e o respeito à liberdade de crença. Em 21 de janeiro, por exemplo, o país chama atenção para o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, oficializado pela Lei n.º 11.635, de 2007, em memória à Mãe Gilda, uma liderança religiosa do Candomblé que foi vítima de perseguição e intolerância religiosa até falecer em decorrência de um infarto, em 2000.

16ª Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, Copacabana. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Outra importante iniciativa é a Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, realizada anualmente no terceiro domingo de setembro na Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Este evento, organizado pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP) e pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), reúne praticantes de diferentes crenças e defensores da diversidade para denunciar casos de intolerância e racismo religioso. Esta ação é realizada em outras cidades do Brasil.

Medidas práticas incluem a criação e o fortalecimento de órgãos especializados, como a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (DECRADI), no Rio de Janeiro, e canais de denúncia, como o Disque 100. Iniciativas como o Observatório Mãe Beata de Iemanjá e a Comissão Parlamentar de Inquérito Contra a Intolerância Religiosa da Alerj   também mostram como políticas públicas voltadas ao monitoramento e denúncias contribuem para o enfrentamento do problema.

Além disso, é fundamental que o ambiente digital também seja monitorado para combater a disseminação de discursos de ódio e desinformação religiosa. Os dados do Observatório Nacional dos Direitos Humanos (ObservaDH) mostram que as denúncias de crimes de intolerância religiosa online triplicaram em seis anos, passando de 1,4 mil em 2017 para 4,2 mil em 2022. Embora o relatório com os dados consolidados de 2023 ainda não tenha sido divulgado,  as tendências dos últimos anos reforçam a relevância das redes sociais digitais como palco de propagação de discursos de ódio.

Por fim, outro ponto significativo é a implementação de campanhas educativas para promover o respeito à liberdade de crença, sobretudo em escolas e espaços religiosos, onde a conscientização pode moldar novas gerações mais tolerantes.

Referências

ISER 


https://religiaoepoder.org.br/artigo/tradicoes-das-raizes-de-matrizes-africanas-e-as-nacoes-do-candomble/


Carta Capital

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Foto de Capa: Tomaz Silva/Agência Brasil

Editora-geral do Bereia discute sobre fundamentalismos, crise da democracia e ameaça aos direitos humanos na América do Sul

Com a participação da editora-geral do Bereia Magali Cunha, a Casa de Leitura Dirce Côrtes Riedel, ligada à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), promoveu em 4 de novembro o Seminário de Altos Estudos “Fundamentalismos, crise da democracia e ameaça aos direitos humanos na América do Sul”. O evento faz parte da programação da instituição que busca incentivar o livro, a leitura e o debate de temas literários e acadêmicos.

Na apresentação de Magali Cunha, ela destacou a forma como o avanço dos fundamentalismos passa a ser um fenômeno social das últimas duas décadas que vai além da dimensão religiosa, adquire um perfil mais diversificado e assume um caráter político, econômico, ambiental e cultural. Conforme comentou, “fundamentalismos precisam ser entendidos não como um rótulo de conservadorismos extremos, mas como uma visão de mundo, uma interpretação da realidade, de uma matriz religiosa, que é recurso discursivo e de posturas também de quem não tem vínculo religioso. Esta visão de mundo orienta ações políticas, que fragilizam os processos democráticos e os direitos, especialmente os sexuais e reprodutivos e os das comunidades tradicionais, também as políticas de valorização da pluralidade”.

Outro aspecto que a pesquisadora chamou à atenção foi que a desinformação, popularmente denominada “fake news”, é estratégia-chave nos discursos dos fundamentalismos, com vistas ao convencimento do público. Segundo sua análise, “esta retórica usa o pânico moral, como é frequentemente checado pela equipe do Bereia, baseado no medo e no uso obrigatório da desinformação, principalmente notícias falsas, uma linguagem que gera identificação popular com padrões reacionários”.

Magali Cunha considera importante que temas como esses façam parte das pautas públicas, bem como de instituições que atuam no enfrentamento dos fundamentalismos e do desrespeito aos direitos humanos. “É preciso que ativistas por direitos nas mais diversas frentes, identifiquem com cuidado o lugar que a religião tem ocupado no cotidiano e na cultura, não apenas na política. É preciso admitir que a religião não cumpre um único papel, mas que seus papéis são plurais, e saber lidar com eles, valorizá-los para a superação dos retrocessos do uso da religião pelos grupos reacionários”, alerta.

Imagem de capa: Michal Jarmoluk / Pixabay

Editora-geral do Bereia defende que futuro do evangelho passa pela valorização do passado e da dimensão comunitária

O futuro do evangelho foi o tema de “Conversas Pastorais”, debate promovido pela Igreja Batista de Água Branca (IBAB) em 31 de outubro na cidade de São Paulo que contou com a participação da editora-geral do Bereia. Participaram também da mesa de conversa o teólogo Ronilso Pacheco, o pastor batista Kenner Terra e o pastor e teólogo Ed René Kivitz, idealizador do evento.

Em sua apresentação, a pesquisadora destacou que não é possível falar de futuro sem se remeter ao passado. Segundo ela, as culturas tradicionais, os povos originários e as tribos africanas estão desafiam constantemente a se entender o que vem antes. “A gente só pode entender quem é se olhar para trás, e só pode entender e falar do futuro se entender o passado e o presente que nos significa hoje”.

Nessa direção, Magali Cunha ressaltou que falar sobre o futuro do Evangelho implica trazer à memória de maneira crítica e também esperançosa aquilo que já ocorreu. Ela fez referência ao período do nazismo, em que o teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer, no trabalho de enfrentamento a esse regime, buscava manter e espalhar esperança em um mundo destruído, e também ao período da ditadura militar, que representou perseguições e o alinhamento religioso.

“Não podemos deixar de olhar o passado, seja de forma crítica, seja de forma profética, dinâmica, esperançosa, pois esse é um grande desafio para refletir sobre o futuro do Evangelho”, acrescentou.

A editora-geral do Bereia também destacou que o futuro do evangelho passa também pela dimensão comunitária, na partilha e na divisão do que se tem. Ao reagir ao comentário do pastor Ed René de que Jesus não trouxe ideias, e sim vivências, Magali Cunha chamou a atenção para o equívoco de se apegar exageradamente à palavra, “como se ele resolvesse tudo”.

“Hoje fala-se e ouve-se muito, mas são poucas as comunidades de partilha, em que as pessoas podem trazer suas vidas, dizer quem são e ter oportunidade de colocar desejos, expectativas e frustrações. Esse é de fato o caminho para a reconstrução”, completou.

A íntegra do debate você encontra no YouTube.

Se Estado é laico, uso da Bíblia em instituições públicas é inconstitucional, defende editora-geral do Bereia

O Estado brasileiro não é confessional, portanto instituições públicas no Brasil não podem professar e propagar preceitos ou símbolos de determinada religião. A opinião é da editora-geral do Bereia Magali Cunha em entrevista ao Jornal GGN em 14 de outubro sobre o uso da Bíblia em escolas públicas.

A pesquisadora destacou a inconstitucionalidade que caracteriza essa conduta. Segundo lembrou, o fato de o Estado ser laico implica que deve atuar para assegurar que todas as pessoas, independentemente da sua crença religiosa, tenham direito a suas práticas de fé. Muitas religiões não têm a Bíblia como livro sagrado.

Magali Cunha considera que polêmicas como a do uso da Bíblia nas escolas são criadas com a intenção de ser empregadas como ferramenta de engajamento em mídias digitais e de aceno de políticos às suas bases eleitorais. O tema é recorrente, especialmente em períodos de eleições, explica.

“Especialmente quando projetos de lei e leis sancionadas são declarados inconstitucionais em altas cortes por ferirem o princípio constitucional da laicidade do Estado, políticos e as mídias da direita cristã (católica e evangélica, de onde partem tais projetos) criam polêmica, ao acusarem a decisão judicial de “perseguição a cristãos” ou de “negação da Bíblia”, analisa a editora-geral do Bereia.

Confira a íntegra da reportagem.

Imagem de capa: Παῦλος / Pixabay

Bereia opina sobre influência de pastores entre eleitorado evangélico

Apoio de líderes e pastores arregimentam o voto dos evangélicos? O tema, que divide opiniões, foi pauta de reportagem publicada em 6 de outubro pelo jornal “O Globo” e ouviu estudiosos e pesquisadores, entre eles a editora-chefe do Coletivo Bereia Magali Cunha. Por causa do trabalho de fact-checking, Bereia vem se tornando fonte consistente para assuntos relacionados à mídia e religião.

Para Magali Cunha, há pelo menos três décadas a ideia de que pastores direcionam o voto dos fiéis não faz mais sentido. Isso se deve àquilo que a pesquisadora trata como “modo de ser” evangélico, além do fato de que não é correta a referência ao voto evangélico.

“Não há um eleitor apenas evangélico; as pessoas são também mães solteiras, motoristas de aplicativo, moradores da periferia”.

A editora-geral do Bereia citou o exemplo de Pablo Marçal, que apresenta um discurso religioso, mas que também estimula o empreendedorismo e a conquista de sucesso individual. Esse tipo de estratégia, segundo ela, “consegue tocar em desejos e expectativas de pessoas que, antes de serem evangélicas, desejam viver com mais conforto e ganho financeiro”. E acrescentou: “falar em prosperidade é teológico para parte dos fiéis, mas também é algo mais amplo”.

Bereia na mídia

O Bereia, que completa cinco anos de fundação em 2024, vem se tornando referência para o jornalismo das grandes mídias e de outros projetos, como Agência Brasil (do governo federal), Agência Lupa, O Globo e Agência Pública. Além disso, há o uso de checagens produzidas pelo Bereia em matérias publicadas (O Globo, O Estado de S. Paulo, Projeto Comprova). De julho de 2023 a outubro de 2024, por exemplo, houve 22 participações em espaços jornalísticos de grande alcance por meio de menções em matérias, entrevistas destacadas com a editora-geral, reprodução de conteúdo produzido com destaque em reportagens.

A íntegra da reportagem de “O Globo” está disponível no site do jornal.

Imagem de capa: Claudio Henrique Claudio / Pixabay

Cristofobia não existe no Brasil, aponta editora-geral do Bereia

Cristofobia, termo que define a perseguição sistemática a cristãos, não existe no Brasil, defendeu a editora-geral do Bereia Magali Cunha durante entrevista ao SIMPodCRER em 29 de outubro.

De acordo com a pesquisadora, pode haver episódios isolados que caracterizam essa condição, mas não algo sistemático e constante. “Se há perseguição religiosa sistemática e histórica, não é contra os cristãos, mas contra as religiões de matriz africana”, comentou.

Na sua opinião, há certa confusão entre a liberdade de expressão – “que devemos defender sempre” – e o abuso dessa liberdade. Por isso, ela defende a necessidade de se identificar até onde vai a liberdade sem que interfira na do outro e onde estão as leis e regras de convivência. “Existem pessoas que desejam falar livremente, desrespeitando leis, a Constituição, e quando são confrontadas afirmam que são perseguidas”, comentou Magali Cunha.

Sua participação no canal evangélico de podcast, cujo programa discutiu o combate à desinformação nas igrejas, coincidiu com a celebração de cinco anos do Bereia. Por isso, a editora-geral do coletivo destacou temas que vêm merecendo a atenção da equipe por conta da desinformação que gira em torno deles, como “ideologia de gênero” e questões de saúde, além da cristofobia.

Magali Cunha também chamou atenção ao que pesquisas chamam de ecossistema da desinformação e que esteve presente nos cinco anos de atuação do Bereia. Esse fenômeno está associado, por exemplo, ao fato de que empresas alcançam enormes lucros, pois vão receber benefícios políticos e financeiros da criação e circulação desses conteúdos, e de que há pessoas que trabalham para isso, com a precisão sobre o que e onde divulgar.

Outro ponto tem a ver com a desinformação como estratégia política, segundo indicou a pesquisadora. O que está em jogo é “angariar e manter apoio e conquistar pautas políticas”, apontou. De acordo com Magali Cunha, essa situação foi institucionalizada e vem ganhando destaque nos períodos eleitorais.

A íntegra da entrevista está disponível no YouTube.

Identidade religiosa está muito além do nome de urna utilizado nas eleições, defende editora-geral do Bereia

O nome de urna – aquele escolhido pelo candidato durante a campanha eleitoral – com indicação de título religioso não garante necessariamente vitória a quem o utiliza, pois a identidade está muito além dele. A avaliação foi feita pela editora-geral do Bereia, Magali Cunha, em entrevista à Agência Brasil em 7 de outubro. A reportagem tratou das candidaturas com viés religioso, incluindo aquelas pertencentes a expressões religiosas de matriz africana, além das cristãs (católicas e evangélicas).

A pesquisadora lembrou que nas eleições de 2020 e 2022 essa estratégia não saiu vitoriosa. Quem usa termos religiosos no nome de urna [como pastor/a, bispo/a, apóstolo/a, missionário/a] não é mais eleito do que religiosos que não colocam a identidade no nome”, afirmou.

Magali Cunha chamou a atenção para uma categoria genérica identificada como “cristã” que cresceu nas últimas eleições. Segundo ela, a estratégia é apropriada geralmente por candidatos conservadores, de direita, com o objetivo de se aproximar tanto de católicos quanto de evangélicos.

“Esses candidatos se apresentam como cristãos, e muitos deles têm uma vinculação específica, seja católica ou evangélica, mas não apresentam essa especificidade e querem ser identificados com a fé cristã de forma genérica”. 

A editora-geral do Bereia reforçou que não faz sentido também falar de voto religioso. “Isso não existe”. Magali Cunha defende que, apesar da dimensão religiosa que caracteriza a pessoa, ela também “é trabalhadora, desempregada, mãe, pai, heterossexual, homossexual, jovem ou idosa, e tudo isso compõe sua identidade e vai pesar nas suas decisões”.

Confira a íntegra da reportagem no site da Agência Brasil.

Foto de capa: TRE-CE

Editora-geral do Bereia rechaça ideia de ‘voto evangélico’

A ideia de voto evangélico é um equívoco, assim como se referir aos evangélicos como um grupo homogêneo, declarou a editora-geral do Bereia Magali Cunha em entrevista à revista Comunhão em 10 de outubro. Ela lembrou que a pessoa evangélica não tem sua identidade moldada apenas pela religião, pois há outras perspectivas em jogo e que influenciam o modo como vota.

 “A identidade religiosa vai ajudar a moldar, sim, a sua visão de mundo, mas ela vai decidir a partir daquilo que tem a ver com a sua vida, com aquilo que pensa que vai trazer benefícios para a sua vida, para o seu salário, para a sua casa, para os seus filhos, para a segurança que ela precisa ter, para o cuidado com a saúde”, opinou Magali Cunha.

A pesquisadora alertou também sobre o engano de caracterizar os evangélicos como um segmento único, pois as teologias e as posturas das denominações são distintas, além de as origens serem diferentes. Segundo ela, é necessário usar o termo “evangélico” no plural, pois “são grupos diversos, cada um com a sua forma de governo, com as suas lideranças”.

Isso significa que não faz sentido alguém se identificar como porta-voz dos evangélicos, adverte a editora-geral do Bereia. De acordo com ela, ninguém deve falar em nome dos evangélicos, pois “não há uma estrutura hierarquizada e centralizada”, completou.

Confira a íntegra da entrevista, que trata também de como os evangélicos vêm merecendo atenção no âmbito da política partidária, em especial nos períodos eleitorais. O conteúdo está disponível no site da revista.

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Foto de capa: Brett Sayles/Pexels

Mentira se tornou estratégia deliberada de campanha política, alerta editora-geral do Bereia

A mentira se transformou em estratégia deliberada de campanha política, alertou a editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha durante entrevista ao Jornal GGN em 24 de setembro. O programa conduzido pelo jornalista Luis Nassif tratou das eleições municipais, com especial atenção a episódios de violência verbal e física, bem como da falta de propostas de grande parte dos candidatos.

A pesquisadora lembrou que apesar de a postura de mentir ser algo que sempre existiu no meio político e de que candidatos e políticos fazem promessas que sabidamente não vão ser cumpridas, a novidade está no fato de que tal comportamento é deliberado. “Capturar a atenção das pessoas, construir imagem, ocupar espaço na arena política [com base na mentira, na falsidade, no engano] é algo novo”, comentou.

De acordo com Magali Cunha, esse processo ganhou força em 2016 com o Brexit – movimento promovido na Grã-Bretanha para a retirada da Comunidade Europeia – e no mesmo ano na campanha de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos. “A partir daí, foi como uma bola de neve chegando ao Brasil em 2018 e por aqui se consolidando a ponto de haver pessoas vitoriosas nas urnas sem apresentar nem sequer propostas”.

A editora-geral do Bereia chamou atenção ainda para a midiatização da política. Na sua opinião, a política deixou de ser um espaço do contato, de colocação de ideias e se transformou em um processo no qual as mídias determinam o que deve ser dito, como e para quem. A consequência disso, aponta Magali Cunha, é a preocupação em performar nessas mídias, tendo em vista como vai sendo construída a imagem de quem está se candidatando ou discute alguma pauta na arena política.

Confira a íntegra da entrevista no YouTube.

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Foto de capa: Mohamed Hassan / Pixabay

Mídias digitais são terra sem lei e precisam ser reguladas, defende editora-geral de Bereia

Em entrevista ao programa de rádio Papo de Crente, iniciativa da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, em 16 de setembro, a editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha defendeu a regulação das mídias digitais. Segundo ela, o que se vê hoje é “uma terra sem lei”, em que as plataformas são soberanas para veicular “o que bem entendem”.

A pesquisadora chamou a atenção para a importância de haver o controle do que é veiculado nessas plataformas, com legislação a respeito. E faz a ressalva: não se trata de censura, mas de regular o que é difundido no espaço público para que haja dignidade e direitos. “A acusação de censura é uma balela”, acrescentou.

Magali Cunha defende que com a regulamentação das mídias digitais é possível garantir liberdade de expressão, e argumenta que esse é um direito previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Constituição Federal. O que está em jogo, segundo ela, é o fato de que a liberdade de expressão se dá no espaço público, e isso implica que ela seja assegurada em todas as instâncias, tanto aquelas do mundo off-line como as do on-line.

“Assim como ninguém pode tirar alguma coisa que pertence a outra pessoa ou tirar a vida de alguém – temos leis sobre isso que garantem a nossa convivência –, a coexistência no espaço digital também precisa ser regulada”, declarou a editora-geral de Bereia. Na sua opinião, isso significa prevenir e coibir os ataques, as ameaças, as perseguições, o machismo, o racismo e toda sorte de intolerância praticada no ambiente on-line.

Confira a íntegra da entrevista em:

Eleições 2024: Portal gospel desinforma e engana com matérias que relativizam caso do laudo falso publicado por Marçal contra Boulos

O portal gospel Pleno.news publicou uma notícia, no dia 4 de outubro, que divulga um falso laudo médico exposto, no mesmo dia, nas mídias sociais pelo candidato à Prefeitura de São Paulo, autoidentificado como cristão não determinado, Pablo Marçal (PRTB). O falso documento buscou levar eleitores a crerem que o também candidato Guilherme Boulos (PSOL) havia sido internado em uma clínica médica por conta do consumo de drogas.

A notícia publicada pelo Pleno.news, ainda disponível no site até o fechamento desta nota, detalha o documento médico que foi rapidamente desmentido por Boulos, especialistas e pela própria imprensa na mesma noite.

Imagem: Reprodução/Pleno.news

O laudo, datado de 2021, carece de autenticidade devido a elementos discrepantes e inconsistentes, como o número errado do RG de Boulos, o nome incorreto da clínica onde ele teria sido atendido, além de uma assinatura falsa de um médico já falecido. Também, Boulos tem provas de que não foi atendido ou internado nas datas que constam no laudo divulgado. A secretária e a filha do médico também já declararam que a assinatura no documento é falsa, e a imprensa identificou que o dono da clínica, que teria emitido o laudo, é apoiador da campanha de Pablo Marçal e já foi processado e condenado por falsificação de diploma.

Ainda na noite de 4 de outubro, a campanha de Guilherme Boulos tomou medidas contra Pablo Marçal, com uma representação por crime eleitoral no Tribunal Regional Eleitoral-SP (TRE-SP) e uma denúncia de crime, com pedido de prisão na Justiça comum. O Instagram já havia suspendido a publicação de Marçal devido ao filtro de conteúdo falso. Em 5 de outubro, véspera das eleições, o TRE-SP suspendeu a publicação nas outras mídias de Marçal, mas o conteúdo já havia sido acessado e compartilhado por centenas de milhares de seguidores.

Análise das publicações do portal

O texto do Pleno.news foi publicado às 22h52, cerca de uma hora após a publicação de Pablo Marçal. A matéria utiliza, no título e na linha fina, os termos “suposto laudo” e “supostamente internado”, o que oferece o benefício da dúvida ao que já é publicamente comprovado como falso. Além disso, a publicação é ilustrada com uma foto-montagem dos candidatos lado a lado, extraída de um dos debates eleitorais, com Pablo Marçal em destaque, fazendo o gesto acusatório de “cheirar cocaína” contra Boulos.

A matéria do site gospel reproduz a imagem do falso laudo e detalha todo o conteúdo, mencionando o nome da substância tóxica citada, que teria sido encontrada no paciente, e caracterizando a contaminação por drogas como causadora de surto, com necessidade de internação.

O texto é encerrado com a afirmação de que o candidato Boulos não havia se manifestado sobre o caso. 

Às 23h, dez minutos após a publicação, várias mídias sociais já repercutiam os desmentidos de Boulos, com textos e vídeos, e a imprensa já publicava matérias com as suspeitas em torno da veracidade do documento.

Além dessa matéria permanecer publicada, sem alterações, até o fechamento desta checagem, o Pleno.news publicou uma nova, na manhã de 5 de outubro, às 10h50, que não destaca a falsidade já comprovada do documento.

Imagem: Reprodução/Pleno.news

A chamada está centrada no tom acusatório de que Boulos pediu à Justiça a suspensão das redes de Marçal. Apenas na linha fina o Pleno.news afirma, ainda impondo dúvida: “Laudo exposto por Marçal em suas redes sociais seria falso.” No entanto, o foco da matéria é a busca de Boulos pela suspensão dos perfis de Marçal nas redes. O motivo, segundo o site gospel, foi a publicação de “suposto laudo em que aponta o uso de cocaína pelo deputado federal.” O Pleno.news repete a falsidade proferida por Pablo Marçal com destaque, sem reproduzir os desmentidos de Boulos, mencionando apenas o que seus advogados afirmaram.

Às 12h43, no dia 5 de outubro, véspera das eleições, o Pleno.news publicou uma nova matéria, desta vez em contraposição ao pedido de suspensão das contas de Marçal nas mídias sociais, feito por Boulos. Nessa última publicação, o site gospel apresenta um texto favorável a Pablo Marçal, retratando-o como líder de popularidade nas redes, sem oferecer a fonte das informações. O título diz: “Marçal atrai mais seguidores do que todos seus adversários juntos”, com a linha fina: “Empresário é considerado um fenômeno nas redes sociais.”

Imagem: Reprodução/Pleno.news

Essa construção de matérias segue sem informar sobre o crime eleitoral praticado por Marçal. De fato, articula a conclusão de que o pedido de suspensão dos perfis de Marçal nas redes sociais, feito por Boulos, estaria relacionado à popularidade do candidato, “que atrai mais seguidores do que todos os candidatos juntos.”

Bereia classifica as publicações do site gospel Pleno.news, que tratam do falso laudo médico usado por Pablo Marçal contra Guilherme Boulos, como enganosas. O veículo religioso omite do público informações e apurações que comprovam a falsidade do documento, continuando a tratá-lo como “suposto laudo médico”. Além disso, publicou matéria que atribui uma imagem negativa a Boulos, insinuando que ele busca suspender as redes de Marçal por concorrência.

Bereia participa da campanha Bote Fé no Voto. Votar é um direito que alerta sobre este tipo de má-fé nas eleições.  Saiba mais.

Editora do Bereia participa de evento que discute papel das religiões na esfera política brasileira

Quando se trata sobre o impacto do conservadorismo e do progressismo religioso na sociedade brasileira, é preciso demolir as noções equivocadas de que religião e política não se discutem nem não se misturam. A opinião é da editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha. Juntamente com Carlos Alberto Libânio Christo (Frei Betto), ela participou da série “Sábados resistentes”, realizada pelo Memorial da Resistência de São Paulo e pelo Núcleo de Preservação da Memória Política e transmitida pela Tutaméia TV. 

Essa edição do evento, realizada em 17 de agosto, discutiu o papel desempenhado pelas diferentes religiões na esfera política brasileira, especialmente no período da Ditadura Militar (1964-1985), e na interação entre religião e política nos anos seguintes.

De acordo com a pesquisadora, religião e política sempre se misturaram e estiveram na pauta de discussão. “A religião constitui um elemento que estrutura a vida e que dá sentido à vida de pessoas e culturas, e a política organiza a coexistência”.

Magali Cunha também chamou a atenção para o fato de que numa democracia a pluralidade de vozes é importante, e nesse sentido os grupos religiosos podem ter seu espaço na cena pública, com base nos valores que defendem.

Segundo ela, essa postura não é nociva, “mas o que é nocivo é que não haja debate e que um grupo se diga supremo ao outro, desqualificando as outras experiências religiosas”. “Os autoritarismos que impedem que a pluralidade ocorra devem ser denunciados”, acrescentou.

Em sua fala, a editora-geral do Bereia destacou quatro posturas relacionadas à relação entre religião e política no contexto da ordem vigente: submissão, como estratégia para preservação e sobrevivência do grupo religioso; alinhamento, por meio de apoio, suporte e promoção de ações; engajamento e participação, até mesmo para influenciar a cena pública; e oposição, quando os valores propostos são contrários aos do grupo religioso.

A íntegra das apresentações e debates está disponível em:

https://www.youtube.com/watch?v=TAMbzBtwUgM HYPERLINK

https://www.youtube.com/watch?v=TAMbzBtwUgM&t=717s”& HYPERLINK

Editora do Bereia defende vigilância constante às instituições para o enfrentamento da desinformação

É necessário que haja uma vigilância constante e pressão às instituições, como Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Congresso Nacional, para que cuidem adequadamente do tema da desinformação e dos desdobramentos dele. A opinião é da editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha, entrevistada do Programa Desinformação & Política da TV GGN, em 10 de setembro de 2024.

Segundo ela comentou, alguns episódios de manipulação da informação e de fortalecimento de fake news nos últimos dez anos no mundo causaram perplexidade e precisam trazer aprendizados. A pesquisadora lembrou de articulações que envolveram o processo do Brexit (saída da Grã-Bretanha da Comunidade Europeia), em 2014, e da campanha eleitoral norte-americana de 2016 que resultou na vitória de Donald Trump. Citou ainda o que ocorreu no Brasil nas eleições presidenciais em 2018 e em 2022, e nas eleições municipais de 2020. Em todos eles a disseminação de conteúdos desinformativos foi intensa, conforme ressaltou.

De acordo com a editora-geral do Bereia, alguns avanços têm sido observados, ainda que existam entraves significativos a serem superados. “Isso [iniciativas] ocorre especialmente no Poder Judiciário, por meio do TSE, que em vista do ocorrido em 2018 e 2020, já tomou uma série de providências para coibir a situação [disseminação de desinformação]”. “Agora chegamos às eleições de 2024 com o aperfeiçoamento dessas medidas, mas é preciso que a preocupação não fique restrita aos períodos eleitorais”, acrescentou.

Magali Cunha fez referência a outras iniciativas da sociedade civil. Ela lembrou de esforços da academia na produção de pesquisas sobre o tema e também da criação e articulação de movimentos pelo país, como a Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNC) e o Coletivo Bereia. 

A íntegra da entrevista, que trata também dos motivos que tornam o segmento cristão o mais vulnerável à desinformação, está disponível em:

Site de notícias diz que Lula suspeita de anúncio do pastor Silas Malafaia de que “Brasil vai pegar fogo”

*Matéria atualizada em 20/09 para acréscimo de informações.

Circula em mídias sociais, chamada para matéria publicada pelo site de notícias Brasil 247 intitulada “Lula sugere envolvimento de bolsonaristas como Malafaia em incêndios criminosos”, com o subtítulo: “O presidente recordou uma declaração do pastor, que usou as redes sociais para convocar bolsonaristas para um ato em São Paulo”.

Imagem: reprodução/Brasil 247

A matéria se baseou em discurso do presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, proferido durante reunião realizada no Palácio do Planalto, em 17 de setembro passado, para tratar, de forma emergencial, sobre a escalada da crise com os incêndios e queimadas florestais em várias regiões do país.

A reunião, convocada por Lula, contou com os representantes dos Três Poderes da República: o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, o presidente do Congresso Nacional Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o procurador-geral da República Paulo Gonet, e ministros do governo.

Ao noticiar sobre o discurso de Lula, que abordou as investigações sobre o caráter criminoso dos incêndios, a matéria do Brasil 247 afirma:

“o presidente Lula sinalizou que o pastor bolsonarista Silas Malafaia pode ter envolvimento com os incêndios no Brasil. ‘Uma pessoa muito importante na convocação do ato de 7 de setembro na Paulista disse que ‘O Brasil vai pegar fogo’, afirmou o chefe de Estado. A declaração do religioso ocorreu em agosto, quando ele usou as redes sociais, para convocando apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) a um protesto marcado para o dia 7 de setembro. A Polícia Federal abriu 52 inquéritos, com o objetivo de apurar os motivos dos incêndios no país”.

O site ilustrou a matéria com uma reprodução de postagem do pastor líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia no X/Twitter, de agosto passado, que convocava para um protesto de rua, em 7 de setembro, na Avenida Paulista (cidade de São Paulo), em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro e em protesto contra ações do Supremo Tribunal Federal em torno dos ataques ao Estado Democrático de Direito iniciados no governo do capitão do Exército. Com o bordão “Vai pegar fogo!” o líder religioso incentivou a participação dos seus seguidores na manifestação bolsonarista.

Interface gráfica do usuário, Texto
Descrição gerada automaticamente

Imagem: reprodução/Brasil 247

Outras mídias jornalísticas também noticiaram a reunião e o discurso de Lula, porém, mantiveram a expressão usada pelo presidente, “Uma pessoa muito importante na convocação do ato de 7 de setembro na Paulista disse que ‘O Brasil vai pegar fogo’”, sem menção ao nome do pastor assembleiano.

Imagem: reprodução/Metrópoles

A suspeita infundada sobre a fala de Silas Malafaia

Os incêndios e queimadas florestais que atingem o Brasil de forma dramática neste 2024, começaram a ser observados de forma emergencial pelo poder público a partir do final de agosto passado. Propagadores de desinformação logo se aproveitaram da calamidade para espalhar conteúdo alarmante. Bereia checou, no início deste mês que líderes políticos e religiosos postaram várias publicações enganosas com questionamentos, sem evidências, da atuação do governo federal no controle dos incêndios e com atribuição de responsabilidade pelos focos de fogo a grupos como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Na verificação, a equipe Bereia se deparou com um vídeo que circulava nas redes no qual o pastor Malafaia falava que “O Brasil vai pegar fogo”. O vídeo teve muitos compartilhamentos por pessoas alinhadas à esquerda política, incluídos políticos com identidade religiosa, em tom acusatório ao líder religioso como incentivador de incêndios criminosos, como novos atentados à democracia. Na checagem, Bereia informou que aquela “alegação carecia de evidências concretas, uma vez que o  vídeo em questão,  diz respeito à convocação para uma manifestação planejada para o feriado do Dia da Independência, 7 de setembro. Não há elementos factuais que indiquem uma conexão direta da convocação com as queimadas”. 

Nesta semana o assunto volta às redes com a fala do presidente Lula, que não mencionou o pastor mas, de fato, aludiu à fala do líder assembleiano divulgada em agosto passado, como Bereia verificou ao acessar a gravação do discurso, disponível no canal do Youtube Gov, da Empresa Brasil de Comunicação. No minuto 8:38, o presidente comenta sobre as suspeitas de crime na promoção dos incêndios e afirma:

[Pode ser] pela realização da COP 30 aqui no Brasil, ou pela performance que o Brasil tem na discussão ambiental no mundo inteiro, talvez uma parte disto seja por interesses políticos. A gente não sabe, não pode acusar, mas que há suspeita há. É importante eu não deixar de dizer para vocês que uma pessoa muito importante na convocação do ato da avenida Paulista utilizou a palavra “Vamos botar fogo no Brasil” ou “O Brasil vai pegar fogo” uma coisa mais ou menos assim. Isto tem na internet, algumas coisas, vocês podem ver. O dado concreto é que a mim parecem muita anormalidade…  

A pesquisa do Bereia confirma que não há qualquer base factual para se afirmar que o uso da frase “O Brasil vai pegar fogo”, pelo pastor Silas Malafaia, na convocação para a manifestação de rua em 7 de setembro, tenha relação com os incêndios e queimadas florestais. Portanto, a fala do presidente Lula é baseada em imprecisões, o que caracteriza desinformação.

Da mesma forma o site Brasil 247, ao noticiar a reunião e o discurso no Palácio do Planalto, não só reproduz a imprecisão, sem apuração que apresente elementos que corroborem a afirmação do presidente. O site de notícias expõe o nome do pastor Silas Malafaia no título e no corpo da matéria, e coloca na boca do presidente da República a pronúncia que ele optou por não fazer, o que amplifica a desinformação.

O uso da imagem do fogo entre cristãos

Silas Malafaia é amplamente destacado em sua presença pública pelo alinhamento recente com políticos e políticas do extremismo de direita, por ter se tornado uma espécie de conselheiro e defensor do ex-presidente Jair Bolsonaro, pela verbalização violenta e autoritária, que angaria seguidores e opositores por conta do discurso ancorado em polêmicas, conforme mostram estudos acadêmicos. Nesse sentido, o pastor líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo ganha visibilidade frequente nas mídias de notícias e chega a ser alçado em alguns espaços como porta-voz dos evangélicos, o que é falso, pois evangélicos, na diversidade que marca o segmento, não têm representantes.

Bereia avalia ser relevante, neste contexto, a informação de que o pastor Malafaia não é o único líder religioso que usa a imagem do “fogo” para captar a atenção de seguidores. Por isso, é importante garantir que para se relacionar o uso desta imagem com o incentivo a um crime incendiário, é preciso reunir evidências para não se cometer injustiças em nome de uma oposição política.

Para os cristãos de uma forma geral, o fogo é um símbolo importante. De acordo com o arcebispo católico de Passo Fundo (RS) Dom Rodolfo Luis Weber, em artigo pastoral, “o fogo representa o poder da fé, a transformação, o desejo e a purificação”. A imagem do fogo está relacionada a muitos episódios na tradição da Bíblia, entre eles, o mais destacado, a “descida do Espírito Santo sobre os apóstolos de Jesus”, após a assunção dele aos céus, durante a festa judaica de Pentecostes.

Conforme narrado no livro de Atos dos Apóstolos, capítulo 2, vieram sobre aquelas pessoas presentes à festa, em Jerusalém, “línguas como de fogo”. Nesse sentido, o fogo passou a ser atribuído entre cristãos como símbolo de força, coragem, poder da fé, e os fez saírem de si mesmos, das fronteiras culturais e étnicas para anunciarem o Evangelho ao mundo.

É comum o uso da palavra fogo nos hinos e nas canções evangélicos, mas para os crentes pentecostais, cuja doutrina é ancorada na leitura da experiência relatada na Bíblia, em Atos 2, é ainda muito mais presente. É comum o jargão pentecostal “sapato de fogo”, ou “reteté”, para as participações espontâneas “inflamadas”, emotivas, nos cultos e rituais com expressões em “línguas estranhas”, chamadas profecias (práticas de proferir publicamente palavras em nome de Deus nas comunidades religiosas pentecostais).

Repetidas vezes nos cultos evangélicos os momentos musicais têm cânticos como: “Deus de fogo, Deus de fogo que abriu o mar vermelho. Deus de fogo, Deus de fogo que não deixa ninguém tocar no fio do teu cabelo…” (grupo Águas Purificadas/Gospel Music Brasil); “Acende o Fogo em Mim” (David Quinlan); “Acende o fogo em meu coração eu não resistirei, eu quero mais de ti, Deus” (Nívea Soares), entre outras centenas de canções repetidas nos cultos pentecostais brasileiros.

“Fogo Divino” é um hino da tradicional “Harpa Cristã”, o hinário oficial da igreja Assembleia de Deus. Um dos seus versos diz: “Fogo divino, clamamos por ti; Vem lá do alto, vem, desce aqui; Ó vem despertar-nos com teu fulgor; Vem inflamar-nos com teu calor. Desce do alto, bendito fogo, Desce poder celestial! Desce do alto, bendito fogo, Vem, chama pentecostal!”.

Outro exemplo do uso da imagem simbólica do fogo está no tradicional hinário utilizado pela Igreja Batista, que pertence à Convenção Batista Brasileira, o “Cantor Cristão”. O segundo verso do hino “Avivamento” diz: “Aviva-nos, Senhor! Eis nossa petição. Ateia o fogo do alto céu em cada coração!”.

A imagem do fogo também é usada em eventos religiosos. O grupo de jovens da Igreja Batista Deus é Fiel, na cidade de Sete Lagoas (MG), tem divulgado nas redes digitais uma conferência para 14 a 16 de novembro próximo, com o título “Incendiários”.

Fonte: Site Incendiários.com.br

No site da conferência,  os jovens são convidados com chamadas como esta: “Seja um incendiário! Deus não colocou este fogo em nós para que queimássemos apenas, Ele quer espalhar este fogo através de nós. No Reino de Deus não é possível ser um incendiário sem estar incendiado.”

Imagem: reprodução/Instagram

Uma conferência evangélica com este tema não é nova. Em 2023, foi realizado evento com o mesmo nome sob a liderança da Batista do Brasil Church, em Barreiros (BA).

Imagem: reprodução/Instagram

Palavra “fogo” é usada como expressão popular

Ainda é preciso considerar que o termo “fogo” é usado popularmente com muitos diferentes sentidos:

  • para classificar uma situação positiva ou negativa ou mesmo estimular a atenção a ela, bastante usada em canções (“Isto vai pegar fogo”).
  • para classificar pessoa de qualquer idade inflamada, agitada, que cria confusão (Fulano é fogo!)
  • E muitas outras expressões como: fogo de palha, fogo no cabaré, ver o circo pegar fogo, entre tantas.

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Bereia classifica como imprecisa a fala do presidente Lula e a matéria publicada pelo site Brasil 247 que explicita suspeitas sobre a fala do pastor Silas Malafaia, em vídeo para convocação para a manifestação de rua, em 7 de setembro passado, na Avenida Paulista, como incentivo a incêndios florestais criminosos.

A pesquisa do Bereia confirma que não há qualquer base factual para se afirmar que o uso da frase “O Brasil vai pegar fogo”, pelo pastor Malafaia tenha relação com os incêndios e queimadas florestais. Como Bereia pesquisou, o que existe de forma intensa é o uso da imagem do fogo como símbolo comum no discurso evangélico, especialmente entre pentecostais e pode ter sido usada pelo pastor dentro deste contexto.

Referências de checagem:

Bereia. https://coletivobereia.com.br/lideres-politicos-propagam-conteudo-enganoso-e-falso-sobre-queimadas-na-amazonia-e-em-sao-paulo/. Acesso em 19 set 2024

UOL. https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2024/08/26/video-distorce-posts-de-bolsonaristas-para-associa-los-a-queimadas.htm Acesso em 19 set 2024

YouTube. https://www.youtube.com/live/27o-B-mQejU?si=_i0XIQFQjEzx1gTC&t=508 Acesso em 19 set 2024

Observatório da Imprensa. https://www.observatoriodaimprensa.com.br/tv-em-questao/quem-tem-moral-entre-os-evangelicos/ Acesso em 19 set 2024

Revista PUC-SP. https://revistas.pucsp.br/index.php/verbum/article/view/60472 Acesso em 19 set 2024

Arquidiocese de Passo Fundo. https://www.arquidiocesedepassofundo.com.br/formacao/palavra-do-pastor/acendei-em-nos-o-fogo-do-amor-#:~:text=O%20Esp%C3%ADrito%20Santo%20em%20Pentecostes,lhes%20fora%20confiado%20ao%20mundo Acesso em 19 set 2024

Folha de S. Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/colunas/juliano-spyer/2022/03/como-e-participar-de-um-culto-pentecostal.shtml Acesso em 19 set 2024

Incendiários. https://www.incendiarios.com.br/?fbclid=IwY2xjawFYSs1leHRuA2FlbQIxMAABHbhJX_8_wDlT37iy1KXmP40_NBsF3rMgQVf-T89Zs2wIrjNosQsOe3sm2A_aem_X0KQMsCe4BeFHIz6UN4_Zg Acesso em 19 set 2024

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Foto de capa: Image by Ronald Plett from Pixabay


Evangélicos não são um único grupo, destaca editora-geral do Bereia

Evangélicos não são um grupo só. Há vários grupos, várias igrejas, cada qual com um modo de ler e interpretar a Bíblia, de agir, de trabalhar. A opinião é da editora-geral do Coletivo Bereia, Magali Cunha. Ela participou, em 30 de julho de 2024  do programa “Espiritualidade na Ação”, apresentado por Frei David, no canal do Instituto Conhecimento Liberta (ICL).

Em diálogo que incluiu o pastor da Igreja Evangélica Luz do Conhecimento Vanderley Carvalho, ela tratou da espiritualidade da Teologia da Libertação nas igrejas evangélicas, destacando que essa linha teológica está na base de parcela de grupos evangélicos desde o início do século XX. Desde aquela época, alfabetizavam pessoas com a Bíblia e trabalhavam com ação social.

“Naquele período, e entrando no século XXI, há muitos grupos que têm um compromisso com as mulheres, com os indígenas, como é o caso do Movimento Negro Evangélico, a Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, entre outros”. Ela acrescentou que esses grupos nem sempre têm espaço de visibilidade, como aqueles mais fechados têm na política e nas grandes mídias.

Magali Cunha também apresentou o Coletivo Bereia e seu esforço permanente de enfrentamento da desinformação, por meio das análises e das checagens de conteúdo.

Confira a íntegra do programa no YouTube.

É preciso denunciar abuso o religioso em tempos eleitorais, defende a editora-geral do Bereia

O abuso religioso vem crescendo no Brasil, e em tempos eleitorais os cidadãos precisam denunciar essa conduta de lideranças religiosas, partidos e candidatos. A opinião é da editora-geral do Bereia Magali Cunha, que participou do programa Entrevista da Hora, da TV Assembleia de Mato Grosso, em 1º de julho de 2024.

Segundo a pesquisadora, esse abuso ocorre quando personagens do mundo religioso e lideranças do mundo político que às vezes que não têm nada de religiosas fazem alianças com grupos religiosos utilizando-se de elementos simbólicos da fé e de argumentos para convencer emocionalmente pessoas por meio de um discurso de pânico moral e também demonizar candidatos e partidos.

Essa situação, já observada nas eleições presidenciais de 2018 e de 2022 e também nas eleições municipais de 2020, vem se repetindo em 2024, destaca Magali Cunha. “Isso não é saudável para a democracia nem para as religiões”, analisa.

O abuso religioso também leva à utilização de discursos extremistas e de ódio, especialmente nas mídias sociais. De acordo com a pesquisadora, pessoas, partidos, candidatos, grupos ativistas têm sido vítimas desse comportamento.

“A oposição política é saudável, mas deve ser feita dentro da civilidade, da democracia. Quando se parte para ataques, chamamentos a agressões, é muito negativo, e nesses casos é preciso enfrentar de forma muito dura, como o TSE tem feito nos últimos anos”, adverte. A íntegra da entrevista está disponível no YouTube.

Discurso desinformativo, enganoso e falso tem evangélicos como público preferencial, avalia a editora-geral do Bereia

O uso político da desinformação não é novidade, assim como não é algo novo no contexto das religiões, alcançando principalmente grupos evangélicos, ressaltou a editora-geral do Bereia, Magali Cunha, durante entrevista ao Programa Papo de Fé, da TV Fórum, em março de 2024.

Ela lembra que o ano de 2016 foi emblemático para essa estratégia, com o episódio do Brexit – movimento que defendia a saída da Grã-Bretanha da União Europeia – e com a campanha de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos.  Em ambas as situações, a escolha foi utilizar as ferramentas digitais para convencer as pessoas, introduzindo discursos que mexiam com a emoção e o sentimento delas para propagar o medo e o pânico.

“A experiência Brexit ensinou sobre a necessidade de formular discursos específicos, segmentando grupos, entre os quais os religiosos. Pesquisas científicas apontaram que estes têm maior suscetibilidade, maior vulnerabilidade à propagação desses conteúdos, pois trata-se de pessoas que acreditam, que estão ancoradas na fé”, analisou Magali Cunha.

A pesquisadora lembrou que particularmente os grupos cristãos evangélicos, têm forte vínculo comunitário e que o que ali circula é acolhido pela comunidade. Ela acrescenta que estudos revelam que, entre os grupos religiosos, os evangélicos são os mais presentes na mídia e os que mais fazem uso das ferramenta digitais. “Quem produz esses conteúdos sabe que ali existe um grupo que acredita, que está alicerçado nas suas crenças, e que, pela própria índole, têm um ímpeto missionário forte, levar adiante a fé, os conteúdos que recebem”.

Acompanhe a íntegra da entrevista no YouTube.

Evangélicos e fake news é tema de podcast com participação do Bereia

Por que evangélicos são mais suscetíveis à fake news? A questão foi debatida durante podcast de O Reino em Pessoa, que foi ao ar em fevereiro de 2024 e contou com a participação da editora-geral do Bereia, Magali Cunha.

Na percepção da pesquisadora, um traço marcante na vida deles é a crença, e isso é explorado por quem deseja manipular e difundir mentira. “Como o próprio nome diz, os crentes creem, são receptivos”, aponta, acrescentando que pessoas mal-intencionadas se aproveitam dessa característica para difundir a esse grupo fatos e notícias enganosas, gerando medo e pânico.

Outra marca dos evangélicos está no fato de que carregam dentro de si a dimensão missionária, segundo destaca Magali Cunha. Isso significa, conforme ela defende, que é muito forte o papel de divulgar e de proclamar, em alguns casos sem um olhar mais crítico. “Além de serem alvos, os evangélicos são os que mais propagam os conteúdos, pois se sentem imbuídos de uma missão, a de salvar o mundo, o que é algo muito bonito. Mas uma coisa é divulgar o evangelho, outra é divulgar a mentira”.

Confira outros assuntos tratados no canal do podcast O Reino em Pessoa no YouTube.

Extremista foragido engana sobre crise econômica e humanitária de Cuba para disseminar pânico social no Brasil

Uma publicação no Instagram sobre crise humanitária em Cuba tem circulado em perfis e grupos de igrejas nas mídias sociais, desde 25 de julho passado, e foi encaminhada por leitor ao Bereia.

A imagem é composta por um grupo que protesta em uma rua, as pessoas usam máscara de proteção sanitária e empunham cartazes com textos como “SOS Cuba”, “Democracia” e “Cuba libre, ya!”.  No título está a frase “Em Cuba, controlada pelo Regime Comunista, apoiado por Lula, cristãos são perseguidos e fome severa atinge vulneráveis”, com o subtexto “Partido Comunista Cubano deixa mulheres grávidas, idosos, crianças e pessoas doentes passarem fome com racionamento severo de alimentos, com muitos ficando 20hs sem alimentação básica”.

O texto da publicação traz a palavra de “uma líder cristã”, citada apenas com o primeiro nome, Ângela, voluntária da organização evangélica internacional Portas Abertas, que acompanha casos de perseguição a cristãos em diferentes países. Ela teria participado de uma videochamada pela qual descreveu a situação de Cuba, que enfrenta crise econômica e social. A postagem remete a texto completo da Revista Exílio.

Bereia checou a fonte e a veracidade das informações.

Imagem: Reprodução da postagem do Instagram recebida pelo Bereia

Imagem: Reprodução da notícia em questão na página da revista Exílio

Sobre a Revista Exílio

A Revista Exílio pertence ao blogueiro brasileiro Allan dos Santos. Ele está foragido do Brasil, desde outubro 2021, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) emitiu um mandato de prisão, decorrente da atuação do blogueiro em milícias digitais na promoção de ataques ao Estado Democrático de Direito.

Ex-padre católico, como Bereia já checou, Allan dos Santos foi proprietário do canal do Youtube Terça Livre, veículo do extremismo de direita no Brasil, suspenso por conta do inquérito. O mandato de prisão preventiva foi emitido como resultado de investigações da Polícia Federal (PF) que reuniram evidências sobre a atuação dele em milícias digitais na forma de organização criminosa, crimes contra a honra e incitação a crimes, preconceito e lavagem de dinheiro.

Mesmo foragido nos Estados Unidos, que negou o pedido de extradição do Estado brasileiro, Allan dos Santos continua a agir nas mesmas bases das acusações que são registradas contra ele, com a propagação de conteúdo digital nocivo. Em julho passado, foi instaurado novo inquérito na PF, determinado pelo STF, para apurar a conduta do blogueiro, no caso em que ele é acusado de forjar mensagens com autoria atribuída à jornalista Juliana Dal Piva (ICL Notícias).

A Revista Exílio oferece o mesmo conteúdo com formato jornalístico que era propagado pelo canal Terça Livre. A marca do canal é utilizada nas chamadas para comunicação com os seguidores perdidos com a suspensão do canal.

Imagem: Reprodução da página de abertura da Revista Exílio

Imagem: Reprodução dos dados do perfil do Instagram da Revista Exílio

A notícia sobre perseguição a cristãos e fome em Cuba

No site da Revista Exílio há várias matérias com conteúdo negativo referente a Cuba. O país, localizado em ilha do Caribe, é frequentemente mencionado em publicações de grupos extremistas de direita, que recorrem ao imaginário do comunismo como ameaça aos elementos simbólicos que defendem, “Deus, Pátria e Família”, como Bereia já checou.

Sobre a grave crise econômica e humanitária vivida por Cuba, desde o período da pandemia da covid-19, a afirmação é verdadeira. Porém, uma breve pesquisa no noticiário e em produções científicas mostra que este é um caso amplamente conhecido e debatido em espaços diplomáticos e de notícias internacionais, com causa conhecida: o bloqueio econômico dos Estados Unidos que perdura há quase 60 anos.

As 243 medidas do bloqueio econômico, que ganharam amplitude nos governos Trump e Biden, impuseram a Cuba uma série de dificuldades não só para a exportação de produtos cubanos, mas de aquisição do que não é produzido na ilha.

O bloqueio é uma das medidas mais condenadas pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), onde todos os anos, desde 1992, é aprovada uma resolução contra a imposição estadunidense. Apenas Estados Unidos e Israel aprovam a medida.

Com o agravamento, atualmente faltam energia, petróleo, alimentos, remédios e vacinas, produtos básicos como material para higiene. “Os danos acumulados durante quase seis décadas de aplicação dessa medida totalizam US$ 144 bilhões (cerca de R$ 734 bilhões)”, registra o governo cubano no documento “Cuba vs. Bloqueio” apresentado à Assembleia Geral da ONU em 2020.

A situação econômica de Cuba foi ainda mais agravada com a pandemia da covid-19, uma vez que a abertura da economia se deu para o turismo e este foi suspenso por dois anos, o que tornou a recuperação econômica do país ainda mais difícil. Esta avaliação é partilhada por analistas internacionais de várias procedências. É fato que, por conta deste quadro, muitas pessoas estão deixando o país em busca de vida melhor, especialmente as mais jovens.

É verdade que a liberdade de expressão, limitada pelo regime socialista cubano, de partido único e controle do Estado, justificada para proteção dos valores da Revolução, contra os ataques dos Estados Unidos, é questionada pela população, especialmente pelos mais jovens. O acesso à internet, liberado à população desde 2018, tornou mais evidente o controle estatal sobre a mídia – a imprensa é do Estado bem como os canais de televisão e estações de rádio. Porém, não há restrições a mídias sociais, na única operadora, que é estatal. O WhatsApp é amplamente utilizado bem como Facebook, Instagram e todos os aplicativos do Google, como outras redes e sites. O bloqueio se dá a sites que têm relação financeira com os EUA.

Há abertura para manifestações no país. Em 2023, depois de protestos nas ruas, que expressam uma população cansada das perdas de qualidade de vida, que exigem alimentos e remédios, o governo cubano anunciou a suspensão temporária de restrições alfandegárias a medicamentos, alimentos e remessas de valores em dinheiro.

Igrejas não são proibidas

É falso que as igrejas são proibidas em Cuba. As igrejas não foram fechadas depois da Revolução Cubana, pelo contrário, permaneceram e ampliaram sua atuação, tanto a Católica, a que tem mais apelo popular, como as evangélicas. Houve tensionamentos entre o governo e lideranças católicas e evangélicas que se colocavam contra as políticas socialistas e faziam propaganda anti-Revolução. Há um autônomo Conselho de Igrejas de Cuba.

Imagem: Igreja Cristã Pentecostal de Cuba Porta do Céu /Global Ministries

As diversas igrejas e religiões têm liberdade de culto e estão sob a regulação constitucional assim como as demais associações. Sobre as igrejas, há um crescimento pentecostal muito forte, na linha do que ocorre em outros países latino-americanos. Ele se deu a partir dos anos 90, com a deterioração da qualidade de vida estabelecida pelo fim da aliança com a União Soviética. Igrejas começaram a entrar no país, como missões dos Estados Unidos, e a distribuir artigos de primeira necessidade não disponíveis por conta do bloqueio.

Teólogo e jurista cubano avalia a matéria da Revista Exílio

Bereia ouviu o teólogo e jurista cubano Loyet García Broche, que integra a Coordenação Colegiada do Centro Memorial Martin Luther King, localizado em Havana, sobre a publicação da Revista Exílio. Loyet Broche confirma vários pontos, conforme a pesquisa do Bereia mostra:

“É verdade que a situação é crítica, como nunca. É verdade que a pobreza aumentou e também a desigualdade. E é certo que há uma grande escassez. O tema da imigração também é verdadeiro: estes dados já foram compartilhados de maneira oficial no país. É lamentável, por certo, o êxodo é gigantesco, principalmente de pessoas jovens, o que torna a situação mais complexa pelo nível de envelhecimento que a ilha tem”.

Porém, o teólogo e jurista alerta que é “exagerada a informação de que pessoas ficam 20 horas sem comer. Não me parece que cheguemos a este extremo. A grande diferença é que o governo segue tentando lutar contra as pressões externas”.

Sobre a situação de cristãos em Cuba, o teólogo e jurista contesta: “não podemos falar de perseguição a cristãos. As igrejas, mais do que nunca, têm liberdade para exercer suas atividades e expressar-se livremente. De fato, as igrejas fizeram isto durante o processo da nova Constituição e do Código das Famílias, e houve as que manifestaram sua oposição radical e não ocorreu nada de mal contra elas”.

Imagem: acima, igreja católica em Havana; abaixo, seminário metodista (Fotos de Nalu Rosa) e igreja pentecostal em Santiago de Cuba (YouTube)

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Bereia classifica a publicação da Revista Exílio enviada por leitor como enganosa. De fato, Cuba vive uma crise econômica e humanitária grave, internacionalmente reconhecida, cuja principal causa é o embargo econômico dos Estados Unidos, que perdura há quase 60 anos, agravado com os efeitos da pandemia da covid-19. A Revista Exílio explora os efeitos e o drama humanitário do país, mas omite as causas, para levar seguidores a crerem que é uma situação provocada pelo “regime comunista”, o que aciona o imaginário de pânico social construído em torno deste tema.

O veículo, editado pelo extremista de direita foragido Allan dos Santos, conhecido propagador de desinformação, também aproveita o tema para fazer campanha política e criticar o governo federal do Brasil, sob a Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, ao atrelá-lo ao “regime comunista de Cuba” e identificá-lo, na chamada, como apoiador.  

Já a informação de que cristãos são perseguidos em Cuba e sofrem os efeitos da crise econômica de forma mais grave é falsa. Não há perseguição oficial a cristãos na ilha e os fiéis das igrejas podem praticar livremente sua religião, com abertura para a implantação de diferentes igrejas e de manifestação crítica a políticas públicas.

Bereia alerta leitores e leitoras para não assimilarem conteúdo de veículos que produzem material com formato jornalístico, mas não realizam pesquisa e apuração nem oferecem informação coerente com situações e fatos. Tais espaços servem apenas para divulgar declarações e noções baseadas em opiniões para defesa e publicização de ideias e de personagens.

Referências de checagem:

STF, https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/ministro-alexandre-de-moraes-acolhe-pedido-da-pf-e-determina-prisao-de-allan-dos-santos/ Acesso em 1 ago 2024

R7, https://noticias.r7.com/brasilia/moraes-abre-inquerito-para-investigar-allan-dos-santos-por-suposta-difusao-de-noticias-falsas-30072024/ Acesso em 1 ago 2024

BBC, https://www.bbc.com/portuguese/articles/c9r262zler0o Acesso em 1 ago 2024

BBC, https://www.bbc.com/portuguese/internacional-57862474 Acesso em 1 ago 2024

BBC, https://www.bbc.com/portuguese/internacional-57832440 Acesso em 1 ago 2024

Marcos Menezes, “Dinâmicas econômicas sob sanções: embargo e suas consequências em Cuba”, https://lume.ufrgs.br/handle/10183/273017 Acesso em 1 ago 2024

News UN, https://news.un.org/pt/story/2023/11/1822847 Acesso em 1 ago 2024
Cuba vs. Bloqueo, https://cubavsbloqueo.cu/en/node/57 Acesso em 1 ago 2024

IJNET, https://ijnet.org/pt-br/story/m%C3%ADdias-emergentes-em-cuba-desafios-amea%C3%A7as-e-oportunidades Acesso em 1 ago 2024

Consejo de Iglesias de Cuba, https://www.facebook.com/people/Consejo-de-Iglesias-de-Cuba/100064645723492/ Acesso em 1 ago 2024

Opera Mundi, https://operamundi.uol.com.br/politica-e-economia/nova-constituicao-de-cuba-e-aprovada-com-8685-dos-votos-em-referendo-popular/ Acesso em 1 ago 2024

Cuba Debate, http://www.cubadebate.cu/noticias/2022/09/25/cuba-vota-en-referendo-su-nuevo-codigo-de-las-familias/ Acesso em 1 ago 2024

Global Ministries, www.globalministries.org Acesso em 1 ago 2024

Youtube, www.youtube.com%2fuser%2fIDDPMI2012/RK=2/RS=s714tq77KBkl48LvCqHVBZw9204- Acesso em 1 ago 2024

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Foto de capa: reprodução/YouTube

Destaques Bereia na Educação em 2023

Bereia participou de diversas iniciativas – seminários, podcasts, trabalhos acadêmicos e outros – ao longo de 2023 voltadas a refletir sobre a desinformação e modos de enfrentá-la. Confira alguns destaques.

Julho – Trabalho acadêmico discute desinformação em redes religiosas e destaca atuação do Bereia

O fenômeno da desinformação em redes religiosas, em especial nos espaços cristãos, foi tema do Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo de Julia Weiss, da Universidade Federal de Santa Catarina. O podcast Heresias da Informação, produzido para o TCC, destaca o trabalho realizado pelo Bereia na checagem de conteúdos noticiosos, com depoimentos de seus integrantes.

Setembro – Bereia participa de seminário sobre religião, discurso de ódio e mídias sociais

Bereia participou do seminário “Religião, discurso de ódio e mídias sociais”, organizado pela área de Religião e Política do Instituto de Estudos da Religião (ISER) em parceria com a Fundação Boll. O evento contou com a presença de pesquisadores e representantes de instituições da sociedade civil.

A pesquisadora Magali Cunha, editora-geral do Bereia, abordou as complexidades das mídias sociais e dos discursos de ódio relacionados à religião. Discutiu-se como a extrema direita tem utilizado a religião para disseminar ódio e desinformação online, fortalecendo estereótipos e discriminações.

Outubro – Jornalista do Bereia participa de treinamento da agência Lupa

Com o objetivo de aprimorar o trabalho de enfrentamento à desinformação, foco do trabalho realizado pelo Bereia, o jornalista  João Pedro Capobianco foi selecionado para integrar o programa de treinamento Mirante, da Agência Lupa, especializada em checagem de notícias.

A capacitação, com duração de quatro meses, inclui treinamento em técnicas de jornalismo investigativo, além de imersão e mentorias. “Estou muito feliz com mais esse passo dado. Bereia tem uma importância crucial nisso, como não poderia deixar de ser!”.

Dezembro – Bereia participa de discussão sobre envolvimento das igrejas em desinformação ou informações falsas

A editora-geral do Bereia Magali Cunha participou de um webinar que discutiu sobre o envolvimento das igrejas em desinformação ou informações falsas e sobre o que fazer para prevenir esses casos.

O evento foi promovido pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI) e a Associação Mundial de Comunicação Cristã (WACC) e contou com representantes de várias partes do mundo.
Magali Cunha falou sobre a situação das igrejas em uma era de alto volume de informações e desinformação. “Os ambientes religiosos são altamente vulneráveis à circulação de desinformação”, destacou. A pesquisadora comentou que “as contas de mídias sociais de grupos religiosos e seus líderes são creditadas como fontes de verdade”. Saiba mais em:

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Foto de capa: StartupStockPhotos/Pixabay

Bereia e Casa Galileia participam de Seminário Internacional promovido pela Uerj

O XII Seminário Internacional sobre Redes Educacionais e Tecnologias, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, realizou um debate essencial para a compreensão dos fenômenos contemporâneos na educação e na sociedade em geral, nesta sexta-feira, 5 de julho.  A editora-geral do Coletivo Bereia e pesquisadora do ISER Magali Cunha, e o sociólogo, assessor de Campanhas da Casa Galileia, Flávio Conrado, participaram da mesa de debate sobre as investidas de discurso neoconservadores em tempos de redes sociais, com destaque para a influência dos evangélicos nesse contexto.

Magali Cunha chamou atenção para a presença marcante de evangélicos nas mídias sociais e criticou o desconhecimento de parte da imprensa sobre a complexidade e a diversidade do segmento cristão. Segundo a editora, esta falta de distinção contribui para a disseminação de desinformação e para uma representação simplista dos religiosos na mídia. 

Como pesquisadora da Religião, destacou que o ativismo de evangélicos na política brasileira é consequência de processos antigos, entre eles, a Teologia do Domínio. “Há um desconhecimento quando se fala sobre o assunto  no momento que se coloca a Teologia do Domínio como algo novo, quando, na verdade, não é”. Ela explicou que teólogos do domínio são observados desde os anos 60, nos Estados Unidos, no ambiente calvinista, e chega ao Brasil muito antes do alto crescimento de evangélicos pentecostais, na década de 80. 

Sobre o dilema da identificação de evangélicos, a coordenadora do debate, professora Talita Vidal, da Faculdade de Educação da Uerj, criticou a generalização ao tratar do segmento e compartilhou um caso sobre a confissão religiosa evangélica de uma familiar que se transformou após o contato com diferentes leituras teológicas.

Para falar sobre o avanço de neoconservadores na militância digital, o cientista social Flávio Conrado apresentou uma série de dados coletados a partir do monitoramento de 450 perfis de influenciadores digitais do campo religioso. O trabalho da Casa Galileia gerou cerca de 90 relatórios, agrupados por temas, e apontou para um aumento significativo da radicalização dentro do campo conservador evangélico nas redes sociais. O sociólogo destacou o fenômeno do “orgulho conservador”, declarado por atores da extrema-direita. “É preciso desmobilizar o discurso de guerra e desarmar os lados para melhorar o ambiente democrático”, analisa.

O evento reforçou a necessidade de novas pesquisas sobre o avanço do conservadorismo em outros segmentos religiosos como as religiões de matrizes africanas. O professor Gustavo Oliveira, durante sua contribuição, celebrou iniciativas como Coletivo Bereia e Casa Galileia, pois, “foram as primeiras iniciativas a reagirem ao avanço da extrema-direita nos ambientes digitais”.

Foto da Capa: Luis Henrique Vieira/Bereia

Imprensa erra ao repercutir conteúdo viral sobre vaias a Eduardo Cunha em culto das Assembleias de Deus

A notícia de que o ex-deputado e presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha (sem partido) participou de culto celebrativo das Assembleias de Deus no Rio de Janeiro e foi vaiado por boa parte dos presentes, viralizou nas redes na noite do último sábado, 29 de junho.

Imagem: reprodução de perfil no Twitter

Imagem: reprodução de perfil no Instagram

Depois de uma gravação do momento ter sido publicada nas mídias sociais, com ampla repercussão, o caso verídico foi amplamente noticiado pela imprensa. Bereia verificou que a notícia foi veiculada por UOL, O Globo , Metrópoles, Terra, Fórum, ICL, entre outros sites de notícias Brasil afora. Mídias religiosas também repercutiram, como o Pleno News.

Imagem: reprodução do site O Globo

O conteúdo do noticiário e as legendas de postagens mídias sociais causaram confusão no público evangélico e no que conhece bem o contexto do segmento, por conta da referência ao evento, realizado no ginásio do Maracanãzinho, no sábado, 29 de junho. As menções se referiam, em geral, a “uma celebração do centenário da Assembleia de Deus no país”, o que foi repetido por boa parte dos veículos da imprensa. Comentários nas redes se repetiram: “ué, centenário da Assembleia de Deus de novo?”

De fato, a maioria dos veículos de imprensa e dos usuários de mídias sociais, que viralizaram o vídeo, errou. O centenário das Assembleias de Deus no Brasil foi celebrado há 13 anos, em 2011, para lembrar o estabelecimento da maior expressão dos pentecostalismos do país, em Belém (Pará), em 1911. O evento do Maracanãzinho, neste 29 de junho, foi uma celebração de uma data regional: os cem anos da chegada dos missionários das Assembleias de Deus ao Estado do Rio de Janeiro, em 1924.

As exceções na cobertura do noticiário foram do UOL e do Metrópoles, que registraram, corretamente, que o evento foi relativo ao “centenário das igrejas da Assembleia de Deus no estado do Rio”.

O evento

Imagem: Divulgação

O ano de 2024 foi incluído no calendário cívico estadual, como o Ano do Centenário das Assembleias de Deus no Estado do Rio de Janeiro, por meio da Lei nº 10.302/2024, aprovada pela Assembleia Legislativa, em 26 de março passado. O Projeto de Lei teve a autoria dos deputados Otoni De Paula Pai, Tia Ju, Rodrigo Bacellar, Fábio Silva, Rosenverg Reis, Samuel Malafaia, Val Ceasa, Dionísio Lins, Andrezinho Ceciliano, Vítor Júnior e Danniel Librelon (vários ligados à denominação evangélica).

O culto de 29 de junho fez parte de uma série de eventos celebrativos no mês que marca o centenário, promovidos por um grupo de convenções da Assembleia de Deus do Estado do Rio de Janeiro. As celebrações incluíram batismos e inauguração da Catedral do Centenário, na cidade de Niterói.  O culto do Maracanãzinho foi o encerramento, com o apoio das diferentes convenções nacionais da Igreja.

Imagem: Instagram

Outro erro na imprensa

Bereia verificou ainda que não houve erro apenas ao erro em relação à classificação da data celebrada no culto do Maracanãzinho. Há equívoco, também, na menção à “Igreja Assembleia de Deus”, como uma única denominação evangélica, como se os participantes do culto no famoso ginásio da capital do estado fossem todos vinculados a uma única igreja. O título do evento, como divulgado e aprovado em Lei Estadual, já diz: Centenário das Assembleias de Deus no Estado dod Rio.

As Assembleias de Deus são o guarda-chuva eclesiástico de uma gama de grupos unidos em torno da memória da fundação em Belém, 1911, que lhes é comum, mas separados por diferentes cisões políticas internas que geraram muitas transformações.

De acordo com a estudiosa dos pentecostalismos no Brasil professora doutora Marina Correa, há “múltiplas ASSEMBLEIAS de Deus (no plural), diversos ministérios, mega templos independentes, pastores presidentes, convenções nacionais e centenas de convenções estaduais. A estrutura eclesiástica envolve estatutos internos, assembleias ordinárias e extraordinárias, eleições, representando uma organização intrincada com hierarquia, poder, cisões, sucessões e uma significativa dinâmica política, tanto interna quanto externa”.

As muitas “convenções” e os distintos “ministérios” que carregam o nome “Assembleia de Deus” representam uma dinâmica religiosa que exige uma atenta compreensão. Marina Correa explica, em um didático Glossário sobre temas religiosos no espaço público, editado pelo Instituto de Estudos da Religião (ISER):

A dinâmica de múltiplos ministérios independentes, os que não estão ligados a nenhuma convenção, reflete as complexidades das relações e tensões internas, evidenciando como a busca pela unidade pode, paradoxalmente, gerar maior fragmentação e diversidade no cenário religioso

Dentro do contexto das ADs, essas igrejas e ministérios participam ativamente do processo de interação por meio de suas redes de igrejas, seguindo uma estrutura interna própria. Essa estrutura é dominante e elitizada por seus organizadores, que compartilham ideias, organizam o trabalho entre seus subordinados e regulam essas atividades. Nesse cenário, observamos uma adaptação constante aos discursos, exemplificados pelos diversos pastores presidentes. Por exemplo, o pastor Silas Malafaia [do Ministério Vitória em Cristo] segue uma abordagem política, Samuel Ferreira da AD Brás mantém um viés semelhante ao de Malafaia, enquanto o pastor-presidente das ADs (AM) foca principalmente no discurso pastoral. Essa diversidade de abordagens contribui para a complexidade e dinâmica das ADs.

No evento do Maracanãzinho, deste 29 de junho, estavam representadas as três convenções nacionais das Assembleias de Deus, a Convenção Geral (CGADB, ligada ao chamado Ministério da Missão (Belém), a de Madureira (CONAMAD, nascida no Rio, resultante da primeira grande cisão nacional) e a Nacional (CADB), recentemente formada, depois  de conflitos políticos internos.

Marina Correa explica: “todos [os ministérios] têm convenções estaduais/nacionais distintas, mas com a mesma sigla AD, coexistem atualmente com uma variedade de ministérios independentes também AD. Cada um desses ministérios opera com seu próprio estatuto e administração, conduzindo suas próprias convenções tanto em âmbito nacional quanto estadual”. 

O caso Eduardo Cunha

Não foi a primeira vez, em que Eduardo Cunha recebeu vaias em eventos, tanto quando ainda era o presidente da Câmara Federal quanto depois de ter perdido os espaços políticos de poder que conquistou.

Imagem: Site revista Exame, 5 mai 2016

O ex-deputado do PMDB (hoje MDB), membro do Ministério Assembleia de Deus Madureira no Rio, após uma passagem pela Igreja Sara a Nossa Terra), tem um histórico controverso. Depois de alcançar o poder máximo da Câmara Federal, a Presidência, em 2015, e de articular o impeachment da presidente da República Dilma Rousseff, em 2016, ele foi cassado, naquele ano, sob acusações de corrupção. Preso preventivamente, foi condenado, um ano depois, em 2017, tendo cumprido prisão domiciliar. O processo que o condenou foi anulado pelo Supremo Tribunal Federal, em 2023, que aceitou o argumento da defesa sobre erro de condução – havia sido julgado na esfera eleitoral e não federal.

Eduardo Cunha candidatou-se a deputado federal nas últimas eleições, em 2022, pelo PTB, por meio de articulações com o então presidente do partido Roberto Jefferson. Não alcançou votos suficientes mas conseguiu a eleição da filha Danielle Cunha (União-RJ), como deputada federal. Por meio dela, o ex-deputado passou a circular novamente pela Câmara Federal e, segundo avaliações de políticos da Casa, voltar a exercer influência.

Eduardo Cunha anunciou que será candidato novamente, em 2026, por uma vaga na Câmara. Como o culto do Maracanãzinho teve forte conotação política, isto pode explicar o destaque que foi dado ao ex-deputado com a concessão da palavra a ele no palco.

Imagem: extrato da transmissão ao vivo do culto – Youtube TV CPAD

No evento, foi concedida a palavra para candidatos que serão apoiados pela igreja nas eleições municipais, a começar do destacado dirigente do culto, um vereador do PSD da cidade fluminense de Volta Redonda, em busca de reeleição. Além dos discursos de deputados federais vinculados às Assembleias de Deus, entre outros com cargos, o candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, deputado federal Delegado Ramagem (PL) foi chamado ao palco para falar e apresentar a saudação do ex-presidente Jair Bolsonaro, que se expressou por meio de vídeo do telefone celular do parlamentar.

A imprensa que cobriu o evento também não ofereceu informações sobre o porque da presença de Eduardo Cunha no evento do Maracanãzinho. O Metrópoles chegou a afirmar que Cunha havia ajudado a “arrecadar recursos para custear o evento”, mas nenhum deles informou sobre a confessionalidade evangélica do político, nem sobre a vinculação do ex-deputado como membro de um dos ministérios das Assembleias de Deus (Madureira).

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Bereia
identifica erros na cobertura de boa parte do noticiário da imprensa brasileira sobre a vaia a Eduardo Cunha em culto celebrativo do Centenário das Assembleias de Deus no Estado Rio de Janeiro. A maioria dos veículos errou ao informar sobre o evento, no qual ocorreu expressão de vaias ao ex-deputado Eduardo Cunha, realizado no Maracanãzinho, em 29 de junho passado. A maior parte das mídias reproduziu conteúdo viralizado nas mídias digitais e registrou, equivocadamente, que o evento dizia respeito ao Centenário da “Igreja Assembleia de Deus no Brasil”.

Bereia identificou, além dos erros em relação à classificação da data celebrada e da referência a uma única (inexistente) Igreja Assembleia de Deus, a lacuna na informação do significado da presença de Eduardo Cunha e de outros políticos no evento.

É possível avaliar que tal erro seja resultante de desconhecimento do contexto evangélico por parte de jornalistas ao lado da prática comum de repetição de conteúdos que viralizam nas mídias, sem as devidas checagem e apuração, como apontam pesquisadores do tema.

Referências:

UOL, https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2024/06/30/eduardo-cunha-e-vaiado-durante-culto-da-assembleia-de-deus-no-rio-veja.htm. Acesso em 1 jul 2024

O Globo, https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2024/06/30/eduardo-cunha-e-vaiado-em-evento-evangelico-e-rebate-gesto-da-plateia-infiltracao-de-grupos-politicos.ghtml Acesso em 1 jul 2024

Metrópoles, https://www.metropoles.com/colunas/igor-gadelha/eduardo-cunha-vaiado-culto-rio Acesso em 1 jul 2024

Terra, https://www.terra.com.br/noticias/brasil/politica/videos/eduardo-cunha-e-vaiado-durante-culto-no-rj-ex-deputado-fala-em-infiltracao-de-grupos-politicos,4f43ef9900f3f031eb8793158d50feab4vmfseaz.html Acesso em 1 jul 2024

Fórum, https://revistaforum.com.br/politica/2024/7/1/video-eduardo-cunha-alvo-de-vaia-estrondosa-em-evento-da-assembleia-de-deus-no-rio-161377.html Acesso em 1 jul 2024

ICL, https://iclnoticias.com.br/eduardo-cunha-e-vaiado-por-evangelicos/ Acesso em 1 jul 2024

Pleno News, https://pleno.news/brasil/politica-nacional/eduardo-cunha-e-vaiado-em-evento-da-assembleia-de-deus.html Acesso em 1 jul 2024

Religião e Poder (Pentecostalismos, Glossário), https://religiaoepoder.org.br/artigo/pentecostalismos-no-brasil/ Acesso em 1 jul 2024

https://religiaoepoder.org.br/artigo/assembleias-de-deus-suas-convencoes-e-ministerios Acesso em 1 jul 2024

ALERJ, https://leisestaduais.com.br/rj/lei-ordinaria-n-10302-2024-rio-de-janeiro-declara-o-ano-de-2024-como-o-ano-do-centenario-das-assembleias-de-deus-no-estado-do-rio-de-janeiro?origin=instituicao Acesso em 1 jul 2024

Folha de S. Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painelsa/2024/03/governo-ve-digital-de-eduardo-cunha-em-projeto-de-falencias-e-cogita-barrar-votacao.shtml Acesso em 2 jul 2024

CNN, Eduardo Cunha anunciou que será candidato novamente, em 2026 Acesso em 2 jul 2024

Jornalismo Contemporâneo: figurações, impasses e perspectivas (livro), https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/1586/1/Jornalismo contemporaneo.pdf Acesso em 2 jul 2024

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Foto de capa: Wikimedia Commons

Destaques Bereia na Mídia em 2023

O Coletivo Bereia esteve presente em diversos espaços da mídia ao longo de 2023. Confira alguns destaques:

Abril – Jornal O Globo (Blog Sonar – a escuta das redes)

O Coletivo Bereia, por meio da editora-geral Magali Cunha, subsidiou o levantamento do jornal “O Globo” sobre fake news contra o governo Lula e o papel de evangélicos nessa estratégia. De acordo com Cunha, ao longo dos primeiros três meses do mandato, o modelo de desinformação se mantém nos mesmos moldes do que ocorreu em 2022 durante a campanha eleitoral: “O discurso ainda permanece o mesmo e com alguma repetição na formação de memes que são criados com alertas de pânico e em torno de alguns vídeos”. Confira o levantamento no site do jornal.

Julho – Programa Almoço no MyNews

A editora-geral Magali Cunha tratou de casos recentes envolvendo cristãos no cenário político. Em entrevista, ela explicou como o termo “cristofobia” é utilizado para ganho político e citou exemplos da época, como o caso do pastor André Valadão, enquadrado dentro das leis brasileiras por discurso de ódio. Veja no Instagram.

Julho – Rede TVT (Podcast do Conde)

A editora-geral Magali Cunha tratou de diversos temas durante a entrevista, entre eles o da interseção entre religião e política. Segundo ela, isso não é algo novo, mas a partir dos anos de 2010 o que se vê “é uma articulação ultraconservadora, especialmente no cristianismo, com uma estratégia de convencimento de determinada população que tem afeto pela religião e que abraça uma perspectiva que não é nada religiosa, mas puramente política, com ocupação de espaços de poder e de negação de direitos, especialmente dos das minorias”. Confira a entrevista completa no canal da TVT no YouTube.

Agosto – Agência Lupa

O pastor presbiteriano, integrante da equipe do Bereia André Mello destacou em entrevista à Agência Lupa o trabalho de combate à desinformação no meio evangélico que realiza ao longo de seu ministério. Mello, que também é jornalista e tradutor, ressaltou a importância de iniciativas como a do Bereia no esforço de checar fake news que vem crescendo nos dias de hoje e que alcançam os evangélicos, tanto na posição de alvos quanto na de disseminadores de fatos enganosos. De acordo com ele, “as mesmas figuras que hoje disseminam desinformação e tentam promover uma campanha de pânico moral, especialmente entre a comunidade evangélica, já faziam isso há no mínimo duas décadas”. Veja no site da Lupa.

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Foto de capa: Florian Pircher/Pixabay

Veículo extremista de direita divulga conteúdo enganoso sobre restrições à educação sexual e de gênero no Reino Unido

Circula em grupos de WhatsApp de igrejas, matéria publicada pela Revista Oeste, em 16 de maio passado, com o título “Reino Unido proíbe ensino de ideologia de gênero nas escolas”. Bereia recebeu de leitores a sugestão de checagem deste conteúdo que tem apelo em comunidades religiosas cristãs.

A matéria afirma que a secretária de Educação do Reino Unido (formado pelos países Inglaterra, Escócia, País de Gales, Irlanda do Norte) Gillian Keegan publicou comunicado na mesma data, que declara ser proibido o ensino da “ideologia de gênero” nas escolas.

A justificativa é que “esse tipo de ensinamento ‘ignora sexo biológico’”. O texto diz ainda que Keegan afirmou que isto não impede as escolas de ensinarem às crianças sobre as pessoas que se submetem à cirurgia de mudança de gênero.

Imagem: reprodução/Revista Oeste

Contexto           

A maior parte da matéria da Revista Oeste é a menção a duas entrevistas da secretária de Educação Gillian Keegan para oferecer mais justificativas: uma para a TV BBC e outra para o jornal Telegraph. A matéria diz que, à BBC, Keegan afirmou que muitos livros têm conteúdo impróprio para as escolas, pois “esse tipo de conteúdo ignora o sexo biológico”. Ela teria afirmado também à TV que não sabe se o problema é generalizado, mas o governo tomou a medida depois que alguns professores manifestaram preocupações.


A notícia em outros veículos de imprensa

Bereia verificou que a notícia da Revista Oeste foi repercutida pelo portal de notícias da Rede Record R7, com indicação do link para leitores e leitoras. A CNN deu a notícia com a mesma ênfase, variando apenas o foco, neste caso dado na palavra do primeiro-ministro Rishi Sunak (Partido Conservador) na defesa da pauta.

Imagem: reprodução/site R7

Imagem: reprodução/CNN

Esta mesma ênfase da notícia foi repercutida por vários veículos e portais que se alimentam de notícias de identidade conservadora, inclusive os religiosos.

Imagem: reprodução/Pleno.News

Outros três veículos de imprensa, O Globo, Folha de S. Paulo e O Dia, ofereceram outra informação, via agência France Press (AFP) de jornalismo: que o governo do Reino Unido “quer proibir”, “cria limite de idade” e “projeta limitar” aulas de educação sexual/de identidade de gênero nas escolas. Com apuração mais ampla, a matéria divulgada por estes veículos enfatiza a informação de que este é um projeto a ser implementado e não uma ação efetivada, como os demais levaram a crer.

Imagem: reprodução/O Globo

Imagem: reprodução/Folha de S.Paulo

Imagem: reprodução/O Dia

O que diz a imprensa do Reino Unido

O que nenhum dos veículos de imprensa no Brasil noticiou é que o que está em questão é um plano, um rascunho de proposta para limitar as idades em que o assunto “identidade de gênero” deve ser abordado nas escolas do Reino Unido – como Bereia apurou em uma pesquisa sobre a cobertura do tema na mais importante rede de imprensa,  a BBC News, e no jornais The Guardian e The Independent.

Segundo matéria da BBC News, de 16 de maio passado, com o título “Escolas são orientadas a não ensinar sobre identidade de gênero”, o veículo informa o que fontes governamentais disseram sobre os planos para proibir a educação sexual para menores de nove anos, bem como o ensino sobre identidade de gênero. A BBC News acrescenta que o primeiro-ministro Rishi Sunak disse que a nova orientação garantiria que as crianças não fossem “expostas a conteúdos perturbadores”.

No entanto, a matéria registra que alguns professores disseram que não há evidências de um problema generalizado. O texto acrescenta que de acordo com os planos, os alunos do ensino secundário aprenderão sobre características protegidas, tais como orientação sexual e mudança de gênero. Porém, a orientação atualizada deixa claro que as escolas “não devem ensinar sobre o conceito de identidade de gênero”, afirma o governo.

Imagem: reprodução/BBC

Em matéria intitulada “Alunos na Inglaterra podem aprender sobre cirurgia de gênero mas não ‘ideologia’, diz Keegan, o The Guardian informa que a orientação será aplicada apenas na Inglaterra, e não em todo o Reino Unido. De acordo com o documento publicado pelo governo, as escolas na Inglaterra serão proibidas de ensinar educação sexual a crianças menores de nove anos. O jornal explica que se espera que a orientação instrua as escolas a não ensinarem às crianças sobre “ideologia de gênero” e deixe claro que se trata de um assunto contestado, se solicitado. A secretária de Educação Gillian Keegan disse ao The Guardian que isso não impediria as escolas de ensinar às crianças sobre as pessoas que se submetem à cirurgia de mudança de sexo e que esta distinção era uma “maneira sensível” de lidar com isso.

The Guardian ouviu professora Jo Morgan, diretora executiva da organização Engendering Change, que realiza oficinas de educação sexual nas escolas. Ela disse que os ministros não deixaram claro o que queriam dizer com ensino de “identidade de gênero”.

Imagem: reprodução/The Guardian

Já o tradicional jornal The Independent, na matéria intitulada “Sunak defende planos de educação sexual como proibição de ensino de identidade de gênero em comparação com a odiada Seção 28 de Thatcher”, chama o plano do governo de controverso. O jornal enfatiza que os ministros devem proibir aulas de educação sexual para crianças menores de nove anos e da noção de identidade de gênero para adolescentes até 18 anos.

The Independent ouviu o chefe-executivo da Anistia Internacional Sacha Deshmukh, que denunciou os planos como “perigosos e colocam em risco a segurança e o bem-estar das crianças, enquanto as escolas enfrentam questões como a exposição de crianças a partir dos sete anos à pornografia”.

Deshmukh acrescentou ao The Independent: “toda uma geração de crianças e jovens LGBTI ficou marcada pela Secção 28 – devemos esforçar-nos para não cometer novamente os mesmos erros… Crianças de todas as idades têm direito a uma educação completa e não devem temer a discriminação. As escolas precisam de mais recursos, mais formação e mais apoio para que os professores proporcionem relações inclusivas, saúde e educação sexual que respondam aos desafios que as crianças enfrentam hoje.”

Imagem: reprodução/The Independent

A cobertura da TV e dos jornais britânicos contextualiza a pauta e oferece pontos de vista críticos à medida. Os veículos informam que o documento oficializa o controverso termo “ideologia de gênero”, avaliado cientificamente como um conceito inventado no espaço da Igreja Católica para confrontar os direitos de gênero conquistados a partir dos anos 90, mesclando a noção de educação sexual com conceitos de sexo anatômico/ biológico com gênero, permitindo que se discuta a cirurgia de mudança de sexo.

Polêmica deixa outros temas em segundo plano

Bereia ouviu o psicólogo e pastor da Igreja Metodista no Brasil, em atuação na Igreja Metodista Britânica Paulo Bessa sobre o caso.

O pastor enviou ao Bereia um relatório do Parlamento Britânico, a House of Commons, de abril passado, o qual oferece um quadro de como a temática de gênero vem sendo tratada nas escolas do Reino Unido, e também sobre a reação dos parlamentares e de organizações que trabalham com educação e com direitos à nova proposta do governo que impõe limites à educação sexual e de gênero.  Ele reafirma que apenas a Inglaterra aprovou a aplicação das novas medidas.

O pastor Paulo Bessa afirma que não sabe se esta medida será, de fato implementada, pois há grande possibilidade de o Partido Conservador não ser reeleito nas próximas eleições. Para ele, levantar esta questão é apenas desviar dos temas fundamentais que vem afligindo a população nos últimos anos e que, estes sim, deveriam ter políticas de enfrentamento. Bessa listou, a pedido do Bereia, os principais problemas do país hoje:

  1. Custo de vida alto e inflação. No ano passado, a inflação oficial chegou a 11% ao ano, altíssima para os padrões britânicos.
  2. Financiamento do sistema público de saúde, o NHS. Já se vê aqui o que acontece em alguns hospitais brasileiros: pacientes sendo colocados em camas nos corredores.
  3. Moradia: há um déficit de moradias em Londres, mais especificamente, e a população de sem-teto tem aumentado, pois muitas pessoas não conseguem pagar os preços atualmente cobrados pelos “locatários”.
  4. Não tenho números oficiais, mas um “Conselheiro” de Hackney, “Boroughs” em que resido, cargo mais ou menos equivalente ao dos vereadores, disse-me que faltam 90 mil  moradias em Londres. “Boroughs” são unidades administrativas parlamentaristas, com Conselheiros eleitos pela população, que administram a vida de áreas equivalentes às subprefeituras de São Paulo, por exemplo. Só que lá, em São Paulo, o prefeito indica os subprefeitos. Aqui, cada “borough” tem um/a prefeito/a, eleito/a pela população, que administra a unidade a partir do parlamento local, que é o “Conselho”.
  5. “Rough sleepers” são as pessoas que dormem diretamente nas ruas. Homeless podem ser pessoas que encontram um abrigo temporário oficial ou não. Temos um trabalho de acolhida a homeless em duas de minhas igrejas e converso com pessoas que ocupam construções abandonadas, mas vivem sem água, eletricidade ou aquecimento. Ofereço um artigo sobre o tema, do começo do ano, mas dá, aos leitores do Bereia, uma ideia do problema

O pastor destaca que é importante lembrar que os planos privados de saúde (convênios) não são comuns, como no Brasil. O sistema de saúde todo é conectado ao NHS. Mesmo que uma pessoa vá a um/ médico/a privado, este/a profissional deve enviar relatório de consultas, exames, etc para o GP (General Practitioner), que é a clínica do bairro, responsável pela guarda do histórico relacionado à saúde dos indivíduos. O NHS atende  todas as pessoas oficialmente residentes no Reino Unido, mas não é universal como no Brasil, onde até os/as turistas estrangeiros podem ser atendidos/as pelo SUS sem terem que pagar.

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Bereia classifica a matéria da Revista Oeste, que circula em grupos de WhatsApp de igrejas como enganosa. É fato que o governo do Reino Unido apresentou um plano para uma possível restrição à educação sexual e de gênero em escolas dos países que o compõem. No entanto, a notícia é oferecida como proposta já implementada, o que não é verdade pois está em discussão e diz respeito apenas à Inglaterra, neste momento. O veículo quer chamar a atenção para uma suposta cruzada internacional contra a chamada “ideologia de gênero” e veicula conteúdo descontextualizado, com informações erradas (a medida não será aplicada a todo o Reino Unido) e sem os dados necessários para oferecer um panorama do que significa esta política do governo britânico no atual momento do país.

Bereia chama a atenção de leitores e leitoras sobre a prática de veículos e lideranças extremistas de direita de divulgar conteúdo desinformativo sobre casos em outros países, com situações distantes, na maioria das vezes, pouco conhecidas no Brasil. É importante buscar fontes locais, como feito nesta entrevista, para conhecer o verdadeiro teor dos casos.


Referências de checagem:

R7, https://noticias.r7.com/internacional/revista-oeste/reino-unido-toma-medida-polemica-proibe-ensino-de-ideologia-de-genero-nas-escolas-17052024/ . Acesso em 27 mai 2024.

CNN, https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/americo-martins/internacional/reino-unido-proibe-ensino-sobre-identidade-de-genero-nas-escolas/ . Acesso em 27 mai 2024.

O Globo, https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2024/05/16/reino-unido-quer-proibir-aulas-sobre-identidade-de-genero-nas-escolas.ghtml  . Acesso em 27 mai 2024.

Folha de S. Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2024/05/reino-unido-cria-limite-de-idade-para-educacao-sexual-nas-escolas.shtml . Acesso em 27 mai 2024.

O Dia, https://odia.ig.com.br/mundo-e-ciencia/2024/05/6846710-reino-unido-projeta-limitar-aulas-de-identidade-de-genero-nas-escolas.html . Acesso em 27 mai 2024.

BBC News, https://www.bbc.co.uk/news/education-69017920. Acesso em 28 mai 2024.

The Guardian, https://www.theguardian.com/world/article/2024/may/16/pupils-in-england-will-not-be-taught-gender-ideology-says-gillian-keegan . Acesso em 28 mai 2024.

The Guardian, https://www.theguardian.com/uk-news/2024/mar/04/nhs-funding-faces-biggest-real-terms-cuts-since-1970s-warns-ifs Acesso em 28 mai 2024.

The Independent. https://www.independent.co.uk/news/uk/politics/rishi-sunak-sex-gender-identity-section-28-b2546256.html . Acesso em 28 mai 2024.

House of Commons, https://researchbriefings.files.parliament.uk/documents/CBP-9078/CBP-9078.pdf. Acesso em 28 mai 2024.

Governo do Reino Unido, https://www.ons.gov.uk/economy/inflationandpriceindices. . Acesso em 28 mai 2024.

Inside Housing, https://www.insidehousing.co.uk/comment/government-has-failed-to-face-up-to-the-real-cost-of-fixing-londons-housing-crisis-84671. Acesso em 28 mai 2024.

Bereia, https://coletivobereia.com.br/panico-moral-sobre-ideologia-de-genero-aborto-erotizacao-de-criancas-e-defesa-da-familia-e-usado-para-disputa-eleitoral-com-base-em-desinformacao/. Acesso em 30 mai 2024

Bereia presente em curso latino-americano para militantes cristãos

A editora-geral do Bereia Magali Cunha participou em 21 de maio de uma das etapas do Curso Latino-Americano para Militantes Cristãos 2024, promovido pelo Centro Ecumênico de Evangelização e Educação Popular (Ceseep).

O evento, cujo tema foi “Juventude e o compromisso com a política e a justiça socioambiental”, reuniu em São Paulo pessoas do Equador, México, Cuba e Argentina para a troca de experiências sobre os desafios que enfrentam nas diferentes realidades onde estão inseridos e atuam. No formato híbrido do curso, na parte da tarde, uniram-se ao grupo, pela internet, outros participantes do Brasil, Angola, Cuba, Equador e República Dominicana.

Em sua reflexão a respeito de redes digitais e participação na política, Magali Cunha ressaltou por que o assunto é tão importante nos dias de hoje. “As mídias são parte do cotidiano da população e determinam o fazer político, seja o institucional (eleições, decisões nos três poderes, por exemplo), seja o das manifestações partidárias ou não no espaço público”.

O tema das mídias e a relevância delas para o ativismo social cristão tem sido priorizado nos  cursos oferecidos pelo Ceseep desde o início dos anos de 2000. Neste ano, o foco foi o lugar das mídias digitais no ativismo político e na defesa da paz com justiça. “Foi importante compartilhar sobre os processos comunicacionais digitais, o que devemos valorizar e o que devemos criticar (rechaçar e transformar), em especial tratar do enfrentamento da desinformação (as mentiras e os enganos) e dos ataques de ódio e intolerância, questões que mais preocupam os participantes”, comentou a pesquisadora. O trabalho do Bereia também foi abordado durante o diálogo com os militantes cristãos que participaram do curso. Segundo a pesquisadora,  o coletivo representa uma das formas pelas quais ocorre esse enfrentamento.

Lideranças religiosas mentem e enganam sobre as enchentes que atingem o RS

Com colaboração de Magali Cunha, André Mello, Naira Diniz, Gabriella Vicente e João Pedro Capobianco

* Matéria atualizada em 21/05/2024 para ajuste de título, texto e acréscimo e correção de informações

As fortes chuvas que atingem o Estado do Rio Grande do Sul desde o 27 de abril passado causaram um verdadeiro cenário de destruição, marcado por um  aumento no número de pessoas desabrigadas, de desaparecidas e mortas. Ao contrário dos temporais ocorridos no ano de 2023, que atingiram áreas isoladas, desta vez mais de 80% dos municípios do estado gaúcho foram afetados.

Os dados são preocupantes: até o fechamento desta matéria, 161 pessoas foram encontradas mortas, e 85 estão desaparecidas. Além disso, dezenas de milhares de pessoas estão desalojadas ou desabrigadas, com 1,5 milhão de pessoas afetadas pelo que o governador Eduardo Leite (PSDB) chamou de “uma catástrofe”. Em 1º de maio, o governo local decretou estado de calamidade em uma edição extra do Diário Oficial do Estado.

O governo federal criou um gabinete de crise para operar com as frentes de ação constituídas pelo Poder Executivo do Estado do Rio Grande do Sul no enfrentamento da tragédia. Em quatro viagens aos locais atingidos, o presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve acompanhado de mais de uma dezena de ministros de pastas-chave para o socorro humanitário.

Na segunda comitiva, Lula levou o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PL-AL), o ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas, já que os três poderes devem agir conjuntamente na aprovação de medidas necessárias para a superação da tragédia vivida pelo estado gaúcho.

Em 15 de maio o governo criou a Secretaria Extraordinária da Presidência da República de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, com status de ministério. O secretário de Comunicação do Governo Paulo Pimenta foi nomeado o titular da pasta.

No acompanhamento das publicações sobre o tema em ambientes digitais religiosos, Bereia verifica três posturas: 

  • Amplas manifestações de empatia com a população atingida e o estado, com orações pelo fim das chuvas e pelo alívio do sofrimento, além de chamados às ações de solidariedade (recolhimento de alimentos, água, roupas);
  • Classificações da tragédia como castigo de Deus por conta de o estado ter baixo número de evangélicos contrapondo o alto número de expressões afro religiosas (viralização do vídeo de uma influenciadora) e  por conta de o Rio Grande do Sul ter dado ampla votação a Jair Bolsonaro – em relação aos compartilhamentos e comentários dos dois conteúdos, há apoio e reforço (em menor número) e crítica e reprovação (em maior número); 
  • Uso político da tragédia, por parte de lideranças religiosas e políticos com identidade religiosa, para criticar o governo federal, as esquerdas, o presidente da República e sua esposa Rosângela (Janja) da Silva, com muito uso de conteúdo falso, enganoso e impreciso.

Nesta matéria, Bereia dedica atenção à desinformação circulante promovida por lideranças e políticos religiosos para uso político da tragédia. 

Júlia Zanatta

A deputada federal católica Júlia Zanatta (PL-SC) publicou em seu perfil no Instagram, em 3 de maio, um vídeo que mostra o presidente Lula, ao chegar ao Rio Grande do Sul, respondendo a um pedido de aceno e dizendo que vai torcer pelos times gaúchos de futebol, Grêmio e Internacional.

Em seguida, são exibidas imagens de cidades inundadas e pessoas em telhados de casas esperando por resgate. O narrador do vídeo traz dados referentes ao desastre e afirma que “o descaso de Lula foi além da declaração futebolística”. Diz, também, que o governo manteria o Concurso Nacional Unificado, adiado pelo governo federal na sexta-feira, 3 de maio. O vídeo termina com informações para quem quiser ajudar e com a declaração: “Lula não tem condições mínimas de ser chefe da nação”.

Imagem: reprodução/Instagram

Este vídeo foi explorado por várias personagens que fazem oposição ao governo federal e repercutido em veículos que divulgam notícias produzidas pela extrema direita. O trecho é uma gravação das imagens da chegada do presidente Lula em sua primeira visita ao Rio Grande do Sul inundado, em 3 de maio. No recorte, ao desembarcar na cidade de Santa Maria, uma das mais atingidas, após ouvir o pedido de homem não identificado “Acena pra gente aí”, o presidente diz “Estou torcendo pelo Grêmio e pelo Internacional”. Críticos alegaram que Lula debochou do povo gaúcho no seu sofrimento. Já a presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) Gleisi Hoffmann, ao comentar a crítica sobre o tema publicada pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL/MG) disse que a fala de Lula foi “uma clara metáfora ao lema ‘todos somos um’, mostrando que era um momento de união do povo gaúcho para enfrentar a tragédia que aconteceu”.

Imagem: reprodução/X

Um outro vídeo publicado por Zanatta exibe, na parte superior da tela, u a deputada afirma que a primeira-dama, Janja, “estava ansiosa” para se encontrar com a cantora e que a atitude da primeira-dama demonstra falta de preocupação para com a situação do povo gaúcho.

Um outro vídeo publicado por Zanatta, em 5 de maio, exibe, na parte superior da tela, um trecho do Jornal Nacional com cenas da apresentação da cantora Madonna na praia de Copacabana e, na parte inferior, pessoas sendo resgatadas de inundações. Na descrição da postagem,a deputada afirma que a esposa do presidente Janja da Silva “estava ansiosa” para se encontrar com a cantora e que a atitude dela demonstraria falta de preocupação para com a situação do povo gaúcho.

A divulgação de que Janja estaria no show da cantora Madonna, no Rio de Janeiro, em 4 de maio, partiu do colunista do jornal O Globo, Lauro Jardim, e foi tema bastante explorado para críticas de descaso com a tragédia no sul, do presidente da República e sua esposa. O secretário-executivo do Ministério da Cultura publicou no X, na tarde do dia do show de Madonna, que Janja da Silva, esteve com a ministra Margareth Menezes cumprindo agendas para ações de cultura do G-20 no Rio de Janeiro e que já se encontrava de volta em Brasília após os compromissos.

Imagem: reprodução/X

Os deputados federais e senadores gaúchos destinaram quase R$ 1,6 bilhão em emendas individuais e de bancada para o estado em 2024, fazendo 408 aportes diferentes. Todavia, apenas três deputadas enviaram recursos relacionados às enchentes: Fernanda Melchionna (PSOL-RS) fez duas emendas, num total de R$ 1,7 milhão, para a elaboração de projetos de prevenção à erosão costeira e para gestão socioambiental. Maria do Rosário (PT-RS) e Reginete Bispo (PT-RS) disponibilizaram, respectivamente, R$ 500 mil e R$ 300 mil para ações de educação ambiental. 

Luís Carlos Heinze 

Em meio à comoção nacional gerada pelo desastre climático, repercutiu nas redes um vídeo no qual o senador Luís Carlos Heinze (PP/RS) defende o produtor rural e argumenta que os produtores não podem ser culpados pelas chuvas volumosas que atingiram o Rio Grande do Sul. 

O senador disse que Organizações Não-Governamentais deveriam arcar com os custos do desastre e alegou não acreditar no aquecimento global: “Eu não acredito [em aquecimento global]. (…) Quero que as ONGS, aqueles que defendem, ponham a mão no bolso, não eu e os produtores”, conclui Heinze.

Imagem: reprodução/X

O vídeo foi gravado em 29 de novembro de 2016, quando o senador Heinze deu entrevista à imprensa após um almoço da Frente Parlamentar da Agropecuária, realizada semanalmente em uma mansão no Lago Sul, Brasília.

Lucas Redecker

Circulou pelas mídias sociais uma publicação do jornalista André Trigueiro, da Rede Globo, que afirma que o deputado federal evangélico (Luterano) Lucas Redecker (PSDB – RS) foi o relator do projeto aprovado, em março passado, pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O jornalista informa que o projeto autoriza o desmatamento de 48 hectares de “campos nativos”.

Imagem: reprodução/X

Em resposta ao conteúdo da publicação, o parlamentar postou em seu perfil no Instagram, na terça-feira 7, um vídeo no qual afirma que em meio à grave situação ocasionada pelas chuvas no Rio Grande do Sul há pessoas divulgando fake news sobre deputados e governos, especificamente sobre o Projeto de Lei 364, de autoria do deputado Alceu Moreira, do qual Redecker é o relator.

Em resposta ao conteúdo da publicação, o parlamentar postou em seu perfil no Instagram, em  7 de maio, um vídeo em que tenta se desvincular do projeto destrutivo do meio ambiente, para o qual deu parecer de aprovação .  Ele atribui a informação a “fake news das esquerdas”.

Imagem: reprodução/Instagram

Bereia checou que Lucas Redecker deu parecer de aprovação ao projeto do deputado Alceu Moreira (MDB/RS). O texto trata, de fato, como denuncia André Trigueiro, da liberação da utilização da vegetação nativa dos Campos de Altitude associados ou abrangidos pelo bioma Mata Atlântica para ampliação das áreas plantio do agronegócio.

Vídeo de Pablo Marçal: desinformação compartilhada por congressistas

Em 6 de maio, o senador Cleitinho (Republicanos-MG) compartilhou em suas páginas, nas redes digitais, um vídeo no qual afirma que a Secretaria de Estado da Fazenda do Rio Grande do Sul estaria impedindo a entrada de caminhões com doações porque os produtos não tinham nota fiscal. O senador reforça o conteúdo do vídeo com seus próprios comentários e ainda questiona a ação do governo federal para ajudar a população castigada pelo evento climático extremo. 

O vídeo foi divulgado originalmente pelo influenciador digital Pablo Marçal, que conta com mais de cinco milhões de seguidores no Instagram. Ele é reincidente na prática de disseminar notícias falsas e é alvo de investigação da Polícia Federal por disseminar afirmações que as urnas eletrônicas foram fraudadas nas eleições de 2022, repercussão ao discurso do ex-presidente e candidato à reeleição na época, Jair Bolsonaro (PL). As informações postadas por Marçal também foram compartilhadas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Imagem: reprodução X

Diante da ampla disseminação desta mentira, a Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul emitiu nota, em 6 de maio, para afirmar que os veículos que transportam doações não estavam sendo retidos.  O órgão público chamou as publicações de “informação incorreta” e disse que os servidores estavam orientados pela Receita Estadual a liberarem todas as cargas com donativos nos postos fiscais.

Pablo Marçal, Cleitinho e Eduardo Bolsonaro foram citados em um ofício enviado pelo ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom) Paulo Pimenta ao ministro da Justiça e Segurança Pública Ricardo Lewandowski.

No documento, encaminhado à Polícia Federal (PF), o governo aponta onze publicações desinformativas sobre a tragédia no Rio Grande do Sul e afirma que elas estão atrapalhando as operações de salvamento e acolhimento, causando transtornos a uma população já fragilizada. Além disso, a Secom também divulgou as medidas adotadas pelos órgãos de transporte para agilizar o fluxo de doações para o estado gaúcho.

Show da Madonna e dinheiro público: outro tema de desinformação

Uma outra tática política de desinformação é destacar um tema comportamental – no caso, o show da cantora estadunidense Madonna no Rio de Janeiro, em 4 de maio, como já mencionado nesta matéria.

O senador Jorge Seif (PL-SC) também criticou o show de Madonna, mas somente após ter sido flagrado na área VIP do evento. Vale lembrar que Santa Catarina, seu estado, faz fronteira com o Rio Grande do Sul e também foi afetado pelas chuvas intensas.

Em um estado que recebeu centenas de migrantes gaúchos, o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) também criticou o show da cantora pop. Ele repostou uma publicação que afirma haver “dois países diferentes” no Brasil: um que enfrenta as enchentes e está “abandonado pelo governo”, e outro que assiste ao que chamou de “espetáculo de chorume moral protagonizado por uma depravada decadente”.

Imagem: reprodução X 

O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) seguiu a mesma linha, atacando a ministra do Meio Ambiente Marina Silva, por agradecer a Madonna pelas mídias digitais. A ministra foi homenageada pela cantora no telão do show em Copacabana. “No dia em que bebês estavam boiando mortos no RS”, disparou o deputado. Nikolas também tem usado as mídias para pedir apoio e doações para as vítimas da tragédia.

Outro episódio que ganhou destaque em grupos de WhatsApp foi um print falso de uma suposta conversa entre a primeira-dama Janja da Silva e a cantora Madonna.

Bereia verificou ser falsa a conversa entre ambas, uma vez que, além de ser ficção flagrante (Madonna ter um Pix, por exemplo), é nítida a montagem feita para difamar a imagem da esposa do presidente da República e utilizar como prática de desinformação o show que reuniu mais 1,6 milhões de espectadores no Rio de Janeiro.

Imagem: reprodução/WhatsApp

Além disso, informações falsas de que o Governo Federal teria gasto R$ 50 milhões no show da cantora, repercutiram também na rede digital X (antigo Twitter). A agência Lupa verificou o fato e publicou ser falsa a informação. Em nota, o governo Federal lamenta a “falsa narrativa” e reforça a necessidade de uma abordagem mais responsável:

“Este episódio serve como um lembrete crítico da necessidade de uma abordagem mais rigorosa e responsável no combate à desinformação. Informações falsas não apenas distorcem a realidade, mas podem ter consequências diretas sobre as vidas e a segurança das pessoas. Em tempos de crise, a verdade e a integridade da informação não são apenas uma necessidade cívica, mas uma questão de sobrevivência. Como sociedade, devemos exigir responsabilidade daqueles que divulgam informações e trabalhar juntos para promover uma cultura de integridade e precisão informativa”.

A turnê “The Celebration Tour”, que comemorou os 40 anos de carreira de Madonna, e terminou para um público de mais de um milhão e meio de pessoas na Praia de Copacabana, custou cerca de R$ 60 milhões. Este valor foi pago pelo banco Itaú (R$ 40 milhões) e por patrocinadores como a cervejaria Heineken e o aplicativo de reprodução musical Deezer. De acordo com dados do estudo realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Econômico (SMDUE), o Governo do Estado do Rio de Janeiro investiu R$ 10 milhões no evento, e a prefeitura do Rio arcou com mais de R$ 10 milhões.

O impacto da desinformação no Rio Grande do Sul

Bereia entrevistou a pastora da Igreja Metodista em Santa Maria (RS) Margarida Ribeiro. Ela afirma que as mentiras e os enganos não têm colaborado para a ação solidária que está ocorrendo e enfatiza que a prática de desinformar está crescendo a cada dia.

A pastora Margarida Ribeiro ainda complementa que toda má informação não ajuda ninguém, só atrapalha. “E atrapalha às vezes ao ponto de socorrer vidas e faltar o que é essencial para as pessoas nesse momento.” Ela reforça que toda ação tem uma intenção, mas que agora não é tempo de julgar, pois o foco é a vida, e finaliza declarando:  “Que esse tempo proporcione uma nova fraternidade, mais fraterna”.

A disseminação de desinformação em meio a eventos trágicos, como as recentes enchentes no Rio Grande do Sul, é um fenômeno preocupante. Isso pode desencadear uma série de graves consequências. Enquanto as autoridades e voluntários se esforçam para ajudar as vítimas, informações falsas circulam, dificultando as ações de resgate e apoio. 

Influenciadores digitais, entre eles os que possuem o selo de verificação de plataformas de mídias, promovem teorias da conspiração sobre eventos climáticos, que são classificados como artificiais, fictícios e superdimensionados.  Por mais que haja um esforço para restringir e remover esses conteúdos, ainda não é o suficiente, dada a quantidade de publicações com as mesmas informações e a ramificação para as outras plataformas como TikTok, X (antigo Twitter), Instagram, WhatsApp, Telegram etc.

Bereia alerta que, por mais que o conteúdo circule em grande escala e seja encaminhado por pessoas conhecidas, leitores e leitoras devem sempre desconfiar de material alarmante e contraditório das informações oficiais. Também é preciso atentar ao fato de que o consenso científico reconhece  a influência humana nas mudanças climáticas e esta responsabilidade deve ser assumida por governantes e por quem os elege.

Diante do alto volume de desinformação que prejudica o socorro às vítimas, Bereia indica a iniciativa Verifica RS, que tem o propósito distribuir conteúdo verificado nas mídias sociais e em grupos de moradores do Rio Grande do Sul. A iniciativa conta com os canais no Instagram (@rsverifica) e no TikTok (@rsverifica).

Referências de checagem:

AGÊNCIA LUPA. É falso que governo Lula patrocinou show da Madonna e deixou de enviar recursos para as vítimas das tragédias no RS. Agência Lupa, 07 maio 2024. Disponível em: https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2024/05/07/e-falso-que-governo-lula-patrocinou-show-da-madonna-e-deixou-de-enviar-recursos-para-as-vitimas-das-tragedias-no-rs . Acesso em: 13 maio 2024.

CNN BRASIL. Fake news sobre tragédias no RS: Governo pede que PF investigue postagens de Eduardo Bolsonaro, senador Cleitinho e Pablo Marçal. CNN Brasil, Política, 2024. Disponível em: https://cnnbrasil.com.br/politica/fake-news-sobre-tragedias-no-rs-governo-pede-que-pf-investigue-postagens-de-eduardo-bolsonaro-senador-cleitinho-e-pablo-marcal . Acesso em: 13 maio 2024.

DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. União de todos os lados pela reconstrução do Rio Grande do Sul. Diário Oficial do Estado do Rio Grande do Sul, 2024. Disponível em: https://diariooficial.rs.gov.br/materia?id=997980 . Acesso em: 13 maio 2024.

G1. Enem dos Concursos: Governo fala sobre o Concurso Nacional Unificado (CNU). G1, Trabalho e Carreira, 17 jan. 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/concursos/ao-vivo/enem-dos-concursos-governo-fala-sobre-o-concurso-nacional-unificado-cnu . Acesso em: 13 maio 2024.

G1. PF faz operação contra coach investigado por divulgar fake news sobre urnas. G1, Política, 17 jan. 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/01/17/pf-faz-operacao-contra-coach-investigado-por-divulgar-fake-news-sobre-urnas . Acesso em: 13 maio 2024.

G1. Temporais no RS: veja cronologia de desastre. G1, Rio Grande do Sul, 05 maio 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2024/05/05/temporais-no-rs-veja-cronologia-de-desastre . Acesso em: 13 maio 2024.

GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Governo do Estado destaca resultado positivo das ações realizadas para o show da Madonna. Governo do Estado do Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://rj.gov.br/noticias/governo-do-estado-destaca-resultado-positivo-das-acoes-realizadas-para-o-show-da-madonna1347 . Acesso em: 13 maio 2024.

INSTAGRAM. Postagem do perfil @mentiratempreco. Instagram, 2024. Disponível em: https://instagram.com/p/C6o5zvqvikF . Acesso em: 13 maio 2024.

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL. União de todos os lados pela reconstrução do Rio Grande do Sul. Governo Federal, 2024. Disponível em: https://gov.br/mdr/pt-br/noticias/uniao-de-todos-os-lados-pela-reconstrucao-do-rio-grande-do-sul . Acesso em: 13 maio 2024.

O GLOBO. Bolsonarista Jorge Seif pede desculpas por ter ido ao show da Madonna: “Decepcionei meu eleitorado”. O Globo, Política, 07 maio 2024. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2024/05/07/bolsonarista-jorge-seif-pede-desculpas-por-ter-ido-ao-show-da-madonna-decepcionei-meu-eleitorado . Acesso em: 13 maio 2024.

O GLOBO. Chega a 145 o número de mortos pelas chuvas no Rio Grande do Sul. O Globo, Brasil, 12 maio 2024. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/sos-rio-grande-do-sul/noticia/2024/05/12/chega-a-145-o-numero-de-mortos-pelas-chuvas-no-rio-grande-do-sul-e-cresce-numero-de-desaparecidos . Acesso em: 13 maio 2024.

O SUL. Bolsonaristas criticam Janja por suposta ida ao show de Madonna em meio à tragédia no Rio Grande do Sul; secretaria de governo negou. O Sul, 2024. Disponível em: https://osul.com.br/bolsonaristas-criticam-janja-por-suposta-ida-ao-show-de-madonna-em-meio-a-tragedia-no-rio-grande-do-sul-secretaria-de-governo-negou . Acesso em: 13 maio 2024.

PREFEITURA DO RIO DE JANEIRO. Estudo de Impacto: Show Madonna. Prefeitura do Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://prefeitura.rio/wp-content/uploads/2024/04/Estudo-Impacto-Show-Madonna.pdf . Acesso em: 13 maio 2024.SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Governo Federal aciona PF para punir quem propaga fake news sobre catástrofe no Rio Grande do Sul. Secom, 2024. Disponível em: https://gov.br/secom/pt-br/assuntos/noticias/2024/05/governo-federal-aciona-pf-para-punir-quem-propaga-fake-news-s . Acesso em: 13 maio 2024.

BRASIL DE FATO. Rio Grande do Sul tem 154 mortes e 94 desaparecidos. Disponível em: https://istoe.com.br/rio-grande-do-sul-tem-154-mortes-e-94-desaparecidos/ Acesso em: 17 maio 2024.

G1. Lula cria secretaria extraordinária para reconstrução do RS; Paulo Pimenta vai comandar órgão https://g1.globo.com/politica/noticia/2024/05/15/governo-confirma-pimenta-em-cargo-para-coordenar-acoes-federais-de-reconstrucao-do-rs.ghtml Acesso em: 17 maio 2024.

YOUTUBE. https://youtu.be/tcXdZtQiTY4 Acesso em: 20 maio 2024.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2190986&fichaAmigavel=nao Acesso em: 20 maio 2024.

CORREIO BRAZILIENSE. Pablo Marçal é alvo de operação da PF que investiga crimes eleitorais https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2023/07/5106830-pablo-marcal-e-alvo-de-operacao-da-pf-que-investiga-crimes-eleitorais.html Acesso em: 20 maio 2024.

O SUL. Bolsonaristas criticam Janja por suposta ida ao show de Madonna em meio a tragédia no Rio Grande do Sul; Secretaria de Governo negou. https://www.osul.com.br/bolsonaristas-criticam-janja-por-suposta-ida-ao-show-de-madonna-em-meio-a-tragedia-no-rio-grande-do-sul-secretaria-de-governo-negou/ Acesso em: 20 maio 2024.

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Foto de capa: Imagem: Lauro Alves /Governo RS

Mídia precisa conhecer mais sobre pluralidade religiosa, defende editora-geral do Bereia

Um dos grandes desafios da mídia é conhecer mais sobre a pluralidade religiosa que existe no país, compreender as particularidades de cada grupo, visando a uma divulgação mais adequada e correta. Ela não pode deixar de ser crítica, mas também ressaltar esses elementos que integram a vida cotidiana das pessoas. A opinião é da editora-geral do Bereia Magali Cunha, que foi entrevistada em 13 de março pelo Canal da Imprensa, revista eletrônica de crítica de mídia do curso de Jornalismo do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), campus Engenheiro Coelho.

Na conversa, que tratou da importância cultural da religião no Brasil e suas implicações na cobertura da imprensa de notícias sobre o tema, Magali explicou que as religiões dão sentido à vida de muitas pessoas. Segundo ela, há também o aspecto de resistência e sobrevivência, “como foi no período da escravidão, e também do ponto de vista indígena, a toda a opressão sofrida ao longo da história da colonização”.

De acordo com a pesquisadora, até hoje é possível observar “diversas experiências de periferias e de grupos excluídos socialmente que encontram na religião essa leitura e uma presença divina que marca a força, que marca a resistência”.

Magali Cunha destacou que a mídia tem um papel importante nas questões que envolvem o tema, até mesmo no sentido de enfrentar a intolerância religiosa, mas criticou a falta de preparo dos profissionais, a começar pela formação acadêmica oferecida a eles.

“Nós não temos nas escolas de jornalismo no Brasil suficiente formação para o jornalismo especializado [em religião]. Em várias áreas, dá-se muita ênfase em política, em economia, em cultura, mas na questão da religião é praticamente zero”, ressaltou a editora-geral de Bereia.

Confira no site do Canal da Imprensa a íntegra da entrevista.

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Foto de capa: Warpmike/Pixabay

No Dia Internacional da Mulher, editora-geral do Bereia é homenageada pelo enfrentamento à desinformação

A editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha foi uma das mulheres homenageadas pela Agência Lupa no Dia Internacional da Mulher neste 2024 pelo trabalho de enfrentamento à desinformação. Sob o  título “8 cientistas mulheres que pesquisam desinformação que você precisa conhecer”, Lupa, um hub de soluções de combate à desinformação por meio do jornalismo e da educação midiática, as apresentou e também trouxe uma reflexão de cada uma dentro da área de atuação delas.

Imagem: reprodução do X

Além de Magali Cunha, também receberam o reconhecimento Ana Regina Rego (coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação – RNCD), Luisa Massarani (Fiocruz), Thaiane Moreira (UFF), Adriana Barsotti (UFF), Alyne Costa (PUC-RJ), Marie Santini (UFRJ) e Helena Martins (UFC).

Em seu artigo, publicado na revista Debates da NER e reproduzido na Lupa, a editora-geral do Bereia aborda o impacto das mídias sociais no voto das mulheres evangélicas. O foco é a pesquisa qualitativa realizada por Jaqueline Teixeira e Lívia Reis com 45 mulheres evangélicas de diferentes denominações, idades e regiões do Brasil. De acordo com Magali Cunha, três elementos são essenciais em qualquer análise sobre política no Brasil: religião, gênero e mídias.

“Quaisquer considerações sobre a presença de evangélicos na igreja e nas dinâmicas socioculturais e políticas do Brasil precisam levar em conta a expressão de uma religião que carrega simbólicas e intensas marcas das lógicas da mídia e de seu processo de produção de sentidos”, destacou a pesquisadora.

Bancada evangélica no Congresso Nacional não representa a totalidade dos evangélicos, defende editora-geral do Bereia

“Falar de evangélicos não é falar de bancada evangélica. A bancada evangélica, aquele grupo de parlamentares que se encontra no Congresso Nacional, não representa a população e o eleitorado evangélico no Brasil, que é muito amplo”. A opinião é da editora-geral do Coletivo Bereia Magali Cunha, que foi entrevistada pelo canal Globonews no dia 23 de março.

Magali Cunha falou sobre a aproximação do governo Lula com o segmento evangélico e explicou a diversidade do campo religioso. Segundo ela, a chamada banca evangélica diz respeito a um segmento dos políticos que não representam os evangélicos, apesar de alguns desempenharem esse papel pelo fato de defenderem o projeto político da igreja a que pertencem.

A editora-geral do Bereia adverte que é preciso distinguir os evangélicos, que constituem um segmento muito diverso: “Existem pastores que pertencem a grandes corporações religiosas que não são apenas igrejas, mas que atuam em outras frentes e que têm interesse em eleger seus políticos para a bancada evangélica”, indica.

Magali Cunha também cita os pastores e pastores que estão no campo intermediário das igrejas médias e pequenas, que são os grupos mais amplos espalhados pelo Brasil. Inclui ainda a grande massa da população, do eleitorado evangélico “que vai à igreja, que participa e que vive o seu cotidiano entre essa vinculação que é a fé, a religião e a vida de todo o dia”. Em sua opinião, esse universo amplo deve ser considerado para um governo defensor e garantidor da liberdade religiosa e que deseja estabelecer um diálogo com esse segmento que vem se mostrando relevante na cena pública.

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Foto de capa: reprodução Globonews

Evangélicos formam um bloco múltiplo, e tentar homogeneizá-los é incorreto, dizem pesquisadoras

Não é possível – e muito menos correta – a tentativa de homogeneização dos evangélicos, enquadrando-os em um único bloco; ao contrário, eles devem ser vistos como heterogêneos, pertencentes a diversas denominações que seguem teologias e práticas completamente distintas. A opinião, publicada em artigo da agência de notícias Intercept Brasil em 27 de março, é das pesquisadoras Magali Cunha e Lívia Reis. De acordo com as autoras, essa homogeneização não reflete a realidade, além de ser nociva ao debate público. “Ninguém é ‘evangélico’ igual, ninguém é só ‘evangélico’”, advertem.

Magali Cunha, editora-geral do Coletivo Bereia, e Lívia Reis, coordenadora da área de Religião e Política do Instituto de Estudos da Religião (ISER), explicam que, apesar da ênfase às expressões da religiosidade evangélica de matriz pentecostal, inúmeras outras estão presentes em todo o país hoje.

As pesquisadoras citam igrejas marcadas por propostas estéticas, rituais e discursivas semelhantes, e outras, caracterizadas “por vivências e práticas relacionadas com a ocupação geográfica dos grupos, sobretudo em territórios periféricos [que] nem sempre se vinculam a grandes igrejas”. Elas lembram ainda os evangélicos que não frequentam igrejas específicas, “mas vivem sua fé de outras formas, assistindo pregações e orações” em diversos canais de comunicação.

O artigo de Magali Cunha e Lívia Reis chama atenção também para a necessidade de se qualificarem os números sobre religião. É preciso que institutos de pesquisa e analistas levem em consideração esse quadro diverso e promova cruzamentos com outros marcadores sociais – raça, gênero e renda, por exemplo. “Caso contrário, as pesquisas e usos que se fazem dela [religião na cena pública] desviarão o caminho da reflexão. E quem instrumentaliza a fé para fazer política só ganha com esse desvio”, ressaltam as pesquisadoras.

Confira o artigo na íntegra no site do Intercept.

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Foto de capa: Wikimedia Commons

Editora-geral do Bereia discute política e religião em programa da rádio CBN

A relação entre política e religião se baseia em um movimento de mão dupla em que ambas as instâncias se socorrem para legitimar seus objetivos e interesses. A opinião é da editora-geral do Bereia e pesquisadora Magali Cunha, que participou de programa jornalístico de entrevistas da Rádio CBN, em 19 de março.

Ela explicou que essa relação não é algo novo, pois o Brasil já foi colonizado com base na religião, o catolicismo ibérico. “Ao longo de muitos anos”, comentou, “tivemos a experiência de ver o catolicismo como a religião do Estado, e isso foi se transformando dentro do quadro de pluralidade religiosa”.

Magali Cunha destacou que desde os anos 2010 se observa no Brasil e em outros lugares do mundo a apropriação de certo populismo de extrema-direita que faz uso da religião. “É um fenômeno que estabelece uma ligação de mão dupla com a política, na medida em que em algum momento vamos ter a politização da religião, e em outro, a sacralização da política”.

Isso significa que a religião se vê legitimando determinado regime, comunidade política ou partidos contra inimigos que eles mesmos definem como tais e que são tidos também como inimigos de Deus. “Por outro lado, a política é sacralizada quando certos partidos ou certas lideranças são colocados como escolhidos de uma divindade”, acrescentou a editora-geral do Bereia. Na entrevista, Magali Cunha também alertou sobre o risco de tratar os evangélicos como um único grupo – “chega a ser uma irresponsabilidade considerá-los de forma homogênea” – e comentou sobre outros temas.

Associar queda de aprovação do governo Lula às críticas sobre ataques militares de Israel é “simplista”, analisa editora-geral do Bereia

Atribuir a queda dos percentuais de aprovação do governo Lula entre o segmento evangélico às suas recentes declarações sobre os ataques militares de Israel em território palestino, conforme indicada na última pesquisa da Quaest, é muito simplista. A opinião é da editora-geral do Bereia e pesquisadora Magali Cunha, que foi entrevistada pelo jornalista Luis Nassif, do canal GGN em 6 de março de 2024.

“O que nós observamos nestes dois meses, com base no trabalho de monitoramento das redes, é que há um verdadeiro bombardeio de conteúdos alimentado pela grande mídia que não passam apenas por essa questão”, analisou a editora.

Ela destacou que temas como a discussão sobre a legalização da maconha no STF e o caso Marajó estão entre os que mais circulam nas redes religiosas.

Segundo Magali Cunha, existe certa confusão entre a figura do Israel do contexto bíblico com o Estado de Israel, criado em 1948 por intermédio da Organização das Nações Unidas (ONU). “Há, entre alguns grupos de evangélicos, uma compreensão histórica de que o Israel, localizado no Oriente Médio, é o mesmo do Israel da Bíblia, o que não é fato, daí transportam esse imaginário”, comentou.

“Os evangélicos”. Magali Cunha também chamou a atenção para a diversidade que existe entre as pessoas que professam a fé evangélica e alertou sobre o equívoco de homogeneizar o segmento. “[O termo] ‘Os evangélicos’ não existe. Ninguém é só evangélico nesta vida. A pessoa é mulher, negra, trabalhadora, desempregada, homem branco de classe média… Ninguém é evangélico igual até mesmo dentro de uma mesma igreja”.

Confira a íntegra da entrevista no canal do GGN no YouTube.

Propagação de fake news é intensificada em anos eleitorais, alerta editora-geral do Bereia

Os anos eleitorais recentes têm sido palco da intensificação da propagação de fake news, segundo avaliou a editora-geral do Bereia e pesquisadora Magali Cunha em reportagem publicada em 20 de março pela Agência Brasil intitulada “Entenda como a nova onda de fake news influencia a guerra digital”.

A pesquisadora chamou a atenção para as eleições ocorridas recentemente. “Os anos de 2018, 2020 e 2022 foram muito intensos com desinformação nos ambientes digitais. Já entre 2019 e 2021, houve deliberadamente uma política de desinformar, promovida pelo governo [do presidente Jair] Bolsonaro (PL). Mas desde outubro do anos passado, é cada vez mais alta a intensidade e quantidade de notícias falsas”, afirmou Magali Cunha.

Na opinião da editora-geral do Bereia, essa guerra digital das fake news é estimulada por diversos atores. “O nosso monitoramento de grupos de influenciadores religiosos aponta um verdadeiro bombardeio de conteúdos falsos, que depois acaba sendo alimentado pela própria grande mídia, com notícias com títulos enganosos que podem induzir leitores a construir pensamentos e ações negativas sobre determinadas pautas”, destacou. Ela acrescentou que “muitos políticos também têm seu papel negativo nesse ecossistema, porque municiam a desinformação com conteúdo não verdadeiro, que depois é trabalhado por esses grupos”.

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Foto de capa: Agência Brasília/Flickr

60 anos do Golpe Militar de 1964: memória e ressurreição

Em plena ditadura militar, estes versos compostos pelo então pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil João Dias de Araújo (1931-2014), transformados em canção pelo médico e músico Décio Lauretti, refletem uma compreensão de fé que insiste em subsistir entre evangélicos brasileiros:

Que estou fazendo se sou cristão? Se Cristo deu-me o seu perdão

Há muitos pobres sem lar, sem pão, há tantas vidas sem salvação

Meu Cristo veio pra nos remir, o homem todo sem dividir,

não só a alma do mal salvar, também o corpo ressuscitar.

Há muita fome em meu país, há tanta gente que é infeliz,

Há criancinhas que vão morrer, há tantos velhos a padecer.

Milhões não sabem como escrever, milhões de olhos não sabem ler

Nas trevas vivem sem perceber que são escravos de outro ser.

Aos poderosos eu vou pregar, aos homens ricos vou proclamar

Que a injustiça é contra Deus, e a vil miséria insulta aos céus

(a canção pode ser ouvida na gravação do Grupo Milad, disco Água Viva, 1985)

Para além da busca pela salvação da alma com uma morada no céu, o pastor João Dias e muita gente no seu tempo haviam construído um jeito de entender a fé e a relação com Deus que ia além do individual e passava por um olhar para o ser humano total, marcado por misericórdia e solidariedade, inspirados na ação de Jesus de Nazaré tal como relatada na Bíblia cristã. Esta fé gerava compromissos por relações justas entre as pessoas, e entre elas e as lideranças públicas. E estes compromissos se desdobravam em ações com base na compreensão expressa no refrão daquela mesma canção de 1967: “a injustiça é contra Deus e a vil miséria insulta os céus”.

Neste 31 de março, de celebração da Páscoa, que nos faz vir à tona a memória dos chamados “anos de chumbo”, com o aniversário de 60 anos do golpe militar de 1964, é significativo lembrar esta canção. Hoje ela ainda é cantada em uma pequena parcela de igrejas e em grupos ecumênicos que buscam superar tanto a lógica individualista do mercado da música religiosa quanto a predominância dos conteúdos musicais que passam longe desse jeito de entender a fé expresso na poesia da canção.

A memória dos anos que se sucederam ao Golpe Militar guarda um lugar especial para cristãs e cristãos, entre eles muitos evangélicos, tanto entre as vítimas, aquelas que tiveram liberdades suprimidas e direitos violados por meio da censura, de prisões arbitrárias, da tortura e das execuções sumárias, quanto entre os omissos e os colaboradores, que no balanço, foram todos apoiadores. Os dois grupos se colocaram assim contraditoriamente em nome da sua compreensão de fé e de relação com Deus.

O primeiro grupo pagou o preço de viver a fé que questiona “Que estou fazendo se sou cristão?”, inspirado na justiça e na paz, como viveu Jesus de Nazaré, que também foi vítima de um sistema repressivo que tinha na religião uma aliada. Essas mulheres e homens, boa parte deles em plena juventude, carregaram sua cruz, mas finalmente encontram sua Páscoa, revivendo na memória de muitos grupos hoje com a retomada das ações pela busca da verdade e da justiça que lhes foi negada.

É fato que o jeito de entender a fé entre evangélicos brasileiros que predominou na história e é enfatizado no nosso tempo é aquele voltado para a salvação individualista, seja da alma, das finanças, de projetos pessoais ou políticos, ou mesmo para uma fé intimista muito pouco ou quase nada marcada por um olhar para o ser humano, com misericórdia, solidariedade e sentimento de justiça. No entanto, é significativo guardar a memória de que, ainda assim, tanto no passado quanto no presente esta não é uma unanimidade. Cristãos evangélicos hoje, como o pastor João Dias de Araújo, e tantos outros que os precederam, ainda se inspiram na humanidade divina de Jesus de Nazaré e buscam respostas para a pergunta “Que estou fazendo se sou cristão?” com base na compreensão de que “a injustiça é contra Deus e a vil miséria insulta os céus”.

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Foto de capa: Arquivo Público do Distrito Federal

Postagem engana ao associar inspirador do pentecostalismo a frase racista (colaboração de Bereia com Estadão Verifica)

O Estadão Verifica publicou uma checagem, com a colaboração da editora-geral do Bereia, Magali Cunha, sobre um conteúdo enganoso que ligava Charles Fox Parham às Assembleias de Deus e a seguinte frase racista: “Quando eu morrer não me enterrem ao lado de um negro”.

Parham fundou o movimento Fé Apostólica no início do século XX, mas foi afastado em 1907, segundo a apuração. Magali Cunha explicou que o movimento tinha como doutrina o batismo no Espírito Santo e o falar em línguas, aspectos abraçados por diferentes movimentos pentecostais.

Contudo, Parham não foi o fundador das Assembleias de Deus nos EUA ou no Brasil. De acordo com o doutor em Ciência da Religião Gedeon Alencar, o religioso “nunca teve ligação oficial com a Assembleia de Deus e que não há qualquer texto acadêmico que confirme ele como sendo o seu fundador”.

Quanto ao racismo atribuído a Paham, o professor da Mackenzie Ricardo Bitun lembra que o pastor era adepto de uma teoria racista: “Basicamente esta teoria entende que os povos anglo-saxões são os descendentes biológicos diretos das dez tribos de Israel que não retornaram à sua terra natal após o exílio assírio no século VIII A.C. Ainda que esta teoria não fosse declaradamente racista, vários grupos supremacistas brancos anglo-americanos defendiam a ideia”.

Embora não seja confirmada a autoria da frase “Quando eu morrer não me enterrem ao lado de um negro”, foi consenso entre os especialistas ouvidos pelo Estadão Verifica que Paham reproduzia o racismo do seu tempo, assim como outros pastores americanos.

Checagem de Talita Burbulhan, do Verifica.

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Foto de capa: reprodução do Estadão Verifica

Balanço Janeiro 2024: Conferência Nacional de Educação é alvo de intensa campanha de desinformação

Desde o final de 2023, Bereia passou a acompanhar publicações em mídias digitais de identidade religiosa sobre a Conferência Nacional de Educação (Conae). Matéria específica sobre o tema foi publicada em dezembro passado, para confrontar vídeo publicado pela Associação Internacional de Escolas Cristãs (ACSI) publicou, em sua página oficial no Instagram, classificado como enganoso.

No vídeo, o diretor-executivo da instituição no Brasil pastor Mauro Meister faz uso de discurso alarmista sobre a convocação, em caráter extraordinário, para a (Conae). Meister afirma que o processo que estava em curso – realização das etapas distritais, municipais e estaduais que antecediam a conferência – estava sendo feito de maneira açodada, “como uma avalanche, por debaixo dos panos, sem citar como, oficialmente, estava protocolada a realização do evento. O pastor alegava ainda que o documento-referência da Conae 2024 seria uma ameaça à liberdade educacional, sem apresentar dados ou citar elementos concretos que justificassem a acusação.

Como o Bereia levantou, a realização do evento está prevista na Lei nº 13.0005/14, que aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE), e incluiu a realização de duas Conferências Nacionais de Educação (Conae) durante o decênio 2014-2024. Em seu artigo 6º, o dispositivo prevê que tais conferências sejam precedidas de versões distritais, municipais e estaduais, sendo articuladas e coordenadas pelo Fórum Nacional de Educação.

Segundo a referida lei, as Conferências Nacionais de Educação, a serem realizadas a cada quatro anos, têm o objetivo de avaliar a execução do PNE estabelecido e subsidiar a elaboração do plano para o decênio subsequente.

O Fórum Nacional de Educação, criado em 2010, e instituído por lei com a aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE), é o órgão responsável pelo acompanhamento e implementação do PNE. Ele estava desarticulado no mandato federal anterior, e foi retomado pelo atual governo por meio da Portaria Ministerial nº 478, de 17/03/2023. A Conae de 2024 foi oficializada pelo Decreto nº 11.697, de 11/09/2023.

Mais sobre o que é a Conae e como ela está projetada oficialmente, pode ser verificado na matéria do Bereia, de dezembro de 2023.

Como foi a Conae em janeiro passado

Cerca de 2,5 mil educadores/as, de todo o país, estiveram em Brasília, de 28 a 30 de janeiro, nas dependências da Universidade de Brasília (UnB) para debater e aprovar as propostas voltadas ao texto final do novo PNE 2024-2034.

Participaram da Conferência 1.847 pessoas, delegados e delegadas eleitos nas etapas estaduais, municipais e distritais, da educação básica, da educação superior e da educação profissional e tecnológica, tanto do setor público como do privado. Entre eles, estavam gestores, trabalhadores, docentes, secretários, conselheiros, estudantes, pais, mães e responsáveis. A lista dos participantes pode ser verificada aqui.

A Conae contou, ainda, com 204 observadores, 78 palestrantes nacionais e internacionais, e 200 pessoas que atuaram no apoio, como servidores do Ministério da Educação e da UnB, estudantes, docentes. Também estavam presentes 48 pessoas com deficiência.

Na conferência, aconteceram sete plenárias simultâneas de discussão do Documento-Base. Ao todo foram 40 horas de avaliação das 8.651 emendas recebidas pelos estados e municípios. Também houve 34 colóquios, para o aprofundamento de temas relacionados ao Documento-Base, como “Sistema Nacional de Educação”, “Saúde e educação”, “Alfabetização”, “Educação antirracista”, “Escola de jovens e adultos”, entre outros. O documento pode ser acessado, na íntegra, aqui.

A desinformação sobre a Conae que circula em ambientes religiosos

Bereia checou que, durante o mês de janeiro de 2024, a Conferência Nacional de Educação (Conae) foi apresentada  em perfis de mídias sociais, com identidade religiosa ultraconservadora, de parlamentares, associações  de educação  e influenciadores digitais,  como um avanço da esquerda na doutrinação dos alunos para a próxima década.

O jornal Folha de S. Paulo, publicou matéria, no dia de abertura da Conae 2024, com a afirmação de que as bancadas ruralista e evangélica no Congresso Nacional , além de outras frentes do Congresso ligadas a movimentos conservadores, como Comércio e Serviço, Segurança Pública (Bancada da Bala) e Brasil Texas, pediram adiamento do evento e criticaram a política de educação do atual governo, em nota conjunta. A nota critica o documento-base da conferência, com a afirmação de que há nele pontos com viés político e ideológico. Os exemplos são a desmilitarização das escolas, crítica à prática de “homeschooling” (ensino em casa) e ao movimento Escola Sem Partido, ações chamadas de ultraconservadoras e temas como diversidade de gênero e religião, questões LGBTQIA+ e ambientais.

A Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE) também publicou uma nota, juntamente com a Frente Parlamentar Evangélica, a Associação Internacional de Escolas Cristãs, a South American Indian Mission, os Ministérios Pão Diário, a Associação de Escolas Cristãs de Educação e a Convenção Batista Nacional. A nota acusa o documento-base da Conae de propor a “imposição de concepções ideológicas radicais e controversas, contrárias às presentes disposições da legislação nacional e à vontade da parcela majoritária da população”. As concepções que a ANJURE contrapõe são “ideologia de gênero”, “liberdade religiosa das escolas confessionais”, “conselhos e comitês fiscalizadores”, ”desqualificação das escolas privadas”, “apoio à formação em direitos humanos por movimentos e coletivos”, “críticas ao agronegócio”, “avaliação ideológica do desempenho de professores”.

Estas críticas opinativas aparecem, de forma distorcida, em postagens de políticos, como esta coletada pela equipe do Bereia, publicada pela deputada Julia Zanatta (PL-SC):

Imagem: reprodução do Instagram

Esta postagem do deputado federal Mario Frias (PL-SP) foi enviada por leitor para o WhatsApp do Bereia:

Imagem: reprodução do Instagram

Outro leitor também enviou ao Bereia um vídeo de seis minutos de duração, em que mulher não identificada diz estar presente na Conae 2024, em Brasília. Em tom alarmista, como os expostos acima, ela faz uma montagem de coleta que realizou de livros, materiais e produtos expostos em barracas e estandes, do depoimento que colheu de outra mulher e do recorte de falas de um grupo de debates, que reforçam a ideia de que a Conae é uma articulação que promove “ameaça/doutrinação marxista/socialista”, “fim da pluralidade de ideias” e perversão.

Imagem: reprodução de vídeo compartilhado em mídias sociais

Doutrinação esquerdista e marxista?

A associação entre educação, que inclui a pauta de direitos (humanos, sociais, culturais, econômicos, sexuais e ambientais), “ideologia de gênero”, “limitação da liberdade religiosa” e “doutrinação marxista” é a principal linha de argumentação de grupos políticos alinhados ao ultraconservadorismo no Brasil. Tal proposição tem relação com a ideologia que emergiu, recentemente, no Brasil, denominada “Escola Sem Partido” (ESP).

Escola sem Partido é um programa e um projeto de lei oriundo de um movimento político surgido no Brasil em 2003, no âmbito da sociedade civil, capitaneado pelo procurador paulista Miguel Nagib. No contexto do surgimento, segundo a pesquisadora e professora da Universidade Federal de juiz de Fora, especialista no tema, a principal pauta do ESP era o combate ao que Nagib denominou ‘doutrinação política e ideológica’ de crianças e jovens nas escolas brasileiras”.

A professora e pesquisadora da Universidade Federal de Juiz de Fora Andréa Silveira explana que por “doutrinação” entenda-se “toda e qualquer informação que seja diversa daquela que é preservada pelas famílias dos e das estudantes, as quais fazem parte da pluralidade de ideias que caracteriza os conhecimentos e os currículos de diferentes componentes para uma formação escolar ampla e cidadã”.

A pesquisadora explica que é nesse sentido que “grupos religiosos fundamentalistas e bancadas conservadoras atuam em conjunto para promover a perseguição de educadores e educadoras, pela supressão do reconhecimento e do diálogo entre as alteridades, forçando o apagamento da pluralidade de ideias, da liberdade e da diversidade em uma das principais instituições da vida moderna, a escola”.

As publicações da deputada federal Julia Zanatta (PL-SC) e da mulher não identificada, expostas como exemplo nesta matéria, atribuem “doutrinação” desta forma e a relaciona apenas às esquerdas políticas, eximindo as direitas e o centro de tal prática. A afirmação se torna enganosa, de acordo com o que a Profa. Andréa Silveira expõe, uma vez que a promoção de quaisquer ideologias, como o militarismo e o armamentismo, por exemplo, e a própria ideia de uma “Escola sem Partido”, podem ser qualificadas como doutrinação ideológica.

Uma informação importante a se recuperar é que participantes da Conae eram oriundos de todos os estados do Brasil, a maioria eleita, segundo o protocolo descrito em legislação referenciada nesta matéria, e o suposto critério de alinhamento partidário e ideológico não faz parte do processo de escolha.

Como classificado na primeira matéria do Bereia sobre este tema (dezembro de 2023), as postagens sobre a Conae, em janeiro de 2024, seguem sendo enganosas, pois contêm elementos dispostos estrategicamente para confundir e causar pânico moral, caso das publicações que subsidiam a matéria.

Como elementos do discurso enganoso estão a ausência de contextualização e a omissão de detalhes. As acusações feitas de que o documento-base da Conae são “doutrinação marxista”, visam usar o tema “marxismo”, amplamente desconhecido por boa parte do público, como ameaça para provocar reações negativas ao processo de discussão do qual

A estratégia de pânico moral se apresenta na defesa de uma pauta política erguida por políticos ultraconservadores, que envolvem a educação infantil. Como este nível educacional, consequentemente se liga à formação familiar, exigem que a educação seja pautada por valores cristãos, sem considerar a diversidade cultural, sexual, de gênero e a liberdade de credo da sociedade brasileira. Trata-se de mais um elemento de discurso enganoso quando não sustentado por fatos, mas por alegações fortalecidas por ideologias apoiadas em valores cristão-conservadores.

Referências de checagem:

Lei 13.005/14. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm#art12 Acesso em: 2 fev 2024

Decreto 11.697/23. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/decreto/D11697.htm#:~:text=DECRETO%20N%C2%BA%2011.697%2C%20DE%2011,cidade%20de%20Bras%C3%ADlia%2C%20Distrito%20Federal. Acesso em: 2 fev 2024

Religião e Poder/Escola sem Partido. https://religiaoepoder.org.br/artigo/escola-sem-partido/ Acesso em 2 fev 2024

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/assuntos/noticias/2024/janeiro/ultimo-dia-da-conae-aprovara-texto-do-novo-pne  Acesso em 2 fev 2024

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conferencias/conae-2024  Acesso em 2 fev 2024

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/assuntos/noticias/2023/setembro/convocada-conferencia-nacional-de-educacao  Acesso em 2 fev 2024

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/assuntos/noticias/2023/outubro/publicado-documento-referencia-da-conae-2024 Acesso em 2 fev 2024

http://portal.Ministério da Educação.gov.br/component/tags/tag/conferencia-nacional-de-educacao Acesso em 2 fev 2024

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/assuntos/noticias/2023/outubro/regimento-geral-define-regras-para-a-conae-2024 Acesso em 2 fev 2024

https://www.gov.br/Ministério da Educação/pt-br/assuntos/noticias/2023/outubro/documento-orienta-estados-e-municipios-para-conferencias Acesso em 2 fev 2024

Fórum Nacional de Educação,  https://fne.Ministério da Educação.gov.br/#documentos Acesso em 2 fev 2024

Folha de S. Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2024/01/agro-e-evangelicos-montam-ofensiva-contra-plano-de-educacao-do-governo-lula.shtml Acesso em 2 fev 2024

Anajure, https://anajure.org.br/manifestacao-publica-sobre-o-documento-referencia-da-conferencia-nacional-de-educacao-para-a-elaboracao-do-plano-nacional-de-educacao-2024-2034/ , Acesso em 2 fev 2024

Montagem que denuncia perseguição do STF a cristãos tem conteúdo falso

Bereia recebeu de leitor um vídeo que tem circulado com intensidade em grupos de WhatsApp nos últimos dias:

Imagem: reprodução de publicação que circula no WhatsApp

A publicação traz um vídeo que é a montagem de duas imagens: uma, com uma frase introdutória, cortada no início e no final, extraída de matéria de um telejornal, a partir do que dizem dois apresentadores, e dura dez segundos: “… pode provocar uma verdadeira caçada aos cristãos. A lei que entrará em vigor em um ano e meio prevê a criminalização daqueles que propagam a fala de Deus”.

Logo em seguida, a montagem inclui um novo vídeo com a fala de uma mulher, sob a legenda “Advogada alerta: STF quer tirar Deus da democracia”. A fala inserida na montagem, como se fosse parte do telejornal, dura 45 segundos, na qual a mulher afirma que o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral teriam encaminhado decisão para cassar todos os candidatos cristãos que forem eleitos.

Bereia já checou a parte da montagem com a fala da mulher

A parte da montagem que inclui o vídeo da mulher discursando contra o STF e o TSE, com a citação do nome do ministro Edson Fachin, é antiga: circulou nas mídias sociais em 2020 e foi checada pelo Bereia, classificada como conteúdo falso.

A mulher é a professora de Direito Tributário e advogada Lenice Moreira de Moura. O vídeo checado pelo Bereia foi publicado no seu canal do Youtube, em 02 de julho de 2020 (atualmente fora do ar), e alcançou alta repercussão nas redes religiosas.

Lenice Moura apresenta acusações contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e afirma que estas instituições buscam “tirar Deus da democracia”. Ela alega: que haveria cassação de candidatos cristãos eleitos sob o argumento de “abuso de poder religioso”; que “ministros do STF ordenaram a apreensão de celulares e computadores de políticos cristãos, além de mandarem prender jornalistas e ativistas cristãos”; “que há proibição de símbolos religiosos em repartições públicas e escolas e do ensino religioso no ambiente escolar”.

Bereia checou cada uma destas afirmações e concluiu, em 2020 (ano eleitoral para cargos municipais) que a acusação proferida por Lenice Moura era falsa. Ela utilizou temas descontextualizados como pretexto para sua argumentação de que cristãos estariam sendo perseguidos pelo Judiciário. Bereia também checou que a advogada era reincidente na propagação de desinformação, fazendo uso do discurso do medo e do pânico moral.

A montagem de agora circula desde 2022

Bereia checou a montagem grosseira em vídeo, recebida de leitor, neste janeiro de 2024, que contém o vídeo com a acusação de Lenice Moura ao STF e ao TSE. A pesquisa mostrou que a montagem já havia circulado amplamente em perfis de mídias sociais, em 2022, ano das eleições para cargos nacionais e estaduais.

Imagem: reprodução do X (antigo Twitter)

O projeto jornalístico de checagem “Aos Fatos”, já havia publicado matéria sobre a montagem em 29 de julho de 2022. Aos Fatos classificou o conteúdo como falso e ofereceu as seguintes informações resultantes de pesquisa:


1. O STF não criou uma lei que propõe cassar o mandato de candidatos cristãos eleitos. Não existe norma aprovada ou projeto de lei semelhante em tramitação no Brasil.

2. O vídeo tira de contexto uma reportagem sobre uma lei da Bolívia que não proíbe cristãos de se candidatar, mas veda o recrutamento forçado de pessoas por entidades religiosas – a introdução do telejornal –  e adiciona, a seguir, o protesto de Lenice Moura, que fez uso de informações enganosas (classificado pelo Bereia, em 2020, como falso).

3. Os dez segundos introdutórios foram retirados de telejornal da RIT TV, emissora vinculada à Igreja Internacional da Graça de Deus, de edição veiculada em 11 de janeiro de 2018. Nela, dois apresentadores criticam uma lei que, na opinião deles, iria perseguir cristãos. A medida criticada, entretanto, foi promulgada na Bolívia, não no Brasil. O governo boliviano havia proposto um artigo na reforma do Código Penal que considerava crime o recrutamento de pessoas para participação em conflitos armados, organizações religiosas ou de culto. A medida foi interpretada por religiosos como uma censura à evangelização cristã. Ainda em janeiro daquele 2018, o então presidente Evo Morales desistiu de defender a norma.

A montagem voltou a circular em 2023, em vários perfis, em diferentes mídias, com amplo alcance entre religiosos, com a divulgação de que a TV aberta estaria falando sobre perseguição a cristãos no Brasil, não apenas pelo STF, mas também pelo atual governo federal:

Imagens: reprodução do X (antigo Twitter)

Bereia acompanha o Aos Fatos, que, já em 2022, classificou a montagem que divulga que o STF (e agora o atual governo federal) querem “tirar Deus da democracia” como falsa.

Bereia alerta leitores e leitoras sobre a utilização deste tipo de conteúdo em ano eleitoral para convencer e fazer campanha contra instituições e pessoas públicas com uso de mentiras e falsidades. Em 2024 ocorrerão as eleições municipais e é preciso muita atenção para que tais estratégias não resultem em assimilação e compartilhamento automático, sem a avaliação e a reflexão devidas.

O tema da perseguição de instituições do Estado brasileiro a cristãos no Brasil tem sido amplamente checado pelo Bereia, e é comprovadamente falso. Bereia também já checou muitas publicações com acusações ao STF que são falsas e enganosas.

É preciso sempre recordar que fazer oposição a governos e oferecer críticas a instituições e suas lideranças são práticas viáveis, saudáveis a uma democracia e devem ser garantidas pelo Estado Democrático de Direito. Porém ambas as ações devem ser feitas com dignidade e coerência e não por meio de falsidades apelativas, o que deve ser imediatamente confrontado e denunciado.

Esta matéria foi produzida a partir de conteúdo enviado por leitor. Qualquer pessoa pode colaborar com o Bereia e enviar indicação de checagens: e-mail coletivobereia@gmail.com ; WhatsApp: (21) 97884-2525

Referências:

Bereia. https://coletivobereia.com.br/e-falso-conteudo-divulgado-em-video-por-advogada-que-acusa-stf-e-tse/ Acesso em 31 jan 2024

Aos Fatos. matéria sobre a montagem em 29 de julho de 2022 Acesso em 31 jan 2024

Paz na Terra: a difícil, mas possível, esperança de Natal

* Publicado originalmente na Carta Capital

2023 chega ao fim com uma mescla de sentimentos que, no plano nacional, vão do alívio e do orgulho à apreensão e a incerteza. Também outros, em âmbito internacional, que estão entre a esperança, de um lado, e a comoção e revolta, de outro. É um tempo que desafia os grupos religiosos, comprometidos com a paz com justiça, diante de mais um ano que chega neste século 21.

É fato que depois de um tempo difícil em termos de governo no Brasil, este primeiro ano inspira alívio. Diante do caos instalado no período anterior, com obscurantismos, negacionismos e destruição de políticas públicas que buscavam garantir direitos, em especial na educação, no meio ambiente, na saúde, nos direitos de minorias sociais, e nas relações internacionais, as propostas de reconstrução e pacificação do atual governo começam a fazer diferença. Não é à toa que recente pesquisa indicou que a satisfação de morar no Brasil subiu de 59% para 74% em um ano, enquanto o sentimento de orgulho de ser brasileiro passou de 77% para 83%, no mesmo período.

Porém, com o perfil do Congresso Nacional, majoritariamente composto por uma direita fisiológica, ironicamente chamada de “Centrão”, e por uma extrema-direita ancorada no ódio e na desestabilização, a dificuldade de governar com justiça se impõe. Negociações necessárias para fazer valer a reconstrução, comprometida com a pauta de direitos, resultam em perdas que podem representar ameaças futuras, na forma de nomeações questionáveis e concessões que são retrocessos diante dos avanços necessários. Com isso, a apreensão ganha lugar.

O reconhecimento do Brasil e do atual governo no campo das relações internacionais tem sido retomado, o que reforça nas pessoas o orgulho de morar no Brasil e de ser brasileiro, e a esperança por tempos melhores. A diplomacia e o Ministério do Meio Ambiente têm atuado em importantes processos, como na intermediação por paz entre Rússia e Ucrânia, Israel e Palestina, Venezuela e Guiana e na defesa da Amazônia e de outras áreas de floresta. Importantes acordos de parceria têm sido firmados e o país se prepara para receber, em 2024, a reunião do grupo das 20 maiores economias do planeta, o G 20, e, em 2025, a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-30).

Porém, o avanço dos extremismos no mundo, dos partidos e políticos de extrema-direita ocupando postos de poder, com imposição de políticas e ações desestabilizadoras, especialmente para as populações mais vulneráveis, causa muita preocupação. É o caso da vizinha Argentina, de partes da Europa e no caos instalado no Oriente Médio, com o Estado de Israel, liderado por Benjamin Netanyahu.

Chegamos ao fim de 2023, com mais de dois meses de massacre da população da Palestina, imposto na oportunidade de retaliação de Israel a um ataque do grupo político palestino Hamas, em 7 de outubro. Isto causa comoção, revolta e sentimento de impotência em muita gente sensível à causa da paz e ao direito de a Palestina existir.

No caso dos cristãos, não é possível chegar ao Natal de 2023, recitar cânticos de Natal e as palavras do anjo aos pastores, no anúncio do nascimento do Menino Jesus, “Glória a Deus nas Alturas e Paz na Terra às pessoas de boa vontade”, sem considerar que aquela terra do anúncio, Belém, é alvo de massacre e destruição por Israel.

Como as igrejas, que anunciam “Paz na Terra…”, cantam e pregam o Menino Jesus, o Emanuel (Deus Conosco), o Príncipe da Paz, poderão celebrar a data sem considerar as milhares de pessoas palestinas mortas, as centenas de famílias desfeitas, desabrigadas, feridas e humilhadas, na terra em que Ele nasceu?

Como cristãos e cristãs lembrarão, revoltados, que o Rei Herodes perseguiu Jesus e sua família, a ponto de buscar impedir que o menino sobrevivesse e mandar matar inocentes de até dois anos de idade até que ele fosse alvejado, sem pensar no “Herodes que ocupa o cargo de Primeiro-Ministro de Israel hoje”? É de Netanyahu que parte a ordem do massacre que promove a matança de crianças (dez mil, segundo o Ministério da Saúde da Palestina, em 15 de dezembro), além de tornar cerca de 25 mil órfãs (segundo o Monitor Euromediterrâneo de Direitos Humanos, de Genebra/Suíça).

O massacre da Palestina causa comoção e revolta em quem tem compromisso com a paz com justiça, além de remeter a violentas e injustas ações similares perto daqui, nas periferias e interiores do Brasil. Sim, do país onde agentes públicos praticam execuções sumárias, que matam para investigar depois; do poder paralelo das milícias, dos “comandos”, dos matadores e jagunços a serviço dos eternos coronéis.

Sim, chegou o Natal e com ele o raiar de um novo ano. É legítima e importante oportunidade de celebrar a vida, a família, a amizade, o alívio, o orgulho, a esperança que precisam confrontar a apreensão, a incerteza, a comoção e a revolta. É com as atitudes, alimentadas pelos sentimentos que embasam reconstrução e pacificação, que se concretiza a “Paz na Terra às pessoas de boa vontade”. Sigamos nesta trilha, inspirada pelo Menino de Belém!

Aviso de recesso: Eu e as companheiras de artigos Angélica Tostes e Simony dos Anjos estaremos em recesso até 31 de janeiro. Desejamos aos nossos leitores e leitoras neste espaço um Natal de muita paz e esperança por um 2024 com justiça e alegria! Retornaremos em fevereiro.

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Foto de capa: Família palestina/Al Jazeera

Bereia foi tema de trabalho apresentado em congresso de ciências da comunicação sobre desinformação

O Bereia foi tema de trabalho apresentado no 43º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação promovido pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). O artigo, produzido pela pesquisadora e editora-geral do Coletivo Magali do Nascimento Cunha e pela também pesquisadora Priscila Vieira-Souza, abordou o fenômeno da circulação de desinformação entre grupos religiosos cristãos no Brasil na perspectiva de enfrentamento dessa realidade.

A análise teórica apresentada pelas autoras buscou explicar o lugar da disseminação das fake news entre grupos religiosos cristãos e também conceituou desinformação, situando-a como fenômeno social. Além disso, o trabalho avaliou o conteúdo de 92 matérias publicadas classificadas como verificação entre dezembro de 2019 a setembro de 2020. A esse exame se somaram análises com categorias ampliadas dos onze textos publicados durante o mês de setembro do último ano da investigação.

Entre as conclusões, as autoras apontaram que há forte tendência de que conteúdos desinformativos que circulam no ambiente religioso são do tipo fabricado/falso. Tal classificação, segundo os critérios do Coletivo Bereia, indica que o fato apresentado pelo conteúdo veiculado é completamente construído, sem correspondência com a realidade.

Clique aqui para ler a íntegra do artigo, intitulado “O enfrentamento da desinformação entre grupos religiosos: um estudo sobre a atuação do Coletivo Bereia – Informação e Checagem de Notícias”.

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Foto de capa: Imagem de armennano por Pixabay

Editora de Bereia analisa fake news e eleições municipais em congresso de comunicação

Você relacionaria fake news com estratégias de campanha eleitoral de candidatos com identidade religiosa? Esse foi o esforço empreendido por Magali do Nascimento Cunha, pesquisadora e editora-geral do Coletivo Bereia, em trabalho apresentado durante a 46ª edição do Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, promovido pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação (Intercom).

A análise, que focou as eleições municipais de 2020,  se baseou em dados quantitativos e qualitativos resultantes de pesquisa do Instituto de Estudos da Religião (ISER). Os discursos contidos em materiais de campanha foram examinados, com a identificação dos principais conteúdos falsos e enganosos que circularam nos pronunciamentos de tais candidatos.

Magali Cunha concluiu que três núcleos temáticos de concentração de desinformação e fake news foram predominantes: ideologia de gênero, pânico em torno da educação e cristofobia.

Clique aqui e confira na íntegra o artigo, intitulado “Fake news como estratégia de campanha de candidatos com identidade religiosa: um olhar sobre as eleições municipais de 2020”.

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Foto de capa: Element5 Digital/Pexels

Conteúdo busca enganar católicos sobre evento na Catedral de Brasília para criticar governo federal

Bereia recebeu de leitor um vídeo com alto nível de circulação em grupos católicos no WhatsApp, que alardeia que o altar da Catedral Católica de Brasília “virou terreiro de Umbanda”, em evento promovido “pela ‘1ª´(sic) dama Janja”. O texto afirma ser uma grave profanação de um templo católico e atribui o caso à “situação geral do país” que “piora a cada dia”. A publicação ainda pede que quem recebe o conteúdo envie “para amigos católicos que fizeram o L ou foram isentões”.

Tela de celular com publicação numa rede social
Descrição gerada automaticamente com confiança média

O radar do Bereia identificou nesse conteúdo elementos comuns a falsidades que circulam pelas mídias sociais: 1) não tem identificação do autor ou autora da postagem nem data; 2) não tem fonte (de onde veio o vídeo); 3) é um recorte de 23 segundos de um vídeo sem  o contexto do ocorrido; 4) há o pedido de compartilhamento para mais pessoas (estratégia para que a desinformação viralize de forma espontânea e orgânica).

Bereia verificou que o mesmo recorte de vídeo foi divulgado na conta do X/Twitter do ex-presidente da Fundação Palmares (nomeado durante o governo de Jair Bolsonaro) Sérgio Camargo, e teve centenas de milhares de visualizações, com milhares de curtidas e compartilhamentos. Na publicação Camargo atribui a cerimônia na Catedral a o “governo petista” e cobra que católicos exijam “posicionamento da CNBB, caso a entidade seja contrária ao que se viu”.

Imagem: X/Twitter

Outros perfis de mídias sociais divulgaram protestos com o uso do mesmo recorte de vídeo, alguns com centenas de milhares de visualizações.


Interface gráfica do usuário, Site
Descrição gerada automaticamente

Imagem: x/Twitter

Imagem: Youtube

A noite na Catedral 

Bereia checou que o evento, acolhido na Catedral Católica de Brasília, foi realizado em 9 de novembro de 2023, como parte da programação do III Congresso Internacional de Direito do Seguro e IX Fórum de Direito do Seguro José Sollero Filho, realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS). O congresso foi sediado no Superior Tribunal de Justiça, sob a coordenação do ministro Paulo Dias Moura Ribeiro.

A noite cultural do evento do IBDS/STJ, na Catedral Católica de Brasília, foi a apresentação da Orquestra Mundana Refugi. O grupo é formado por 22 músicos brasileiros e imigrantes refugiados vindos do Irã, Guiné, Congo, Turquia, Cuba, China, Síria, Venezuela, França e Palestina. A orquestra apresenta repertório com composições próprias, músicas tradicionais e homenagens a compositores brasileiros, lançando mão de instrumentos entre os tradicionais piano, saxofone, flauta e bateria até os mais diferentes como bouzouki, kanun árabe, alaúde e rebab. 

Tela de celular com publicação numa rede social
Descrição gerada automaticamente com confiança média

Imagem: cartaz eletrônico de divulgação da apresentação da Orquestra Mundana Refugi na Catedral de Brasília.

O evento, com entrada franca, lotou a Catedral e foi noticiado pela revista eletrônica Metrópoles, pelo Correio Brasiliense, pelo Jornal de Brasília, pelo Portal Terra e pela Agência Brasil. Segundo a matéria do Metrópoles “os brasilienses ficaram encantados com o talento do grupo e conheceram um pouco dos ritmos e estilos de diferentes países. Duas obras do fotógrafo Sebastião Salgado foram expostas ao lado do palco e chamaram atenção por representar a luta pela proteção dos povos originários”.

O programa teve participação do cantor Renato Braz e do acordeonista Toninho Ferragutti, indicado três vezes ao Grammy Latino. Entre os presentes estiveram autoridades como o ministro do STJ Moura Ribeiro e o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar Paulo Teixeira. 

Com dois integrantes da orquestra originários da Palestina, o show em Brasília foi oportunidade de expressão de um pedido pela paz no Oriente Médio, para que cessem os ataques e que sejam devolvidos os reféns judeus, o que constou dos discursos proferidos. 

Bereia verificou, portanto, que a programação na Catedral não tem qualquer relação com o governo federal ou com a esposa do presidente da República Rosângela da Silva (Janja).

Altar profanado?

Na programação, de fato, ocorreu um momento, ao final, com uma dança relacionada à cultura africana. Porém, tanto a Arquidiocese quanto o maestro da Orquestra Mundana Refugi Carlos Antunes, explicaram, respectivamente, em nota oficial e carta, que ela ocorreu de forma imprevista, fora da programação, espontaneamente, da parte de duas pessoas africanas que estavam na audiência, como forma de agradecimento. 

A Arquidiocese também corrigiu as postagens críticas à Igreja e nega que haja “elementos concretos que caracterizem, moralmente e canonicamente, profanação do templo”.

Diz a nota da Arquidiocese de Brasília:

1- Nosso objetivo, ao aceitar o evento na Catedral, foi sensibilizar a comunidade de Brasília a respeito dos refugiados e migrantes, uma vez que a orquestra Mundana Refugi é um grupo musical composto por músicos brasileiros e por imigrantes e refugiados. Seu nome faz referência ao fato de acolher instrumentistas e vocalistas de todas as partes do mundo (“mundana”), refugiados no Brasil (“refugi”);

2- O acordo do evento em questão, previa somente a apresentação de coro e orquestra, algo comumente presente em nossas igrejas, com temas tradicionais de diversos países. No entanto, mesmo no fato ocorrido inesperadamente, não há elementos concretos que caracterizem, moralmente e canonicamente, profanação do templo;

3- Ao final da apresentação, ocorreu uma manifestação espontânea por parte de uma pessoa presente na plateia, surpreendendo não só a nós, mas, também, aos organizadores e ao maestro responsáveis pelo evento, gerando o episódio divulgado (cf. nota em anexo);

4- Reafirmamos que, em todo momento, a Catedral de Brasília conduziu com a devida prudência o que foi previamente acordado.

A carta do maestro Carlos Antunes, entre outros pontos, detalha o ocorrido:

Não havíamos programado realizar qualquer ato de dança como parte da apresentação musical, pois todos sabíamos que essa regra fora estabelecida como condição fundamental pela Catedral. Assim, com relação à dança espontânea que ocorreu ao final da última música, por parte de dois expectadores (sic) africanos, somente podemos imaginar, e isso foi dito por ambos ao se despedirem, que o fizeram em agradecimento ao espetáculo pois para eles ouvir música de seu país naquele templo espetacular foi muito emocionante, alegre e inesquecível. 

Suas manifestações foram feitas sem o nosso conhecimento. Isso faz parte da sua cultura e não demonstra, de forma alguma, desrespeito para com a religião católica. Tenho inúmeros amigos dançarinos africanos da religião católica e eles mencionaram-me suas boas emoções com o ocorrido. Acho importante reiterar que não havíamos combinado a dança, embora ela ocorra ocasionalmente nas nossas apresentações, como outras intervenções espontâneas do público.

(…)

Quando fomos surpreendidos pela dança dos expectadores (sic), ao final da música, fiz um sinal para a Mariama, nossa integrante, cantora africana, para que fosse lá, educadamente, e ocupasse o lugar deles, para que não continuassem ocupando o espaço e voltasse para cantar.

Ela de forma respeitosa fez exatamente isso. Chegou, fez alguns movimentos e ele se retirou. Ela em seguida voltou para cantar e terminamos a canção. Foi exatamente isso que ocorreu. O primeiro senhor que entrou para dançar, de forma muito cordial, me abordou e disse, ao final, que estava muito feliz por estarmos ali naquele momento”.

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Bereia classifica a publicação que circula em grupos católicos de WhatsApp e em mídias sociais sobre o evento cultural, ocorrido na Catedral de Brasília, em 9 de novembro como ENGANOSO. Anonimamente, como, propagadores de desinformação agem frequentemente, e sem dados que permitam às pessoas verificarem o ocorrido de forma honesta, foi utilizado um vídeo do final da apresentação da Orquestra Mundana Refugi, para criticar a Arquidiocese de Brasília, a esposa do presidente da República Rosângela da Silva (Janja) e o governo federal. 

Como checado pelo Bereia: 

1) a apresentação musical não tem qualquer relação com o governo federal ou com a esposa do presidente da República. Foi parte da programação de um evento realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito do Seguro (IBDS), sediado no Supremo Tribunal de Justiça; 

2) o recorte do vídeo, divulgado sem explicação do que trata, refere-se ao final da apresentação musical da Orquestra Mundana Refugi, momento em que pessoas da plateia, de origem africana, espontaneamente se digiram à frente para dançar em agradecimento ao que presenciaram; 

3) a palavra oficial da Igreja Católica em Brasília é que, ancorada na moral e nos Cânones da Igreja, não houve profanação do templo com a manifestação espontânea das duas pessoas africanas.

Bereia alerta para o uso da fé cristã e do cuidado que fiéis têm com suas igrejas para se fazer política e atacar instituições religiosas, outras instituições e governos. Alerta também para a intolerância religiosa estimulada com a propagação do vídeo, sem a devida explicação do que foi uma dança da cultura africana, porém com as observações maldosas, por escrito e em vídeos, de que o altar da Catedral foi “transformado em terreiro de Umbanda” e “profanado”. Há outro aspecto em curso com a publicação, que é o racismo, uma vez que a dança foi realizada por pessoas negras, africanas, e as acusações que foram proferidas têm relação com este perfil.

Referências

Supremo Tribunal de Justiça https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Institucional/Educacao-e-cultura/Eventos/III-Congresso-Internacional-de-Direito-do-Seguro.aspx Acesso em 20 nov 2023

Youtube https://www.youtube.com/watch?v=IwZDDe1hlFA&pp=ygURZGlyZWl0byBkbyBzZWd1cm8%3D Acesso em 20 nov 2023 

IBDS https://www.ibds.com.br/18719-2/ Acesso em 20 nov 2023

Instagram https://www.instagram.com/omrefugi/ Acesso em 20 novv 2023

Metrópoles https://www.metropoles.com/colunas/claudia-meireles/orquestra-mundana-refugi-se-apresenta-em-show-emocionante-na-catedral Acesso em 20 nov 2023

Correio Brasiliense  https://www.correiobraziliense.com.br/diversao-e-arte/2023/11/6653001-catedral-recebe-orquestra-mundana-refugi-nesta-quinta-9-11.html Acesso 20 nov 2023

Jornal de Brasília https://jornaldebrasilia.com.br/entretenimento/eventos/orquestra-mundana-refugi-se-apresenta-na-catedral/ Acesso em 20 nov 2023

Portal Terra https://www.terra.com.br/esportes/orquestra-que-reune-brasileiros-e-refugiados-se-apresenta-em-brasilia,0ffcbbaf88502674cbab95f8f6195cbdll9vnvw7.html Acesso em 20 nov 2023

Agência Brasil https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-11/orquestra-que-reune-brasileiros-e-refugiados-se-apresenta-em-brasilia Acesso em 20 nov 2023 

Arquidiocese de Brasília https://arqbrasilia.com.br/nota-de-esclarecimento-2/ Acesso em 20 nov 2023Carta do Maestro Carlos Antunes https://arqbrasilia.com.br/wp-content/uploads/2023/11/Nota-de-Esclarecimento-Apresentac%CC%A7a%CC%83o-Mundana-Refugi.pdf  Acesso em 20 nov 2023

Foto de Capa: reprodução do Youtube

Bereia é citado em matéria da Agência Brasil sobre combate à desinformação nas periferias

A Agência Brasil produziu reportagem sobre coletivos que contribuem para enfrentar a desinformação nas periferias brasileiras. Nesse sentido, além do coletivo Sargento Perifa, de Pernambuco, a reportagem apresentou o Bereia como outra iniciativa.

A editora-geral Magali Cunha falou do histórico do coletivo e das repercussões da recente pesquisa da Universidade Brasília, que demonstrou como os evangélicos são mais propensos a compartilhar conteúdos falsos sobre vacinas.

A reportagem no site da Agência Brasil você confere aqui. Para ver a matéria em vídeo sobre o tema, que foi ao ar no Repórter Brasil, clique aqui (a participação do Bereia ocorre a partir de 1’13”).

Foto de capa: coletivo Sargento Perifa

Evangélicos estão entre os que mais compartilham conteúdo falso sobre vacinas no Brasil

Pessoas identificadas como evangélicas, entre 35 e 44 anos, com grau de instrução até o ensino médio, integrantes das classes de renda mais baixa (D e E), usuários do Telegram, do TikTok e audiência do Jornal da Record, formam o perfil de quem mais compartilha conteúdo falso sobre vacinas no Brasil. A descoberta é parte do estudo “A comunicação no enfrentamento da pandemia de Covid-19”, produzido pelo Centro de Pesquisa em Comunicação Política e Saúde Pública, da Universidade de Brasília. O levantamento foi realizado em agosto passado, com 1.845 pessoas que têm acesso à internet, e os resultados foram divulgados no último 22 de outubro, pela Agência Brasil.

Para seleção dos entrevistados, os pesquisadores utilizaram um cadastro online com mais de 500 mil inscritos, no qual foram aplicadas cotas de gênero, idade, região e classe social para representar adequadamente a população brasileira. Os participantes selecionados responderam um questionário online, no qual foram convidados a compartilhar 12 notícias sobre vacinas, identificadas apenas pelo título, divididas igualmente entre verdadeiras e falsas.

De todos os pesquisados, 11,3% informaram que compartilhariam ao menos uma das notícias falsas e 3,7% informaram que compartilhariam cinco das seis notícias inverídicas.

O coordenador do CPS da UnB, e líder do estudo, Prof. Wladimir Gramacho, fez um destaque, com a Agência Brasil, sobre o perfil dos que mais propagam estes conteúdos:

“não quer dizer que pessoas que têm essas características são pessoas que automaticamente compartilham notícias falsas, mas o contrário: que pessoas que compartilham esses tipos de desinformação sobre vacinas costumam ter essas características”.

O professor acrescenta que outros estudos que tratam do tema da desinformação na internet indicam que o comportamento de pessoas que divulgam informações incorretas, ou notícias falsas, variam conforme o tema. Gramacho explica quando o tema em questão é político, há uma tendência de pessoas idosas compartilharem desinformação mais facilmente, mas quando o assunto é vacina este padrão é diferente no Brasil, inclusive quando comparado a pesquisas realizadas em outros países.

“A principal explicação para isso talvez seja o fato de pessoas mais velhas terem sido socializadas em uma época em que o país viveu grandes conquistas no seu Programa Nacional de Imunizações”, conclui o pesquisador.

Imagem: Agência Brasil

Telegram, TikTok e Jornal da Record em destaque na propagação de falsidades

Na pesquisa também foram analisados os hábitos de uso de mídias das pessoas que afirmaram que compartilhariam as notícias falsas. Foi observado que as pessoas que mais espalhariam desinformação são as que têm as mídias digitais como principal fonte de informação. “São usuários mais frequentes de plataformas como Telegram e Tik Tok que têm maior tendência de compartilhar notícias falsas sobre as vacinas”, indicou o Prof. Wladimir Gramacho à Agência Brasil.

Ao analisarem o uso da televisão, principal meio de informação no país, pesquisadores compararam entrevistados que declararam ser audiência do Jornal Nacional e os que declararam ser audiência do Jornal da Record. Os telespectadores do Jornal Nacional demonstraram compartilhar menos notícias falsas do que os da Record: os primeiros tiveram a metade das chances de divulgarem falsidades sobre vacinas.

Uma possível justificativa para esse comportamento, segundo Wladimir Gramacho, é um processo de exposição seletiva das pessoas entre esses dois telejornais. “A audiência mais frequente do Jornal da Record reúne pessoas simpatizantes do governo Jair Bolsonaro, que foi um governo que difundiu muitas informações incorretas sobre as vacinas e que, ele próprio, fez campanha contra a vacinação”, destaca o pesquisador.

As conclusões da pesquisa do CPS da UnB reafirmam os resultados da pesquisa que originou e o Coletivo Bereia e orienta suas ações: “Caminhos da Desinformação: Evangélicos, Fake News e WhatsApp no Brasil”. Realizada de 2019 a 2020, a pesquisa foi conduzida pelo Grupo de Estudos sobre Desigualdades na Educação e na Saúde (Gedes), do Instituto Nutes de Educação em Ciências e Saúde da UFRJ, sob a coordenação dos professores Dr. Alexandre Brasil e Dra. Juliana Dias, colaboradores do Bereia, com relatório publicado em 2021. 

Foto de capa: Agência Brasil

‘Narcopentecostalismo’? Mídias de notícias desinformam sobre a relação entre igrejas evangélicas e traficantes

* Matéria atualizada em 02/06/2023 para correção de informações

Matéria publicada originalmente pela BBC News Brasil repercutiu intensamente nas mídias digitais nas últimas semanas. Intitulada “‘Narcopentecostalismo’: traficantes evangélicos usam religião na disputa por territórios no Rio”, a reportagem apresenta a complexa dinâmica entre territórios disputados pelo tráfico e o fenômeno religioso.

Religiosos e acadêmicos estudiosos do tema reagiram à reportagem, reproduzida por jornais de grande circulação, apontando possível sensacionalismo na utilização de termos que associam práticas criminosas do tráfico à religiosidade evangélica. Bereia apurou a utilização, pela imprensa, do termo “narcopentecostalismo” à luz do que dizem pesquisadores do fenômeno religioso em áreas conflagradas.

Uso do termo narcopentecostalismo

Reportagem da BBC News Brasil, veiculada em 12 de maio, reproduziu argumento da cientista política e pesquisadora do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) Kristina Hinz, segundo o qual “o termo neopentecostalismo tem sido empregado por diversos pesquisadores que analisam o fenômeno de narcotraficantes que assumem, de forma explícita e aberta, religiões neopentecostais, inclusive em suas atividades criminosas”.

Imagem: reprodução do Twitter

De acordo com a cientista política, “são traficantes que ao mesmo tempo participam da ‘vida do crime’ e da vida religiosa evangélica, indo a cultos, pagando o dízimo e até mesmo pagando por apresentações de artistas gospel da comunidade”.

O principal exemplo utilizado para sustentar a tese de que há uma convergência entre tráfico de drogas e religiões neopentecostais é a criação, em 2016, do Complexo de Israel, que uniu as comunidades de Vigário Geral, Parada de Lucas, Cidade Alta, Cinco Bocas e Pica-Pau, no Rio de Janeiro. 

No território recém-unificado foram introduzidos símbolos religiosos e alguns traficantes se dizem convertidos ao Evangelho. É o caso de Peixão, criador do complexo, que se autointitula “traficante evangélico”. Entretanto,alguns estudiosos reagiram à forma de abordar a relação entre tráfico e religião apresentada por parte da imprensa como uma fusão que institui uma nova forma religiosa: uma narcorreligião, o narcopentecostalismo.

A utilização do termo não é nova na imprensa brasileira. Os pesquisadores em Língua Portuguesa Anderson Ferreira e Carlos Alberto Baptista produziram pesquisa, em 2020, que identifica este uso, por exemplo, em reportagem da revista Época, em 2019, com o título “‘Narcopentecostais’: casos de intolerância religiosa crescem com expansão de facção no Rio”. 

Época reportou um relatório da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, que contabilizou 176 terreiros fechados no Rio de Janeiro, após ataques ou ameaças de traficantes. Ferreira e Baptista analisam a matéria e identificam que a revista anuncia “narcopentecostais” como uma “facção” em expansão. O relatório da Comissão referida, porém, não mencionava “traficantes evangélicos” e, sim, “traficantes”, destacam os pesquisadores. Eles tomam a matéria como exemplo de como as mídias jornalísticas seriam “responsáveis pela [re]construção de uma identidade híbrida entre traficantes e evangélicos”.

Dinâmica histórica da religiosidade nas periferias

A relação da religiosidade com dinâmicas de ocupação de territórios é um fenômeno antigo. É o que afirma a teóloga, pastora e pesquisadora da equipe do Instituto de Estudos da Religião (ISER), e autora do livro “Traficantes evangélicos: Quem são e a quem servem os novos bandidos de Deus”, Viviane Costa, em entrevista ao canal no YouTube Meteoro Brasil.

Imagem: reprodução do YouTube

“Há, desde a antiguidade, essa participação das divindades nas conquistas de território. No final da década de 1980, os traficantes já utilizavam os elementos religiosos, já utilizavam símbolos religiosos nessas disputas de poder no Rio de Janeiro. Então, quando um território era dominado por uma nova facção, a divindade dessa facção era derrotada e também era destruída e substituída, fosse numa imagem, fosse numa pintura, num muro, numa pichação ou em alguma espécie de devoção que era expressada na comunidade, como elemento, também, de dominação do território”, afirma a pesquisadora.

Costa faz, ainda, uma correlação com a própria dinâmica religiosa nacional: “nos últimos anos, a gente sabe que o campo religioso brasileiro começou a mudar. A gente tinha um catolicismo muito presente em toda a estrutura da nossa cultura, mas que vai sendo transformado, especialmente a partir das margens, das favelas, dos lugares de pobreza. E acontece assim no Rio de Janeiro”.

Periferias, tráfico e igrejas evangélicas

Uma das primeiras pesquisadoras a se dedicar a compreender o fenômeno da relação entre traficantes de drogas e igrejas foi a antropóloga, professora da Universidade Federal Fluminense e integrante da equipe do Instituto de Estudos da Religião (ISER) Christina Vital. Ela identificou nos seus estudos, ainda no limiar dos anos 2000, que, na virada dos anos 1990 para os anos 2000 houve uma mudança radical da sociabilidade nas favelas do Rio de Janeiro, no que diz respeito à relação entre religiosidade e tráfico. 

Aquele novo contexto, segundo Vital, foi marcado pelo que ela denominou “cultura pentecostal”. “[Tal cultura] existe nas localidades e se expressa dentro das lógicas do universo evangélico, a ver com a cosmovisão pentecostal do mundo como o lugar da guerra. É o mundo da guerra do bem contra o mal, da disputa das almas. Paralelamente, esse é o mundo do tráfico, da guerra e da vigia, é bíblico também, vigiar e orar. O vigiar vem antes do orar. O cotidiano dos traficantes é o de vigia constante”, descreveu em entrevista ao IHU On Line, em 2017,  após o lançamento do seu livro Oração de Traficante: uma etnografia (Rio de Janeiro: Garamond, 2015).

Imagem: Christina Vital/Arquivo Pessoal

Na entrevista ao IHU, Christina Vital explicou que, na pesquisa, “tentava entender de que modo as redes evangélicas funcionavam como redes de segurança para os moradores dessas localidades que dispunham de um dia a dia muito entrecortado por situações de violência e de precariedade de serviços oferecidos pelo Estado”. 

Naquele momento, a pesquisadora afirmou: “Eu pensava estas redes como um suporte material, espiritual e psicológico, entendendo que várias dessas igrejas pentecostais ou neopentecostais têm pastores e obreiros que são formados em psicologia e que fazem um tipo de abordagem misturando os diferentes universos de conhecimento. Durante este acompanhamento pude observar a proximidade dos traficantes às redes evangélicas, buscando por proteção, sobretudo porque muitos desses traficantes haviam sido formados em famílias evangélicas, mas que saíram de casa e acabaram indo para o tráfico”.

Vital continua: “O que acontece em Acari, como em outras favelas, é o crescimento do número de igrejas formando um público cada vez mais numeroso de pessoas que estão nas igrejas. E mesmo aquelas que não estão começam a partilhar daquilo que poderíamos chamar de ‘cultura pentecostal’. Isso é uma marca estética e uma gramática utilizada pelos moradores de modo que os traficantes são influenciados por essas perspectivas compartilhadas de modo mais geral”.

Imagem: reprodução do G1

Outro pesquisador que estudou o fenômeno, naquele início dos anos 2000, em diferentes favelas do Rio de Janeiro, foi o sociólogo e professor da Universidade de Vila Velha César Pinheiro Teixeira. Ele abordou o tema sob outra perspectiva: narrativas de conversão que recolheu e que destacavam o lugar do relacionamento entre pentecostais e traficantes num mesmo território mostrando a emergência de uma nova identidade, os ”ex-bandidos”. Teixeira explicou que “ex-bandidos” não se referiam, no que observada, aos egressos do sistema prisional, mas àqueles que tinham abandonado a vida no crime por terem experimentado uma conversão religiosa pentecostal.

Com um olhar voltado para o que Christina Vital e César Teixeira haviam indicado, o sociólogo professor da Universidade de Vila Velha Diogo Corrêa realizou um trabalho de campo na favela Cidade de Deus, na zona oeste do Rio de Janeiro, entre 2011 e 2014. Ele buscou compreender as relações entre tráfico de drogas e as igrejas pentecostais naquela localidade. Em artigo para o Observatório Evangélico, o pesquisador afirma ter diagnosticado fenômenos semelhantes àqueles percebidos por Vital e Teixeira. Ele é autor do livro “Anjos de fuzil: uma etnografia das relações entre pentecostalismo e vida do crime na favela Cidade de Deus”.

 Corrêa aponta ter identificado, com a pesquisa, a existência de uma “complexa coabitação entre traficantes de drogas e evangélicos no território da favela Cidade de Deus [que] teria produzido um duplo fenômeno: de um lado, um estilo de pentecostalismo particular, gerado na relação com a forma de vida do crime e com um ambiente caracterizado pela recorrência de situações violentas; de outro, um tráfico de drogas que abraça, em boa parte, uma cultura, uma linguagem ou mesmo uma gramática pentecostal”.

Diogo Corrêa ressalta que tal fenômeno de transformação mútua – tanto do  tráfico que se transformou com o crescimento dos evangélicos no território da Cidade de Deus, bem como do pentecostalismo que se transformou em sua relação com o universo do crime – não significou uma fusão entre ambos. Na análise do sociólogo, “moradores, traficantes e crentes da Cidade de Deus continuam a saber discernir o que é próprio do mundo da igreja pentecostal e o que é próprio do mundo do crime; grosso modo, eles sabem diferenciar o que é um traficante e o que é um crente”.

Repercussão negativa do termo narcopentecostalismo

A reportagem da BBC News Brasil ganhou repercussão nos meios evangélico e acadêmico, que reagiram à fusão entre o crime organizado e o protestantismo. Diogo Corrêa questiona, no texto para o Observatório Evangélico, a utilização dos termos “narcopentecostalismo” e “traficante evangélico”.

“Ao menos a partir do meu contexto etnográfico (…), categorias como ‘traficante evangélico’, ‘narcopentecostalismo’ não descrevem de forma adequada a experiência dos próprios evangélicos – e nem dos traficantes aderentes à cultura pentecostal -, além de incorrerem no risco de sugerir, de forma equivocada, a existência de uma espécie de religião para o crime”.

Corrêa cita exemplos, extraídos de pesquisa etnográfica por ele conduzida. Em um deles, uma pessoa ligada ao crime organizado reconhece, em conversa com o pesquisador, que suas atitudes não permitem que ela se classifique como evangélica: “para ser evangélico eu preciso praticar aquilo que eu acredito”, teria dito.

O pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia também repercutiu a reportagem da BBC, criticando, principalmente, o jornal O Globo, que a reproduziu. Em vídeo publicado no Twitter, o pastor chamou a reportagem de “canalha e mentirosa” e apontou o fato de que o jornal O Globo não se refere a “traficante umbandista”, “traficante do candomblé” ou “traficante católico” em outras ocasiões. 

Imagem: reprodução Folha Gospel

Bereia verificou que a abordagem do líder midiático reforçou o caráter sensacionalista em torno do caso. O discurso do pastor, além de ser emotivo e carecer de argumentação sólida quanto ao tema em questão, ainda lançou mão de desinformação promotora de intolerância contra as religiões de matriz africana.

“Narcopentecostalismo”: uma noção sem base concreta

Bereia ouviu a pesquisadora pioneira no estudo sobre a relação entre lideranças do tráfico de drogas e igrejas evangélicas nas periferias do Rio, Christina Vital, sobre as abordagens nas mídias de notícias nas últimas semanas. 

Sobre o ‘narcopentecostalismo’, Vital ressaltou que não há base concreta para sustentar este termo na atualidade. “Não sabemos do futuro, mas, hoje, não temos uma igreja liderada por alguém que está deliberadamente no crime e que tenha uma liturgia ou teologia voltada somente a esta atividade criminosa.  Se é isso que o termo supõe, não se sustenta. A aproximação entre criminosos e redes religiosas não é nova, não foi inventada por evangélicos e nem acontece exclusivamente em torno desta religião”. 

A pesquisadora explica que, já o segundo termo, “traficantes evangélicos”, sim, tem base concreta, mas deve ser usado com ética e cuidado porque não é usado comumente nem pelos traficantes e nem por evangélicos de modo geral. Vital afirma: “Lancei este termo em 2006 para descrever um fenômeno identificado nas favelas cariocas em que eu pesquisava, e o fiz entre aspas, explicando que não era uma autorreferência dos traficantes em relação a eles mesmos. O termo incomodava muitos evangélicos e evangélicas que se sentiam estigmatizados pelo uso descuidado desta expressão que fazia parecer que sua religião era permissiva em relação ao crime e eles afirmam que não. No entanto, usei esta terminologia pioneira e cuidadosamente para descrever um fenômeno que chamava atenção: a emergência de traficantes que atuavam em favelas e faziam orações publicamente, participavam de cultos, alguns eram dizimistas em grandes denominações, falavam sobre a redução de práticas violentas em seu cotidiano. Além dos pedidos de oração facilmente identificados pela mídia, esses traficantes apoiavam a divulgação da Palavra e a faziam de forma direta, eventualmente”.

Christina Vital oferece a leitoras e leitores do Bereia um alerta relevante: “É importante lembrar que o uso deste termo ‘traficantes evangélicos’ não deve mascarar, ainda, outras formas de experiência religiosa entre traficantes em favelas e periferias na atualidade. A religião de traficantes de drogas na high society carece de investigação”.

A pesquisadora e pastora Viviane Costa reforça: “O termo ‘narcopentecostalismo’ é equivocado e vem se revelando como parte de um alinhamento preconceituoso midiático contra evangélicos pentecostais. ‘Narcopentecostalismo’ força a ideia de exclusividade e até de ineditismo da presença de religiões em dinâmicas do crime”. 

Costa também sinaliza: “Ainda que estejamos falando de uma nova configuração quando olhamos para o Complexo de Israel e os traficantes evangélicos, onde a religião tem papel fundamental na estrutura, estratégias, identidades e ética local impostas pelo tráfico, é equivocado dizer que somente nesses territórios e na relação com evangélicos pentecostais, a religião e as experiências com o sagrado estão presentes dando sentido à vida e segurança em contextos de violências”.

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Com base nesta verificação, Bereia avalia que o uso do termo “narcopentecostalismo” em matérias das mídias de notícias, destacadas nas últimas semanas, é desinformativo, com caráter ENGANOSO. Os estudos empreendidos por diferentes pesquisadores, com ênfases distintas, voltados ao relacionamento entre igrejas evangélicas e o tráfico de drogas na vivência das favelas, afirmam uma coabitação e a transformação mútua de ambos. Porém, nenhuma das pesquisas identifica uma fusão entre pentecostalismo e crime ou a existência de uma ou mais igrejas com teologia, liturgia e pastoral voltadas à prática do crime. 

Ou seja, não há base concreta para se afirmar um “narcopentecostalismo”, quando o que se comprova é a existência de líderes do tráfico de drogas que se identificam como evangélicos e de igrejas que transformam seu jeito de existir nas favelas por conta da dinâmica do tráfico.

O uso do termo “narcopentecostalismo” tem sido veiculado de forma irresponsável pelas mídias de notícias, contribuindo para a amplificação de expressões de intolerância religiosa em diferentes contextos.

Referências de checagem:

BBC. https://www.bbc.com/portuguese/articles/cj5ej64934mo Acesso em: 31 mai 2023

Folha de S. Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/05/ascensao-evangelica-fez-traficantes-substituirem-santos-e-orixas-por-deus-de-israel-conta-livro.shtml Acesso em: 01 jun 2023

Deus no comando: uma análise do discurso “narcopentecostal”.https://revista.unitins.br/index.php/humanidadeseinovacao/article/view/4218/2218 Acesso em: 31 mai 2023

YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=9fLdyxDnxIU&ab_channel=MeteoroBrasil Acesso em: 31 mai 2023

Observatório Evangélico.

https://www.observatorioevangelico.org/ha-de-fato-um-narcopentecostalismo-e-traficantes-evangelicos/ Acesso em: 31 mai 2023

https://www.observatorioevangelico.org/nao-existe-narco-pentecostalismo-em-favelas-hoje/ Acesso em: 31 mai 2023

Folha Gospel. https://folhagospel.com/silas-malafaia-critica-materia-jornalistica-sobre-traficantes-evangelicos/ Acesso em: 31 mai 2023

IHU.

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/159-entrevistas/564908-oracao-de-traficante-o-mundo-da-guerra-do-trafico-e-da-guerra-das-almas-entrevista-com-christina-vital-cunha Acesso em: 31 mai 2023

https://www.ihu.unisinos.br/564604-livro-de-professora-da-uff-analisa-relacao-entre-religiosidade-e-trafico Acesso em: 31 mai 2023

http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3206&secao=329 Acesso em: 31 mai 2023

De “Corações de Pedra” a “Corações de Carne”: Algumas Considerações sobre a Conversão de “Bandidos” a Igrejas Evangélicas Pentecostais. https://www.scielo.br/j/dados/a/W9HH5dc7vcqn6xdPXxzpGwQ/?lang=pt&format=pdf Acesso em: 31 mai 2023

Wikifavelas. https://wikifavelas.com.br/index.php/De_%E2%80%9CCora%C3%A7%C3%B5es_de_Pedra%E2%80%9D_a_%E2%80%9CCora%C3%A7%C3%B5es_de_Carne%E2%80%9D:_Algumas_Considera%C3%A7%C3%B5es_sobre_a_Convers%C3%A3o_de_%E2%80%9CBandidos%E2%80%9D_a_Igrejas_Evang%C3%A9licas_Pentecostais._(Resenha) Acesso em: 31 mai 2023

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Foto de capa: reprodução IHU.