Cientista político e ONG desinformam sobre boicote do Brasil ao discurso do primeiro-ministro de Israel na ONU

Publicações sobre a participação do Brasil na Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), na última sexta (27), ganharam relevância nas mídias sociais, em especial em espaços digitais religiosos. No Instagram, uma postagem do cientista político André Lajst, em parceria com a StandWithUs Brasil (organização educacional sobre Israel), afirma que as delegações de Brasil, Cuba, Irã, Turquia, Arábia Saudita e Venezuela se retiraram do plenário durante o discurso da delegação de Israel no órgão. 

Na legenda da imagem, Lajst diz que o ato é uma demonstração de que a ONU se transformou em uma plataforma para o antissemitismo e que o Brasil seguiu o “viés anti-Israel” da organização. O cientista político afirma, ainda, que algumas delegações que deixaram o salão “possuem um grave histórico de violações de direitos humanos, a exemplo do Irã, Arábia Saudita, Venezuela e Cuba”. A deputada federal católica Bia Kicis (PL-DF) compartilhou a publicação em seu perfil no Instagram.

Imagem: Reprodução/Instagram

Boicote e plenário vazio 

Bereia levantou o que foi reportado pelas mídias de notícias sobre o discurso do primeiro- ministro de Israel na ONU. De acordo com o Jornal Nacional, da Rede Globo, ao menos 12 delegações se tiraram do salão da Assembleia Geral em sinal de protesto ao discurso primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu. Essa foi a primeira vez que o Brasil boicotou um discurso na ONU, e, segundo o jornal, a instrução foi para que os diplomatas saíssem do local antes da entrada do premier israelense no plenário.

Segundo o Estadão, a ordem partiu do Ministro de Relações Exteriores Mauro Vieira, e foi motivada não só pela escalada do conflito no Oriente Médio, protagonizado por Israel, mas também pela morte de dois brasileiros nas recentes ofensivas de Netanyahu no Líbano. 

Em 25 de setembro, dois dias antes do discurso do primeiro-ministro, o Itamaraty confirmou a morte de Ali Kamal Abdallah, de 15 anos, primeiro brasileiro vitimado em um ataque de Israel ao Líbano. No dia do protesto, uma segunda morte foi confirmada: Mirna Raef Nasser, de 16 anos, estava em casa quando uma explosão atingiu o local no início daquela semana.

Em vídeo publicado pelo jornal The Guardian, é possível notar que membros das delegações começam deixar o local assim que o nome do premier israelense foi anunciado – o que contraria a afirmação de que o protesto ocorreu no meio do discurso. Por outro ângulo, um vídeo da agência AFP mostra que muitos lugares já estavam vazios antes da movimentação.

Analisando as imagens, Bereia verificou que os assentos das seguintes delegações estavam vazios: Turquia; Santa Lúcia; Paraguai; Nepal; Mauritânia; Madagascar; Argélia; Macedônia do Norte; Libéria; Namíbia; Nauru; Jordânia; Kuwait.

As ausências não significam adesão automática ao protesto, pois não é possível determinar em que momento os diplomatas deixaram do local, mas, além do Brasil, há confirmação de que no caso de Malásia, Indonésia e Turquia a saída foi intencional. Imagens do discurso do primeiro-ministro do Paquistão, que falou imediatamente antes de Benjamin Netanyahu, mostram que muitas delegações já haviam deixado o plenário. 

Imagem: Reprodução/ Youtube

A situação não foi diferente após o discurso do premier israelense: a primeira-ministra de Barbados também encarou um auditório parcialmente vazio.

Imagem: Reprodução/ Youtube

Netanyahu pede paz em meio aos piores ataques dos últimos 20 anos

Nos registros em vídeo, Netanyahu foi vaiado no início. Ele fez críticas ao Irã, a quem chamou de “maldição”,  falou sobre uma “reconciliação histórica” entre árabes e judeus, defendeu o que chamou de “mentiras e calúnias” sobre seu país. Netanyahu expôs uma demonstração de força diante da escalada do conflito no Líbano, onde o premier afirma “não ter escolha e ter todo o direito”.

Enquanto Netanyahu discursava, o número de vítimas dos bombardeios de Israel no Líbano nos cinco dias anteriores chegou a 700, mais da metade do número de mortos na guerra de 2006. A ofensiva de Israel contra o Hamas matou mais 40 mil palestinos nos primeiros 10 meses de conflito, marcado por ataques a campo de refugiados, hospitais, escolas, comboio de ajuda humanitária e civis desarmados.  

Diante deste cenário, Israel sofre duras críticas de toda a comunidade internacional e da ONU, que, em março de 2024, afirmou ter motivos para sustentar que o país comete genocídio na Faixa de Gaza. Em julho deste ano, o principal tribunal das Nações Unidas considerou ilegal a ocupação de Israel em territórios palestinos e pediu a suspensão da construção de assentamentos israelenses na região.

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Bereia classifica a publicação de André Lajst e da organização Stand with Us como enganosa. Apesar de se basear em informações verdadeiras sobre o boicote do Brasil ao premier israelense, Lajst divulga desinformação para reforçar mensagem pró-governo israelense. Em primeiro lugar, afirma que a delegação brasileira se retirou do plenário da Assembleia Geral da ONU durante o discurso de Netanyahu, quando, de acordo com diplomatas ouvidos pela imprensa brasileira, ela nem estava presente quando o primeiro-ministro foi anunciado. 

Em segundo lugar, a publicação coloca o Brasil em um suposto grupo de países que teria deixado o plenário. Como Bereia verificou, o grupo de países ausentes é muito maior do que o que foi listado nos perfis do Instagram. A seleção apresentada é composta por países que recebem frequentes críticas públicas a respeito de suas políticas interna e externa. Colocar o Brasil no grupo selecionado oferece a leitores e seguidores uma mensagem negativa como se o país se alinhasse às mesmas tendências políticas, o que não é factual. 

Em terceiro lugar, a publicação reduz o gesto dos países a antissemitismo e descarta a dimensão política do protesto na Assembleia da ONU, associado aos fatos recentes, como a violenta ação no Líbano que vitimou centenas de civis, incluindo dois adolescentes brasileiros. 

Essa imprecisão e a omissão de um contexto importante para a compreensão de uma questão tão complexa leva o público a uma percepção enganosa dos fatos.

Referências 

StandWithUs

https://www.standwithus.com/brazil-about-us Acesso em 30 set 2024

The Guardian

https://www.theguardian.com/world/video/2024/sep/27/delegates-walk-out-of-un-general-assembly-chamber-as-benjamin-netanyahu-takes-podium-video Acesso em 30 set 2024

G1

https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2024/09/27/no-discurso-do-primeiro-ministro-de-israel-na-onu-delegacoes-do-brasil-e-de-outras-nacoes-deixam-o-plenario-em-protesto.ghtml Acesso em 30 set 2024

Reuters

https://www.reuters.com/world/middle-east/netanyahu-says-israel-seeks-peace-fighting-life-2024-09-27/ Acesso em 01 out 2024

Estadão

https://www.estadao.com.br/internacional/brasil-deixa-plenario-antes-de-discurso-de-binyamin-netanyahu-na-assembleia-geral-da-onu/ Acesso em 01 out 2024

CNN Brasil

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/itamaraty-confirma-morte-de-segundo-adolescente-brasileiro-no-libano/ Acesso em 30 set 2024

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/israel-abre-fogo-mata-e-fere-centenas-que-esperavam-por-comida-em-gaza/#:~:text=Pelo%20menos%20112%20pessoas%20morreram,da%20Saúde%20palestino%20em%20Gaza. Acesso em 02 out 2024

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/ataque-a-comboio-humanitario-foi-sistematico-carro-a-carro-diz-fundador-de-ong/ Acesso em 02 out 2024

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/ataque-aereo-israelense-contra-escola-da-onu-em-gaza-deixa-dezenas-de-mortos-dizem-autoridades-de-hospital/ Acesso em 02 out 2024

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/discurso-netanyahu-assembleia-onu-delegacoes-deixam-plenario/ Acesso em 30 set 2024

Instagram  

https://www.instagram.com/p/DAcRsJWp1P9/?igsh=MXcxMGw1ZGV0ZG1yag== Acesso em 30 set 2024

https://www.instagram.com/p/DAbdsUgRDhe/?igsh=MW91MTU4NzJ2OTg0NQ== Acesso em 30 set 2024

Youtube

https://youtu.be/w0b0dAb81qQ?si=QgS7TEWxG3LBbLIB Acesso em 02 out 2024

https://www.youtube.com/watch?v=ARZGgK1x4oM Acesso em 02 out 2024

https://www.youtube.com/watch?v=lTMm8BYRG4E Acesso em 02 out 2024

https://www.youtube.com/watch?v=aUvWnTesK3w&t=1588s Acesso em 02 out 2024

ONU News

https://news.un.org/pt/story/2024/09/1838336 Acesso em 02 out 2024

Nexo Jornal

https://www.nexojornal.com.br/extra/2024/09/27/benjamin-netanyahu-na-onu-boicote-brasil-ataques-contra-o-libano Acesso em 02 out 2024

Monitor do Oriente

https://www.monitordooriente.com/20240927-discurso-de-netanyahu-na-onu-e-marcado-por-vaias-e-saida-de-diplomatas/ Acesso em 02 out 2024

Agência Brasil

https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2024-03/relatora-da-onu-diz-que-israel-comete-genocidio-na-faixa-de-gaza Acesso em 02 out 2024 

https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2024-03/ataque-de-israel-hospital-em-gaza-faz-quatro-mortos-e-17-feridos#:~:text=Ataque%20de%20Israel%20a%20hospital%20em%20Gaza%20faz%20quatro%20mortos%20e%2017%20feridos,-Exército%20israelense%20visava&text=Um%20ataque%20das%20forças%20militares,Mundial%20de%20Saúde%20(OMS).Acesso em 02 out 2024

BBC News Brasil

https://www.bbc.com/portuguese/articles/cn33r5lkkn4o Acesso em 02 out 2024

Euronews

https://pt.euronews.com/2024/07/19/tribunal-da-onu-considera-ilegal-a-ocupacao-dos-territorios-palestinianos-por-israel Acesso em 02 out 2024

Capa: Reprodução/Youtube

Religioso católico tem redes sociais bloqueadas por engano, mas discurso de que sofreu perseguição se espalha

Na última semana, o religioso católico Frei Gilson teve perfis bloqueados em redes sociais digitais, e não conseguiu transmitir lives em que rezava o Rosário com seus seguidores. Segundo a Meta, empresa dona das redes em que Gilson foi bloqueado temporariamente, o bloqueio ocorreu por engano. Os acessos foram restabelecidos em cinco dias. Mesmo assim, discursos de perseguição religiosa ecoaram nas redes e na política. Bereia checou o caso e a propagação de possíveis conteúdos enganosos.

Imagem: reprodução Instagram

Desde 15 de agosto, o líder católico Frei Gilson, que tem 5,4 milhões de seguidores no Instagram, vem rezando o Rosário diariamente às 4h, em lives nas suas redes. Trata-se da Quaresma de São Miguel, que muitos fieis acompanham nas primeiras horas da madrugada.

Em 17 de setembro, no entanto, o religioso da Ordem das Carmelitas fez uma publicação, em seu perfil no Instagram, na qual relatava ter sido alvo de medidas restritivas por parte da rede digital. Na legenda, ele disse que, segundo o Instagram, sua conta havia transgredido uma das normas da plataforma.

Nesta mesma publicação, Gilson afirmou que, após sua equipe ter entrado em contato com o Instagram, a plataforma respondeu “dizendo que tudo havia sido um erro” e com um pedido de desculpas. Porém, mesmo com o esclarecimento, a publicação ensejou comentários que difundiam um discurso de perseguição religiosa.

Ainda hoje estão visíveis, na aba de comentários da publicação, frases como: “Já estava achando que o Alexandre de Moraes iria derrubar o Rosário”, “O inimigo querendo nos derrubar”, “Certeza de que estão tentando calar o nosso Frei”, “Só acontece com páginas de valores cristãos” e “Certeza que foi porque o senhor falou sobre aborto”.

Em uma das imagens publicadas, Frei Gilson compartilhou a mensagem recebida do Instagram, com a informação de que o bloqueio havia sido um engano e de que o conteúdo fora restaurado.

Imagem: reprodução Instagram

Discurso enganoso de perseguição a cristãos ganhou fôlego em comentários

No dia seguinte, 18 de setembro, uma segunda publicação informava: “Santo Rosário!!! Até o momento não estamos conseguindo fazer transmissão ao vivo pelo Instagram. Estamos ao vivo no YouTube!!!”. Na legenda, Frei Gilson informava: “Avisa todo mundo!!!”

Nos comentários, alegações de perseguição religiosa continuavam: “Tem católicos que votam nessa esquerda”, “Senhor, livra o Brasil desse comunismo que estão querendo implantar”, “Está começando a perseguição religiosa”, entre outras que promoviam o mesmo discurso enganoso de perseguição. 

Não havia, por parte da plataforma, nenhuma menção a restrição de conteúdo em razão de um posicionamento religioso. Também não havia – e não há, neste caso – qualquer envolvimento de entes governamentais ou do Estado brasileiro que permitam associar a queda das transmissões a perseguição religiosa ou à intenção de implantação do comunismo. 

No mesmo dia 18, mais tarde, o perfil fez uma nova publicação sobre a situação com a plataforma. Na legenda, Frei Gilson informava: “Até o momento, o ‘Instagram’ ainda não liberou a ferramenta de transmissão ao vivo. Como vocês podem ver em um dos posts, fomos informados pelo Instagram que estamos bloqueados por 29 dias. No entanto, há uma contradição, pois em outro post o Instagram afirma que temos liberação para todas as ferramentas da plataforma”.

No dia 19, o perfil novamente informou seus seguidores: “Estamos ao vivo no YouTube. O Instagram ainda não liberou a transmissão ao vivo”. O público reagiu com comentários como “Guerra espiritual!!”, “Nós avisamos em 2022” e “Não podemos deixar o inimigo nos derrotar”. Alguns usuários, no entanto, pediam que as lives do Rosário apenas continuassem em outra plataforma enquanto o problema não fosse resolvido.

Plataformas da Meta, como Instagram e WhatsApp, contam com sistema de detecção de comportamento inautêntico e de conteúdos que possam ferir as diretrizes da comunidade. O Instagram tem, por exemplo, a prerrogativa de bloquear conteúdos quando há indícios de atuação fora dos padrões. Qualquer associação com intenções persecutórias ou de viés comunista não encontra sustentação na realidade.

Imagem: reprodução Instagram

Frei Gilson adere à tese de perseguição religiosa

No último domingo, 22, o caso ganhou repercussão a partir de uma nova publicação do perfil de Frei Gilson, que dizia: “ATENÇÃO!!! Quero, por meio deste post, informar que fui bloqueado em minhas comunidades do WhatsApp, nas quais me comunicava com 50 grupos. Além disso, hoje faz 5 dias que estou impedido de fazer transmissões ao vivo no Instagram, devido a um bloqueio que recebemos sob a alegação de termos transgredido as regras da plataforma”.

Na publicação, o religioso afirma que não transgrediu regras, que atua dentro das leis e pede orações aos fiéis. Ao final do texto, a mensagem: “É importante que você entenda o que está acontecendo. Evangelizar nunca foi fácil, desde os tempos da Igreja primitiva. Mas uma coisa é certa: não vamos parar. Se uma porta se fecha, vamos abrir outras. Não vamos parar”.

A publicação seguinte feita pelo perfil de Gilson subiu o tom. O religioso publicou um vídeo com a canção “A Nossa Fé” em que, na introdução, faz uma pregação sobre perseguição a cristãos. “Em todos os tempos, em todas as épocas, a Igreja de Jesus é perseguida. Em todas as épocas os cristãos são perseguidos. Se viverem o que tiverem que viver, sofrerão perseguições”, diz Gilson no vídeo.

A série de publicações, acrescida da adesão do líder carmelita à narrativa de perseguição, fortaleceu a propagação de discursos enganosos de perseguição a cristãos no Brasil, inclusive com reprodução por parte de atores políticos. 

“Perseguição” chega ao Congresso Nacional

Naquele mesmo domingo, 22, a deputada federal católica Bia Kicis (PL-DF) publicou, em seu perfil no Instagram, um vídeo com os dizeres “Perseguição religiosa escancarada! Ódio ao Cristianismo! Basta!”. A legenda da publicação traz a seguinte mensagem: “A Meta bloqueou grupos do WhatsApp e suspendeu as lives do Frei Gilson nas quais ele reunia milhares de cristãos para rezar o terço. Ódio ao Cristianismo, mas, NÃO VÃO NOS CALAR!”.

Imagem: reprodução Instagram

No vídeo, Kicis afirma que Frei Gilson teve 50 grupos de WhatsApp bloqueados e foi censurado pelo Instagram, que o impediu de transmitir lives. A deputada sugere que as restrições à conta de Gilson ocorreram porque o Rosário estava sendo rezado e porque o religioso teria feito uma fala contrária à prática do aborto. Tais justificativas nunca foram usadas pela Meta, conforme mensagem da empresa que o próprio religioso compartilhou

A tese de que comentários sobre aborto teriam justificado o bloqueio foi repercutida pelo próprio Frei Gilson. Em uma outra postagem, publicada nos dias em que suas lives estavam bloqueadas, o carmelita contou que, há três anos, gravou três vídeos sobre o tema, e um deles não teve a mesma repercussão que os outros dois. 

Segundo Gilson, o vídeo que teve a propagação restrita recebeu um alerta do YouTube com a informação de que o tema aborto não poderia ser tratado na plataforma. O conteúdo continua disponível na plataforma e contava com quase 130 mil visualizações até a publicação da matéria. Os outros dois vídeos já chegaram a 1 milhão e 2 milhões de visualizações. O fato de, em três vídeos, dois deles terem repercutido normalmente, sem interferência do YouTube, não pesa nas considerações do religioso.

Outro político que mencionou perseguição religiosa – neste caso, no Senado Federal – foi o senador Izalci Lucas (PL-DF). Na terça-feira, 24, ele levou à Sessão Plenária do Senado a informação de que contas ligadas a Frei Gilson haviam sido bloqueadas. O senador disse que entrou em contato com a Meta e recebeu a resposta de que houve equívoco por parte da empresa, e que o acesso às lives  no Instagram e aos canais de WhatsApp vinham sendo normalizados.

Mesmo assim, ele afirmou estar preocupado com a possibilidade de perseguição religiosa: “Acontece uma coisa dessa, não é, onde o Frei Gilson simplesmente reza o Santo Rosário. A gente vê e fica preocupado que não esteja acontecendo também alguma perseguição, vamos dizer assim, religiosa, como vem acontecendo em outros países onde a ditadura reina, como as coisas estão caminhando aqui, nessa direção (…) espero que não haja nenhuma relação com a questão religiosa, mas lamentável que o Frei Gilson tenha tido mais de uma semana com o Instagram bloqueado”.

Discursos enganosos sobre perseguição a cristãos no Brasil

No mesmo domingo, 22, em que Bia Kicis fez seu protesto contra a suposta perseguição religiosa, o perfil de Frei Gilson no Instagram publicou e fixou uma postagem com a legenda: “Boas notícias!!! Quem ficou feliz???”. Em vídeo, Gilson diz que tanto seu perfil no Instagram quanto seus canais no WhatsApp haviam sido liberados. “Nossas redes voltaram, para que eu possa continuar rezando e evangelizando”, disse.

Nos comentários, fieis aliviados comemoraram o fim do bloqueio – que durou cinco dias -, mas o discurso de perseguição continuou: “A censura da extrema esquerda é uma ameaça de cada dia”, comentou um seguidor. Outro disse: “Eles tentaram nos calar, mas nossa fé é inabalável”.

A propagação do discurso de perseguição religiosa ou de “cristofobia” – um termo construído para justificar uma inexistente perseguição a cristãos no Brasil – tem tido ampla repercussão nas redes digitais e no meio político brasileiro. No recente caso que envolveu o Frei Gilson, a tese foi amplamente propagada, sem que houvesse indícios concretos de perseguição por parte da Meta, que efetuou os bloqueios e admitiu ter cometido um erro, ou de qualquer outra entidade.

Como Bereia tem alertado, os discursos sobre perseguição a cristãos têm ganhado terreno no Brasil, mas nem sempre estão em acordo com a realidade dos fatos. Muitas vezes, o discurso de perseguição ganha espaço nas redes digitais, mas também é comum encontrá-lo na política, propagado por líderes que fazem da fé suas plataformas eleitoreiras.

É comum que ocorra um apelo ao imaginário cristão e ao tema dos inimigos da fé como forma de explorar a fidelidade dos cristãos ao Evangelho, mesmo que não haja, de fato, uma perseguição em curso. O recente caso do Frei Gilson é um exemplo entre tantos.

Casos de perseguição como o que ocorre na Nicarágua são importados para a realidade brasileira como se aqui ocorressem. Decretos que dizem respeito à saúde pública são instrumentalizados para justificar suposta perseguição religiosa. Reações dos Poderes a atos ilícitos praticados por atores políticos também se encaixam à tese.

Importante também destacar que a suspensão de contas é ação frequente das plataformas que trabalham com algoritmos e práticas automatizadas, sujeitas a equívocos, como justificado ao Frei Gilson pela Meta. São periódicas as reclamações de usuários que têm suas contas suspensas tanto no Instagram quanto no Facebook. Isto reforça o questionamento sobre a falta de regulação sobre as dinâmicas das plataformas digitais, até hoje soberanas nas decisões sobre o que e como publicam, levandos em conta os altos níveis de lucro financeiro. 

*A reportagem entrou em contato com Frei Gilson, mas não obteve resposta até a publicação da matéria.

Referências

YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=xwQJteHe3Pc&ab_channel=Biakicis Acesso em: 25 set 2024

https://www.youtube.com/watch?v=ngM9byPcZEM&ab_channel=FreiGilson%2FSomdoMonte-OFICIAL Acesso em: 25 set 2024 

https://www.youtube.com/watch?v=bckvNY1aCng&ab_channel=FreiGilson%2FSomdoMonte-OFICIAL Acesso em: 25 set 2024 

https://www.youtube.com/watch?v=m5WDJTphqK8&ab_channel=TVSenado Acesso em: 25 set 2024 

DF Mobilidade

https://www.dfmobilidade.com.br/cidades/video-senador-izalci-denuncia-possivel-perseguicao-religiosa-apos-bloqueio-do-frei-gilson/ Acesso em: 25 set 2024

Coletivo Bereia

https://coletivobereia.com.br/a-mentira-que-nao-quer-calar-sobre-perseguicao-a-cristaos-no-brasil/ Acesso em: 26 set 2024

https://coletivobereia.com.br/sites-e-lideres-religiosos-apontam-suposta-perseguicao-religiosa-em-decreto-sobre-comprovante-vacinal/ Acesso em: 26 set 2024

https://coletivobereia.com.br/apos-perda-de-mandato-de-dallagnol-politicos-religiosos-propagam-narrativa-enganosa-de-perseguicao/ Acesso em: 26 set 2024

https://coletivobereia.com.br/mensagem-em-grupos-religiosos-engana-e-cria-alarde-sobre-fechamento-de-igrejas-na-nicaragua/ Acesso em: 26 set 2024

Instagram

https://www.instagram.com/p/DABFd7RR1tf/?img_index=1 Acesso em: 24 set 2024

https://www.instagram.com/p/DAOxwNHPTRD/?img_index=1 Acesso em: 24 set 2024

https://www.instagram.com/biakicis/reel/DAOqoBYPLQf/?hl=pt-br Acesso em: 24 set 2024

Gazeta do Povo

https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/apos-denuncias-redes-sociais-do-frei-gilson-sao-desbloqueadas/?ref=busca Acesso em: 23 set 2024

Folha Vitória

https://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/09/2024/frei-gilson-relata-bloqueio-de-suas-comunidades-no-whatsapp Acesso em: 23 set 2024

Brasil Paralelo 

https://www.brasilparalelo.com.br/noticias/instagram-proibe-frei-gilson-de-realizar-live-do-rosario-de-sao-miguel Acesso em: 24 set 2024

Deputados e mídias gospel espalham falsidades sobre Projeto de Lei que retira direitos sobre aborto no Brasil

O Projeto de Lei 1904/24, conhecido como “PL do Estupro”, “PL do Aborto”, “PL da Gravidez Infantil” tem gerado intensa mobilização nas mídias sociais, nas primeiras semanas de junho de 2024, sob reações de diversas perspectivas. O texto, proposto por 33 parlamentares da Câmara Federal, sob a liderança do deputado evangélicos Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), foi apresentado em 17 de maio, na Câmara dos Deputados. 

O PL visa alterar o Código Penal para equiparar o aborto, realizado após 22 semanas de gestação, ao crime de homicídio, mesmo nos casos permitidos pela legislação atual, como gravidez decorrente de estupro. Os portais de notícias gospel, como Gospel Prime, Guiame, Pleno News e Gospel Mais, passaram a destacar o processo de apresentação do PL, alinhando-se com a agenda dos autores, classificada por eles próprios e por analistas críticos como conservadora. 

Em 12 de junho, a tramitação do projeto ganhou urgência no plenário da Câmara dos Deputados, graças a uma manobra do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Lira aprovou a urgência do PL em apenas 23 segundos, sem permitir a manifestação contrária de deputados opositores. ​Com a urgência aprovada, segundo as regras da Câmara Federal, o PL pode ser debatido diretamente no plenário, sem precisar passar pelas comissões temáticas que discutem detalhadamente os projetos e emitem pareceres, antes de irem a plenário. 

A apresentação do PL vem sendo avaliada  como uma reação de parlamentares ultraconservadores a uma decisão  do Supremo Tribunal Federal (STF), em maio passado, que suspendeu a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proibia médicos de realizarem a chamada “assistolia fetal” .

A resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) proibia a assistolia fetal em casos de aborto legal após 22 semanas de gestação decorrentes de estupro. O método, recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), é uma técnica considerada essencial para a segurança das gestantes, pois minimiza os riscos durante o procedimento de aborto. Segundo o ministro do STF, responsável pelo caso, Alexandre de Morais, a proibição da assistolia fetal representava um risco adicional para a saúde das gestantes que necessitavam do procedimento em circunstâncias já previstas pela legislação, como casos de estupro ou risco de vida para a mulher.

O presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva manifestou-se sobre o caso em 15 de junho, em entrevista coletiva, durante participação em reunião do G20 na Itália. O perfil de Lula (PT) no X, reproduziu fala, em que ele afirma ser, pessoalmente, contra a prática do aborto, mas reconhece que há necessidade de tratar o assunto como um caso de saúde pública. Lula ainda criticou a proposta de punir as mulheres que abortam após um estupro com penas maiores do que as dos estupradores, classificando a medida como uma “insanidade”. 

A proposta de mudança na legislação sobre o aborto no Brasil 

A legislação atual sobre o aborto no Brasil tem raízes no Código Penal de 1940, aprovado durante o Estado Novo (1937-1945), presidido por Getúlio Vargas. O Código Penal passou a permitir a interrupção da gravidez quando há risco de vida para a gestante ou em casos de estupro. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ação que autorizou a interrupção da gravidez também em casos de anencefalia (má formação do cérebro) do feto. 

Fora dessas exceções, o aborto no Brasil é considerado um crime sujeito a penas de detenção tanto para a gestante quanto para quem realiza o procedimento. Em 2016, no julgamento de um recurso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a de autorização do aborto nos casos de anencefalia  se aplicava também a outras malformações incompatíveis com a vida. 

Nos casos de estupro ou risco à vida da gestante, não há um limite de tempo específico de gestação estabelecido pela lei para que o aborto legal possa ser realizado. 

Para o que estiver fora destas situações e representar aborto por vontade própria, o Código Penal prevê punições como detenção de um a três anos para mulheres que praticam, reclusão de um a quatro anos para médicos ou outras pessoas que realizam o aborto com consentimento da gestante, e reclusão de três a 10 anos para quem provoca aborto sem consentimento da gestante.

Em 2022, no último ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica, com a recomendação de que o aborto legal fosse realizado apenas até 21 semanas e seis dias de gestação. Essa recomendação não tinha poder de lei e não alterou a legislação vigente no Brasil.

Em 21 de março deste ano, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou uma resolução (Resolução CFM N° 2.378) proibindo médicos de utilizarem a técnica de assistolia fetal em gestações com mais de 22 semanas nos casos de aborto legal permitidos por lei. No entanto, como o CFM não pode agir em desacordo com a legislação, essa norma foi suspensa pelo STF, como já relatado nesta matéria.

A proposta dos 33 deputados federais por meio do PL 1904/24, prevê as seguintes alterações no Código Penal

  • abortos realizados após 22 semanas de gestação, com ou sem o consentimento da gestante, quando há “viabilidade fetal”, serão tratados como homicídio simples. O juiz poderá considerar as circunstâncias individuais para mitigar ou não aplicar a pena. 
  • Revoga-se a não punibilidade em casos de aborto em gravidez resultante de estupro após 22 semanas, diante da “viabilidade extrauterina do feto” equiparando a pena de homicidio simples, que pode chegar a 20 anos. A pena torna-se mais severa do que a aplicada a estupradores, que de acordo com o artigo 213 do Código Penal, pode variar de seis a dez anos de prisão. 
  • Torna-se obrigatória a notificação compulsória à autoridade policial, por parte dos profissionais de saúde, dos casos de interrupção da gravidez decorrente de estupro, sob pena de detenção de seis meses a dois anos. A interrupção da gravidez em casos de estupro só poderá ser realizada até a 22ª semana de gestação, exceto em casos de risco de vida para a gestante.

O termo-chave “viabilidade fetal” foi explicado pelo médico presidente da Comissão de Medicina Fetal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) Mário Burlacchini, em entrevista à Folha de S. Paulo. Ele explica que a viabilidade “é a capacidade do feto viver fora do útero, nascer e ficar vivo — e que esse número depende de cada maternidade e berçário”.  Burlacchini acrescenta que “em geral, na maioria dos hospitais em São Paulo, a viabilidade é entre 24 e 25 semanas, mas depende de cada berçário. Com certeza outros locais do Brasil devem ter uma idade gestacional maior”.

O coordenador no Brasil da Rede Médica pelo Direito de Decidir (Global Doctors For Choice), o médico ginecologista e obstetra Cristião Rosas, também foi ouvido pela Folha de S. Paulo. Ele diz que, para a comunidade médica, o conceito de viabilidade fetal é utilizado em relação a partos prematuros, isto é, quando há necessidade de se adiantar o processo de nascimento, por conta das condições da gravidez, de doenças ou outros motivos de força maior.

Esta noção de viabilidade fetal, segundo Cristião Rosas, é utilizada na medicina para orientar a adequação nos cuidados intensivos neonatais, mas deve ser entendida como um último recurso porque prematuros possuem maiores riscos de sequelas e complicações, como as cardiológicas e respiratórias por conta da não formação completa.

Por isso, segundo o médico, ao se referir à legislação de aborto, a questão muda, e o termo não cabe. “Quando falamos em viabilidade fetal pensamos num parto prematuro e espontâneo em que existe um equilíbrio no desejo da mãe em relação ao interesse pelo bebê, então esse conceito não funciona para aborto induzido”, diz Rosas. Para ele, as 22 semanas de um feto são classificadas como prematuridade extrema. Cerca de 26, como prematuridade intermediária, e 37 como “a termo”, ou seja, com menores riscos de sequelas. 

A inclusão da noção de viabilidade fetal no PL 1904, para o médico obstetra, facilita a confusão sobre o tema. “Isso leva a uma banalização perigosa sobre os danos da prematuridade”, afirmou à Folha de S. Paulo.

O perfil dos autores do PL 1904/24

O projeto, que até 18 de junho passado contava com a proposição de 33 parlamentares, após o alto volume de manifestações contrárias da sociedade civil, recebeu a adesão de mais assinaturas proponentes. Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) solicitou à Mesa Diretora da Câmara, naquela data, a inclusão de novos autores no documento. 

Na lista de proponentes, todos estão no espectro político da direita e centro-direita. Em termos de equidade, especialmente no caso de Projeto de Lei 1904/24, que altera legislação que infere diretamente em pessoas com útero,  são apenas 12 mulheres, enquanto 43 são parlamentares do sexo masculino.

 

PARLAMENTARPARTIDOIDEOLOGIARELIGIÃO POR AUTOIDENTIFICAÇÃOVINCULAÇÃOGÊNERO
AbílioPL – MTDireitaCristãIgreja Evangélica não identificadaMasculino
Adilson BarrosoPL – SPDireitaCristãNão identificadaMasculino
André FernandesPL – CEDireitaEvangélicaIgreja Evangélica não identificadaMasculino
Bia KicisPL – DFDireitaCatólicaIgreja CatólicaFeminino
Bibo NunesPL – RSDireitaCristãNão identificadaMasculino
Cabo Gilberto SilvaPL – PBDireitaNão identificadaNão identificadaMasculino
Capitão AldenPL – BADireitaEvangélicaSem denominaçãoMasculino
Carla ZambelliPL – SPDireitaCatólicaIgreja CatólicaFeminino
Coronel AssisUNIÃO – MTDireitaCristãNão identificadaMasculino
Coronel ChrisóstomoPL – RODireitaCristãIgreja CatólicaMasculino
Coronel FernandaPL – MTDireitaEvangélicaAssembleia de DeusFeminino
Cristiane LopesUNIÃO – RODireitaEvangélicaIgreja Santa GeraçãoFeminino
Dayany do CapitãoUNIÃO – CEDireitaCristãIgreja Evangélica não identificadaFeminino
Delegado CaveiraPL – PADireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Delegado Eder MauroPL – PADireitaCristãNão identificadaMasculino
Delegado Fabio CostaPP – ALDireitaCristãNão identificadaMasculino
Delegado PalumboMDB – SPCentroCristãIgreja CatólicaMasculino
Delegado Paulo BilynskyjPL – SPDireitaNão identificadaNão identificadaMasculino
Delegado RamagemPL – RJDireitaCristãNão identificadaMasculino
Dr. FredericoPATRIOTA – MGDireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Dr. Luiz OvandoPP – MSDireitaCristãIgreja Batista KairósMasculino
Eduardo BolsonaroPL – SPDireitaCristãComunidade Batista do Rio de JaneiroMasculino
Ely SantosREPUBLICANOS – SPDireitaNão identificadaNão identificadaFeminino
Eros BiondiniPL – MGDireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Evair de MeloPP – ESDireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Filipe BarrosPL – PRDireitaEvangélicaIgreja Presbiteriana do BrasilMasculino
Filipe MartinsPL – TODireitaEvangélicaAssembleia de Deus MadureiraMasculino
Franciane BayerREPUBLICANOS – RSDireitaCristãIgreja Internacional da Graça de DeusFeminino
Fred LinharesREPUBLICANOS – DFDireitaCristãNão identificadaMasculino
General GirãoPL – RNDireitaCristãNão identificadaMasculino
Gilvan O Federal da DireitaPL – ESDireitaCristãIgreja Evangélica não identificadaMasculino
Greyce EliasAVANTE – MGCentroCristãNão identificadaFeminino
Gustavo GayerPL – GODireitaCristãNão identificadaMasculino
José MedeirosPL – MTDireitaEvangélicaIgreja Presbiteriana do BrasilMasculino
Julia ZanattaPL – SCDireitaCristãNão identificadaFeminino
Junio AmaralPL – MGDireitaEvangélicaIgreja Evangélica não identificadaMasculino
Lêda BorgesPSDB – GOCentroCatólicaIgreja CatólicaFeminino
Marcelo MoraesPL – RSDireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Marcos PollonPL – MSDireitaCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Mario FriasPL – SPDireitaCristãNão identificadaMasculino
Mauricio MarconPODE – RSDireitaCristãNão identificadaMasculino
Messias DonatoREPUBLICANOS – ESDireitaEvangélicaIgreja do Evangelho QuadrangularMasculino
Nikolas FerreiraPL – MGDireitaCristãComunidade Evangélica Graça e PazMasculino
Pastor DinizUNIÃO – RRDireitaEvangélicaAssembleia de DeusMasculino
Pastor EuricoPL – PEDireitaEvangélicaAssembleia de DeusMasculino
Paulo Freire da CostaPL – SPDireitaEvangélicaAssembleia de Deus Ministério BelémMasculino
Rafael PezentiMDB – SCCentroCatólicaIgreja CatólicaMasculino
Rodolfo NogueiraPL – MSDireitaCristãNão identificadaMasculino
Rodrigo ValadaresUNIÃO – SEDireitaEvangélicaIgreja Evangélica não identificadaMasculino
Sargento FahurPSD – PRCentroNão identificadaNão identificadaMasculino
Sargento GonçalvesPL – RNDireitaCristãIgreja BatistaMasculino
Silvia WaiãpiPL – APDireitaEvangélicaIgreja Evangélica não identificadaFeminino
Simone MarquettoMDB – SPCentroCatólicaIgreja CatólicaFeminino
Sóstenes CavalcantePL – RJDireitaEvangélicaAssembleia de Deus Vitória em CristoMasculino
Zé TrovãoPL – SCDireitaNão identificadaNão identificadaMasculino
Fonte: Instituto de Estudos da Religião. Plataforma Religião e Poder (www.religiaoepoder.org.br)

O deputado líder do PL e a propagação de desinformação

Pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo e teólogo, Sóstenes Silva Cavalcante é deputado federal pelo Partido Liberal (PL) do Rio de Janeiro, eleito em 2022, em sua terceira filiação partidária. Assumiu seu primeiro mandato em 2015, filiado ao PSD e, em seguida, foi reeleito para um segundo, que se estendeu de 2019 a 2022, pelo DEM. Desde o primeiro mandato tornou-se conhecido como afilhado do pastor presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia.

Em 2015, Sóstenes Cavalcante foi eleito presidente da Comissão Especial, criada na Câmara para analisar o Projeto de Lei  6583/13, denominado Estatuto da Família. O PL havia sido proposto por Anderson Ferreira (PR-PE), arquivado com o fim da legislatura anterior, mas desarquivado pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).  O PL, que ainda tem tramitação aberta na Câmara, propõe uma lei que define   família como a união entre um homem e uma mulher.
Bereia já checou várias afirmações e publicações desinformativas de Sóstenes Cavalcante. No ano do lançamento do site Bereia, 2019, foi publicada matéria sobre a divulgação feita pelo deputado de uma declaração falsa atribuída à Organização Não Governamental (ONG) Greenpeace. Originalmente compartilhada pelo Pastor Silas Malafaia, a publicação acusava o Greenpeace de recusar ajuda na limpeza de óleo vazado em praias do Nordeste, por falta de conhecimento e equipamentos. No entanto, o vídeo compartilhado era uma edição deturpada de uma declaração do Greenpeace. 

Thiago Almeida, ativista da ONG, que desmentiu a distorção, confirmou que voluntários da organização estavam atuando na limpeza das praias afetadas, embora ressaltasse a necessidade de técnicas e equipamentos específicos para combater o óleo derramado. A versão editada do vídeo foi compartilhada pelo deputado e pelo Ministro do Meio Ambiente do governo de Jair Bolsonaro, Ricardo Salles, para criticar a Greenpeace, . Além disso, o portal Aos Fatos também classificou o vídeo como falso.

Imagem: Coletivo Bereia / Reprodução

Neste junho, cinco anos depois daquela e de outras 15 checagens, Bereia verificou mais um vídeo do deputado Sóstenes Cavalcante, com informações falsas  em resposta a uma reportagem do programa Fantástico, da TV Globo, que abordou o Projeto de Lei 1904/24. Na gravação, eleafirmou que existe uma “indústria mundial do aborto” financiada pelo milionário George Soros e proferiu mentiras sobre o uso de fetos em cosméticos. Estas afirmações foram desmentidas por veículos como a Folha de São Paulo e Aos Fatos, que as classificaram como teorias conspiratórias infundadas. 

Imagem: Coletivo Bereia / Reprodução

Parlamentares desinformam nas redes digitais

O PL 1904 gerou debates nos espaços do Congresso Nacional e também nas mídias sociais de parlamentares. Em levantamento realizado pelo Bereia em publicações no X (antigo Twitter), até a data de fechamento desta matéria, foi observado que os deputados Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF) e Nikolas Ferreira (PL-MG), todos coautores do PL publicaram em suas páginas pessoais comentários sobre o tema, com 29 publicações totais. O pico de atividade ocorreu entre os dias 11 e 13 de junho, que incluiu o momento da votação do pedido de urgência na Câmara, no dia 12.

Já foi destacado nesta matéria o vídeo publicado pelo deputado Sóstenes Cavalcante em que afirma que “Há uma indústria mundial liderada por (…) George Soros, um milionário americano que patrocina mundo afora o aborto (…) Sabe por quê? Porque eles vivem de empresas também que dependem do feto humano para fabricar cosméticos”. 

Fonte: Instagram / Reprodução: Aos Fatos

O deputado Eli Borges (PL-TO), autor do pedido de urgência e presidente da Frente Parlamentar Evangélica, argumentou que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a partir das 22 semanas de gestação, o aborto é considerado assassinato de criança porque o feto poderia sobreviver fora do útero da mãe. 

Bereia verificou que Borges apresenta um argumento falso, sem qualquer referencial, pois a OMS não define aborto como assassinato em nenhuma circunstancia, além de que não há consenso global de quantas semanas seriam necessárias para precisar a viabilidade fetal, ou seja, a capacidade de sobreviver fora do útero. 

Desinformação em portais cristãos

Portais de notícias gospel, como o Pleno News, Guiame e Gospel Prime, têm publicado uma série de matérias em defesa do Projeto de Lei (PL) 1.904/2024. O Pleno News, entre os dias 12 e 15 de junho, disponibilizou quatro matérias desinformativas, com notícias falsas ou que desviam do assunto principal. Nelas é afirmado que a esquerda está mentindo contra o PL, sem dados comprobatórios da assertiva, e que deputados que defendem o PL teriam sofrido ataques de hackers, o que também não tem elementos factuais. Também há destaque para declarações em ataque  ao presidente da República, que são desprovidas de caráter informativo – são opiniões. 

Imagem: Pleno News / Reprodução

O portal Guiame publicou matéria que contrapõe o apelido de “PLdo estupro” com “PL da vida”, e rebate as críticas à proposta, sem apurar as controvérsias como o risco dos abortos tardios e a criminalização de meninas e dos profissionais da saúde que realizam o procedimento. 

Imagem: Guiame / Reprodução

O Gospel Prime, em duas matérias publicadas como notícia, opina sobre autoridades do governo federal. As declarações públicas do presidente Lula (PT) sobre o PL 1904/24, foram classificadas como distorcidas do objetivo do projeto de “punir o assassinato de bebês em ventre materno após o período de formação da criança”. Esse tipo de afirmação desinforma pois é contrária às diretrizes da OMS sobre abortos e não há consenso na comunidade médica quanto ao período de formação de uma criança. 

O ministro dos Direitos Humanos e Cidadania Silvio Almeida, e a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima Marina Silva foram criticados pelo Gospel Prime por terem se manifestado contra o projeto em seus perfis de mídias digitais. Marina Silva foi destacada de forma pejorativa/opinativa como a  “que se apresentava como evangélica”.

Imagem: Gospel Prime/Reprodução

Bereia verificou que, como outros integrantes do governo federal, a ministra Marina Silva tornou pública uma crítica aos políticos proponentes do PL, de instrumentalizar um tema complexo, sem considerar os direitos e a dignidade das mulheres. Ela criticou o PL por ser “altamente desrespeitoso e desumano”, apesar de ela se declarar, pessoalmente, contra o aborto. Na mesma linha, o ministro Silvio Almeida afirmou que o Projeto de Lei é “vergonhosamente inconstitucional” e fere os princípios da dignidade humana. 

A linguagem que desinforma e confunde

Boa parte do conteúdo que tem falsidades e enganos sobre o tema do aborto, que circula em ambientes digitais, recorre ao discurso do medo para ganhar atenção e gerar compartilhamentos. De acordo com a Doutora em Linguística Jana Viscardi, a maneira como se fala sobre direitos reprodutivos e sobre aborto contribui significativamente para criar pânico em torno da questão. A pesquisadora destaca que “a extrema direita sabe muito bem usar apenas a palavra bebê, justamente para gerar indignação e pânico. Para convencer as pessoas de que aborto é desumano, homicídio”. 

Jana Viscardi alerta que é um erro chamar de “bebê” o objeto do aborto e que é importante usar os termos corretos. A professora explica que primeiro, há um embrião, depois, um feto; assim que nasce, um recém-nascido; 28 dias depois, é que existe um bebê. Nesse sentido, a mulher não aborta um bebê, pois um bebê, para existir, precisa ter passado pelas etapas anteriores, ter saído do útero e vivido seus primeiros dias. 

Viscardi também ressalta que “nenhuma mulher é mãe até que escolha ter uma criança. Gravidez não é sinônimo de maternidade. Embrião e feto são estágios que antecedem a existência do bebê. E não são a mesma coisa”. Para a pesquisadora, o uso do termo que não cabe “bebê” é feito para causar emoção e provocar pânico de morte.

Além disso, Viscardi chama a atenção para a questão da “viabilidade fetal” mencionada no PL 1904, sobre a qual não há uma conclusão definitiva e divergências entre médicos na compreensão da questão. 

O uso inadequado dos termos nas discussões públicas sobre aborto leva a uma comoção pública pautada “em um discurso torto, feito justamente para causar desinformação. O embate com a extrema-direita é também um embate discursivo, e ter atenção à linguagem utilizada é fundamental nesse contexto”, orienta Jane Viscardi.

***

Foto de capa: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

Afirmação do ministro Paulo Pimenta sobre deputada Bia Kicis usar falsidades como oposição procede

Ao participar da Audiência Pública da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, em 11 de junho, sobre as ações do governo federal no Rio Grande do Sul, o ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul Paulo Pimenta (PT-RS) usou boa parte do tempo desmentir conteúdo dos próprios deputados.

Durante a audiência, deputados de oposição criticaram o que consideram uso da Polícia Federal contra opositores ao governo federal. Eles se referiam ao pedido do ministro para que o órgão investigue o conteúdo falso sobre as enchentes no sul, fartamente propagado nas redes, como já checado pelo Bereia e outros projetos de checagem de conteúdo. Um dos discursos acusatórios foi proferido pela deputada católica Bia Kicis (PL-DF). Na resposta, o ministro lembrou do envolvimento da parlamentar na divulgação de notícia falsa em situação de tragédia. 

Imagem: reprodução/X

Pimenta recordou que postagens promovidas pela deputada, em 2013, afirmavam ser ele um dos proprietários da Boate Kiss, que pegou fogo naquele ano, e foi responsável pela morte de 242 pessoas. Na época em que a notícia foi divulgada, Kicis fazia parte do grupo da extrema direita política Revoltados Online, juntamente com Carla Zambelli (também de identidade católica, hoje deputada do PL-SP) e o empresário paulista Marcello Reis.

A resposta de Paulo Pimenta foi amplamente divulgada nas mídias sociais por meio de vídeo com trecho da transmissão da audiência gravada. Nele, o ministro relata que, as hoje deputadas, Bia Kicis e Carla Zambelli foram convocadas, à época, para prestar depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o incêndio na Boate Kiss. Ambas foram instadas a explicarem o conteúdo falso que propagaram a respeito do então deputado Paulo Pimenta (PT-RS) e que, segundo ele, foi uma tentativa deliberada de prejudicar a sua imagem. “Eu sei do que vocês são capazes!”, pronunciou o ministro.

Na resposta a Bia Kicis, Pimenta também conclamou os ouvintes a conferirem os anais da Câmara de Deputados sobre o caso que mostra antigo envolvimento de certo grupo de pessoas, hoje parlamentares, com a propagação de mentiras, mesmo em meio a uma tragédia. Bereia verificou.

Audiência em 2015

A oitiva, mencionada pelo ministro, refere-se a uma das que foram realizadas nos trabalhos da CPI que se dedicou a investigar crimes cibernéticos, entre os anos de 2015 e 2016. Bereia teve acesso ao vídeo da audiência na Câmara Federal, realizada em 27 de outubro de 2015. Dela, de fato, participaram Bia Kicis e Marcello Reis, com o objetivo de esclarecer sobre o conteúdo falso, divulgado pelo grupo Revoltados Online, do qual faziam parte à época.

Bereia também consultou os anais da oitiva, como mencionado pelo ministro Paulo Pimenta. A sessão aconteceu e nela estavam presentes, segundo os registros, além de Paulo Pimenta, Bia Kicis e Marcello Reis. Naquele evento, tanto a parlamentar quanto o empresário prestaram depoimento acerca de notícias falsas divulgadas sobre Paulo Pimenta, que atribuíam a ele propriedade da Boate Kiss e responsabilidade no incêndio criminoso. Os anais comprovam que tanto Bia Kicis quanto Carla Zambelli estiveram envolvidas na divulgação de notícias falsas sobre a tragédia da boate.

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Bereia classifica como verdadeira a resposta do ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul Paulo Pimenta à deputada federal católica Bia Kicis. A parlamentar, em audiência na Câmara Federal sobre a ação do governo federal, no socorro ao Rio Grande do Sul, o acusou de perseguição a opositores, por conta do pedido encaminhado à Polícia Federal de investigação da propagação de conteúdo falso em meio à tragédia. Bereia verificou que a resposta do ministro desqualifica a acusação e evidencia a falácia discursiva da deputada, uma vez que foi trazida à memória o histórico de Bia Kicis como disseminadora de falsidades e mentiras como estratégia política. Bereia já verificou uma série de materiais que corroboram este tipo de ação frequente da parlamentar, inclusive sobre a tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul.

Referências de checagem:

Bereia.

https://coletivobereia.com.br/a-desinformacao-de-religiosos-nas-enchentes-que-atingem-o-rio-grande-do-sul. Acesso em 17 jun 2024

https://coletivobereia.com.br/deputada-alinhada-a-extrema-direita-engana-ao-alegar-manipulacao-do-numero-de-mortes-pelas-enchentes-no-sul Acesso em 17 jun 2024

X. https://x.com/TucaAndrada3/status/1800637057213051144?t=oQdnKdnfTRxj-4J2TJwxdQ&s=19. Acesso em 17 jun 2024

YouTube. https://www.youtube.com/watch?si=bf9vzVdaLt4nrByQ&v=H5MjSJ4doQA&feature=youtu.be Acesso em 17 jun 2024

Câmara dos Deputados. https://www.camara.leg.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=11&nuSessao=2217/15&hrInicio=15:31&dtReuniao=27/10/2015&dtHorarioQuarto=15:31&dtHoraQuarto=15:31&Data=27/10/2015 Acesso em 17 jun 2024

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Foto de capa: reprodução do X


Deputada alinhada à extrema direita engana ao alegar manipulação do número de mortes pelas enchentes no Sul

A deputada federal e líder da minoria na Câmara Bia Kicis (PL/DF) levantou uma questão polêmica em sua conta pessoal no X (antigo Twitter) em 26 de maio, viralizada repercutido nas redes. A parlamentar  questionou se o governo estaria escondendo o número verdadeiro de mortes causadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul, por meio do compartilhamento de um vídeo com supostas graves denúncias. 
De acordo com o conteúdo do vídeo, o governo não estaria contabilizando corretamente o número de mortos na tragédia do Rio Grande do Sul, com o registro das mortes por afogamento como “indeterminadas” nas certidões de óbito. 

Na denúncia, há um trecho da TV Jovem Pan  e outro de vídeo anônimo. As denúncias mencionadas, caso fossem verdadeiras, seriam de extrema gravidade. Segundo as alegações, a esfera pública estaria mascarando o motivo das mortes relacionadas à catástrofe, a fim de não revelar a verdadeira proporção da mortalidade decorrente das enchentes. De acordo com números oficiais, foram contabilizadas 169 mortes, até o fechamento desta matéria, com outras 63 pessoas ainda desaparecidas.

Imagem: reprodução/X

Conteúdo do vídeo da deputada

Imagem: reprodução/Facebook

O vídeo compartilhado por Bia Kicis apresenta dois relatos para embasar a denúncia.

O primeiro é um trecho de uma entrevista do ornal 3 em 1, da TV Jovem Pan, veiculado em  14 de maio de 2024. O jornalista Bruno Pinheiro, que acompanhava a situação da cidade de Canoas, a maior da região metropolitana de Porto Alegre, largamente afetada pelas chuvas, com mais de 10 mil pessoas desalojadas, de acordo com o prefeito Jairo Jorge (PSD/RS). Este local ganhou destaque na imprensa nacional por conta de um cavalo ter ficado ilhado em um telhado 

No trecho em questão, retirado do programa ao vivo, foi veiculada a entrevista em que um homem de nome Alex (não é mencionado sobrenome na entrevista) afirma que resgatou o corpo do pai afogado e preso a fiações, mas que este teria brevemente desaparecido do IML. O homem afirma que para sua surpresa, a causa da morte consta na certidão como indeterminada. Os jornalistas e comentaristas do programa não teceram comentários em relação a isto, e restringiram-se reconhecimento  da tristeza e da terrível situação vivida pelo entrevistado. 

O segundo relato, originado de um vídeo amador, mostra um anônimo que afirma que sua irmã morreu devido às enchentes em Eldorado do Sul. Ele alega que, no IML de Porto Alegre, para onde o corpo teria sido levado, os servidores estariam impedindo os familiares de reconhecerem os corpos e obrigando-os a assinar um termo com a declaração da morte por causa indeterminada, e não por afogamento decorrente das chuvas. O homem menciona ainda que é o governo da capital gaúcha, liderado pelo prefeito Sebastião Melo (MDB/RS), que estaria adulterando os atestados de óbito e obrigando os familiares a atestarem que as causas das mortes foram indeterminadas.

Identificação de óbitos das enchentes Rio Grande do Sul

A identificação de vítimas após grandes desastres é uma atividade complexa. Primeiramente, por conta da quantidade de corpos que são resgatados, o que sobrecarrega os Institutos Médicos Legais (IML), responsáveis pela execução e produção de necropsias e laudos cadavéricos de cada Estado brasileiro.

Em segundo lugar, o estado de decomposição dos corpos influencia diretamente na velocidade e na forma de identificação. Após o falecimento, naturalmente, esse processo ocorre de forma muito rápida, porém, quando se trata de corpos que estavam submersos, cobertos de matéria orgânica por um grande período de tempo, o uso das digitais para verificar as informações pessoais da pessoa morta, método mais usado de identificação, torna-se cada vez mais difícil.

Dessa maneira, os peritos conseguem fazer um tratamento para melhorar a qualidade da impressão, processo que demora de dois a três dias. Caso ainda não seja possível, é necessário recorrer ao reconhecimento pela arcada dentária ou por exames de DNA. Porém, não são métodos infalíveis e há grande possibilidade de pessoas não serem identificadas.

Desde  6 de maio, um mutirão com todos os 120 servidores do estado que são médicos legistas  atua para suprir a demanda. No entanto, com a descida do nível das águas, a possibilidade de encontrarem mais corpos ainda é grande. Equipes dos estados do Paraná e de Santa Catarina foram enviadas para o Rio Grande do Sul para  ajudar.

Atuação do governo do Estado sobre a tragédia do Rio Grande do Sul

A Defesa Civil do Rio Grande do Sul, afirma que está atuando de forma eficaz para atender a população afetada e garantir a segurança de todos. Diariamente, pela manhã e ao final da tarde são divulgadas as ações de resgate e os últimos números da tragédia no estado. Até 28 de maio, 169 pessoas foram vítimas das enchentes, enquanto ainda há  ao menos, 53 desaparecidos, tendo sido mais de 77 mil pessoas resgatadas em 469 municípios afetados. 

Além disso, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado, mantém atualizações de hora em hora sobre o nível do Guaíba, lago localizado na região metropolitana de Porto Alegre, que alcançou níveis históricos no mês de maio. O governo do Estado do Rio Grande do Sul, em parceria com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e do Operador Nacional do Sistema (ONS), também está monitorando a situação das demais barragens gaúchas.

Bia Kicis e o compartilhamento de notícias falsas

Imagem: reprodução/X

Beatriz Kicis Torrents de Sordi (PL/DF) foi eleita deputada federal em 2019, ocupou os cargos de vice-líder do governo Jair Bolsonaro (PL) na Câmara, além de ter sido eleita presidente da Comissão de Constituição e Justiça também em 2019. Com identidade católica declarada, a deputada frequentemente se envolve em casos de compartilhamento de notícias falsas, tanto nas mídias digitais quanto em discursos públicos, como Bereia já checou em várias matérias. 

 Imagens: reprodução site Bereia

Desde 2020, Kicis está na lista dos parlamentares investigados no Inquérito n° 4781, mais conhecido como Inquérito das Fake News, no Superior Tribunal Federal (STF). Ela é  acusada de disseminação de notícias falsas ou/e distorcidas sobre a pandemia de covid-19, tendo apregoado contra medidas de isolamento social, atacou opositores do governo Bolsonaro e convocou seguidores para as manifestações antidemocráticas que ocorreram no auge da pandemia.  

Em outro episódio, Bia Kicis teve que se desculpar depois de afirmar, da tribuna da Câmara dos Deputados, que uma idosa, presa por ter participado dos ataques de 8 de janeiro de 2023, teria falecido nas dependências do presídio. A idosa não existia.

Hoje, Bia Kicis é a líder da Minoria da Câmara dos Deputados, e continua a fazer uso da máquina desinformativa para atacar opositores. Mais recentemente, a deputada católica afirmou, de forma mentirosa, que a cidade de Farroupilha (RS) foi retirada da lista de alvos de calamidades do governo federal após uma discussão entre o prefeito Fabiano Feltrin (PL) e o recém-empossado ministro da Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul Paulo Pimenta (PT) por telefone, divulgada por Feltrin.

Coincidências com a pandemia de Covid-19

A notícia de possíveis adulterações nas causas de óbitos da população durante uma grave crise, como as chuvas  de maio no Rio Grande do Sul, traz à tona lembranças recentes para os brasileiros. Isso porque, em 2021, em meio à pandemia de covid-19, o então presidente Jair Bolsonaro, também do PL, fez uma afirmação semelhante.

Na época, Bolsonaro alegou que um suposto relatório “paralelo” do Tribunal de Contas da União (TCU) indicava que cerca de 50% das mortes atribuídas à pandemia, em 2020  não foram causadas pela doença. No entanto, no mesmo dia, o TCU desmentiu a informação, e afirmou que o documento era falso. Apesar disso, a deputada Bia Kicis (PL/DF), então presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara, repostou o vídeo das declarações de Bolsonaro.

É importante ressaltar que essa notícia sobre a adulteração de dados da covid-19 era comprovadamente falsa, tendo sido desmentida por diversas instituições e órgãos. O próprio TCU negou a autenticidade do relatório mencionado por Bolsonaro, e os números oficiais das Secretarias de Saúde Estaduais, aferidos pelo Consórcio de Veículos de Imprensa, contradisseram a afirmação do ex-presidente. Além disso, investigações conduzidas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Pandemia e pelo Ministério Público Federal também comprovaram a falsidade da alegação. 

Imagem: reprodução/O Globo

Imagem: reprodução/Carta Capital

Imagens: reprodução/Veja

Bereia verificou que o vídeo compartilhado pela deputada católica Bia Kicis é enganoso pois distorce informações verdadeiras com o objetivo de afetar o governo federal e o ministro Paulo Pimenta. Os estados da federação são os entes que têm a atribuição e a gerência dos Institutos Médicos Legais. O governo do Estado do Rio Grande do Sul esclareceu em nota, que a causa da morte é determinada pelo médico legista no momento do exame e caso não haja evidências suficientes para atestar que a vítima, de fato, morreu de afogamento, a causa é indeterminada, até que os exames complementares requisitados sejam recebidos pelo IML.

Ou seja, por mais que seja verdadeira a informação compartilhada no vídeo, essa prática não é uma ação deliberada  do governo do Rio Grande do Sul para mascarar o número de óbitos decorrentes das enchentes. Está sendo obedecido um padrão para casos em que os médicos legistas necessitam de mais informações para aferir corretamente a causa mortis. Ademais, o governo federal não tem responsabilidade nesta ação, como deve ser de conhecimento de uma agente pública, como a parlamentar. Portanto, há indícios de que a deputada está, deliberadamente, propagando um engano.

Referências de checagem:

UOL. Temos 10 mil pessoas dormindo no chão, diz prefeito de Canoas (RS). UOL, 08 maio 2024. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/08/temos-10-mil-pessoas-dormindo-no-chao-diz-prefeito-de-canoas-rs.htm. Acesso em: 27 maio 2024.

PODER 360. Auditor do TCU diz que relatório sobre mortes por Covid foi alterado. Poder 360, [s.d.]. Disponível em: https://www.poder360.com.br/governo/auditor-do-tcu-diz-que-relatorio-sobre-mortes-por-covid-foi-alterado/. Acesso em: 27 maio 2024.

O GLOBO.

Teorias conspiratórias mobilizam bolsonarismo com explicações simplórias da realidade. O Globo, [s.d.]. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/teorias-conspiratorias-mobilizam-bolsonarismo-com-explicacoes-simplorias-da-realidade-1-25072853. Acesso em: 27 maio 2024.

Presidente da CCJ, deputada Bia Kicis é condenada a pagar R$ 418 mil por fake news contra Jean Wyllys. O Globo, [s.d.]. Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/sonar-a-escuta-das-redes/post/presidente-da-ccj-deputada-bia-kicis-e-condenada-pagar-r-418-mil-por-fake-news-contra-jean-wyllys.html. Acesso em: 28 maio 2024.

FORUM. Vídeo: Paulo Pimenta desmonta fake news de Bia Kicis: “mal intencionada”. Revista Fórum, 16 maio 2024. Disponível em: https://revistaforum.com.br/politica/2024/5/16/video-paulo-pimenta-desmonta-fake-news-de-bia-kicis-mal-intencionada-158952.html. Acesso em: 27 maio 2024.

AGÊNCIA BRASIL. Sobe para 83 número de mortes no Rio Grande do Sul pelas fortes chuvas. Agência Brasil, 28 maio 2024. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2024-05/sobe-para-83-numero-de-mortes-no-rio-grande-do-sul-pelas-fortes-chuvas. Acesso em: 28 maio 2024.

CARTA CAPITAL. A fábrica de fake news de Bia Kicis. Carta Capital, [s.d.]. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/politica/a-fabrica-de-fake-news-de-bia-kicis/. Acesso em: 28 maio 2024.

VEJA.

Por nova fake news, Bia Kicis tem conta bloqueada no YouTube. Veja, [s.d.]. Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/radar/por-nova-fake-news-bia-kicis-tem-conta-bloqueada-no-youtube. Acesso em: 28 maio 2024.

Bia Kicis volta a mentir, agora na tribuna da Câmara. Veja, [s.d.]. Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/maquiavel/bia-kicis-volta-a-mentir-agora-na-tribuna-da-camara. Acesso em: 28 maio 2024.

COLETIVO BEREIA.

https://coletivobereia.com.br/video-de-kicis-sobre-conferencia-em-ny-volta-a-circular-com-desinformacao/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-bia-kicis-usa-recorte-de-video-para-acusar-psol-de-agir-contra-mulheres-na-politica-a-direita/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-bia-kicis-classifica-parlamentar-da-alemanha-em-visita-ao-brasil-como-conservadora/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/a-deputada-bia-kicis-e-a-desinformacao-sobre-o-voto-impresso/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/publicacao-de-bia-kicis-com-relato-de-syllas-valadao-contem-informacoes-enganosas/. Disponível em 29 de maio de 2024.

https://coletivobereia.com.br/deputada-catolica-dissemina-enganos-sobre-uso-dos-lucros-extraordinarios-com-acoes-da-petrobras-pelo-governo/. Disponível em 29 de maio de 2024.

JOVEM PAN NEWS. Disponível em: https://www.facebook.com/watch/?v=1209648273745302. Acesso em: 28 maio 2024.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Deputada Bia Kicis. Câmara dos Deputados, [s.d.]. Disponível em: https://www.camara.leg.br/deputados/204374. Acesso em: 27 maio 2024.

DEFESA CIVIL RS. Defesa Civil atualiza balanço das enchentes no RS – 28/5 9h. Defesa Civil RS, 28 maio 2024. Disponível em: https://www.defesacivil.rs.gov.br/defesa-civil-atualiza-balanco-das-enchentes-no-rs-28-5-9h. Acesso em: 28 maio 2024.

YOUTUBE.

https://www.youtube.com/live/iuCq63qP_t4?si=4BQrkNj31Jn7yosH&t=4395. Acesso em: 27 maio 2024.

https://www.youtube.com/watch?v=mmIpwgW_jhQ. Acesso em: 28 maio 2024.

https://youtu.be/Ud_NGY9eUZk?si=2S04U-q4NWqSTj8U. Acesso em: 28 maio 2024.

GOVERNO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. É fake que o Posto Médico-Legal de Canoas está atestando que a causa da morte de vítimas das enchentes é indeterminada. Governo do Estado do Rio Grande do Sul, [s.d.]. Disponível em: https://estado.rs.gov.br/e-fake-que-o-posto-medico-legal-de-canoas-esta-atestando-que-a-causa-da-morte-de-vitimas-das-enchentes-e-indeterminada. Acesso em: 28 maio 2024.

UOL. Cada minuto importa: enchentes atrapalham identificação de vítimas no RS. UOL, 22 maio 2024. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/22/cada-minuto-importa-enchentes-atrapalham-identificacao-de-vitimas-no-rs.htm. Acesso em: 29 maio 2024.

METRÓPOLES. Peritos travam guerra contra o tempo na identificação dos corpos no RS. Metrópoles, [s.d.]. Disponível em: https://www.metropoles.com/brasil/peritos-travam-guerra-contra-o-tempo-na-identificacao-dos-corpos-no-rs. Acesso em: 29 maio 2024.

EBRADI. Instituto Médico Legal. EBRADI, [s.d.]. Disponível em: https://wp.ebradi.com.br/coluna-ebradi/instituto-medico-legal/. Acesso em: 24 maio 2024.

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Foto de capa: Flickr/Governo do Rio Grande do Sul

Deputada católica dissemina enganos sobre uso dos lucros extraordinários com ações da Petrobras pelo governo

Em uma publicação no Instagram,  a deputada federal Bia Kicis (PL-DF) repercutiu desinformação que circulou pelas mídias sociais, inclusive pela imprensa, na primeira quinzena de março, para fazer crer que a decisão do Conselho de Administração da Petrobras, para que lucros extraordinários com as ações da empresa fossem retidos para investimentos e pagos trimestralmente a acionistas privados, seriam do interesse pessoal do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT). 

Na postagem, a deputada da Bancada Católica na Câmara Federal, cita como fonte, matéria do site de notícias, de extrema-direita, Terra Brasil Notícias e uma publicação do próprio presidente da Petrobras Jean Paul Prates. Ela mostra imagem com reprodução visual da matéria e a legenda: “Por meio das redes sociais, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, rebateu questionamentos à administração da estatal brasileira em função da retenção de dividendos extraordinários promovida pelo Conselho de Administração da empresa pública. A decisão do colegiado da Petrobras, de acordo com Prates, foi orientada pelo ‘presidente da República e pelos seus auxiliares diretos’. A fala foi feita na quarta-feira (13).”

Imagem: reprodução do Instagram

Imagem: reprodução do site Terra Notícias

A grande imprensa também repercutiu o tema, com tom negativo:

Imagem: reprodução dos sites G1 e Terra

Como funciona a distribuição de dividendos aos acionistas da Petrobras?

Bereia verificou que a Petrobras anunciou a sua nova política de distribuição de dividendos extraordinários (parcela dos lucros extras que é distribuída a acionistas minoritários – privados – , uma vez que a União é acionista majoritária da empresa estatal), definida em reunião do Conselho de Administração da companhia, em fevereiro passado

A partir daquela data da reunião, o pagamento dos lucros extras passa por reserva e adiamento: acionistas minoritários serão remunerados em 45% do “fluxo de caixa livre” (dinheiro à disposição da empresa), ao invés dos 60% definidos na gestão do governo anterior. Os valores retidos, segundo a decisão, passariam a ser utilizados em novos investimentos para fortalecimento da empresa e os liberados serão pagos por trimestre.

O Conselho da Petrobras assim informou sobre a decisão:

O fluxo de caixa livre representa o valor que sobra no caixa após os investimentos. A nova política também ampliou a definição de investimentos para incluir a recompra de ações, quando a própria companhia adquire suas ações.

As circunstâncias em que a estatal distribuirá dividendos também mudaram. O Conselho de Administração estabeleceu a remuneração mínima de US$ 4 bilhões por ano para exercícios em que o preço médio do barril de petróleo tipo Brent for superior a US$ 40 por barril.

A distribuição de 45% do fluxo de caixa livre só será aplicada quando a dívida bruta da Petrobras for igual ou inferior ao nível máximo de endividamento definido no Plano Estratégico 2024–2028 e quando a companhia obtiver lucro em um trimestre. Os dividendos serão, portanto, pagos a cada três meses. 

No documento publicado pela Petrobras, ficou estabelecido que as novas regras da remuneração aos acionistas foram aperfeiçoadas para manter “o objetivo de promover a previsibilidade do fluxo de pagamentos de proventos aos acionistas, ao mesmo tempo em que garante a perenidade e a sustentabilidade financeira de curto, médio e longo prazos”. 

Já em relação à recompra de ações, a empresa informou que segue a prática das principais companhias petroleiras internacionais, “em complemento ao pagamento de dividendos”. As mudanças na política de dividendos e de recompra de ações haviam sido pedidas pelo Conselho de Administração em maio de 2023.

Matéria da Agência Brasil detalha o que são os dividendos, como era a política anterior e a decisão sobre a nova política. Sobre a situação anterior, o texto afirma:

A Petrobras foi a petroleira que mais pagou dividendos aos acionistas em 2023 quando comparado com outras cinco grandes companhias do setor: Chevron, BP, Total, Shell e Exxon Mobil, segundo levantamento da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET). Enquanto a Petrobras pagou US$ 20,28 bilhões, a 2ª colocada, que foi a Exxon, pagou U$S 14,95 bilhões em dividendos.

“Em 2023, a Petrobras, apesar de ter a menor receita entre as seis empresas, pagou o maior montante em dividendos. Além disso, foi a petrolífera que realizou o menor investimento líquido”, afirmou o presidente da AEPET, Felipe Coutinho.

Ouvido pela Agência Pública, o economista do Observatório Social do Petróleo, Eric Gil Dantas, explica:

Em 2023, a Petrobras investiu US$ 12,7 bilhões, um crescimento de 29% em relação ao ano anterior. Apesar do aumento nos investimentos, o economista do Observatório Social do Petróleo , Eric Gil Dantas, avaliou que eles ainda são baixos de considerados os planos da companhia. “Não faltam projetos que estão sendo tocados, são refinarias, eólicas, novas fronteiras exploratórias, novos produtos ligados à transição energética. Se a Petrobras não controlar o pagamento dos seus dividendos, ela terá que se endividar para fazer esses investimentos”, avaliou o economista.

A decisão sobre a nova forma de pagamento dos dividendos, provocou reações negativas de grandes acionistas e das empresas de jornalismo, que a classificaram como “intervenção do governo na Petrobras”. As posturas geraram especulações e desinformação, como a produzida pelo site Terra Notícias, e queda drástica no valor das ações da empresa na Bolsa de Valores.

Imagem: reprodução do YouTube

Imagem: reprodução do UOL

Imagem: reprodução da Folha de São Paulo

Imagem: reprodução do YouTube

 Imagem: reprodução d’O Globo

O que disse o presidente da Petrobrás, citado por Bia Kicis

O presidente da Petrobras Jean Paul Prates publicou na rede digital X,  uma reação a este clima em torno da decisão sobre os lucros da empresa: “O mercado ficou nervoso esperando dividendos sobre cuja decisão foi meramente de adiamento e reserva”. Ele afirma que “falar em ‘intervenção na Petrobras’ é querer criar dissidências, especulação e desinformação”. E explicou que “é preciso compreender que a Petrobras é uma corporação de capital misto, controlada pelo Estado Brasileiro, e que este controle é exercido legitimamente pela maioria do seu Conselho de Administração”.

Prates critica explicações que tentam apontar o governo federal como interventor na decisão sobre os dividendos extraordinários da Petrobras: “É o exercício soberano dos representantes do controle da empresa. É legítimo que o CA [Conselho da Administração] se posicione orientado pelo Presidente da República e pelos seus auxiliares diretos que são os ministros. Foi exatamente isso o que ocorreu…”.

No X, Jean Paul Prates disse ainda:

“Somente quem não compreende (ou propositalmente não quer compreender) a natureza, os objetivos e o funcionamento de uma companhia aberta de capital misto com controle estatal pode pretender ver nisso uma intervenção indevida.

Vamos voltar à razão e trabalhar para executar, eficaz e eficientemente, o Plano de Investimentos de meio trilhão de reais que temos pelos próximos cinco anos à frente, gerar empregos, renda, pesquisa, impostos e também lucro e dividendos compatíveis com os nossos resultados e ambições”.

Imagem: reprodução do X

O que diz o presidente Lula

 Em entrevista ao programa de TV SBT Brasil, em 11 de março passado, o  presidente Lula respondeu à questão do apresentador César Filho: .

– […] A Petrobras, presidente, na semana passada, perdeu no valor de mercado mais de R$ 50 bilhões. Isso porque não quis repassar dinheiro para os sócios. Existiu uma intervenção do governo nisso ou não?

Em resposta, o presidente afirmou:

– […] nós tivemos uma conversa séria aqui com o governo, com a direção da Petrobras, porque a gente acha que é importante a gente pensar na Petrobras, é preciso a gente pensar nos acionistas, mas é preciso a gente pensar no povo brasileiro. E eu tenho um compromisso, é importante, eu não esqueço. Eu tenho um compromisso com o povo brasileiro que é de reduzir o preço do combustível, o preço da gasolina, o preço do gás de cozinha e o preço do óleo diesel. A gente não tem por que ter um preço equiparado a preço internacional, porque nós somos autossuficientes na prospecção de petróleo.

Então, essa discussão tem que ser feita. Se eu for atender apenas a choradeira do mercado, você não faz nada. Porque o mercado, vou contar uma coisa para vocês, o mercado é um rinoceronte, um dinossauro voraz. Ele quer tudo para ele e nada para o povo. Será que o mercado não tem pena das pessoas que passam fome? […] Olha, então vamos pensar no mercado e vamos pensar na sociedade. Sabe, cada um tem a sua parte, mas é importante que a gente saiba que a minha preocupação é fazer com que o povo mais pobre, os mais humildes, sabe, possam ter uma chance, uma oportunidade de crescer nesse país.

Lula ainda destacou: 

“Às vezes, eu vejo a notícia assim: ‘Petrobras cresce 30%. Petrobras bateu o recorde de produção de gasolina. Petrobras bateu o recorde de exportação de petróleo. Petrobras bateu o recorde de arrecadação.’ E a gente não ganha nada com isso. Então, quando a pessoa vive de especulação na bolsa, você pode crescer 30% num dia, cair 20% num outro, e fica tudo por isso mesmo. Então, o que eu acho é que a Petrobras, que é uma empresa em que o governo tem ascendência sobre ela, é importante ter em conta o seguinte: a Petrobras não é apenas uma empresa de pensar nos acionistas que investem nela, porque a Petrobras tem que pensar no investimento e pensar em 200 milhões de brasileiros que são donos dessa empresa ou são sócios dessa empresa. O que não é correto é a Petrobras, que tinha que distribuir R$ 45 bilhões de dividendos, queria distribuir R$ 80 bilhões. E 40 bilhões a mais que poderia ter sido colocado para investimento, para fazer mais pesquisa, para fazer mais navio, para fazer mais onda, não foi feito.[…]  A gente não tem por que ter um preço equiparado a preço internacional, porque nós somos autossuficientes na prospecção de petróleo. Então, essa discussão tem que ser feita.”

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Após a apuração, Bereia considera enganosa a publicação da deputada católica Bia Kics (PL-SC), sobre a decisão da Petrobras sobre nova forma de pagamento dos lucros extraordinários a acionistas. Embora seja verdadeira a informação de que o Conselho de Administração da Petrobras tenha mudado a política de distribuição de lucros  pagos aos acionistas, sob a orientação do governo federal, com retenção e pagamento por trimestre,a publicação não oferece o contexto e distorce as informações para fazer crer que há interesse pessoal do presidente Lula no caso. 

Com o intenção de colocar sob suspeita o governo federal e na atual gestão da Petrobras a postagem da deputada do (PL-SC), em associação com a matéria publicada no site Terra Brasil Notícias, dissemina informação enganosa. Bia Kicis desinforma  sobre o direito da acionista majoritária da empresa estatal,, que é a União, sobre a indicação das políticas de investimentos e distribuição de dividendos da petroleira brasileira ao Conselho de Administração da empresa. Com isso, tenta influenciar seus leitores a crerem que existe má gestão da atual administração e ingerência indevida do governo federal na Petrobras. 

Referências de checagem:

CNN BRASIL. https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/raquel-landim/economia/prates-admite-que-orientacao-de-reter-os-dividendos-da-petrobras-foi-de-lula/?fbclid=IwAR0Z_PpRbgLXPCrJn8f3OxyjIrwjpKXxPcb7Cdn7VFOSEdrj1RWKFowrs74. Acesso em 20 mar 2024

EXAME. https://exame.com/economia/prates-afirma-que-conselho-da-petrobras-seguiu-orientacao-de-lula-e-que-isso-e-legitimo/. Acesso em 19 mar 2024

AGÊNCIA BRASIL.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2023-07/petrobras-muda-politica-de-dividendos-e-reduz-ganho-de-acionistas. Acesso em 22 mar 2024

https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2023-07/petrobras-muda-politica-de-dividendos-e-reduz-ganho-de-acionistas. Acesso em 22 mar 2024

https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2024-03/entenda-disputa-por-dividendos-da-petrobras-que-derrubou-acoes. Acesso em 22 mar 2024

GOV.BR- Presidência da República. https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/entrevistas/entrevista-do-presidente-da-republica-luiz-inacio-lula-da-silva-ao-sbt?fbclid=IwAR3s7gSvr3qNPsJvL3R8ui64cdXIUHpeK5Clq_xRrihh0og_W0BcmTzWIY0. Acesso em 19 mar 2024

X – Jean Paul Prates. https://twitter.com/jeanpaulprates/status/1768059392488841524?t=ZdfqrTe5145CTi-YnRPmRA&s=08&fbclid=IwAR0Yup9bBWCI6dxQUrbWyg68fHGcdR4gHPjU7SvSu0xPNUYcobRFk4dD2LY. Acesso em 19 mar 2024

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Foto de capa: Câmara dos Deputados

Deputada católica repercute afirmação do Papa sobre “ideologia de gênero” ameaçar a humanidade

Circula em espaços religiosos digitais publicação da deputada católica Bia Kicis, em seus perfis de mídias sociais, em que divulga uma fala do Papa Francisco. O conteúdo reforça a campanha de grupos católicos e evangélicos ultraconservadores e de políticos e apoiadores da extrema direita contra a chamada “ideologia de gênero”.

Fonte: X (antigo Twitter) deputada federal Bia Kicis

O que o Papa falou sobre o tema?

O discurso do Papa Francisco foi dirigido em audiência especial com os participantes da  conferência, realizada no Vaticano, nos dias 1º e 2 de março, intitulada “Homem-Mulher: imagem de Deus, para uma antropologia das vocações”, promovida pelo Centro de Pesquisa e Antropologia das Vocações. Já no início do discurso proferido, que foi lido pelo seu colaborador monsenhor Ciampanelli, dado o pontífice estar resfriado, os participantes foram chamados a atenção para os riscos associados à “ideologia de gênero”, argumentando que ela pode apagar as diferenças fundamentais entre homens e mulheres, que são essenciais para a humanidade.  

… gostaria de realçar algo: é muito importante que se realize este encontro, um encontro entre homens e mulheres, porque hoje o perigo mais horrível é a ideologia do género , que anula as diferenças. Pedi que se façam estudos sobre esta ideologia horrível do nosso tempo, que anula as diferenças nivelando tudo; anular a diferença significa anular a humanidade. O homem e a mulher, ao contrário, vivem em fecunda “tensão”. 

Em plateia formada por religiosos e religiosas católicos, Francisco afirmou:

O objetivo desta Conferência é, em primeiro lugar, considerar e valorizar a dimensão antropológica  de cada vocação. Isto remete-nos para uma verdade elementar e fundamental, que hoje precisamos redescobrir em toda a sua beleza: a vida do ser humano é vocação . Não esqueçamos: a dimensão antropológica, que está na base de cada chamada no âmbito da comunidade, tem a ver com uma caraterística essencial do ser humano como tal: ou seja, que o próprio homem é vocação.

No Brasil, políticos conservadores têm divulgado essa fala do Papa como reforço às críticas à chamada “ideologia de gênero”. O termo surgiu surgiu no ambiente da Igreja Católica como reação aos avanços, inicialmente dos movimentos feministas, depois, da pauta LGBTQ+, explicitados no reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos e no casamento igualitário.

Ideologia de gênero: o Vaticano reage aos avanços de pautas feministas

De acordo com com o teólogo, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa Marcio Ornat, a expressão “ideologia de gênero” começou a ser mencionada nos anos 90, especialmente em textos da Igreja Católica que questionavam a ênfase do conceito de“gênero”pela Organização das Nações Unidas (ONU). 

A introdução do conceito de gênero nas Conferências Internacionais da ONU  sobre Mulheres, em Pequim, e sobre População e Desenvolvimento, no Cairo, ambas ocorridas na década de 1990, representou um marco significativo na luta contra a desigualdade  entre homens e mulheres, por meio da adoção do conceito de “gênero”. 

O conceito de gênero emergiu no interior das políticas feministas, nos anos 1970. Pesquisadoras da temática articularam diferentes vertentes teóricas e ativismos, que questionaram a vinculação do caráter biológico ao destino social das mulheres, questionando os essencialismos persistentes na vida social. Gênero, nesse contexto, surge como um termo que se contrapõe ao sexo biológico e considera que as desigualdades na distribuição do poder corroboram para a manutenção de preconceitos, opressões e discriminações. 

Contudo, a adoção do conceito nas conferências da ONU não foi recebida de maneira consensual, provocando divergências evidenciadas pelas objeções formalizadas por delegações de diversos países. Em particular, a Santa Sé destacou-se nesse cenário, posicionando-se contrariamente aos direitos sexuais e reprodutivos femininos, e expressando uma oposição enfática ao conceito de gênero proposto nas conferências da ONU, marcando um episódio notável de tensão em debates globais sobre direitos e igualdade de gênero.Com a expansão das discussões sobre a temática de gênero, estas pautas passaram a ser classificadas como ideológicas e contrárias às famílias, uma vez que questionavam a formação familiar nuclear tradicional.

A discussão sobre o termo ganhou destaque na Europa, sobretudo após a publicação do “Lexicon” – Léxico dos termos ambíguos e controversos sobre a vida, a família e as questões éticas, pelo Pontifício Conselho da Família, em 2003, uma obra encomendada pelo Vaticano que aborda gênero, sexualidade e bioética, e ajudou a disseminar o termo na política de vários países, incluindo o Brasil.

“Inicialmente conduzido por representantes do Vaticano, tais críticas ao conceito de gênero entraram na esfera pública por meio de textos escritos pelo então Arcebispo Joseph Ratzinger, futuro Papa Bento XVI, a partir de 1997. Nos textos, o cardeal acusa a ‘cultura moderna’ de promover ideologias que se distanciavam dos preceitos cristãos da família nuclear e seus pressupostos, sustentados na reprodução dos ideais de boa esposa e mãe virtuosa.”

Como Bereia já checou em várias matérias, desde seu surgimento, a expressão “ideologia de gênero” carrega um sentido pejorativo. Por meio dela, setores mais conservadores da sociedade protestam contra atividades que buscam falar sobre a questão de gênero e assuntos relacionados, como sexualidade nas escolas. As pessoas que concordam com o sentido negativo empregado no termo “ideologia de gênero” geralmente temem que, ao falar sobre as questões mencionadas, a escola vá contra os valores da família.

A expressão “ideologia de gênero” não é admitida no mundo acadêmico. Nas universidades, apenas o termo teoria de gênero é reconhecido, e estabelece que gênero e orientação sexual são construções sociais e não apenas determinações biológicas. 

Já para segmentos da extrema-direita, a “ideologia de gênero” é um ataque ao conceito tradicional de família.

Como afirmou a pesquisadora Valéria Vilhena, ouvida pelo Bereia, em 2020:
Essa narrativa foi construída para se opor aos direitos da mulher e da população LGBT. Eles constroem esse discurso para mais uma vez se posicionarem e reforçarem a negação da dignidade humana. Essa é a questão. Porque não existe uma “ideologia de gênero” – algo que se referem como uma “crença”, uma crença que se impõe para destruir a família. 

Na verdade, não existe e nunca existiu uma ideologia de gênero. O que há é a construção de uma narrativa se utilizando do conceito “gênero” que vem dos estudos de gênero, mas que não tem nada a ver com o que dizem. É muito interessante como eles constroem algo em cima do inexistente. 

“Ideologia de gênero” no Brasil 

No Brasil, o termo ganhou notoriedade em  2014, durante os debates no Congresso Nacional para aprovação do Plano Nacional de Educação (PNE). O   texto   do   relator,   deputado   Angelo Vanhoni (PT-SC) propunha estimular “a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da  igualdade  racial,  regional,  de  gênero  e  de  orientação  sexual”. Contudo, encontrou forte resistência de grupos conservadores e religiosos, resultando na retirada desses termos do plano após intensos protestos. 

Fonte: Boitempo

Desde então, a expressão “ideologia de gênero” tem sido usada frequentemente em discursos políticos, principalmente por representantes da direita ultraconservadora, como uma crítica a políticas de igualdade de gênero e direitos LGBTQIAP+. 

A discussão em torno do termo tem sido marcada por controvérsias, acusações de tentativa de imposição de uma visão específica sobre gênero e sexualidade, enquanto defensores argumentam que a educação e discussões sobre gênero são cruciais para combater desigualdades e promover o respeito à diversidade.

Esta trajetória complexa do termo “ideologia de gênero” ilustra a polarização em torno de questões de gênero e sexualidade na sociedade contemporânea, mostrando como conceitos acadêmicos e políticas públicas podem ser interpretados e utilizados de maneira diversa, dependendo dos contextos políticos e sociais.

Papa Francisco e a “ideologia de gênero”

Visto como progressista por muitas de suas posturas em diversos assuntos de interesse público, incluindo a acolhida à comunidade LGBTQIAP+, no entanto, as posições do Papa Francisco em relação às pautas que envolvem a temática de gênero de forma mais ampla não fogem do que o Vaticano estabeleceu com Bento XVI. 

Em diferentes ocasiões, o Papa Francisco denominou a “ideologia de gênero” de “colonização ideológica”, uma “expressão de frustração e resignação”, uma “guerra ao casamento”. Dessa forma, Francisco reafirma o tom pejorativo relacionando gênero a uma “ideologia”, associando-o ao pânico moral: “um perigo para as famílias”.

Meses antes da conferência de março com religiosos e religiosas, em janeiro de 2024, no dia da audiência do Papa com o Corpo Diplomático credenciado junto ao Vaticano, Francisco declarou: “a teoria de gênero é perigosíssima, apaga as diferenças”. Em reportagem do jornal La Stampa, Domenico Agasso, reproduzida pelo IHU-On Line, é avaliado: “Depois de um outono de aberturas ‘progressistas’, em particular para o mundo LGBTQIAPN+, o Pontífice intervém em temas éticos com a firmeza pregada pelos conservadores”. 

Conclusão

Bereia avalia a  publicação da deputada federal Bia Kicis como verdadeira. O conteúdo veiculado pela deputada corresponde à fala do Papa Francisco em conferência realizada no Vaticano, com religiosos e religiosas, neste mês de março. Apesar de o Pontífice manifestar posições progressistas em muitos temas de interesse público, e apregoar o acolhimento da igreja à comunidade LGBTQIA+ e a mulheres, o tratamento que oferece às pautas de gênero seguem o padrão dos conservadorismos político-religiosos, checados por Bereia em outras matérias: negação da abordagem científica da temática de gênero, atribuindo-a a qualificação pejorativa de “ideologia” e uso do pânico moral para convencer.

Referências de checagem:

Vatican News https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2024-03/papa-francisco-ideologia-genero-homem-mulher-antropologia-perigo.html Acesso em 04 MAR 2024 

https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20160319_amoris-laetitia.html Acesso em 04 MAR 2024

Vaticano
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2024/march/documents/20240301-convegno-uomo-donna.html 

Coletivo Bereia

https://coletivobereia.com.br/e-falso-que-papa-francisco-segura-bandeira-gay-em-foto/ Acesso em 04 MAR 2024

https://coletivobereia.com.br/igreja-catolica-permite-que-transexuais-sejam-batizados-e-apadrinhem/ Acesso em 04 MAR 2024

https://coletivobereia.com.br/ideologia-de-genero-estrategia-discursiva-e-arma-politica/ Acesso em 04 MAR 2024

https://coletivobereia.com.br/candidato-extremista-nas-eleicoes-argentinas-javier-milei-usa-falsidades-contra-o-papa-francisco-em-campanha/ Acesso em 04 MAR 2024

Instituto de Estudos da Religião

https://iser.org.br/wp-content/uploads/2023/10/Dicionario-para-entender-o-campo-religioso-Volume-1.pdf Acesso em 04 MAR 2024

BBC News Brasil

https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/07/130729_papa_gays_entrevista_jp Acesso em 04 MAR 2024

IHU-On line https://ihu.unisinos.br/633393-papa-francisco-se-reune-com-grupo-lgbt-dos-eua-anteriormente-denunciado-pelo-vaticano Acesso em 04 MAR 2024

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/637023-francisco-pedi-para-realizar-estudos-sobre-a-ideologia-de-genero-o-perigo-mais-feio-hoje Acesso em 07 MAR 2024

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/635842-a-teoria-do-genero-e-perigosa-nao-a-substituicao-afirma-papa-francisco#:~:text=%E2%80%9CA%20teoria%20do%20g%C3%AAnero%20%C3%A9,Francisco%20%2D%20Instituto%20Humanitas%20Unisinos%20%2D%20IHU, Acesso em 11 mar 2024

Artigo. Lilian Sales (lilian.sales@unifesp.br). professora Adjunta de Antropologia na Universidade Federal de São Paulo. Mestre e Doutora em Antropologia Social pela USP. https://www.scielo.br/j/ref/a/TvyfD5SHWcmwjHWk5VGYpgH/ Acesso em 04 MAR 2024

DUARTE DE SOUZA, S. O gênero da discórdia. A Igreja Católica e a campanha contra os direitos das mulheres na política internacional: uma abordagem a partir das conferências do Cairo e de Pequim. Religare: Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências das Religiões da UFPB, [S. l.], v. 15, n. 2, p. 483–504, 2019. DOI: 10.22478/ufpb.1982-6605.2018v15n2.42234. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/religare/article/view/42234. Acesso em: 5 mar. 2024.

ROSADO-NUNES, M. J. F. A “ideologia de gênero” na discussão do PNE. A intervenção da hierarquia católica. HORIZONTE – Revista de Estudos de Teologia e Ciências da Religião, v. 13, n. 39, p. 1237-1260, 30 set. 2015.Disponível em: https://periodicos.pucminas.br/index.php/horizonte/article/view/9499  Acesso em: 5 mar. 2024.

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Foto de capa: Prensa Total/Flickr

Católicos ofereceram missa por Israel em Nova York

Um vídeo que registra uma procissão pelas ruas da cidade de Nova York (EUA) foi compartilhado pela deputada federal católica Bia Kicis (PL-DF) em seu perfil no Instagram. Na legenda, ela fez a seguinte afirmação: “5.000 católicos acabaram de oferecer missa por Israel e depois lideraram uma enorme procissão eucarística que se estendeu por blocos no coração da cidade de Nova York. Deixando os espectadores em prantos no meio da Times Square. Deus está agindo”.

A deputada federal Bia Kicis é conhecida pela defesa das pautas da extrema-direita no Congresso Nacional e é muito ativa nas redes sociais digitais. Seu perfil no Instagram tem 1,7 milhões de seguidores.

Bereia checou o vídeo da procissão e as informações publicadas pela deputada.

Missa e procissão em Nova York

No último 10 de outubro, o Instituto Napa, uma organização que prepara líderes católicos para promover e defender a fé católica na sociedade, sediada nos Estados Unidos, promoveu a “Conferência de Empreendedorismo de Princípios”, que reuniu padres, freiras e leigos na cidade de Nova York.

O evento foi aberto com uma missa e uma procissão eucarísticas, que reuniram cerca de cinco mil católicos. A missa foi celebrada pelo diretor dos Ministérios de Jovens e Jovens Adultos do Instituto Napa, padre Mike Schmitz, lotado na Diocese de Duluth, (Minnesota), um orador renomado.

Mídias católicas nos EUA reportaram a conferência, e relataram que o padre Schmitz declarou oferecer a missa “pela paz em Israel após o ataque do Hamas, que custou a vida a pelo menos 1.200 pessoas”. “Ore por Israel agora mesmo”, disse ele durante o evento. “Esta missa está sendo oferecida pela paz em Israel”.

A partir da verificação dos fatos em torno do vídeo compartilhado pela deputada federal Bia Kicis, Bereia avalia que a publicação da parlamentar é verdadeira.

 Conteúdos publicados e compartilhados por líderes e políticos evangélicos em defesa do Estado de Israel têm circulando por diversos grupos de mensagens desde o início do conflito bélico após ataque do braço armado do partido palestino Hamas ao território  israelense, com vítimas fatais, em 7 de outubro passado.  Os registros da missa e da procissão realizadas durante evento do Instituto (Católico) Napa, nos EUA, em 10 de outubro passado, tornaram-se fontes de suporte.

Referências de checagem:

Napa Institute. https://napa-institute.org/eucharistic-revival-resources/ Acesso em 16 OUT 23

X. https://twitter.com/NapaInstitute/status/1712458477518356874 Acesso em 16 OUT 23

Plataforma de notícias digitais da Arquidiocese de Nova York. https://thegoodnewsroom.org/four-thousand-take-part-in-nyc-eucharistic-procession/ Acesso em 16 OUT 23

Mashable. https://mashable.com/article/instagram-shadowbanning-censor-israel-palestine?utm_source=email&utm_campaign=breakingnews&cmp=1&utm_medium=newsletter Acesso em 16 OUT 23

Boatos.org. https://www.boatos.org/religiao/procissao-catolicos-times-square-nova-york-apoio-israel-guerra.html Acesso em 16 OUT 23

UOL. https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2023/10/10/manifestacao-em-nova-york-reune-milhares-de-pessoas-em-apoio-a-israel.htm Acesso em 16 OUT 23

Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2023-10/milhares-de-pessoas-se-manifestam-pela-causa-palestina-em-nova-york Acesso em 16 OUT 23

Brasil de Fato. https://www.brasildefato.com.br/2023/10/13/em-nova-york-times-square-e-tomada-por-milhares-de-manifestantes-pro-palestina Acesso em 16 OUT 23

Comunidade Católica Shalom. https://comshalom.org/procissao-eucaristica-passara-pelas-ruas-de-nova-york-no-proximo-mes/ Acesso em 16 OUT 23

Church Pop.

https://www.churchpop.com/father-mike-schmitz-offers-mass-for-israel-in-nyc-before-eucharistic-procession/ Acesso em 17 OUT 2023

https://pt.churchpop.com/jesus-eucaristico-atrai-milhares-de-fieis-na-times-square-nova-iorque/ Acesso em 17 OUT 2023

BBC. https://www.bbc.com/portuguese/articles/clkjxpvjxjgo.amp Acesso em 17 OUT 2023

Deputada Bia Kicis usa recorte de vídeo para acusar PSOL de agir contra mulheres na política à direita

Um vídeo da deputada federal católica Bia Kicis (PL-DF)  viralizou em espaços digitais de religiosos. Trata-se de um recorte de fala da deputada, em reunião realizada na Câmara dos Deputados, uma sessão da Comissão Especial para votação do parecer do relator da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 9/23 , conhecida como PEC da Anistia. 

O texto, apresentado pelos deputados Paulo Magalhães (PSD-BA) e Hugo Motta (Republicanos-PB), prevê a anistia aos partidos políticos que não repassaram os percentuais mínimos de destinação de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha para as candidatas mulheres nas eleições do ano passado. A PEC propõe que esses partidos não serão multados e que o descumprimento da legislação não implique na perda do mandato de candidatos eleitos ou acarretar inelegibilidade.

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Imagem: reprodução do Instagram

O que Bereia verificou 

Logo após uma intervenção da deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), no trecho 19’40”, Bia Kicis diz: “Me espanta ver uma deputada que diz que defende as mulheres, que é um partido que defende tanto as mulheres, mas que na verdade não consegue cumprir […]  a gente tem que entender o objetivo da Lei, o escopo da Lei, o escopo da lei da cota feminina […]  é botar mulher na política[…]  Aí o que aconteceu no Ceará? Mulheres foram eleitas com seus próprios votos, pessoas saíram de casa […] . Depois que elas já estão diplomadas exercendo seus mandatos vem uma decisão com base na lei que é pra colocar mulher e diz o seguinte: Não, como teve outras mulheres que parece que foram laranjas – a gente não sabe se foram, né – mas parece que foram laranjas, que não se elegeram, não se elegeram, olha só, então nós vamos retirar aquelas que foram eleitas e vamos colocar homens no lugar delas. Gente, isso não faz o menor sentido […] então, tô assistindo aqui uma deputada do PSOL, brigando pra, em nome da defesa da cota feminina, tirar mulheres que foram eleitas […] é o cúmulo! É cúmulo! Isso desafia a lógica você querer com base num argumento de que não foi cumprida a cota feminina que, por isso, você vai retirar as mulheres que foram eleitas com seus próprios votos…”.

Os fatos e a fala da deputada do PSOL Fernanda Melchionna (RS)

No trecho da transmissão da sessão da comissão (16’30” em diante), a deputada Fernanda Melchionna, que falou antes da deputada Kicis, denunciou o desvirtuamento trazido pela PEC 09/23, concernente às políticas afirmativas de inserção das mulheres na política, em razão da cota de gênero, estabelecida em Lei. 

Nas palavras críticas de Melchionna à PEC, foi dito: “nós pedimos a votação nominal como parte dos requerimentos de obstrução diante da PEC da vergonha, da PEC da autoanistia que, infelizmente, tramita nesta casa.” 

A deputada do PSOL, citou as ações movidas contra o Partido Liberal (PL), no Tribunal Regional Eleitoral do Ceará, sobre denúncias de “candidaturas laranjas” nas eleições de 2022 (prática ilegal, comum em eleições, de lançamento de candidatos sem o objetivo de ocupar vagas eletivas, mas  para preencher cotas ou para o partido receber financiamento). 

A deputada do PSOL no Rio Grande do Sul, lembrou a comprovação das denúncias e a condenação do partido por conta das “candidaturas laranjas” no Ceará, com a cassação da chapa de deputados, em primeira e em segunda instância,  por fraude à cota de gênero. O caso pode ser confirmado na página do TRE-CE.

Na verificação feita pelo Bereia, da gravação da transmissão da reunião citada por Bia Kicis em sua postagem, acessada diretamente no canal oficial da Câmara Federal, não se observou, em qualquer trecho, menção da deputada Melchionna que defendesse a substituição de mulheres eleita, por homens, conforme alegou Bia Kicis em sua fala, viralizada nas mídias sociais. 

Sete candidatas “laranja”

Fernanda Melchionna reproduziu, aos presentes na reunião, os depoimentos das mulheres que foram usadas pelo PL no Ceará, que, na alegação da deputada, “descobriram pela imprensa ou por parentes que eram candidatas. Sete candidatas laranja, com declaração delas próprias de que não deram seus nomes, que não eram candidatas e que foram usadas no verdadeiro laranjal no Ceará”. 

Melchionna afirma que, em depoimento, uma das “candidatas” a sra. Marlucia disse: “Eu não sabia. Me botaram, eu não sabia”. Segundo a parlamentar, a Sra. Marlucia, ao ser questionada, durante depoimento, se queria ser candidata, respondeu que “não queria, que não foi fazer foto para ser candidata, que ficou sabendo por um primo do marido e que sabia e não queria se candidatar.” 

A parlamentar encerrou essa parte da fala na Comissão Especial, com a denúncia da gravidade do uso de candidatas laranja acionadas para burlar a Lei e descumprir a cota de gênero. Nesse sentido, a deputada do PSOL afirmou que a condenação da Justiça em Primeiro e em Segundo Grau, no Ceará, se mostra “importantíssima para combater o uso de candidatas laranjas, descumprindo a cota de gênero, desrespeitando a histórica luta das mulheres […] e essa condenação colocou uma responsabilização  sobre o conjunto da chapa, porque é assim que tem que ser tratado. Os partidos não podem usar as mulheres achando que não vão ser condenados ou responsabilizados”, disse aos presentes.

A denuncia de um “jabuti” inserido na PEC 09/23

No prosseguimento da sua fala, de encaminhamento contrário à votação do texto do relator, Fernanda Melchionna menciona, com tom de indignação, o fato de que, além de manter a anistia aos partidos no caso das candidaturas de negros e negras,  e de transformar o piso de 30% das candidaturas femininas em teto, o relator da PEC 09/23, deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), inseriu no texto final “um jabuti gigante” (jargão parlamentar que se refere à inserção de artigos em projetos de lei  que não têm relação com o objeto da proposta para atender interesses). 

O “jabuti”, segundo a deputada, tenta garantir a revogação da decisão tomada pela Justiça do Ceará. “É uma vergonha! E como é que não tem impedimento se o relator é de um partido que vai ser beneficiado com quatro cadeiras que obviamente foram anuladas diante do expediente criminoso de uso de candidatas laranjas”, criticou a deputada do PSOL.

Ao finalizar o encaminhamento contra a votação do texto do relator, Melchionna concluiu dizendo ter aproveitado o requerimento que fez para que haja votação nominal para dizer que a PEC 09/23 “tem impedimento, tem conflito de interesse, além de jabuti, além de uma vergonha, além de uma tentativa de autoanistia que já era objetivo original da PEC, aqui, de revogar uma decisão judicial no tapetão” (trecho no minuto 19’35’’). Verifica-se que foi logo após este momento que a deputada Bia Kicis fez a da defesa da PEC 09/23 e acusou a deputada do PSOL de atuar para retirar o mandato de mulheres de direita para substituir com homens de esquerda,  o que representa distorção do conteúdo da fala anterior, como se pode verificar. 

Bereia recorreu à avaliação da procuradora regional da República, coordenadora do GT Violência Política de Gênero da Cice-PGE/MPF, Raquel Branquinho sobre a situação denunciada por Fernanda Melchionna na Câmara Federal. Em artigo, a procuradora diz: “o mesmo Parlamento que promulgou uma legislação que representa, nos últimos 25 anos, um microssistema jurídico de políticas afirmativas em prol de maior representatividade feminina, vem, ao longo do tempo e principalmente nestes últimos anos, concedendo, por meio de Emendas Parlamentares, sucessivas anistias que aniquilam ou neutralizam a finalidade dessas medidas e seu modo de execução. Dessa forma fragilizam iniciativas que visam a uma maior participação feminina na vida política do país e aportam em reflexos positivos para a sociedade.”

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Após verificar  o contexto do vídeo que mostra as falas dos integrantes da Comissão Especial instalada para discutir e votar o texto do relator da PEC 09/23, Bereia considera o conteúdo postado em mídias sociais pela deputada Bia Kicis (PL-DF) enganoso. A publicação usou trecho gravado de reunião parlamentar que, de fato existiu, porém, as afirmações sobre falas dos parlamentares do PSOL, especialmente da deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RJ) foram distorcidas. 

Diferentemente da fala enganosa de Bia Kicis, o que se observou na análise dos fatos e nas publicações de instituições que se posicionaram em relação a PEC 09/23, ocorreu o contrário, a firme defesa da inserção da mulher no exercício parlamentar em consolidação às políticas afirmativas conforme estabelecido em lei. Foi identificado, no discurso de Fernanda Melchiona, a denúncia contra a PEC em discussão, que, se aprovada, manterá o uso de mulheres como “laranjas”, por partidos. A prática, trazida na denúncia com o caso da Justiça Eleitoral no Ceará, envolve o Partido Liberal, de direita, ao qual está vinculada Bia Kicis. A postagem viralizada e checada pelo Bereia, é um recorte de discussão mais ampla, que uma vez conhecida, desmente a acusação da deputada católica que atua para defender seu partido e a PEC em  discussão recorrendo a desinformação.

Bereia incentiva que o leitores e leitoras exerçam sempre uma leitura crítica dos discursos presentes nas redes sociais digitais que se apresentam de forma recortada e descontextualizada, em busca de informações de qualidade, completas e contextualizadas.

Referências

JOTA. https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/campanhas-eleitorais-a-pec-09-2023-e-seus-reflexos-sociais-19042023. Acesso em 19 set 2023

YOUTUBE.  PEC 9/23 – Cota Mínima de Recursos dos Partidos – Votação do parecer do relator – 13/09/2023  https://www.youtube.com/watch?v=ogtscyUxNLs . Acesso em 19 set 2023

TRE-CE. TRE-CE cassa chapa de deputados estaduais do PL por fraude à cota de gênero. https://www.tre-ce.jus.br/comunicacao/noticias/2023/Maio/tre-ce-cassa-chapa-de-deputados-estaduais-do-pl-por-fraude-a-cota-de-genero. Acesso 20 set 2023

MPF. MPF alerta para retrocesso em PEC de anistia a partidos que não repassaram mínimo de recursos a mulheres. https://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr/mpf-alerta-para-retrocesso-em-pec-de-anistia-a-partidos-que-nao-repassaram-minimo-de-recursos-a-mulheres. Acesso 20 set 2023

Lançamento do Foro do Brasil é marcado por ausência de público e desinformação

Na tarde de 29 de junho, dia em que a Igreja Católica celebrava São Pedro, o esvaziado auditório Nereu Ramos, da Câmara Federal, foi palco para o político Padre Kelmon (PTB) lançar o Foro do Brasil, junto de outros religiosos e políticos autodenominados conservadores, em tentativa de contrapor o 26º Encontro do Foro de São Paulo, marcado para o mesmo dia, em Brasília.

A defesa de pautas de políticas da extrema-direita se associou ao forte tom religioso do evento, dado pelas declarações recheadas de passagens bíblicas, apresentação de músicas cristãs, orações e depoimentos. O evento trouxe, para testemunhar, inclusive, um jovem político venezuelano que, de acordo com a organização, sofre perseguição política.

Um fato que marcou o lançamento do Foro foi a ausência de seus principais divulgadores. Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, Bia Kicis (PL/DF), Carla Zambelli (PL/SP) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) convidaram o público por meio de suas mídias sociais, mas faltaram ao lançamento. Kicis e Zambelli enviaram vídeos com declarações de apoio ao evento, a primeira foi a um funeral e a segunda não justificou. Já o parlamentar carioca, segundo o deputado General Girão (PL/RN), não compareceu pois, no dia anterior ao evento, teve o celular roubado no Rio de Janeiro.

Se por um lado o público presente não conseguiu encher o pequeno auditório, a desinformação marcou presença no discurso do senador evangélico Magno Malta (PL-ES), um dos personagens frequentemente checados na seção Torre de Vigia do Bereia. Com duração de cerca de 40 minutos, a preleção mais longa do evento, notoriamente religiosa, foi repleta de afirmações falsas e dados incorretos.

Ataque à esquerda

O senador, logo no começo, utiliza, em seu discurso, estratégias de desinformação checadas pelo Bereia, como a “ameaça comunista” e a “cristofobia”. Na tentativa de incriminar a reunião do Foro de São Paulo  no Brasil, ele afirma que o evento receberia “ditadores inescrupulosos, negadores da fé, negadores de direitos, assassinos da moral alheia, esses que matam, homossexuais que perseguem cristãos, que fecham igrejas, eles verbalizam”. Em seguida, finaliza o trecho afirmando que os participantes do Foro de São Paulo desfrutam da estrutura de governo. Esta é uma informação fasa, pois, ao contrário do Foro do Brasil, que ocorre em um dos auditórios da Câmara Federal, sob o rótulo de “Reunião Técnica“, o Foro de São Paulo ocorre em local privado, no Hotel San Marco, às custas dos participantes.

Imagem: reprodução do site da Câmara dos Deputados

Economia

Magno Malta proferiu também  uma série de afirmações falsas e enganosas sobre a economia do País. Ele citou o fechamento de diversas empresas, aumento do desemprego e de falências para criticar o atual governo. A afirmação falsa fica por conta do desemprego: de acordo com dados do IBGE, o desemprego diminuiu 8,3% e chega à menor taxa do período desde 2015. Já as enganosas são as declarações sobre o fechamento e falência de empresas. O Brasil atingiu a marca de 1,3 milhão de empresas abertas nos primeiros quatro meses de 2023, contra 736,9 mil fechadas, o que deixa um saldo positivo de 594.963 CNPJs abertos em todo o país, segundo dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento. 

Já, quando Malta cita o aumento de pedidos de falência, o senador acerta, mas omite um fator fundamental para a saúde financeira das empresas: a alta taxa de juros definida pelo Banco Central. De acordo com diversos economistas, os juros altos aliados à restrição de crédito são um dos fatores que têm contribuído para o cenário atual. A taxa de 13,75% é defendida pelo presidente do Banco Central, Campos Neto, que, por sua vez, é alvo de elogios no discurso do senador. 

Sobre a pandemia, o senador nega, inclusive, a fome sofrida por cerca de 33 milhões de brasileiros durante o período, em semelhança a declaração dada pelo ex-presidente Bolsonaro, durante debate das eleições presidenciais em 2022, quando afirmou não ver pessoas passando fome no país.

Por fim, afirma que o deputado Lindbergh Faria (PT/RJ) teria dito que o “calabouço(sic) fiscal tem parte com capeta”. Bereia entrou em contato com a assessoria do deputado para confirmar a conversa, mas até o fechamento da matéria não obteve resposta. 

Aula de Geoteologia?

Um fato curioso do evento veio no discurso do deputado federal General Girão. Logo no início, ele pediu que os presentes fechassem os olhos e “imaginem na parede”. Em seguida, pegou o microfone, caminhou até a parede ao fundo e, gesticulando, narrou a posição geográfica dos países sul-americanos e perguntou: “Quem está mais à direita no continente sul-americano?” e depois, “Quem criou o mundo?”. Por fim, conclui com a frase: “Quem quer tirar o Brasil da direita e colocar na esquerda, está querendo contrariar uma criação de Deus. O padre Kelmon falou, é o destino manifesto do Brasil”. 

Imagem: reprodução de site da Câmara dos Deputados

Padre Kelmon, o presidente

O candidato à Presidência da República pelo PTB nas últimas eleições foi apresentado como presidente do Foro do Brasil. Padre Kelmon afirma que a criação do Foro deve-se ao Espírito Santo, que inspirou padres e pastores. Mais tarde, foi apresentado um trailer de um documentário batizado de “Operação Verdade”. Após a exibição, quebrando o protocolo, Kelmon retorna a tribuna e revela os financiadores do trabalho: “Eu preciso dizer isso. Quero agradecer especialmente ao agronegócio […], que nos permitiu passar uma semana em Boavista, em Pacaraima, que nos acolheu, pagou nossas passagens, fez o melhor por nós para que esse documentário pudesse ficar pronto.”

Referências de checagem:

Câmara dos Deputados. https://www.camara.leg.br/evento-legislativo/68804 Acesso em 3 Jul 2023

Foro de São Paulo https://forodesaopaulo.org/novas-informacoes-logisticas-para-convidados-no-brasil/ Acesso em 3 Jul 2023

IBGE https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/37252-desemprego-recua-a-8-3-no-trimestre-encerrado-em-maio-mesmo-nivel-de-2015 Acesso em 3 Jul 2023

Ministério do Desenvolvimento https://www.gov.br/mdic/pt-br/assuntos/noticias/2023/maio/brasil-teve-1-3-milhao-de-empresas-abertas-no-1o-quadrimestre-de-2023  Acesso em 3 Jul 2023

Agência Brasil https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/economia/audio/2023-04/pedidos-de-falencia-de-empresas-aumentam-mais-de-40-no-trimestre Acesso em 3 Jul 2023

CNN https://www.cnnbrasil.com.br/economia/juros-altos-no-brasil-prejudicam-saude-financeira-de-empresas-dizem-especialistas/ Acesso em 3 Jul 2023

Unisinos https://www.ihu.unisinos.br/noticias/509765-reinventando-a-educacao Acesso em 3 Jul 2023

Estado de Minas https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2022/06/08/interna_nacional,1371929/fome-no-brasil-quase-dobra-apos-dois-anos-de-pandemia.shtml  Acesso em 3 Jul 2023

Perfis religiosos omitem dados de pesquisas científicas sobre a covid-19 e geram desinformação


Publicações feitas em perfis religiosos nas mídias sociais divulgaram informações que supostamente encerrariam duas grandes polêmicas envolvendo a pandemia de COVID-19: a origem do vírus e a eficácia do uso de máscaras. 

Baseando-se, principalmente, em artigo de opinião veiculado pela revista Veja, figuras ligadas à extrema-direita compartilharam postagens afirmando que a origem da pandemia está no vazamento do vírus, a partir de um laboratório chinês, e que o uso de máscaras não teve impacto na redução da propagação do vírus. 

Reprodução do Twitter

Reprodução: Twitter

A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) e o pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, ecoaram, em seus perfis no Twitter, o artigo assinado pela colunista Vilma Gryzinski. Malafaia, em sua publicação, diz que a “matéria sensacional” da revista Veja “destrói toda safadeza montada na pandemia”. Outras contas também fizeram coro à tese, sempre utilizando a hashtag “BolsonaroTinhaRazão”. As narrativas sobre a origem chinesa do vírus e sobre a ineficácia do uso de máscaras foram amplamente disseminadas por Jair Bolsonaro durante a pandemia.

Reprodução do Twitter
Reprodução do Twitter

Informações retiradas de artigo de opinião

A jornalista Vilma Gryzinski, autora da coluna Mundialista na revista Veja, usa em seu texto intitulado Teste da realidade: vírus saiu de laboratório e máscaras foram inúteis, o termo “razoável convicção” para se referir às recentes declarações do Departamento de Energia dos Estados Unidos ao considerar a teoria de que o vírus da covid-19 teria escapado por acidente de um laboratório do governo chinês em Wuhan. 

Gryzinski afirma, sem apresentar referências, que a França cortou relações com o laboratório de Wuhan e avisou que este era utilizado para estratégias militares. Não foram encontrados dados suficientes para sustentar a veracidade desta afirmação. 

O texto continua e apresenta um levantamento da Cochrane Library – uma coleção de bancos de dados da área da saúde – que segundo Vilma, afirma a indiferença no uso de máscaras no combate à COVID-19. 

Uso de máscaras

A publicação da Cochrane Library, principal referência utilizada no artigo de opinião veiculado na revista Veja, intitula-se Intervenções físicas para interromper ou reduzir o espraiamento de vírus respiratórios. Trata-se de uma revisão sistemática, ou seja, um “estudo secundário, que tem por objetivo reunir estudos semelhantes, publicados ou não, avaliando-os criticamente em sua metodologia”, segundo definição da Cochrane Library.

Conforme o título da revisão indica, não se trata de uma pesquisa específica para o coronavírus, mas para vírus respiratórios de maneira geral, e as “intervenções físicas” podem ser não apenas o uso de máscaras, mas a lavagem das mãos, o distanciamento social e outras providências, conforme relata o pesquisador em clínica epidemiológica Leonardo Costa, em artigo para a revista Questão de Ciência. Ressalta-se, ainda, que a referida revisão teve início no ano de 2007, muito antes do início da pandemia de coronavírus e de toda a polêmica alimentada por grupos políticos que não necessariamente baseiam-se em evidências científicas.

O pesquisador explica que estudos laboratoriais sustentam, com alto grau de evidência científica, que o uso de máscaras apropriadas (N95, PFF2 ou máscaras cirúrgicas) constitui uma ótima barreira na contenção de diversos microrganismos transmissores de doenças.  A revisão da Cochrane, ampla e preocupada em entender o fenômeno na escala comunitária, inclui estudos com “alto risco de viés”, ou seja, com grandes chances de apresentar erros, graças à própria natureza dos estudos.

A má utilização de máscaras, seja porque as pessoas deixam nariz ou boca descobertos, retiram-na para falar, comer ou até para sentir algum alívio na respiração, também foi observada nos estudos avaliados pela revisão, podendo ocasionar erros nos resultados. A própria publicação da Cochrane ressalta a ocorrência de vieses nos estudos, algo que o artigo de opinião veiculado na revista Veja esconde.

Origem do coronavírus

As recentes publicações reverberadas por perfis ligados à extrema-direita afirmam, ancoradas no artigo de Vilma Gryzinski, que a covid-19 teve origem no vazamento de um laboratório chinês. Para sustentar a afirmação, Gryzinski apoiou-se em um relatório vazado do Departamento de Energia dos Estados Unidos da América e na posição divulgada pelo FBI, unidade de investigação ligada ao Departamento de Justiça norte-americano.

Segundo a colunista da Veja, as duas instituições apontam com “razoável convicção” a origem do vírus a partir de um vazamento de um laboratório chinês. O termo utilizado pelo FBI foi “moderado”. Apesar de semanticamente próximos, há ligeira diferença entre os termos, o que pode induzir a conclusões diferentes. O projeto Comprova, que se dedica a combater conteúdos enganosos, ressalta que o FBI não confirmou a origem do vírus.

A rede britânica BBC, em matéria publicada no início do mês de março, chama atenção para o fato de um debate “tóxico” sobre a teoria do vazamento estar atrapalhando as pesquisas sobre a origem do vírus. A possibilidade de um vazamento laboratorial ter originado a pandemia de covid-19 não está descartada, mas a contaminação política do tema impede uma abordagem isenta.

É preciso lembrar que Estados Unidos e China travam, há anos, uma intensa batalha geopolítica e que suas respectivas instituições tendem a culpar o rival pelo espraiamento do vírus. Apesar de diferentes teorias circularem em ambos os países, as mais altas autoridades nacionais são cautelosas. O conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, em entrevista recente à rede americana de televisão CNN afirmou que “no momento não há uma resposta definitiva que tenha surgido da comunidade de inteligência sobre esta questão”.

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As postagens em mídias sociais que foram analisadas por esta checagem trazem um tom de sensacionalismo ao se utilizarem única e exclusivamente do título do texto e da marca do veículo de comunicação, com o objetivo de trazer ao artigo opinativo uma relevância de matéria jornalística de um veículo reconhecido.

Além disso, Bereia checou o texto publicado na revista Veja – já que este foi compartilhado pelos perfis de extrema-direita e compunha a mensagem divulgada – e identificou a omissão intencional de informações com o objetivo de construir uma narrativa norteada pela inclinação ideológica da autora. 

O conteúdo checado traz alguma substância verdadeira, mas a maneira escolhida para apresentá-lo o torna enganoso, e portanto se faz necessária uma contextualização para o entendimento total da informação. 

Bereia alerta seus leitores e leitoras para sempre receberem criticamente conteúdo opinativo, que pode ser apoiado, contestado ou rechaçado. Afinal, opinião é a livre expressão de uma ideia sobre alguma coisa, tem caráter subjetivo. Opinião não é informação. Para um conteúdo ser classificado como informação precisa estar ancorado em fatos, contextos, referências objetivas, tais como dados e explicações, todos verificáveis. Se o conteúdo se apresenta como informação mas não tem estes elementos, ou é opinativo, então é desinformação, como as postagens verificadas nesta matéria. 

Referências de checagem:

Veja. https://veja.abril.com.br/coluna/mundialista/teste-da-realidade-virus-saiu-de-laboratorio-e-mascaras-foram-inuteis/ Acesso em: 8 mar 2023

Wall Street Journal. https://www.wsj.com/articles/three-years-late-the-lancet-recognizes-natural-immunity-great-barrington-declaration-tech-censor-antibodies-mandates-b3ba912c Acesso em: 8 mar 2023

BBC. https://www.bbc.com/news/world-us-canada-64819965 Acesso em: 8 mar 2023


Exame. https://exame.com/ciencia/relatorio-confidencial-de-agencia-dos-eua-revela-nova-teoria-sobre-origem-da-covid-19/ Acesso em: 9 mar 2023

Estadão. https://www.estadao.com.br/internacional/origem-do-coronavirus-departamento-de-energia-dos-eua-diz-que-virus-vazou-de-laboratorio-de-wuhan/ Acesso em: 8 mar 2023

Folha de São Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2023/03/polemica-das-mascaras-ciencia-constantemente-e-usada-como-uma-ferramenta-para-proselitismo.shtml Acesso em: 7 mar 2023

Questão de Ciência. https://www.revistaquestaodeciencia.com.br/questao-de-fato/2023/02/17/o-que-sabemos-sobre-eficacia-das-mascaras Acesso em: 8 mar 2023

Cochrane Library.

https://www.cochranelibrary.com/cdsr/doi/10.1002/14651858.CD006207.pub6/full Acesso em: 8 mar 2023

https://www.cochranelibrary.com/cdsr/doi/10.1002/14651858.CD015029/full/pt Acesso em: 8 mar 2023

CNN. https://edition.cnn.com/videos/politics/2023/02/26/covid-origin-wsj-report-national-security-advisor-jake-sullivan-sotu-bash-vpx.cnn Acesso em: 9 mar 2023

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Foto de capa: Getty Images, reprodução de site Veja

Vídeo de Bia Kicis sobre conferência em NY volta a circular com desinformação

Circula novamente nas redes sociais um vídeo em que a deputada federal Bia Kicis (PL-DF) usa a tribuna da Câmara dos Deputados para falar sobre um evento a ser realizado no próximo mês de novembro, em Nova Iorque, a Brazil Conference NY. A deputada criticou com um tom irônico: “Nós temos aqui uma conferência em que se anuncia, aspas, A economia do Brasil com o novo governo, fecha aspas”. E ela continua: “Participam dessa conferência o ministro Alexandre de Moraes, a ministra Carmem Lúcia, o ministro Dias Tóffoli, o ministro Gilmar Mendes […]”.

Imagem: reprodução do TikTok

Kicis diz que estranhou, “afinal de contas já se anuncia em 15 de novembro um novo governo. E eu pensei: o que será que eles sabem – os ministros do Supremo, o recém-eleito ministro do TSE – que nós não sabemos?!” E ainda usando a tribuna da Câmara Federal, a deputada diz que fez contato com a empresa que organiza o evento (lide.com.br) e constatou que pertence ao grupo Dória. “Isso é absolutamente estarrecedor! Anuncia-se já, dias 14 e 15 de novembro ‘a economia do Brasil com o novo governo’, ou seja, estão aqui garantindo que o presidente Bolsonaro não será reeleito e isso é feito na presença de cinco ministros do Supremo Tribunal Federal e do já recém-eleito presidente do TSE, aquele que presidirá o TSE durante o processo eleitoral. Isso é estarrecedor, eu gostaria que nós tivéssemos esclarecimento a respeito disso”, conclui Kicis.

A deputada já havia publicado um tuíte em 6 de julho passado sobre o mesmo assunto. Logo em seguida, checagens feitas por alguns projetos de enfrentamento de fake news  provaram ser falsas as acusações de Bia Kicis com relação ao programa anunciado pela empresa Lide, que é a organizadora do “Brazil Conference New York”, com o apoio institucional da Brazilian-American Chamber of Commerce (BACC).

 

De acordo com o site de notícias UOL, durante live no dia 7 de julho de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (PL) também sugeriu uma relação entre o tema do evento e “a possibilidade de o STF já saber que o país teria um novo presidente em 2023”. Bolsonaro afirmou: “Olha, o Supremo e esses outros economistas estão dizendo que vamos ter um novo governo. Eles já sabem o resultado das eleições? Esquisito isso, né?”.

Na verificação feita pelo UOL, o Grupo Lide explicou, em nota publicada no dia 7 de julho, “que o tema da palestra dos economistas foi alterado para facilitar a compreensão. A temática proposta para o debate do dia 15 de novembro foca no panorama econômico do Brasil pós-eleições, independentemente do vencedor ou da vencedora do pleito nacional. Qualquer interpretação diferente desta pauta está errada”.

Também o site de notícias Terra checou a fala da deputada Kicis e os compartilhamentos nas redes sociais: “Publicações nas redes sociais sugerem que ministros do STF já saberiam do resultado das eleições de outubro, pois estão previstos para participar de um debate em Nova York, em novembro, sobre o ‘novo governo’ — o que é falso.” 

O Bereia visitou o site da Lide (www.lide.com.br), em 14 de setembro, onde pode ser encontrada a programação do evento “Brazil Conference New York”, e onde também podem ser feitas as inscrições. É possível observar na programação que, de fato, foi mudado o título do tema do painel que ocorrerá no dia 15 de novembro, que será: “A Economia do Brasil a partir de 2023”, e não mais “A Economia do Brasil com o novo governo”. O Grupo Lide explicou que o assunto diz respeito, desde o início, ao cenário no Brasil após as eleições de 2022.

Respeito à Liberdade e à Democracia

Da forma como a deputada Kicis afirmou, os ministros Carmen Lúcia, Luiz Fux, Gilmar Mendes e  Dias Toffoli e o ministro recém-eleito presidente do TSE, Alexandre de Moraes seriam os palestrantes do painel sobre economia no “Brazil Conference NY”. Porém, isto é falso. Os ministros participarão na abertura, em 14 de novembro, sobre o tema “O Brasil e o respeito à Liberdade e à Democracia”.

A programação completa, como se pode ver no site do Lide é a seguinte:

14 de Novembro
“O Brasil e o Respeito à Liberdade e à Democracia”

Presenças confirmadas:

Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal
Cármen Lúcia, Ministra do Supremo Tribunal Federal
Dias Toffoli, Ministro do Supremo Tribunal Federal
Gilmar Mendes, Ministro do Supremo Tribunal Federal
Luís Roberto Barroso, Ministro do Supremo Tribunal Federal
Ricardo Lewandowski, Ministro do Supremo Tribunal Federal

15 DE NOVEMBRO
“A ECONOMIA DO BRASIL A PARTIR DE 2023″

Presenças confirmadas:

Roberto Campos Neto, Presidente do Banco Central
Henrique Meirelles, Ministro da Fazenda (2016 – 2018) e Presidente do Banco Central (2003 – 2011)
Joaquim Levy, Diretor de Estratégia Econômica e Relações com Mercados no Safra e Ministro da Fazenda (2015)
Pérsio Arida, Economista, Presidente do BNDES (1993 – 1994) e Presidente do Branco Central (1995)
Rodrigo Garcia, Governador do Estado de São Paulo
Rubens Ometto, Presidente do Conselho de Administração da Cosan

Moderação:
Merval Pereira, Colunista, Comentarista Político e Escritor.

Grupo LIDE

Conforme publicação em seu site, “o LIDE – Grupo de Líderes Empresariais é uma organização que reúne executivos dos mais variados setores de atuação em busca de fortalecer a livre iniciativa do desenvolvimento econômico e social, assim como a defesa dos princípios éticos de governança nas esferas pública e privada. Presente em cinco continentes e com mais de duas dezenas de frentes de atuação, o grupo conta com unidades regionais e internacionais com o propósito de potencializar a atuação do empresariado na construção de uma sociedade ética, desenvolvida e competitiva globalmente.  Foi fundado no Brasil, em 2003”. E, de fato, faz parte do Grupo Dória.

Ainda segundo o site, “podem ingressar no LIDE empresas brasileiras e multinacionais com faturamento igual ou superior a R$ 200 milhões anuais, companhias que praticam a governança corporativa, valorizam o ser humano em todos os níveis, respeitam o meio ambiente e oferecem apoio a programas de responsabilidade social; além de organizações notórias, que tenham imagem pública de alta reputação no Brasil e no exterior”.

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O Bereia considera ENGANOSA a fala de Kicis em trecho de gravação em vídeo de um pronunciamento dela na Câmara dos Deputados, compartilhado em suas mídias  sociais. A deputada federal ligou os nomes dos ministros do STF a um painel em que não seriam os palestrantes no evento “Brazil Conference New York”, para induzir seus seguidores ao engano.  Ela buscou fazer crer que o painel trataria de assuntos sobre um novo governo brasileiro, insinuando que os ministros do STF saberiam demais sobre os resultados das eleições. 

Referências de checagem: 

Lide. https://www.lide.com.br/ Acesso em: 14 set 2022

Lide Brazil Conference. https://www.lide.com.br/eventos/lide-brazil-conference-new-york1 Acesso em: 14 set 2022

Uol. https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2022/07/15/ministros-do-stf-nao-participarao-de-debate-sobre-novo-governo-em-ny.htm?cmpid=copiaecola Acesso em: 14 set 2022

Terra. https://www.terra.com.br/noticias/ministros-do-stf-nao-participarao-de-debate-sobre-novo-governo-em-novembro,99829bbb3d896b7cb3d87182a1cc2f89l87w0ols.html Acesso em: 14 set 2022

Grupo Dória. https://www.grupodoria.com.br/ Acesso em: 19 set 2022

Brazilian-American Chamber of Commerce. https://brazilcham.com/ Acesso em: 19 set 2022

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Foto de capa: YouTube

Deputada católica e influenciadores evangélicos compartilham conteúdo enganoso sobre investigação da OMS e coronavírus

Na última semana voltaram a circular na internet teorias sobre a criação do vírus da Covid-19, o SARS-CoV-2. Em postagens compartilhadas nas mídias sociais e sites gospel, influenciadores evangélicos e lideranças políticas, como a deputada federal Bia Kicis (PL), repercutiram o recente relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) que trata da investigação do surgimento do vírus, sem descartar a possibilidade um acidente de laboratório.

Imagem: reprodução do Instagram

O que diz o relatório

O relatório preliminar divulgado pela OMS, em 9 de junho, contou com a participação de 27 membros, entre pesquisadores de áreas multidisciplinares de todo o mundo. O documento sugere que ainda existem dúvidas quanto à trajetória de transmissão do vírus da covid para os humanos, bem como sua circulação e evolução. Não foram identificada até o momento a origem do vírus, assim como os hospedeiros naturais/ intermediários e o evento de transbordamento para os seres humanos. 

As primeiras investigações apontaram que o mercado de frutos do mar de Huanan, localizado na cidade chinesa de Wuhan, desempenhou um papel importante na amplificação da pandemia, já que vários dos infectados pelo coronavírus, em dezembro de 2019,tinham uma conexão com o local.

Porém, existem lacunas quanto a esse apontamento. A origem do SARS-CoV-2 e sua introdução no referido mercado, por exemplo, ainda não são claras e o(s) evento(s) inicial(is) de transbordamento também não foram determinados. Por isso a necessidade de examinar amostras ambientais coletadas das barracas e drenos do mercado, que em janeiro de 2020 deram positivo para SARS-CoV-2 em áreas conhecidas pela venda de animais vivos.  [p. 05 e 06, tradução nossa]

No relatório, redigido em 12 de abril deste ano, os pesquisadores procuraram compreender as causas primárias que desencadearam a pandemia, não descartando intervenção humana e má manipulação de material contaminado. Ainda segundo o documento, já houve casos em que vírus foram espalhados por má manipulação de material contaminado e se tornaram possíveis armas biológicas, mesmo essa não sendo a intenção do projeto de pesquisa.  

Uma possível violação das medidas de biossegurança pode ser causada por um evento acidental ou falha processual ou de engenharia que resulte na infecção de equipes que trabalham em laboratório lidando com a manipulação de animais ou coleta de espécimes em um ambiente de campo. Tais violações de biossegurança podem também resultar na liberação inadvertida ou intencional de patógenos de um laboratório para o ser humano, população ou meio ambiente, por meios diretos ou indiretos. Há várias precauções e regulamentos para trabalhos laboratoriais e de campo em alguns países, mas existe uma lacuna naqueles de baixa e média renda. [p.14, tradução nossa]

No entanto, em nenhuma passagem a China – ou seus  laboratórios – são apontados como responsáveis pelo surgimento ou disseminação da covid-19, tratando-se apenas de uma das hipóteses a ser analisada pelo conselho de pesquisadores dentre algumas outras, como a proximidade e a convivência com animais portadores do vírus, insalubridade urbana e mutações e evoluções naturais de hospedeiros e do vírus em si.

A comissão responsável pelo relatório assinado para a OMS tem como propósito realizar investigações sobre o surgimento do covid-19, para assim estabelecer possíveis formas de prevenção para novas doenças e vírus potencialmente letais para a vida humana e animal, sem o intuito de procurar culpados.

O SARS-CoV-2 e a desinformação

É crescente a desinformação que circula nas mídias sociais associando a China à criação da covid-19. Os conteúdos desinformativos, há muito desmentidos por agências de checagem de notícias e a mídia profissional, frequentemente fazem alusão à teorias da conspiração que se estendem desde uma possível ameaça global com a criação de bombas químicas e guerra viral; à confecção de vacinas contaminadas que causaram mortes; criação do vírus em laboratório, além do uso de ivermectina como tratamento para a doença ou ainda a produção de máscaras e objetos de uso doméstico contaminados

O jornal O Estado de Minas lembra que estratégias como essa, da busca por um culpado em comum, não é novidade quando se lida com um quadro de pandemia e crises de saúde global. Em casos como as gripes espanhola, mexicana, francesa, alemã, russa e africana já foram levantadas suspeitas quanto às intenções e intervenções nacionalistas desses Estados-Nação na criação de possíveis armas biológicas contra seus inimigos. 

Com ânimos ainda mais exaltados diante da guerra, jornalistas e escritores da época faziam questão de levantar a hipótese de o vírus ter sido criado pela Alemanha, que, em 1918, já estava mais pra lá do que pra cá no conflito. Em 24 de setembro do mesmo ano, o jornal de Juiz de Fora O Pharol noticiava: “A mysteriosa influenza espanhola – que afinal bem pode ser mais um infame produto da infinita barbárie allemã – já matou em Dakar cincoenta e tantos marinheiros e officiaes da esquadra brazileira enviada a combater os submarinos allemães (sic)”. [O Estado de Minas]

Constantemente, busca-se um culpado para se responsabilizar pelo ocorrido. Se para boa parte das pessoas esse culpado é a China, há ainda quem culpe a OMS, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e os demais órgãos mundiais de saúde e desenvolvimento, alegando que suas ações são causadoras da morte de milhares de pessoas. Muito desse investimento na investigação de um culpado em comum está associado à negligência com o cuidado dos doentes, falta de ações governamentais e governos negacionistas.

Seria um enorme exagero, contudo, colocar a culpa do que nós e outros países estamos sofrendo nessa negligência inicial chinesa. Em 10 de março, Bolsonaro dizia que a epidemia era uma fantasia propagada pela mídia. Em 20 de março, chamava a Covid-19 de “gripezinha”. Paulo Guedes, por sua vez, previa em 13 de março que os gastos para combater a epidemia seriam da ordem de “3, 4 ou 5 bilhões de Reais”. No dia 15, estimou que, mesmo com a crise global, a economia global ainda poderia crescer 2,5%. [Exame]

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Bereia classifica como enganosas as teorias sobre o surgimento do vírus da covid-19 que circulam em sites gospel e mídias sociais de apoiadores do governo federal e influenciadores evangélicos. As postagens e notícias fazem referência ao relatório preliminar divulgado recentemente pela OMS e distorcem seu conteúdo, já que as investigações ainda estão em andamento, sendo prematura e equivocada a afirmação de que o SARS-CoV-2 tenha sido criado em laboratório. 

O documento elaborado pelo órgão defende maior amplitude de investigação e a linha de pesquisa sugere má manipulação de materiais contaminados, e não uma criação intencional do vírus como uma arma química. A circulação de desinformações como essa visa confundir o leitor ao utilizar de informações de substância verdadeira, mas de cunho distorcido, além de buscar culpabilizar um inimigo em comum, colocando em segundo plano a importância de ações governamentais de combate ao covid-19.

Referências de checagem:

CNN. https://www.cnnbrasil.com.br/saude/dados-sugerem-que-virus-veio-de-animais-diz-oms-em-1o-relatorio-sobre-origem-da-covid/ Acesso em: 14 jun 2022

Poder 360.

https://www.poder360.com.br/coronavirus/oms-recomenda-investigacao-aprofundada-sobre-origem-da-covid/ Acesso em: 14 jun 2022

https://static.poder360.com.br/2022/06/origem-covid-relatorio-oms-jun2022.pdf Acesso em: 14 jun 2022

Organização Mundial de Saúde. https://www.who.int/pt/news-room Acesso em: 14 jun 2022

Boatos.org

https://www.boatos.org/saude/vacinas-sao-assachinas-causaram-45-mil-mortes-no-havai-32-mil-mortes-no-brasil.html Acesso em: 14 jun 2022

https://www.boatos.org/saude/mascaras-cotonetes-china-vindo-vermes-parasitas-morgellons.html Acesso em: 14 jun 2022

https://www.boatos.org/mundo/senado-americano-denuncia-farsa-covid-19-china-redes-sociais.html Acesso em: 14 jun 2022

https://www.boatos.org/saude/coronavirus-testado-arma-biologica-china-documentos.html Acesso em: 14 jun 2022

Estado de Minas. https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/05/12/interna_gerais,1146356/coronavirus-humanidade-sempre-procura-um-culpado-para-pandemias.shtml Acesso em: 14 jun 2022

EXAME. https://exame.com/colunistas/joel-pinheiro-da-fonseca/quem-e-o-culpado-e-isso-importa/ Acesso em: 14 jun 2022

Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos é investigada por gastar pouco

Circula em sites de notícias evangélicos e mídias sociais de apoiadores do governo críticas sobre notícia a respeito de investigação do Ministério Público Federal (MPF) que envolve os baixos investimentos feitos pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), atualmente comandado pela pastora batista Damares Alves. O MPF não costuma comentar oficialmente o andamento de inquéritos, e não respondeu a questionamentos de jornalistas nesse sentido.

A informação também foi compartilhada nos perfis oficiais da ministra na internet. Em 18 de outubro de 2021, ela afirmou por meio de seu perfil no Instagram ainda não ter sido comunicada sobre a abertura do inquérito. O deputado federal Dr. Jaziel (PL-CE) e as deputadas Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP) foram alguns dos parlamentares que repercutiram a investigação do MPF e defenderam a ministra. O discurso de Damares Alves e apoiadores nas mídias sociais é de que “gastar pouco” deveria ser entendido como benéfico. 

Imagem: reprodução do Twitter

Sobre a investigação

Segundo as informações da imprensa, o inquérito pretende apurar a baixa execução orçamentária do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos nos anos de 2020 e 2021. De acordo com dados disponíveis no Portal da Transparência, no ano passado o MMFDH executou apenas R$ 253,2 milhões de um orçamento de R$ 673,7 milhões, o que corresponde a 38% do valor disponibilizado para a pasta. Já em 2021, até o momento, 18% do orçamento foi realizado (dos R$ 618,6 milhões, R$ 110 milhões foram gastos pelo Ministério).

Mesmo afirmando não ter sido comunicada do inquérito, Damares Alves procurou se justificar, dizendo que “todo nosso orçamento do ano passado está devidamente executado, devidamente empenhando (sic). Nossa execução passou de 98%, o que foi publicamente anunciado.” A ministra justificou que “só recebe dinheiro para a próxima etapa da obra após medição e conferência do que já foi feito”.

Menos políticas públicas de proteção

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos é o órgão responsável pela defesa dos Direitos Humanos no Brasil. Encarregado de formular políticas públicas de inclusão, o MMFDH tem papel fundamental na promoção da igualdade racial, defesa dos direitos da pessoa idosa, mulheres, crianças e adolescentes, Pessoas Com Deficiência, indígenas e população LGBTQIA+ no país.

A baixa execução do orçamento, mesmo com verba disponível, pode impactar projetos e programas governamentais, como o de proteção às mulheres e combate à violência de gênero. Damares Alves afirma que “o orçamento está garantido, empenhado e o dinheiro na conta, mas em nossa gestão, o valor só é liberado, a ordem de pagamento só é feita fase por fase da realização da obra, do projeto ou do programa, com a devida prestação de contas e com relatórios”. No entanto, esta não é a primeira vez que o MPF pede esclarecimentos à pasta quanto à execução de políticas públicas de responsabilidade do Ministério.

Em 2020, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão vinculado ao MPF, requereu ao Ministério informações sobre políticas públicas voltadas à proteção dos direitos das mulheres, especialmente no contexto da pandemia. Apesar do aumento da violência no período de isolamento social, com uma denúncia a cada cinco minutos, o MMFDH registrou o menor gasto da década com ações de proteção à mulher, segundo levantamento feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). 

Já em setembro deste ano, a PFDC solicitou informações sobre a execução orçamentária do Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), que sofreu atrasos de pagamentos e corte de pessoal, colocando em risco a proteção de ativistas.

* * *

Bereia classifica como enganosa a afirmação de que a Ministra do MMFDH é alvo de investigação pelo MPF por gastar pouco, o que seria uma virtude da pasta. Caso se confirme a informação de que há um inquérito em andamento, Damares Alves será investigada por possível baixa execução do orçamento do Ministério, tendo em vista que o um menor investimento da pasta impacta diretamente projetos e programas governamentais o voltados para o auxílio às populações vulneráveis. Ou seja, gastar menos do que o orçado e planejado para a pasta não necessariamente significa uma economia sem custos para a população e representa negligência com os deveres e responsabilidades que devem ser assumidos pelo poder público em relação a direitos de minorias sociais.

Referências

Último Segundo. https://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2021-10-17/damares-inquerito-mpf-orcamento.html Acesso em: 27 out 2021.

Poder 360. https://www.poder360.com.br/brasil/damares-critica-investigacao-do-mp-por-nao-ter-gasto-verba-disponivel/ Acesso em: 27 out 2021.

Instagram. https://www.instagram.com/p/CVJsTOVgEPk/ Acesso em: 22 out 2021.

Portal da Transparência http://portaldatransparencia.gov.br/ Acesso em: 24 out 2021.

Ministério Público Federal

http://www.mpf.mp.br/pfdc/noticias/pfdc-pede-a-ministra-damares-dados-sobre-acoes-para-a-protecao-de-mulheres-no-contexto-da-covid-19 Acesso em: 22 out 2021.

O Globo. https://oglobo.globo.com/celina/dia-internacional-da-mulher-2021-em-ano-de-aumento-da-violencia-contra-mulher-damares-usa-apenas-14-do-orcamento-menor-gasto-da-decada-24907681 Acesso em: 22 out 2021.

https://oglobo.globo.com/brasil/alem-de-orcamento-mpf-questiona-pasta-de-damares-por-acoes-voltadas-protecao-de-mulheres-defensores-25240066 Acesso em: 22 out 2021.

Poder 360

https://www.poder360.com.br/brasil/damares-critica-investigacao-do-mp-por-nao-ter-gasto-verba-disponivel/ Acesso em: 22 out 2021.

O Tempo

https://www.otempo.com.br/politica/governo/damares-reage-a-inquerito-do-mpf-sem-mencionar-os-motivos-da-investigacao-1.2557220 Acesso em: 22 out 2021.

Governo Federal

https://www.gov.br/mdh/pt-br/damares-alves Acesso em: 22 out 2021.

Politize!

https://www.politize.com.br/ministerio-da-mulher-familia-e-direitos-humanos/ Acesso em: 22 out 2021.

O Globo – Celina

https://oglobo.globo.com/celina/dia-internacional-da-mulher-2021-em-ano-de-aumento-da-violencia-contra-mulher-damares-usa-apenas-14-do-orcamento-menor-gasto-da-decada-24907681 Acesso em: 24 out 2021.

UOL – Universa

https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2021/10/18/mpf-investiga-minsterio-de-damares-por-nao-gastar-verba-que-tem-disponivel.htm Acesso em: 24 out 2021.

O Globo

https://oglobo.globo.com/brasil/alem-de-orcamento-mpf-questiona-pasta-de-damares-por-acoes-voltadas-protecao-de-mulheres-defensores-25240066 Acesso em: 25 out 2021.

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Foto de capa: Isac Nóbrega/PR

Relatório da CPI da Pandemia aponta autoridades e influenciadores de perfil religioso na rede de desinformação

Após quase seis meses de trabalho, a CPI da Pandemia, que apura responsabilidades referentes à atuação de autoridades e cidadãos brasileiros no trato com a pandemia do coronavírus, aproxima-se do fim. E seu relatório final cita  diversas autoridades e influenciadores digitais de perfil religioso como atuantes na propagação de notícias falsas e desinformação a respeito do tema. O relatório ainda passará pelos integrantes da comissão, podendo sofrer emendas ou alterações.

Segundo consta no relatório, a disseminação de notícias falsas era operada por vários núcleos, que contavam com a participação de diversos atores de identidade religiosa. São eles:

Núcleo Central:

Eduardo Bolsonaro, deputado federal (PSL-SP), evangélico batista

Carlos Bolsonaro, vereador (Republicanos-RJ), evangélico batista

Núcleo Formulador:

Filipe Martins, assessor internacional da Presidência da República, cristão

Núcleo Político:

Bia Kicis, deputada federal (PSL-DF), católica

Onyx Lorenzoni, ministro da cidadania, evangélico luterano

– Carlos Jordy, deputado federal (PSL-RJ), católico

Núcleo de Produção e Disseminação – Influenciadores:

Bernardo Kuster, influenciador digital, católico

– Allan dos Santos, católico; Oswaldo Eustáquio, evangélico;  e Barbara Zambaldi Stefani, católica, que há pouco tempo tiveram seus canais bloqueados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob a alegação de propagarem desinformação. Ontem Allan teve prisão preventiva decretada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.

O relatório e suas consequências

Conforme descrito pelo Nexo Jornal, “o relatório final de uma CPI é o documento que reúne as provas colhidas ao longo das investigações conduzidas pela comissão parlamentar, indicando possíveis crimes que, na visão dos autores do texto, foram cometidos pelas pessoas investigadas. (…) Esse pedido de punição costuma ser chamado por parlamentares e imprensa de “indiciamento”. Isso porque uma CPI cumpre por vias parlamentares o papel que normalmente é exercido pela polícia. Ou seja, a comissão não acusa formalmente, não julga nem pune, apenas investiga”.

A partir da aprovação do texto final pela CPI, o relatório é encaminhado ao Ministério Público, que pode propor a responsabilização civil e criminal dos investigados, além de acionar outros órgãos para encaminhamento de outras providências.

Além dos indiciamentos, o relatório da CPI da Pandemia também propôs sugestões aos poderes Legislativo e Judiciário no sentido de combater a disseminação de desinformações:  

– Tipificação da conduta de produzir ou disseminar notícia falsa no âmbito do Direito Penal;

– Aperfeiçoamento da identificação de usuários e perfis de redes sociais na internet. Somente a partir da devida identificação do eventual infrator é que se pode responsabilizá-lo por seus atos e exigir a reparação dos danos causados;

– Aumento da responsabilidade dos provedores de aplicação de internet, uma vez que já se sabe que essas empresas dispõem de recursos tecnológicos para, no mínimo, restringir o alcance de conteúdos maliciosos;

– Limitar ou mesmo de eliminar os ganhos financeiros auferidos por meio das fake news, tal como já adotado de forma pontual em algumas decisões judiciais

No entanto, algumas propostas estão sendo criticadas por especialistas. Embora se reconheça o esforço de combater a prática da desinformação, o que se aponta é que da maneira que está colocada, a lei pode dar margem para arbitrariedades. Bia Barbosa, pesquisadora da organização Repórteres Sem Fronteiras e participante do Comitê Gestor da Internet, pontua:

“O relatório do senador Renan Calheiros para a CPI da Covid erra nas duas propostas que traz para combater a desinformação nas plataformas digitais. Primeiro, porque cria um crime com pena de dois anos para quem divulgar notícia  falsa, ameaçando todo mundo em vez de focar na indústria das fake news. Segundo, porque tenta definir “notícia falsa”, um conceito extremamente subjetivo e que abrirá margem para arbitrariedades da Justiça. O problema é tão grande que nem o  PL das Fake News  propôs uma definição para o termo, entendendo que o combate à prática passa por outros caminhos”.

A pesquisadora ainda aponta que as propostas alteram o Marco Civil da Internet sem debater com a sociedade, alterando regras sobre guarda e uso de dados pessoais e sobre liberdade de expressão nas redes sociais. “A CPI faria melhor se remetesse as propostas para o GT-Net, presidido na Câmara pela deputada Bruna Furlan, onde uma dezena de parlamentares está há um ano discutindo a fundo o tema do enfrentamento às fake news”.

Referências:

Relatório da CPI da Pandemia. https://legis.senado.leg.br/comissoes/mnas?codcol=2441&tp=4 Acesso em: 21/10/2021.

Bereia.

https://coletivobereia.com.br/?s=filipe+martins Acesso em: 21/10/2021.

https://coletivobereia.com.br/?s=bia+kicis Acesso em: 21/10/2021.

https://coletivobereia.com.br/?s=onyx+lorenzoni Acesso em: 21/10/2021.

https://coletivobereia.com.br/?s=bernardo+kuster Acesso em: 21/10/2021.

https://coletivobereia.com.br/varios-canais-e-perfis-bloqueados-pela-justica-por-veicularem-fake-news-tem-identidade-religiosa/. Acesso em: 21/10/2021.

G1.

https://g1.globo.com/politica/cpi-da-covid/noticia/2021/10/19/cpi-identifica-organizacao-com-sete-nucleos-para-disseminar-fake-news-sobre-covid.ghtml Acesso em: 21/10/2021.

https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/10/21/moraes-determina-prisao-preventiva-de-blogueiro-bolsonarista-e-pede-que-ministerio-inicie-extradicao.ghtml. Acesso em: 22/10/2021.

Nexo Jornal. 

https://www.nexojornal.com.br/expresso/2021/10/19/O-que-voc%C3%AA-precisa-saber-sobre-a-fase-final-da-CPI-da-Covid Acesso em: 21/10/2021.

https://www.nexojornal.com.br/expresso/2021/10/20/O-que-h%C3%A1-no-relat%C3%B3rio-testado-e-ajustado-pela-CPI-da-Covid. Acesso em: 21/10/2021.

Desinformante. https://desinformante.com.br/o-que-mais-diz-o-capitulo-sobre-fake-news-do-relatorio-da-cpi-da-pandemia/. Acesso em: 21/10/2021.

Twitter. https://twitter.com/BiaBarbosa2020/status/1450601932884688905?t=NU48HUFUJrtBQrQ_YXOz1g&s=19 Acesso em: 21/10/2021.

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Foto de capa: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Prisão de mulher no Canadá por passaporte de vacinação é retirada de contexto

Circula nas mídias sociais um vídeo no qual uma mulher é presa em um restaurante no Canadá, na frente dos filhos. Na descrição é informado que a mulher teria sido presa por desrespeitar as normas de segurança sanitária do país, ao não apresentar o passaporte de vacinação exigido. 

O vídeo ganhou destaque nas mídias sociais dos irmãos Bolsonaro e, também, da  deputada federal Bia Kicis (PSL/DF). 

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Descrição gerada automaticamente
Imagem: reprodução do Twitter
Imagem: reprodução do Twitter

Até a conclusão desta matéria, os posts realizados pelos irmãos Bolsonaro somavam 3.1 mil compartilhamentos, 10.4 mil curtidas, 1.5 mil comentários e 108 mil visualizações. Já a postagem do mesmo vídeo nas redes da deputada, alcançaram 12.4 mil curtidas, 3.271 compartilhamentos, 439 comentários e também ultrapassado as 100 mil visualizações. 

Novas regras no Canadá

No vídeo oficial completo, postado por Josh Dawson, marido de Sara Dawson, no Facebook, ele afirma que ambos não poderiam ser retirados do local por este ser um espaço público e por eles terem pagado para estar ali. Os policiais explicam à mulher a necessidade de ela apresentar o passaporte de vacinação e deixam claro as consequências do contrário. Tudo é feito de forma respeitosa e pacíficamemte, mas esse trecho foi retirado do vídeo compartilhado nas redes dos parlamentares.

Dawson diz ao policial que ele estaria infringindo a lei, e afirma que o agente de polícia não pode impedi-lo de participar de uma atividade pública. Contudo, essa informação encontra-se fora de contexto. Desde o dia 22 de setembro deste ano, a província de Ontário, no sul do Canadá, exige a apresentação do passaporte de vacinação completo para a entrada em locais não essenciais, como bares, restaurantes, cinemas, teatros e entre outros.

Durante toda a situação, o policial que deu voz de prisão à Sara Dawson, lembra o marido de ter pedido que eles se retirassem do local. Josh Dawson, também pai das crianças que choram no vídeo, não presta qualquer assistência a elas durante a situação ou busca acalmá-las. O grupo que também grava o ocorrido, se manifestou dizendo “estamos no Canadá e não na Alemanha”, como uma alusão ao nazismo. 

A medida aplicada no estado de Ontário ainda não vale em ordem federal no Canadá. O país, por não ter um sistema de saúde unificado, encontra dificuldades para estabelecer um passaporte de vacinação único, digital e à prova de fraude. Entretanto as medidas aplicadas na província são as mesmas já exigidas na Europa, Estados Unidos e em algumas cidades brasileiras. 

No perfil da deputada, a mentira é um prato cheio

Esta não é a primeira vez que o perfil de Bia Kicis é acusado de veicular desinformação. Ao longo de toda a pandemia de Covid-19 no Brasil, a deputada compartilhou em suas redes sociais notícias comprovadamente falsas, distorcidas ou retiradas de contexto sobre o combate ao vírus. Dentre os compartilhamentos, estavam presentes afirmações referentes à não eficácia das máscaras faciais no combate à pandemia, a ponto de se tornar autora do Projeto de Lei 4.650/20, no qual retira a obrigatoriedade do uso de máscaras no país, mesmo que a ação não fosse indicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), na época.

Além disso, em 2020, Kicis foi classificada como a quarta deputada bolsonarista com maior veiculação de desinformação em suas mídias sociais, ficando atrás apenas de Osmar Terra (MDB/RS), Eduardo Bolsonaro (PSL/SP) e Carla Zambelli (PSL/SP), respectivamente, em um levantamento realizado pela agência de checagem Aos Fatos

O envolvimento da deputada com desinformação foi tão expressivo em 2020, que Kicis tornou-se alvo do inquérito sobre fake News no Supremo Tribunal Federal. Os conteúdos compartilhados em sua rede eram produzidos por agências de mídias sociais de fachada, financiadas com dinheiro público. 

Em 2019, Kicis também compartilhou um vídeo publicado pela rede do presidente da República, Jair Bolsonaro, no qual vinculava a figura do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva às FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Horas após o compartilhamento, a parlamentar excluiu a postagem das mídias e declarou: “removi assim que fui informada de que seria fake. Postei porque recebi de uma fonte muito respeitável e acreditei que fosse real. Removi porque não compactuo com a mentira, valeu? A gente pode se enganar mas não pode perder a integridade”.

Em 2018, em uma entrevista cedida ao programa televisivo CB.Poder, Bia Kicis mentiu a respeito de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente da República, e distorceu declarações dadas pelo então Secretário de Educação do Distrito Federal Rafael Parente. 

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Bereia classifica como enganosas as postagens nas mídias sociais dos irmãos Bolsonaro e Bia Kicis sobre uma intervenção violenta de policiais na prisão de uma mulher na frente de seus filhos. O vídeo apresentado pelos deputados e senadores é verdadeiro mas não é divulgado na íntegra, comprometendo o sentido de toda a informação para criar oposição às medidas de prevenção contra a covid-19 que envolvem a vacinação. 

Referências:

CBC. https://www.cbc.ca/news/canada/toronto/covid-19-ontario-vaccine-passport-proof-vaccination-1.6182533. Acesso em: 14/10/21.

Politico. https://www.politico.com/news/2021/10/07/canada-vaccine-passport-tbd-515645. Acesso em 14/10/21

Câmara dos Deputados. https://www.camara.leg.br/noticias/694589-projeto-desobriga-o-uso-de-mascara-para-combate-a-pandemia-de-covid-19/. Acesso em: 14/10/21.

UOL. https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/bbc/2020/06/06/coronavirus-por-que-oms-agora-recomenda-uso-de-mascara-em-publico-contra-covid-19.htm. Acesso em: 14/10/21.

Aos Fatos. https://www.aosfatos.org/noticias/deputados-governistas-lideram-desinformacao-sobre-covid-19-entre-parlamentares-no-twitter/. Acesso em: 14/10/21.

Agência Pública. https://apublica.org/2020/06/investigada-por-fake-news-kicis-contratou-servicos-de-midias-sociais-de-apoiadores-do-governo/?amp. Acesso em 14/10/21.

UOL. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/10/26/bolsonaro-farc-video-fake-daniel-silveira-bia-kicis-lula-pt-colombia.htm. Acesso em: 14/10/21.

Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/holofote/2019/01/10/interna-holofote,730130/fizemos-a-checagem-da-entrevista-da-deputada-bia-kicis-ao-cb-poder.shtml. Acesso em: 14/10/21.

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Imagem de capa: reprodução do Facebook

Deputada Bia Kicis classifica parlamentar da Alemanha em visita ao Brasil como conservadora

* Matéria atualizada em 02 de agosto de 2021 às 19:31 para acréscimo de informações.

Em postagem em mídias sociais em 22 de julho de 2021, a deputada federal Bia Kicis (PSL/DF), que integra a Bancada Católica no Congresso Nacional, divulgou reunião, em Brasília,com a deputada do Partido Alternativa para Alemanha Beatrix von Storch. Bia Kicis apresentou a alemã como integrante “do maior partido conservador daquele país” e completou em português e inglês: “Conservadores do mundo se unindo p/ defender valores cristãos e a família”.

Reprodução do Twitter

Depois da reação crítica nas mídias sociais que denuncia ser Beatrix von Storch, liderança da extrema direita alemã, de um partido de tendência neonazista, Bia Kicis publicou: “A deputada Beatrix von Storch é uma parlamentar conservadora,que denuncia política de imigração na Alemanha e ataques às liberdades individuais,como a liberdade de expressão.Nada desabona sua conduta,por tudo que pesquisei.É a mesma narrativa contra conservadores aqui e no mundo”.

Reprodução do Twitter

O Partido Alternativa para Alemanha

O Partido Alternativa para Alemanha, em alemão Alternative für Deutschland, sigla AfD, foi fundado em fevereiro de 2013. No site Deutschland.de, com informações oficiais sobre a República da Alemanha,  o AfD é classificado como um partido populista de direita, que defende a saída da Alemanha da União Europeia e a abolição da moeda Euro. Grande parcela do AfD rejeita políticas de imigração, assim como as medidas de proteção climática. De acordo com o AfD, a mudança climática não é causada pelo ser humano, contrariamente aos resultados de pesquisas científicas.

O Deustschland.de informa também que o AfD está sendo investigado pelo Departamento Federal de Proteção da Constituição como suspeito de ser extremista de direita. Lideranças do partido estão sendo monitoradas para registros de opiniões anticonstitucionais e extremistas de direita. O Departamento estima que pelo menos 20% dos membros do partido podem ser classificados neste grupo. O partido está representado em todos os parlamentos estaduais e no Parlamento Federal.

O Museu do Holocausto, inaugurado em Curitiba, em 2011, para a conservação da memória do genocídio judeu pela Alemanha no período do Nazismo, no século 20, publicou, em suas mídias sociais, reação ao encontro divulgado por Bia Kicis. O Museu do Holocausto informa que o Alternativa para a Alemanha foi fundado em 2013, com tendências racistas, sexistas, islamofóbicas, antissemitas, xenófobas e forte discurso anti-imigração.

Entre várias informações, o Museu do Holocausto mostra que a deputada que se encontrou com Bia Kicis, Beatrix von Storch, é “vice-líder do partido, famosa por tweets xenofóbicos e neta de Lutz Graf Schwerin von Krosigk, ministro nazista das Finanças e um dos poucos membros do gabinete do Terceiro Reich a servir continuamente desde a nomeação de Hitler como chanceler”. A postagem esclarece que “após os suicídios de Hitler e de Goebbels, von Krosigk (…) serviu como Ministro Principal e das Relações Exteriores durante um curto período, na pequena porção da Alemanha que estava encolhendo progressivamente devido ao rápido avanço das forças aliadas”.

Ao final da postagem, a organização judaico-brasileira afirma: “É evidente a preocupação e a inquietude que esta aproximação entre tal figura parlamentar brasileira e Beatrix von Storch representam para os esforços de construção de uma memória coletiva do Holocausto no Brasil e para nossa própria democracia”.

O perfil Judeus pela Democracia também publicou nota assinada por diversos coletivos a respeito do encontro, lamentando o alinhamento do governo atual com “movimentos supremacistas e nazistas”.

Extremismo na agenda bolsonarista

A parlamentar alemã também se reuniu com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL/SP), da Bancada Evangélica no Congresso Nacional, como ele mesmo registrou em seus perfis de mídias sociais.

Reprodução do Twitter

O presidente Jair Bolsonaro também se encontrou, fora da agenda oficial, com a deputada Beatrix von Storch. O encontro ocorreu no Palácio do Planalto, em Brasília, mas não foi incluído na agenda. A reunião só se tornou pública quando a parlamentar alemã divulgou fotos com Bolsonaro na segunda, 26 de julho.

Na postagem, a deputada agradeceu a recepção de Bolsonaro e declarou-se impressionada pelo presidente compreender os problemas da Europa e os desafios políticos atuais. Ela defendeu “a união dos conservadores para combater a ideologia dos grupos de esquerda”.

Von Storch também se encontrou com o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marcos Pontes, compromisso que estava na agenda pública do titular da pasta, e a pauta anunciada foi “energias renováveis e mudanças climáticas”. O Secretário Especial de Cultura, Mario Frias, foi outro membro do governo a receber a deputada alemã, por intermédio do deputado estadual Gil Diniz (sem partido-SP), cuja pauta divulgada foi “big techs”.

O reconhecido jornalista especializado em coberturas internacionais Jamil Chade publicou matéria sobre esta visita no jornal El País, em 23 de julho, na qual afirma que esta não foi a primeira demonstração de proximidade da base de Bolsonaro com grupos extremistas. Em 2019, o mesmo deputado Eduardo Bolsonaro esteve na Hungria em visita ao notório extremista de direita do partido Fidesz, primeiro-ministro Viktor Orbán. Chade explica que analistas identificam coincidências entre a agenda internacional de Bolsonaro e suas ações no Brasil (na luta contra perseguição sofrida por cristãos no mundo, a defesa da “família tradicional” e a necessidade de proteger a “soberania”). Há muitas semelhanças desta pauta em relação aos projetos que, ao longo de anos, foram implementados por Viktor Orbán, que controla, na Hungria, a Corte Constitucional (equivalente ao STF), o Ministério Público e dois terços do Parlamento, além da imprensa, clubes de futebol, as artes, os espaços públicos e universidades.

No ano passado, Eduardo Bolsonaro realizou uma live com o líder do partido de extrema-direita da Espanha, o Vox, Santiago Abascal. O AfD, o Vox e o Fidesz têm em comum, explica Chade: a busca por pautas conservadoras radicais, a xenofobia, a hostilização à esquerda e à imprensa.

Jamil Chade afirma ainda que “o Brasil virou terreno fértil para expandir suas ideias sob o governo Bolsonaro, que ainda traz um elemento extra: após o fim do Governo de Donald Trump nos Estados Unidos, a ofensiva ultraconservadora colocou no Brasil de Jair Bolsonaro todas as suas fichas, considerado o país com maior influência de consolidar a agenda ultraconservadora”.

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Bereia classifica a postagem da deputada Bia Kicis sobre o encontro com a parlamentar alemã do Partido Alternativa para Alemanha Beatrix von Storch como enganosa. A deputada brasileira apresenta a parlamentar como conservadora, atuando para unir “conservadores do mundo para defender valores cristãos e a família”. Como se pode verificar, o partido da parlamentar visitante está sendo investigado pelo Departamento de Proteção à Constituição da Alemanha sob a suspeita de atentar contra os valores constitucionais do país. Além disso é pública a sua plataforma nacionalista anti-imigrantes (xenófoba), contra a agenda ambiental, de hostilização de opositores.

Conservadorismo político, segundo o clássico Dicionário de Política, organizado por Norberto Bobbio, Nicola Matteucci, Gianfranco Pasquino, se refere a posições que visam à manutenção do sistema político existente e dos seus modos de funcionamento, apresentando-se como contraparte das forças inovadoras.

O que se identifica do partido alemão da visitante acolhida pelos deputados Bia Kicis e Eduardo Bolsonaro é outra postura política, o extremismo. O mesmo Dicionário a concebe como ultraconservadorismo ou extrema-direita, representada por movimentos independentes e partidos políticos com posicionamentos radicais, geralmente relacionados ao nacionalismo. A exaltação da nacionalidade acaba por levar à postura de superioridade em relação a outros grupos sociais, o que gera preconceito e xenofobia. Na história da Alemanha esta postura já foi base para o Nazismo.

Referências

Deutschland.de, https://www. /pt-br/topic/politica/a-afd-partidos-no-parlamento-federal-alemao. Acesso em 23 jul 2021

El País, https://brasil.elpais.com/internacional/2021-03-05/servico-secreto-alemao-coloca-partido-de-ultradireita-afd-sob-vigilancia-por-suspeita-de-extremismo.html Acesso em 23 jul 2021

Museu do Holocausto, https://www.museudoholocausto.org.br/o-museu/ Acesso em 23 jul 2021

Twitter, Museu do Holocausto, https://twitter.com/MuseuHolocausto/status/1418265064877043719 Acesso em 23 jul 2021

Twitter, Judeus Pela Democracia, https://twitter.com/jpdoficial1/status/1420166491434110978?s=20 Acesso em 28 jul 2021

G1, https://g1.globo.com/politica/noticia/2021/07/26/fora-da-agenda-bolsonaro-se-reune-com-deputada-de-extrema-direita-da-alemanha.ghtml. Acesso em 26 jul 2021

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, https://www.gov.br/mcti/pt-br/acesso-a-informacao/agenda-de-autoridades/agenda-ministro/2021-07-22. Acesso em 27 jul 2021

Secretaria Especial da Cultura, https://www.gov.br/turismo/pt-br/acesso-a-informacao/agenda-de-autoridades/agenda-Secretario-Especial-de-Cultura-do-Ministerio-do-Turismo/2021-07-22. Acesso em 02 ago 2021.

Flickr, https://www.flickr.com/photos/sintonizemcti/albums/72157719648427115. Acesso em 27 julho 2021.

jul El País, https://brasil.elpais.com/brasil/2021-07-22/extrema-direita-mundial-estreita-lacos-com-governo-bolsonaro-que-segue-passos-de-orban-e-trump.html?mid=DM72815&bid=655301307 Acesso em 23 jul 2021

Dicionário de Política, https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2938561/mod_resource/content/1/BOBBIO. Dicion%C3%A1rio de pol%C3%ADtica..pdf     Acesso em 23 jul 2021

Deputados governistas de bancadas evangélica e católica enganam nas mídias sociais sobre votos pelo “Fundo Eleitoral”

Divulgaram que eram contra, mas votaram a favor e continuaram dizendo ser “contra”. Esta foi a atitude de deputados federais da base governista que, na quinta-feira (15/7), votaram pela aprovação do bilionário Fundo Eleitoral que é parte Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2022.

A Câmara aprovou a matéria por 278 votos a 145, com uma abstenção, e o Senado aprovou em seguida por 40 a 33. Por conta da covid-19, as votações ocorreram separadamente, no formato semipresencial. A inserção do substitutivo do relator no orçamento para financiar campanhas nas eleições de 2022, deputado Juscelino Filho (DEM-MA), aumenta o Fundo Eleitoral de R$ 1,8 bilhão para R$ 5,7 bilhões.

Uma parcela dos deputados e senadores de partidos de diferentes correntes ideológicas manifestaram discordância à proposta que destina tantos recursos em plena crise econômica e sanitária, para campanhas eleitorais. Quem era contra o Fundão votou “não” ao texto da LDO como estava. Seguindo o protocolo, o partido Novo apresentou um destaque, votado de forma simbólica após aprovação do texto-base,que tentava retirar o Fundão da LDO. A tentativa de retirar o Fundão da Lei foi rejeitada. O projeto agora segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro.

O Fundo [Público] de Financiamento de Campanha foi criado após a proibição do financiamento privado, em 2015, pelo Supremo Tribunal Federal, após avaliação de que as doações de grandes empresas privilegiam certas candidaturas e desequilibram o pleito eleitoral. Por isso, nas eleições de 2018, foi criado o fundo de R$ 2 bilhões com recursos públicos, distribuídos proporcionalmente aos partidos.

A base governista religiosa na votação

Chamou a atenção nas mídias sociais que deputados da base governista que haviam declarado que seriam contra o popularmente denominado “Fundão”, votaram a favor do texto final da LDO que o incluía. No caso do destaque, a votação foi feita de forma simbólica, que se dá pela maioria dos deputados presentes em Plenário no momento da votação. Não é exigida a manifestação individual de todos os presentes. O presidente convida a se manifestar apenas aqueles que forem contrários à proposição em análise. Os demais devem permanecer sentados para a verificação do contraste visual entre os favoráveis e os contrários à matéria. Se necessário ou solicitado por algum parlamentar, pode ser feita a contagem dos votos. Mas não há registro nominal dos votos.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL/SP), da Bancada Evangélica, votou a favor da aprovação do texto final da LDO que incluía o Fundão. Após ser criticado nas mídias sociais, Eduardo Bolsonaro disse no Twitter que votou a favor do destaque apresentado pelo partido Novo que tentava evitar o aumento das verbas do financiamento eleitoral. “Votei sim à LDO (que engloba vários temas) e contra o fundão eleitoral (sim ao destaque)”, disse, e apresentou uma declaração de voto.

Declaração de voto (Foto: Eduardo Bolsonaro/Twitter)

Também cobrada nas mídias sociais pela incoerência, a deputada Bia Kicis (PSL/DF), da Bancada Católica, disse que apoiou o destaque do partido Novo. “Eu votei contra o aumento do Fundão e a favor da LDO. Tem gente querendo fazer confusão”, disse em vídeo publicado no Twitter. No entanto, ela não esclarece que não havia votação em separado, era um texto único com o Fundão incluído. Quem era contra o fundo bilionário para campanhas eleitorais teria que votar contra o texto da LDO.

Foto: Publicação de Bia Kicis/Twitter

Apenas com o destaque do partido Novo se poderia derrubar a inclusão do fundo bilionário no orçamento, mas Bia Kicis apenas fez referência a uma fala do líder do PSL, ao microfone do plenário, no momento dos destaques, de que o partido “orientou a votar contra o Fundão”. No entanto, o PSL votou a favor do texto integral com o Fundo Eleitoral incluído, e não atuou na votação simbólica do destaque, depois que o texto-base já havia sido aprovado. A postagem de Bia Kicis foi retuitada pelo deputado Eduardo Bolsonaro.

O deputado da Bancada Católica Carlos Jordy (PSL-RJ) usou o mesmo discurso de Bia Kicis para refutar críticas de seguidores:

Foto: Publicação de Carlos Jordy/Twitter

Bia Kicis e Carlos Jordy ainda usaram o argumento do antipetismo e anti-esquerdas, que capta seguidores governistas, ao postar nas mídias sociais que quem votou contra a aprovação da LDO, como o PT e o PSOL, quer “inviabilizar o governo”.

Fonte: Bia Kicis/Twitter

Apesar de afirmar, no vídeo que produziu, que “tem gente querendo fazer confusão”, na postagem, Bia Kicis confundiu o público ao dizer que PT e PSOL orientaram a votação “Não”, contra a LDO, porque o “PT quer o pior para o governo”.

O seu colega de partido Carlos Jordy também distorceu a informação para usar de acusações aos partidos de oposição de serem contra as políticas do governo e construiu um discurso desprovido de sentido: “Se votar contra a LDO seria votar contra o fundão, por que a OPOSIÇÃO TODA votou CONTRA, sendo que serão os maiores beneficiados com o aumento do fundo eleitoral (PT será o maior)? Porque são contra as POLÍTICAS DO GOVERNO e não contra o fundo eleitoral, q foi inserido pela CMO”.

Nestes casos, os deputados católicos publicaram a imagem com a orientação dos partidos com corte que omite de seus seguidores que outros partidos também orientaram a votação pelo “Não”: PDT, PSB, PV, Rede, PcdoB, e os partidos que não são de oposição,e que dão apoio a várias pautas do governo, Podemos e Novo.Ainda houve o caso do Cidadania que teve orientação para o “Sim”, mas se dividiu na votação. Os números podem ser conferidos no registro de votação organizado abaixo:

O deputado da Bancada Evangélica Filipe Barros (PSL-PR) usou de discurso que foi mescla entre o que Eduardo Bolsonaro postou e retuitou as postagens de Carlos Jordy.

Foto: Filipe Barros/Twitter

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Bereia avalia que os deputados da Bancada Religiosa na Câmara Federal Eduardo Bolsonaro, Bia Kicis, Carlos Jordy e Filipe Barros divulgaram conteúdo enganoso para escaparem das críticas de seguidores por terem apoiado a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2022, com a inclusão de valores triplicados para o Fundo Eleitoral na casa de 6 bilhões de reais. Além de postarem mensagens que não correspondem à votação simbólica do destaque do partido Novo, que poderia ter retirado o Fundão do texto-base da LDO, os deputados emitiram conteúdo confuso sobre o papel dos partidos de oposição no processo, omitindo que não só este grupo votou contra a LDO, mas também partidos de apoio ao governo federal. As justificativas pelo “Não”, registradas oralmente pelos votantes, abordaram a incoerência e a falta de transparência da inserção da triplicação de valores para campanha eleitoral, diminuindo itens orçamentários prioritários como saúde (em meio a pandemia que já matou mais de 540 mil pessoas) e educação, mantendo-se desvalorização do salário-mínimo em R$ 1.147,00.

Sete parlamentares já acionaram o Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo à Corte que anule as votações. Eles pretendem que qualquer aumento no fundo seja vetado até que a pandemia seja superada.

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Foto de Capa: Jefferson Rudy/Agência Senado

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Referências

Agência Brasil, https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2021-07/ldo-de-2022-preve-aumento-do-fundo-eleitoral-para-quase-r-6-bilhoes

Uol Economia, https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/07/15/veja-como-deputados-votaram-lei-de-diretrizes-orcamentarias-2022.htm

Poder 360, https://www.poder360.com.br/congresso/saiba-como-cada-partido-e-congressistas-votou-sobre-ldo-e-fundo-eleitoral/

Câmara Notícias, https://www.camara.leg.br/noticias/786049-comissao-aprova-ldo-2022-com-prioridade-para-vacinas-creches-habitacao-e-oncologia/

Veja, https://veja.abril.com.br/blog/maquiavel/deputados-recorrem-ao-stf-contra-fundo-de-r-57-bi/

Blogueiro católico Allan dos Santos mente mais uma vez ao usar drama de jogador dinamarquês contra vacina da covid-19

O blogueiro católico, criador do canal do Youtube Terça Livre, Allan dos Santos, conhecido como comunicador apoiador do governo Jair Bolsonaro, causou reação indignada nas mídias sociais neste domingo, 13 de junho. Ele usou o caso do jogador de futebol da seleção da Dinamarca Christian Eriksen, 29 anos, que sofreu um mal súbito durante jogo contra a Finlândia pela Eurocopa, no sábado, 12 de junho, para propagar desinformação sobre a vacinação contra a covid-19.

A parada cardíaca que jogou Eriksen ao chão foi assistida ao vivo pelos espectadores da partida e causou comoção por conta do demorado processo de reanimação realizado ainda no gramado sob as lentes das câmeras.  A equipe médica usou um desfibrilador para reanimar o atleta. “Ele se foi. Fizemos ressuscitação cardíaca, foi uma parada cardíaca. Quão perto estávamos? Não sei. Nós o trouxemos de volta depois de uma desfibrilação”, disse o médico da Dinamarca, Morten Boesen em entrevista coletiva horas depois, informando que o jogador permanecia no hospital para mais exames.“Os exames que foram feitos até agora parecem bons”, acrescentou o médico. “Não temos uma explicação de por que isso aconteceu.”

A mentira

Na postagem que fez no Twitter, Allan dos Santos afirma que o médico da Inter de Milão, time onde Eriksen atua, na Itália, havia confirmado em rádio daquele país que o jogador havia tomado a vacina do laboratório Pfizer contra a covid-19, em 31 de maio. Santosreproduz insinuações que emergiram nas mídias sociais depois do caso, de que o mal súbito sofrido pelo dinamarquês, que teria sido contaminado de covid-19, seria uma reação à vacina. O blogueiro católico lançou o conteúdo para alimentar grupos negacionistas e conspiratórios contra vacinas, em especial contra o processo de vacinação no enfrentamento da pandemia.

Procurado pela imprensa, o diretor da Inter de Milão Giuseppe Marotta desmentiu que Eriksen tivesse contraído covid-19 em algum momento e afirmou que ele nunca apresentou sinais de problemas de saúde.“Ele não teve Covid nem foi vacinado”, afirmou Marotta à rede de TV italianaRAI, o que desmente a informação falsa espalhada por Allan dos Santos.

Contas suspensas depois recuperadas e drible no Twitter

Allan dos Santos está sendo investigado no inquérito das fake news, instrumentos de ataques antidemocráticos contra o Supremo Tribunal Federal (STF), desde 2020, como Bereia já publicou. Ele teve sua conta oficial no Twitter retirada, em 2020, por conta do processo, mas criou um perfil alternativo, onde continua postando desinformação, a exemplo desta última do caso Eriksen.

Em fevereiro de 2021, o YouTube desativou os canais do blogueiro,por avaliar que os conteúdos veiculados não seguiam as diretrizes da plataforma, que dizem respeito a não oferecer desinformação e promoção de ódio. O recurso de Allan dos Santos na Justiça de São Paulo, com o apoio de políticos governistas, inclusive o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), obteve a reversão da desativação. Na decisão, o juiz Mathias Coltro afirma que “a remoção das contas da agravante na plataforma YouTube se mostra desproporcional, violando a garantia constitucional da liberdade de expressão e de informação”.

Notório disseminador de fake news

Em fevereiro de 2021, em mandado de busca e apreensão, a Polícia Federal encontrou na casa de Allan dos Santos, material que fazia referência à deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), governista, também destacada disseminadora de desinformação, que se tornou presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante da Câmara dos Deputados.

No material encontrado na casa do blogueiro,comprovou-se que Kicis se reunia com o ele para discutir, de forma regular, pautas para a promoção de intervenção militar no Brasil. Além disso, a deputada prestou informações inverídicas para a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito das Fake News, que atuou em 2020, e designou um assessor para acompanhar e auxiliar os organizadores do acampamento conhecido como “300 do Brasil”, que pedia o fechamento do Congresso Nacional e do STF. 

A investigação da PF aponta ainda formação de rede com empresas sediadas no exterior, suspeita de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e até de desvio de recursos públicos por meio de funcionários fantasmas (a chamada “rachadinha”).O relatório foi encaminhado à Procuradoria Geral da República (PGR) e em seguida para o ministro do STF Alexandre de Moraes, que abriu o inquérito.

Sobre o blogueiro

De origem protestante, batista, Allan Lopes dos Santos se converteu ao Catolicismo, tendo-se tornado seminarista pelo Seminário Maria Mater Ecclesiae do Brasil. Depois de formado, nos anos 2000, ingressou na Fraternidade Sacerdotal de São Pedro, tendo servido a este grupo nos Estados Unidos, onde atuou como jornalista no Portal de notícias católico Church Militant, com sede no Estado de Michigan. Depois de voltar ao Brasil, em 2014, fundou, ao lado de amigos da igreja, o portal multiplataforma “Terça Livre”,um canal de notícias que tinha como objetivo “não apenas falar com o público católico, mas com o público conservador em geral”.

Ainda durante o período no seminário, Allan dos Santos passou a estudar com o escritor e astrólogo Olavo de Carvalho. Ele se declara formado no Seminário de Filosofia de Olavo de Carvalho, um fiel seguidor do escritor considerado o guru do bolsonarismo.

Allan dos Santos deixou a batina em 2017, casou-se e é pai de três filhos.O site e o canal de vídeos Terça Livre ganharam notoriedade durante as eleições de 2018, quando, o blogueiro passou a atuar próximo à família Bolsonaro, tendo livre acesso a áreas vedadas a repórteres de jornais e revistas.

Considerado um dos líderes do esquema de divulgação de notícias falsas e de ataques a adversários do presidente Jair Bolsonaro, estimulado pelo próprio Palácio do Planalto, Allan dos Santos estaria inserido no chamado “Gabinete do Ódio”, como reconheceu o ministro do STF Alexandre de Moraes.

Neste domingo, 13 de junho, em que Allan dos Santos publicou a mentira contra vacinas, usando o drama do jogador Eriksen, o jornal O Globo publicou conteúdo exclusivo sobre mensagens de WhatsApp colhidas pela Polícia Federal ao longo do inquérito dos atos antidemocráticos. Nelas, Fabio Wajngarten, então chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom) do governo Bolsonaro, defendeu a liberação de verba publicitária da Caixa Econômica Federal para veículos de comunicação classificados por ele como “mídia aliada”.

Segundo relatório da PF, em abril de 2019 Wajngarten assumiu o comando da Secom e se aproximou de Allan dos Santos, dizendo ser um empresário de mídia “muito” próximo de executivos de emissoras de TV. Afirmou ainda que poderia aproximar o blogueiro desses veículos e que, naquela semana, já havia promovido encontros de parlamentares com a cúpula do SBT, da Band e que iria se encontrar com “bispos da Record”. Em nota, Wajngarten diz que atuação na Secom foi ‘técnica e profissional’, e emissoras negam privilégio e reafirmam isenção.

Em uma live com apoiadores do governo federal em 2020, Allan dos Santos afirmou ter deixado o Brasil. De fato, não há mandado de prisão em abertoou proibição de viajar contra o blogueiro. No entanto, muitos países estão com as fronteiras fechadas para brasileiros, em razão da pandemia de coronavírus. O Brasil é o segundo país em número de infectados e mortes no mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Apenas portadores de passaportes diplomáticos podem ingressar em nações que aplicaram o bloqueio da entrada de brasileiros. Não se sabe, portanto, se a afirmação de que o blogueiro está fora do país é verdadeira.

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Bereia classifica a postagem de Allan dos Santos sobre o mal súbito do jogador Eriksen como falsa. O blogueiro católico é notório disseminador de desinformação, por meio de conteúdos falsos e enganosos em seus veículos de mídias (Canais Terça Livre, site Terça Live e perfis em mídias sociais) e promotores de dissenso e ódio. Bereia alerta leitores e leitoras que o blogueiro é alvo de investigações da Polícia Federal por conta do inquérito do STF e os conteúdos que dissemina não devem ser curtidos ou compartilhados e precisa ser sempre tratados com desconfiança por meio de verificação.

Referências

Jornal de Brasília, https://jornaldebrasilia.com.br/torcida/eriksen-nao-teve-covid-nem-foi-vacinado-diz-diretor-da-inter-de-milao/. Acesso em 14 jun 2021.

Congresso em Foco, https://congressoemfoco.uol.com.br/justica/justica-determina-reativacao-de-canais-do-bolsonarista-allan-dos-santos/. Acesso em 14 jun 2021.

Correio Braziliense, https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/02/4904769-pf-apreende-na-casa-de-allan-dos-santos-material-referente-a-bia-kicis.html.  Acesso em 14 jun 2021.

Youtube, Terça Livre, https://www.youtube.com/watch?v=RUrhnFaxYpo&t=83s. Acesso em 14 jun 2021.

Supremo Tribunal Federal, http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/mandado27maio.pdf. Acesso em 14 jun 2021.

O Globo, https://oglobo.globo.com/brasil/exclusivo-dialogos-de-inquerito-da-pf-mostram-que-secom-privilegiou-midia-aliada-25059119. Acesso em 14 jun 2021.

Correio Braziliense, https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/07/31/interna_politica,877154/investigado-no-stf-allan-dos-santos-diz-que-deixou-o-brasil.shtml Acesso 14 jun 2021.

Unicef é contra pornografia para crianças: portais desinformam com interpretação distorcida de estudo do organismo

No último sábado, 5 de junho,o portal gospel Pleno News publicou notícia com o título “UNICEF sugere que pornografia pode ser positiva para crianças”. Nos últimos dias, a informação foi replicada por sites como ContraFatos, AcessePolítica, O Nortão e Gospel Prime. O conteúdo também circulou pelo aplicativo de mensagens WhatsApp em grupos religiosos.

Imagem: Reprodução da matéria publicada pelo Pleno News em 05/06/2021

A notícia foi replicada por políticos, como os deputados federais Marco Feliciano e Bia Kicis:

Postagem do pastor e deputado Marco Feliciano
Postagem da deputada federal Bia Kicis

A informação foi desmentida pelo próprio Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em nota pública no site e em suas mídias sociais.

O Unicef explicou que  o relatório “Ferramentas de garantia da era digital e direitos das crianças online em todo o mundo” discute como melhorar a proteção das crianças na internet e apresenta os numerosos riscos e danos associados ao acesso das crianças à pornografia e a outros conteúdos nocivos online. “A posição do UNICEF é clara: nenhuma criança deve ser exposta a conteúdo nocivo, online ou offline”, informa o comunicado.

Em virtude dessa desinformação em relação aos resultados do estudo, o Unicef o retirou do ar para revisão e ajustes necessários.       

O relatório mencionado na matéria do Pleno News só se encontra disponível no momento no site do Centro da Família e Direitos Humanos (C-Fam, no original em inglês), que serviu de fonte para o portal gospel. No entanto, ao contrário do que diz a C-Fam e a notícia do Pleno News, o estudo não menciona qualquer “direito humano ao consumo de pornografia”, nem implica que o consumo de pornografia possa ser benéfico para crianças.O estudo – que estava disponível somente em inglês – não chegou a ser publicado no site do UNICEF no Brasil.

Muitos perfis em mídias sociais compartilharam a afirmação de que o UNICEF defende pornografia

O estudo original

Em seu subcapítulo sobre “Quais os riscos que ferramentas de restrição de idade ajudam a mitigar, e quais as evidências que corroboram esses riscos”, o Unicef apresenta um intertítulo denominado “Pornografia”, páginas 35 à 39. Neste trecho, o estudo afirma que:

“Há vários riscos e males que foram associados à exposição de crianças a pornografia, mas não há consenso em que grau a pornografia é prejudicial a crianças. Proeminentes críticos apontam que as pesquisas mostram como o acesso à pornografia, em tenra idade, é associado a uma saúde mental empobrecida, sexismo e objetificação, agressão sexual e outros males. A evidência sugere que algumas crianças aparentam ser prejudicadas pela exposição a pornografia por algum tempo, mas a natureza do dano e sua duração variam de caso a caso”.

Trecho de Estudo do Unicef

Pelo menos seis estudos são citados para corroborar a posição do órgão, citados em revistas científicas revisadas por pares e bem classificadas em termos de credibilidade. O trecho que é mal interpretado pelos portais, diz respeito a uma pesquisa, realizada pelo grupo European Union Kids Online, em que se avaliava as reações emocionais de crianças a pornografia. Em nenhum momento o estudo ratifica que a pornografia é boa ou ruim, mas avaliava como as crianças se sentiam ao ter contato com ela. Dessas, o maior número foi de indiferente, seguido por crianças que se sentiam mal, e por fim, crianças que alegavam ter se sentido mais alegres. Dessas, 39% eram espanholas.

Mais à frente o relatório diz: “Como discutido acima, a evidência é inconsistente, e não há consenso quanto a natureza ou extensão do mal causado pelo consumo de pornografia por crianças”. “Natureza”, em um estudo científico, se refere a perguntar “o que é afetado”. Determinar se é um mal para a psicologia, a neurofisiologia, os órgãos sexuais, comportamental, é definir sua natureza. A “extensão” é definida pelo tempo de duração – se são problemas causados por toda a vida ou que podem ser remediados. Em nenhum dos casos se propôs que a pornografia não causasse mal às crianças.

O Unicef

O Fundo das Nações Unidas para a Infância, do inglês United Nations Children’s Fund (UNICEF), foi criado em 11 de dezembro de 1946, em Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), como meio de fornecer assistência às crianças no período pós-Segunda Guerra Mundial da Europa, no Oriente Médio e na China. Tornou-se órgão permanente em 1953 e atua defendendo e protegendo os direitos das crianças e adolescentes de todo o mundo.

“O bem-estar das crianças de hoje está inseparavelmente ligado à paz do mundo de amanhã.”

Henry Labouisse, diretor executivo do UNICEF de 1965 a 1979

O Unicef está presente no Brasil desde 1950 e a atuou diretamente “na aprovação do artigo 227 da Constituição Federal e na elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente; do movimento pelo acesso universal à educação; dos programas de enfrentamento ao trabalho infantil; entre outros grandes avanços para a garantia dos direitos de meninas e meninos brasileiros”, segundo seu site.

Em 7 de junho passado o Unicef declarou publicamente que a notícia do Pleno News que circulava pelos canais de WhatApp brasileiros é fake. O Unicef afirma na nota pública que “nenhuma criança deve ser exposta a conteúdo pornográfico nem a qualquer outro conteúdo nocivo online e offline”. Após as interpretações incorretas e a dissipação das fake news,o orgnaismo afirmou que retirou do ar o estudo para que ajustes fossem feitos e o artigo revisado.

O Unicef declara ainda estar  alarmado com a quantidade de conteúdos pornográficos disponíveis para crianças e reforça como a atitude é prejudicial para o desenvolvimento infantil. A nota pública indica também que o organismo trabalha para promover a segurança online das crianças e que incentiva governos, indústria de tecnologia, escolas, pais e comunidades a que façam tudo ao seu alcance para proteger as crianças de todos os conteúdos prejudiciais. No Brasil, o Unicefatuana proteção de meninas e meninos contra as diferentes formas de violência.

É possível saber mais sobre a atuação do Unicef no Brasil em unicef.org/brazil/protecao

Pleno News não se retrata e ainda usa desmentido da UNICEF

Em 8 de junho, o Pleno News publicou a notícia de que o Unicef retirou o estudo do ar depois da controversa interpretação errônea e ter gerado repercussão negativa. O portal afirmou também que, embora o órgão tenha classificado as notícias como fake news, decidiu retirar o estudo para revisão mantendo o tom de suspeita sobre o conteúdo.

Mais uma vez o deputado Marco Feliciano repercutiu a desinformação dizendo que a retirada do relatório do site do Unicef foi uma “vitória”:

Postagem do pastor e deputado Marco Feliciano

Diversas agências de checagem e veículos de comunicação realizaram a verificação sobre este caso que se alastrou pelas mídias sociais e classificaram a alegação em favor da pornografia no estudo como enganoso e falso, como Boatos.orgEstadão Verifica e o Portal R7 da Rede Record.

Bereia entrou em contato com o secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos Maurício Cunha para uma declaração sobre como o órgão está atuando na superação desta desinformação contra o Unicef, parceiro do governo federal. O secretário indicou que Bereia deveria entrar em contato com a assessoria de imprensa do ministério, o que foi feito. Até o fechamento dessa verificação não houve retorno. Tão longo se consiga o posicionamento governamental esta matéria será atualizada.

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Com base na apuração, o Coletivo Bereia conclui ser enganosa a notícia do Pleno News de que o UNICEF sugere que pornografia pode ser positiva para crianças. Apesar do estudo tratar do tema, as conclusões tiradas dele por meio de interpretações incorretas,e divulgadas de forma a comprometer a reputação do organismo, são tratadas de forma imprecisa. Pleno News age na linha dos veículos e grupos que disseminam desinformação para provocar pânico moral com temas sobre sexualidade e sobre a educação de crianças, gerando, assim, engajamento em suas matérias.

Bereia alerta leitores e leitoras que uma das formas de se avaliar se um conteúdo é falso ou enganoso é identificar matérias de cunho bizarro ou ausentes de sentido. No caso da publicação do Pleno News, pode-se avaliar como bizarro que um organismo da ONU, historicamente respeitado pelo trabalho dedefesa dos direitos das crianças e adolescentes, em várias frentes em todo o mundo, como o Unicef, com atuação no Brasil há 70 anos, seja acusado de sugerir que “pornografia seja positiva para crianças”. Uma afirmação fora de sentido como esta deve gerar desconfiança no primeiro acesso, a veracidade deve ser imediatamente buscada e os promotores da calúnia devem ser denunciados.

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Foto de capa: Pixabay/Reprodução

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Referências

Unicef, https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/e-fake-noticia-que-circula-no-whatsapp-e-em-sites-sobre-unicef-e-pornografia Acesso em 08 de junho de 2021

C-Fam, https://c-fam.org/friday_fax/unicef-report-says-pornography-not-always-harmful-to-children/ Acesso em 08 de junho de 2021

EU Kids Online, https://www.lse.ac.uk/media-and-communications/assets/documents/research/eu-kids-online/reports/EU-Kids-Online-2020-10Feb2020.pdf Acesso em 08 de junho de 2021

Unicef, https://www.unicef.org/brazil/sobre-o-unicef Acesso em 08 de junho de 2021


A deputada Bia Kicis e a desinformação sobre o voto impresso

No último 24 de maio, vários veículos de imprensa divulgaram a informação de que a deputada federal Bia Kicis (PSL/DF) contratou, com verba parlamentar, duas empresas de tecnologia para promover informações falsas sobre a segurança das urnas eletrônicas. De acordo com o site do Jornal O Globo, a deputada, que é autora da PEC 135/2019, que prevê a impressão do voto nas urnas eletrônicas, contratou duas empresas para ajudar na divulgação de conteúdo de sua proposta. 

A empresa Gohawk Tecnologia Da Informacao Ltda foi contratada para criar um site de cadastro de apoiadores da proposta de Kicis e recebeu em dezembro de 2020, o pagamento único de R$ 4.500 pelo serviço. Já a empresa Inovatum Soluções em Tecnologia da Informação e Eventos Ltda foi contratada em janeiro deste ano, por R$ 2 mil  por mês para gerenciar o Canal do Telegram “VotoImpressoAuditável”, criado em 07 de abril, com mais de 12.4581 inscritos, somando, até o momento, um gasto de R$12.500. 

A matéria do Globo, no entanto, afirma que o projeto proposto pela deputada quer a volta do voto impresso, o que gera uma certa confusão.  Na verdade, o projeto prevê a impressão do voto depositado na urna eletrônica e não o uso de cédulas de papel. O que está em discussão, porém, é a legalidade do uso de verba pública na contratação das empresas supracitadas. O Bereia foi conferir o conteúdo divulgado no grupo do Telegram e encontrou postagens que podem ser classificadas como desinformação, como as publicadas a seguir. 

Nesta imagem, a frase em destaque, dita pelo engenheiro Amilcar Brunazo Filho,  conhecido em mídias sociais pela defesa do voto impresso, diz que não é possível detectar fraudes no sistema atual. No entanto, de acordo com informações disponíveis no site  do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a urna eletrônica possui uma série de recursos e procedimentos de funcionamento que permitem a realização de auditorias. 

A foto foi divulgada originalmente pelo Deputado Federal Filipe Barros (PSL-PR), investigado no inquérito das fake news do STF, e repostada no Canal do Telegram da campanha.  

São inúmeras postagens que levantam suspeitas sobre a lisura do processo eleitoral, usando informações falsas para ratificar a aprovação da PEC 135/2019. Até mesmo o artigo de opinião da deputada no site Poder 360, que destaca no título: “Voto auditável é um jeito de fortalecer a urna eletrônica” desinforma, levando o leitor a entender que o sistema atual não é auditável, informação já desmentida pelo TSE e disponível no site da instituição.

O que diz a justificação do projeto de Bia Kicis

A PEC 135/2019 faz uma adição de um 12º inciso ao artigo 14º da Constituição Federal com a seguinte redação: “No processo de votação e apuração das eleições, dos plebiscitos e dos referendos, independentemente do meio empregado para o registro do voto, é obrigatória a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor, a serem depositadas, de forma automática e sem contato manual, em urnas indevassáveis, para fins de auditoria.”

A justificação elabora argumentos que discordam das razões pelas quais membros do Judiciário contestaram a implementação da impressão do voto depositado na urna eletrônica e não cédulas de papel. Em resumo, o texto descreve três tentativas mal-sucedidas de execução da ideia nos pleitos brasileiros e as decisões contrárias por parte de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Tanto na apreciação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4543, em 2013, quanto da ADI 5889, em 2020, o STF decidiu por unanimidade declarar inconstitucionais trechos de leis que previam o voto impresso. O texto da proponente da PEC contesta argumentos como o de que a impressão iria comprometer o sigilo do voto ou as possibilidades de falhas nas impressoras seriam tão graves quanto às de urnas eletrônicas sem o voto impresso.

Além disso, Kicis criticou a forma como os ministros julgaram a ADI 5889 e alegou que as dificuldades do teste do voto impresso em 2002 se deram por falta de instrução dos eleitores sobre a mudança, o que configuraria um boicote à modificação no processo eleitoral.  “O TSE, para impedir a fiscalização de seu trabalho, alegou motivos, como o alto custo da operação, para obstaculizar a implantação do voto impresso”, afirma a deputada. Ela ainda diz que propõe uma PEC porque as mudanças legislativas foram insuficientes para implementação da mudança no processo eleitoral até agora.

Como é feita a contagem de votos hoje

Em dezembro de 2020, Bereia verificou desinformação a respeito das urnas eletrônicas e explicou como funciona a contagem dos votos pelas urnas eletrônicas.  O TSE acompanha as urnas desde a fabricação pela empresa vencedora da licitação. Analistas externos são chamados para encontrar erros nos programas das urnas. Caso exista problemas, o TSE corrige e submete as máquinas a uma segunda avaliação. Em 2018, foram quatro os erros encontrados e corrigidos.

No dia das eleições, o presidente da seção eleitoral imprime a zerésima, listagem de todos os candidatos que demonstra que não há nenhum voto contabilizado antes dos eleitores escolherem seus representantes. Esse procedimento é acompanhado por mesários e fiscais dos partidos ou coligações, que devem assinar a zerésima. 

Ao fim do período de votação, é impresso o Boletim de Urna (BU), um extrato dos votos que informa também qual seção emitiu, qual urna e quantos eleitores compareceram. Três vias são anexadas à ata e encaminhada à seção eleitoral e também uma via é entregue aos fiscais dos partidos. A partir daí, os dados das urnas são codificados em dispositivos de memória e, após ter sua autenticidade verificada com uma assinatura digital, são transmitidos ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Nesse processo não é utilizada a internet.

Em 2014, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) questionou o resultado das eleições presidenciais de 2014 após seu candidato Aécio Neves perder para Dilma Rousseff (PT). O TSE autorizou o pedido de auditoria do partido, que não encontrou qualquer indício de fraude. Vale lembrar que a apuração não é secreta. Cada cidadão pode ver o resultado por zona e seção eleitoral.

Articulação no Congresso e possibilidade da impressão por amostragem

O presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) criou uma comissão especial para avaliara PEC de Bia Kicis. O relator da proposta é o deputado Filipe Barros. Enquanto parlamentares governistas como o deputado Ricardo Barros (PP-PR) veem a pauta com otimismo, outros deputados e senadores têm uma perspectiva diferente sobre o assunto.

O Deputado Federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) afirmou que o voto impresso será positivo para milícias. “Imagina em uma área onde tem milícia, como no Rio de Janeiro, onde 58% do território da cidade está na mão de milicianos, de acordo com estudos recentes. Se você passar o recado para a população que em algum lugar está anotado o seu voto, a milícia nunca mais perde uma eleição”, disse em entrevista para o Metrópoles

O professor de sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Elimar Pinheiro também se preocupa com o fortalecimento do coronelismo na política brasileira. “Quando fui fiscal eleitoral, anotei sete formas de ludibriar o resultado da eleição com o voto impresso. A mais tradicional é levar o voto já anotado para a urna e sair com uma cédula em branco, para entregar ao cabo eleitoral. Imagine isso com as periferias tomadas por traficantes e pelas milícias”, afirmou ao Correio Braziliense.

À Folha de São Paulo, o TSE levantou entraves para implementação do voto impresso no próximo pleito mesmo se aprovado no Congresso. Entre os argumentos do Tribunal estão a segurança do atual sistema, questões relativas à licitação, como a necessária rigidez do processo e a demora para implementação completa da mudança. Nesse último ponto entram questões como a quantidade de urnas demandadas – mais de 500 mil – e a complexidade do processo que vai do desenvolvimento do software ao transporte dos equipamentos. Por outro lado, alguns parlamentares defendem que o voto impresso por amostragem (em um teste é feito em locais específicos, mas não adotado em todo território nacional) possa ser chancelado pelo Tribunal para neutralizar o discurso de fraude eleitoral adotado pelo presidente JairBolsonaro.

Questionamento de Bolsonaro às eleições

Bolsonaro afirmou em março de 2020 que foi eleito em primeiro turno no pleito de 2018. O presidente alegou ter provas de que houve fraude nas votações de 7 de outubro daquele ano e prometeu apresentá-las, mas não o fez.

”E nós temos não apenas palavra, temos comprovado, brevemente quero mostrar, porque precisamos aprovar no Brasil um sistema seguro de apuração de votos. Caso contrário, passível de manipulação e de fraudes. Então acredito até que eu tive muito mais votos no segundo turno do que se poderia esperar, e ficaria bastante complicado uma fraude naquele momento”, afirmou. Ainda durante a campanha eleitoral, o então candidato à presidência já tinha dito ter sido alvo de uma fraude.

Em maio de 2020, o atual presidente do TSE ministro Luís Roberto Barroso disse que o voto impresso criaria o “caos” em um sistema que funciona bem. O ministro também disse: “A democracia é um jogo em que as regras valem para todos. Quem ganhar tem o direito de governar e quem perder tem que respeitar a vontade das urnas. Essa história de cantar a existência de fraude antes da divulgação do resultado e colocar sob suspeita um processo eleitoral que jamais identificou qualquer tipo de fraude é problemático”.

Bolsonaro reagiu ao comentário de Barroso no dia seguinte. “Se o Parlamento brasileiro, por maioria qualificada, por 3/5 da Câmara e no Senado, aprovar e promulgar, vai ter voto impresso em 2022 e ponto final. Vou nem falar mais nada, vai ter voto impresso. Porque se não tiver voto impresso é sinal de que não vai ter eleição, acho que o recado tá dado. Não sou dono da verdade, mas eu respeito o Parlamento brasileiro assim como eu respeito o artigo quinto da Constituição.”

Esta pauta não é o único envolvimento do Presidente com polêmicas relacionadas ao voto impresso. Bereia já verificou como verdadeiro que uma nota do Jornal do Brasil descrevia um esquema de cédulas falsas e citava o então candidato a deputado federal Jair Bolsonaro, nas eleições de 1994. Ainda assim, conforme verificou o Projeto Comprova, Bolsonaro não se beneficiou da fraude eleitoral daquele ano no Rio de Janeiro, visto que a Justiça Eleitoral descobriu a fraude e tais eleições foram anuladas.

Histórico de Bia Kicis com desinformação

A deputada federal possui um histórico de propagação de desinformação. Em setembro de 2020, Bereia verificou publicações que Kicis fez a respeito da covid-19 e, no mês seguinte, a parlamentar voltou a reproduzir mensagens enganosas em suas redes a respeito da vacina CoronaVac. Já em 2021, Bia Kicis voltou a fazer postagens enganosas, mas a respeito da exclusão do ex-presidente norte-americano Donald Trump do Twitter. Ela afirmou que a plataforma excluiu o republicano por conta de um vídeo em que Trump pede aos seus apoiadores que voltem para casa. Na verdade, a suspensão está relacionada ao não reconhecimento por parte de Trump de sua derrota para Joe Biden (Partido Democrata) na eleição presidencial de 2020. A deputada Bia Kicis é também parte do grupo de parlamentares investigados no inquérito das fake news do STF. 

Segundo o levantamento do Radar Aos Fatos em abril de 2020, Bia Kicis é a terceira parlamentar que mais espalhou desinformação sobre o coronavírus no Twitter, atrás apenas de Osmar Terra e de Eduardo Bolsonaro. 

Referências

O Globo, https://oglobo.globo.com/brasil/bia-kicis-usa-verba-parlamentar-para-contratar-empresa-que-divulga-desinformacao-sobre-urna-eletronica-1-25030962?utm_source=Twitter&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar. Acesso em 26 de maio de 2021.

Câmara Federal, https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2220292. Acesso em 26 de maio de 2021.

Bia Kicis, https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1807035. Acesso em 26 de maio de 2021.

Câmara Federal, https://www.camara.leg.br/cota-parlamentar/documento?nuDeputadoId=3402&numMes=12&numAno=2020&despesa=5&cnpjFornecedor=23625344000191&idDocumento=115&idDocumentoFiscal=7137203. Acesso em 26 de maio de 2021.

Câmara Federal, https://www.camara.leg.br/cota-parlamentar/documento?nuDeputadoId=3402&numMes=1&numAno=2021&despesa=5&cnpjFornecedor=15022614000141&idDocumento=1&idDocumentoFiscal=7156385. Acesso em 26 de maio de 2021.

VotoImpressoAuditável (Telegram), https://web.telegram.org/#/im?p=@votoimpressoauditavel. Acesso em 26 de maio de 2021.

TSE,https://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/perguntas-mais-frequentes-sistema-eletronico-de-votacao/rybena_pdf?file=https://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/perguntas-mais-frequentes-sistema-eletronico-de-votacao/at_download/file. Acesso em 26 de maio de 2021.

ConJur, https://www.conjur.com.br/2020-mai-30/resumo-semana-busca-apreensao-ativistas-bolsonaristas-foi-destaque. Acesso em 02 de junho de 2021.

Câmara Federal, https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2220292. Acesso em 26 de maio de 2021.

Bia Kicis (Poder 360), https://www.poder360.com.br/opiniao/eleicoes/voto-auditavel-e-um-jeito-de-fortalecer-a-urna-eletronica-escreve-bia-kicis/. Acesso em 26 de maio de 2021.

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Bia Kicis, https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1807035. Acesso em 26 de maio de 2021.

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TSE, https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2015/Novembro/plenario-do-tse-psdb-nao-encontra-fraude-nas-eleicoes-2014. Acesso em 26 de maio de 2021.

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Projeto Comprova, https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/apuracao-da-eleicao-brasileira-e-aberta-a-qualquer-pessoa-ao-contrario-do-que-afirma-post/. Acesso em 26 de maio de 2021.

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Metrópoles, https://www.metropoles.com/brasil/milicia-nao-vai-mais-perder-eleicao-diz-freixo-sobre-voto-impresso. Acesso em 1º de junho de 2021.

Correio Braziliense, https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/01/4899509-as-razoes-do-voto-impresso-especialistas-explicam-estrategia-de-quem-defende-a-mudanca.html. Acesso em 1º de junho de 2021.

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Folha de São Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/03/sem-apresentar-provas-bolsonaro-diz-que-houve-fraude-eleitoral-e-que-foi-eleito-no-1o-turno.shtml. Acesso em 1º de junho de 2021.

Folha de São Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/bolsonaro-diz-que-foi-alvo-de-fraude-e-pede-mobilizacao-a-eleitores.shtml. Acesso em 1º de junho de 2021.

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CNN Brasil, https://www.cnnbrasil.com.br/politica/2021/05/06/se-nao-tiver-voto-impresso-nao-tera-eleicao-diz-bolsonaro-a-barroso. Acesso em 1º de junho de 2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/nota-de-jornal-sobre-votos-de-cedulas-falsas-beneficiando-bolsonaro-em-1994-e-verdadeira/. Acesso em 1º de junho de 2021.

Projeto Comprova, https://politica.estadao.com.br/blogs/estadao-verifica/bolsonaro-nao-se-beneficiou-de-fraude-eleitoral-em-1994/. Acesso em 1º de junho de 2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/publicacao-de-bia-kicis-com-relato-de-syllas-valadao-contem-informacoes-enganosas/. Acesso em 1º de junho de 2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/com-anuncio-de-testes-no-pais-vacina-contra-covid-19-continua-sendo-alvo-de-desinformacao-nas-redes-sociais/. Acesso em 1º de junho de 2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/site-gospel-e-deputada-federal-propagaram-desinformacao-sobre-invasao-do-capitolio-nos-eua-em-janeiro/. Acesso em 1º de junho de 2021.Radar Aos Fatos, https://www.aosfatos.org/noticias/cotado-para-saude-osmar-terra-e-congressista-que-mais-difundiu-desinformacao-sobre-coronavirus-no-twitter/. Acesso em 2º de junho de 2021.

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Foto de Capa: Jefferson Rudy/Agência Senado (Reprodução)

Site gospel e deputada federal propagaram desinformação sobre invasão do Capitólio nos EUA em janeiro

Em janeiro passado, apoiadores do então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, invadiram o Capitólio com a intenção de bloquear a confirmação, pelos parlamentares, da vitória de Joe Biden como o novo mandatário do país.

O site Gospel Prime fez publicações sobre o ocorrido. Na primeira, Manifestantes pró-Trump invadem Congresso dos Estados Unidos, relatou a invasão e a negação do resultado das eleições pelos apoiadores de Donald Trump.

Print do site Gospel Prime

Em outra publicação, fez referência à matéria divulgada pelo site Infowars, Site aponta que Antifas podem ter se infiltrado em protesto nos EUA.

Print do site Gospel Prime

Segundo matéria do Infowars, “o jornalista investigativo Paul Sperry postou no Twitter que um ex-agente do FBI confirmou que, pelo menos, um ônibus cheio de bandidos da Antifa se infiltrou na manifestação pró-Trump”. O Antifa é um movimento de militantes que se opõe ao fascismo, composto majoritariamente por pessoas com perfil mais progressista. O site se referiu a eles como “bandidos”, atribuindo juízo de valor negativo ao grupo.

A fonte utilizada pelo Gospel Prime, o site Infowars, é conhecida nos EUA por veiculação de desinformação. Criado pelo radialista e cineasta Alex Jones, também conhecido como teórico da conspiração norte-americana de extrema-direita, as sucessivas práticas desinformativas do site provocou uma reação conjunta de Facebook, Google, Twitter e Spotify em agosto de 2018. Parte dos seus conteúdos do programa Infowars apagada dessas plataformas. De acordo com a revista Forbes, nessa mesma ação, o Twitter baniu permanentemente o seu perfil na plataforma.

O levantamento feito pelo Coletivo Bereia indica que a informação veiculada pelo Infowars e reproduzida no Brasil pelo Gospel Prime é falsa. As investigações e desdobramentos do caso da invasão do Capitólio em janeiro têm responsabilizado grupos de extrema-direita dos EUA. Um deles é Proud Boys (Garotos Orgulhosos), uma organização extremista e machista conhecida por atacar manifestantes “antifas”. Pelo menos oito réus ligados ao grupo foram acusados ​​no motim do Capitólio, um deles está preso aguardando julgamento.

Deputada desinforma sobre o tema

A deputada federal católica Bia Kicis (PSL-DF), em seu perfil no Twitter, compartilhou postagem enganosa sobre o banimento das publicações de Donald Trump no dia da invasão ao Capitólio. Segundo a parlamentar, o ex-presidente estadunidense teria publicado um vídeo pedindo que os manifestantes voltassem para casa, e o material teria sido derrubado pelo Twitter.

Print do tuíte de Bia Kicis

No entanto, o discurso de que a plataforma excluiu o conteúdo esconde o que de fato ocorreu A plataforma intimou o ex-presidente a remover o conteúdo por violar a cláusula de “pôr em dúvida o sistema eleitoral estadunidense”. Segundo as diretrizes do Twitter, quaisquer conteúdos publicados por autoridades que questionassem a validade do resultado das eleições sofreriam sanções. Parte do conteúdo do vídeo afirmava que “Não há a menor chance de Biden ter ganho”.

A postura segue a tendência de outras empresas de mídias sociais que buscam tornar o ambiente digital menos danoso às democracias. Após os escândalos da Cambridge Analytica, quando dados de estadunidenses e ingleses foram usados em estratégias de marketing direcionadas para fins eleitorais, plataformas de redes sociais como o Facebook, de Mark Zuckerberg (que inclui, dentre outros aplicativos, o Facebook, o Instagram e o WhatsApp), e o Twitter, de Jack Dorsey, têm sido cobrados para agir proativamente contra o uso indevido de dados.

Na União Europeia, o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados passou a valer em 2018, buscando responsabilizar as plataformas pelos conteúdos nelas veiculados. No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados entrou em vigência em 2020 e busca atribuir mais responsabilidade aos gestores das redes sociais.

Essa responsabilidade civil dos provedores de aplicações de internet foi debatida por Juliana Medeiros, pesquisadora de Direito Digital do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS-Rio). Ela aponta como as diretrizes internacionais prezam pela liberdade de expressão, ao mesmo tempo que têm reforçado o combate à desinformação. O jeito de garantir ambas é por meio da transparência quanto aos motivos de exclusão de um conteúdo – o que ocorreu no caso do ex-presidente.

O Coletivo Bereia classifica este conteúdo postado pela deputada Bia Kicis, como enganoso. A deputada investigada pelo Supremo Tribunal Federal como propagadora de fake news, apresenta apenas parte do conteúdo do vídeo do ex-presidente Donald Trump, omitindo as informações que vão de encontro às políticas do Twitter, levando leitores a criarem animosidade em relação às políticas da plataforma.

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Referências

G1, https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2018/08/08/como-as-teorias-da-conspiracao-de-alex-jones-levaram-infowars-a-ser-apagado-de-redes-e-virar-alvo-de-acoes-nos-eua.ghtml. Acesso em: 23 fev. 2021.

Forbes, https://forbes.com.br/colunas/2018/09/twitter-bane-permanentemente-alex-jones/. Acesso em: 27 fev. 2021.

G1, https://g1.globo.com/mundo/eleicoes-nos-eua/2020/noticia/2021/01/06/apoiadores-de-trump-protestam-contra-certificacao-da-vitoria-de-biden-pelo-congresso.ghtml. Acesso em: 27 fev. 2021.

ITS-Rio, https://itsrio.org/wp-content/uploads/2020/10/Responsabilidade-civil-dos-provedores-de-aplica%C3%A7%C3%B5es-de-internet_Juliana_Medeiros.pdf. Acesso em: 27 fev. 2021.

Com anúncio de testes no país, vacina contra Covid-19 continua sendo alvo de desinformação nas redes sociais

Mais uma vez, a deputada católica Bia Kicis (PSL/DF) desponta nas mídias sociais digitais com discursos que ratificam sua militância antagônica à obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19.

No último dia 16 de outubro, ela retuitou o post do perfil Médicos pela Liberdade, autointitulado como “grupo em prol das liberdades individuais e contra o totalitarismo disfarçado de ciência”.

Fonte: Perfil Bia Kicis no Twitter

A publicação, que parabeniza a ação do grupo, gerou 3,4 mil curtidas, 769 retuítes e 61 comentários. Já o conteúdo original, publicado no perfil Médicos pela Liberdade, angariou 6,9 mil curtidas, 2,3 mil retuítes e 190 comentários.

Fonte: Perfil Médicos pela Liberdade no Twitter

O post foi motivado após o governador de São Paulo, João Doria, no mesmo dia, se pronunciar sobre a obrigatoriedade da vacina contra a Covid-19 em todo o estado paulista, caso ela seja aprovada nos testes e tenha o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo Doria, em entrevista à Agência Brasil, apenas pessoas com atestado médico serão liberadas de receber o imunizante.

“Em São Paulo a vacinação será obrigatória, exceto para quem tenha orientação médica e atestado médico de que não pode tomar a vacina. E adotaremos medidas legais se houver contrariedade nesse sentido”, disse Doria, em entrevista coletiva em São Paulo.

O governador revelou ainda que os testes com a vacina chinesa CoronaVac deveriam ser finalizados no final da semana e os resultados desses testes deveriam ser anunciados em coletiva à imprensa na segunda-feira, 19. Contudo, matéria do UOL, publicada no dia 19 de outubro, noticiou que Doria recuou e adotou um tom mais cauteloso, dizendo que ainda não seria possível precisar quando as doses estarão disponíveis. Anteriormente, o governador Doria havia dito que a Coronavac, vacina contra o coronavírus que será produzida pelo Instituto Butantan em parceria com o laboratório chinês Sinovac, poderia começar a ser aplicada em profissionais de saúde a partir de 15 de dezembro, caso fosse aprovada em todos os testes. Contudo, durante a entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes na tarde do dia 19, ocasião do recuo de Doria, o diretor do Instituto Butantan Dimas Covas explicou que “as perspectivas são otimistas, mas não podemos dar data precisa de quando isso vai acontecer. Esperamos que até o final desse ano”.

Na ocasião da coletiva, Doria também disse que a vacina do Butantan é a que está em estágio mais avançado entre todas as que estão em produção no mundo. “Os primeiros resultados do estudo clínico comprovam que, entre todas as vacinas, a Coronavac é a mais segura e a que apresenta melhores índices e mais promissores. É, de fato, a vacina mais avançada neste momento”, declarou. O governo do estado divulgou hoje os resultados dos testes da Coronavac com nove mil voluntários no país. De acordo com Covas, a vacina teve poucos efeitos colaterais e os resultados no Brasil comprovam que a vacina é segura.

Segundo a matéria do UOL, os resultados apresentados mostraram que 35% dos voluntários apresentaram algum tipo de efeito colateral após a aplicação da vacina, sendo dor no local de aplicação a mais comum, relatada por 18% dos que receberam a dose. Não foram apresentadas reações de grau 3, que são mais graves. Apenas 0,1% dos voluntários tiveram febre. “As outras reações foram insignificantes do ponto de vista estatístico. O mais frequente foi dor de cabeça, que pode ter relação com vacina ou não. Os outros sintomas foram muito baixo”, afirmou Covas. “Portanto é a vacina mais segura não só no Brasil, mas no mundo”.

Nas mídias sociais, grupos antivacina seguem usando o espaço para dar eco a conteúdo enganoso e gerar desconfiança sobre futura campanha de vacinação. No caso do perfil Médicos pela Liberdade, a postagem mostra a resistência dos profissionais frente à suposta obrigatoriedade de vacina contra o vírus, classificado como “vírus chinês’, e ainda aponta que esta foi produzida “a toque de caixa, sem nenhum estudo a médio e longo prazo”, fato que dividiu a opinião entre os usuários e seguidores.

Entenda o movimento antivacina

Em 2019 o movimento antivacina passou a figurar na lista das dez maiores ameaças à saúde global, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) A informação consta no Repositório Institucional da Fiocruz. Segundo a organização, o movimento seria um dos fatores responsáveis pelo aumento de 300% no número de casos de sarampo no mundo todo, sendo que, a doença havia sido oficialmente erradicada no Brasil em 2016.

Desconfiança em relação às formas de imunização oferecidas pelo governo e teorias da conspiração sobre os efeitos das vacinas são elementos que sustentam o movimento antivacina pelo mundo. O fenômeno não é recente, tanto é que, a mais de um século, em 1904 ocorreu a revolta da vacina no Rio de Janeiro, movimento de motim popular que rejeitava a obrigatoriedade da vacina contra a varíola. No entanto, a comunidade médica acredita que os movimentos mais recentes e organizados foram desencadeados por um estudo publicado pelo médico britânico Andrew Wakefield na renomada revista de ciência Lancet, em 1998.

Nesse estudo, Wakefield relacionava a vacina tríplice viral, que previne contra caxumba, sarampo e rubéola, à manifestação de quadros de autismo. O médico teria examinado 12 crianças para seu artigo, das quais oito supostamente manifestaram autismo duas semanas após receberem a vacina. Segundo ele, o sistema imunológico das crianças havia sofrido uma sobrecarga com a imunização.

O estudo foi descartado após descobertas de que Wakefield, estava envolvido com advogados que queriam lucrar a partir de processos contra fabricantes de vacinas. Além disso, ele utilizou dados falsos e alterou informações sobre os pacientes.

Portanto, observa-se que dados falsos, mesmo hoje, são um dos principais argumentos utilizados pelo movimento antivacina, que relaciona não só a tríplice viral, como várias outras vacinas à manifestação do autismo.

Outro sistema de imunização que também foi e ainda é alvo de boatos e fake news é a vacina que previne contra o papilomavírus humano (HPV). Ela começou a ser distribuída em 2014 tendo como público-alvo garotas adolescentes entre nove e 14 anos e visa combater o vírus, sexualmente transmissível e causador de doenças como câncer no colo do útero. Na época em que surgiu a vacina contra o HPV, o boato circundante era o que o produto causaria paralisia, segundo matéria publicada no UOL. Contudo, tais alegações foram checadas e comprovadamente declaradas falsas por pesquisadores da área.

No que tange o combate à pandemia de Covid-19, a elaboração e distribuição de uma vacina eficaz no combate ao vírus é a principal esperança das autoridades e da população, mas, mesmo diante desse cenário de expectativa, movimentos antivacinas se fortalecem a partir das incertezas e inseguranças fomentadas pela pandemia e ganham visibilidade, fazendo circular diversos conteúdos falsos ou desinformativos, que atribuem mortes em decorrência de vacinações e substâncias tóxicas que comporiam as vacinas.

Exemplo de conteúdo enganoso sobre vacinação (Fonte: Internet)

O caminho da desinformação sobre a vacina contra o vírus

A cada novo fato sobre os testes de vacinação contra a Covid-19, um turbilhão de desinformação avança por todo o país, invadindo as redes sociais digitais e dividindo as opiniões na sociedade. Percebe-se que, para além da pandemia de uma grave e mortal doença, outra ainda mais sutil e tanto quanto perigosa vem se desenvolvendo: a onda de notícias falsas, desinformativas e enganosas.

A constatação pode ser justificada pelos números levantados pela União Pró-Vacina – UPVacina, um grupo de instituições ligadas à Universidade de São Paulo – Ribeirão Preto, cujo objetivo é esclarecer informações falsas sobre vacinas. Segundo o levantamento, houve um aumento de 383% em postagens contendo postagens com conteúdos falsos ou distorcidos envolvendo o tema, o que aponta que a desinformação quase quintuplicou em apenas dois meses.

De acordo com informações apresentadas pela UPVacina, a análise foi feita com base em postagens dos dois principais grupos antivacina brasileiros no Facebook, os quais já haviam sido objeto de outro estudo da entidade em março. Entre os dias 1º de maio e 31 de julho, foram identificadas no total 155 postagens ligadas à vacina em desenvolvimento contra a covid-19. O volume de interações chama a atenção: foram 3.282 reações, 1.141 comentários e 1.505 compartilhamentos.

A rapidez com que o número de postagens cresce no decorrer do tempo impressiona. Durante todo o mês de maio, apenas 18 postagens abordavam assuntos ligados à vacina contra a covid-19. Em junho, elas chegaram a 50 e, em julho, a 87.

Fonte: União Pró-Vacina

A análise, apresentada no mês de agosto, também levou em conta os números por períodos. Assim, percebeu-se que em dois há uma frequência maior na disseminação de conteúdo falso: entre 11 e 20 de junho e entre 21 e 31 de julho. Os picos coincidem com informações bastante difundidas pela imprensa e ligadas à temática. Entre elas estão o anúncio da parceria entre o Instituto Butantan e o laboratório chinês Sinovac Life Science para a produção de uma vacina contra a covid-19; o início dos testes dessa vacina no País; e os primeiros testes, no Brasil, de outra vacina para combater a doença, desenvolvida pela Universidade de Oxford.

Assim como na análise anterior da UPVacina nos mesmos grupos, há um pequeno número de pessoas produzindo a maior quantidade das postagens. De acordo com a pesquisa, 56 autores foram responsáveis por todas as 155 postagens. Cinquenta deles publicaram 52% (81) do total e os outros seis, 48% (74).

Os resultados apontaram também que a grande maioria das postagens gira em torno de possíveis perigos e ineficácia das vacinas (24,52%), além de uma variada gama de teorias da conspiração (27,10%). Contudo, outras temáticas também se destacam pelo grau de desinformação que trazem. Uma delas já era bastante citada pelos grupos antivacina: a de que vacinas podem alterar o DNA dos seres humanos, que aparece em 14,84% das postagens.

Até mesmo o empresário americano Bill Gates, um dos fundadores da Microsoft, está sendo alvo de grupos antivacina, segundo dados da pesquisa da UPVacina. No rol das notícias enganosas, que aparece em 14,19% das postagens, está a informação enganosa de que ele também fomenta pesquisas e o desenvolvimento de vacinas, patrocinando estudos por meio da Fundação Bill and Melinda Gates. As postagens geralmente associam essa atividade a um possível controle populacional realizado a partir das vacinas ou até mesmo a teorias da conspiração envolvendo o controle da mente humana usando chips implantados com a aplicação dos imunizantes.


Fonte: União Pró-Vacina

De acordo com a análise de UPVacina, um dos vídeos com informações falsas e alarmistas sobre as vacinas, que apresentou maior engajamento entre os usuários, foi produzido pelo jornalista e servidor público da Câmara dos Deputados, Cláudio Lessa, que ganhou destaque pela publicação no site Jornal da Cidade Online, citado na CPMI das Fake News, e pelo compartilhamento na página da deputada Bia Kicis (PSL-SP), investigada em inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo financiamento de notícias falsas.

Fonte: YouTube

No vídeo, Lessa afirma que vacinas modificam o DNA do ser humano e contêm “nanopartículas de controle social” – argumentos recorrentes entre grupos antivacina e que têm tido maior alcance devido ao alto volume de buscas pelas vacinas em fase de testes. O servidor ainda se refere à vacina como “lixo que está sendo produzido” contra a “peste chinesa” e, sem citar quaisquer referências e atribuindo as afirmações a “opiniões” de “várias pessoas”, apresenta informações falsas sobre a imunização. Na ocasião, agências de checagem de informações, como Projeto Comprova, Agência Lupa e Aos Fatos classificaram as alegações do vídeo como falsas.

De acordo com matéria publicada na Carta Capital em 08 de outubro, Lessa consta como Analista Legislativo da Câmara dos Deputados e, segundo o Portal de Transparência da Câmara, ganha mais de 34 mil reais mensalmente como salário bruto. Ele chegou à Casa por indicação política do ex-deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), que atualmente cumpre pena domiciliar por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Já a deputada católica Bia Kicis Kicis recebe mais de 33 mil reais como deputada federal.

Carta Capital traz ainda outros números importantes para se entender a dimensão da questão. As publicações no site e na página de Kicis, juntas, tiveram 232,3 mil interações, entre curtidas, comentários e compartilhamentos no Facebook, sendo feitas respectivamente em 24 e 25 de setembro, segundo a análise da UPVacina. Os estudos mostraram também que o post e a matéria foram compartilhados por 79,7 mil usuários, enquanto as outras sete notícias provenientes de sites jornalísticos com maior engajamento no mesmo mês, como Carta Capital, G1 e Folha de S. Paulo, tiveram 79,6 mil compartilhamentos em conjunto.

Seguindo a mesma proposição de checagem, em setembro, o Coletivo Bereia verificou dois vídeos que viralizaram em mídias sociais no referido mês, especialmente no WhatsApp . O primeiro apresenta um suposto médico que fala contra a testagem e vacinação em massa, pois segundo ele são um projeto de redução da população mundial. O segundo vídeo trata da aferição de temperatura na testa, que supostamente atinge a chamada glândula pineal e pode prejudicar o funcionamento do corpo. Ambos foram categorizados como falsos, baseados em teorias da conspiração com fundo religioso, mas que não se comprovam com dados científicos. Este tipo de conteúdo tem sido disseminado em mídias sociais para causar pânico, alimentar a relativização da gravidade da pandemia de coronavírus e diminuir o engajamento nas medidas preventivas, podendo causar prejuízos graves à população.

No caso da nova postagem checada, que trata sobre a total resistência do grupo Médicos pela Liberdade à vacinação contra a Covid-19, chancelada pela deputada Bia Kicis, o Coletivo Bereia a categoriza como enganosa. O conteúdo traz o rótulo de“vírus chinês” para o coronavírus, tipificação descartada por organismos internacionais e descabida para qualquer organização reconhecida. Apresenta também, a afirmação de que a vacina teria sido produzida “a toque de caixa”, argumento falso, uma vez que as instituições de pesquisa seguem os protocolos internacionais no tocante a processos e prazos. Da mesma forma, dizem que não foi oferecido estudo a médio e longo prazo, argumento que, por si só, não aponta qualquer informação precisa e devidamente apurada.

É importante ressaltar que no dia 21 de outubro, o presidente em exercício, Jair Bolsonaro, causou polêmica no Twitter ao afirmar que o governo só irá disponibilizar a vacina se comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela ANVISA, ratificando que não é possível justificar um aporte financeiro bilionário em um medicamento que “sequer ultrapassou sua fase de testagem”. Tal proposição adiciona mais um fator desinformativo que circula nas mídias envolvendo o desenvolvimento da vacina contra a Covid-19 no Brasil.

Fonte: Twitter/Reprodução

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Foto de Capa: Youtube/Reprodução

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Referências de checagem

Covid-19: vacina será obrigatória em SP quando estiver disponível. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-10/covid-19-vacina-sera-obrigatoria-em-sp-quando-estiver-disponivel Acesso: 19 de outubro de 2020.

Notícia falsa associa vacina da Covid a ‘nanopartículas de controle social’. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/saude/vacina-da-covid-19-noticia-falsa-e-a-mais-vista-sobre-o-tema-no-facebook-em-setembro/ Acesso: 19 de outubro de 2020.

Vídeos falsos alegam vacinação e medição de temperatura como forma de controle da população https://coletivobereia.com.br/videos-falsos-alegam-vacinacao-e-medicao-de-temperatura-como-forma-de-controle-da-populacao/ Acesso em 20 de outubro de 2020.

“Entenda o que é o movimento antivacina” Guia do Estudante, Disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br/atualidades/entenda-o-que-e-o-movimento-antivacina/ Acesso em 20 de outubro de 2020

“O movimento antivacina e suas ameaças”. Disponível em: https://periodicos.fiocruz.br/pt-br/content/sarampo-o-movimento-antivacinas-e-suas-amea%C3%A7as Acesso em 20 de outubro de 2020

“Universo antivacinas se expande em plena Pandemia e aumenta desinformação”. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2020/06/25/universo-antivacina-se-expande-em-plena-pandemia-e-aumenta-desinformacao.amp.htm#aoh=16032411954849&referrer=https%3A%2F%2Fwww.google.com&amp_tf=Fonte%3A%20%251%24s Acesso em: 20 de outubro de 2020

“Vacina de HPV pode causar paralisia”. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/confere/ultimas-noticias/2017/12/06/vacina-de-hpv-pode-causar-paralisia-ela-pode-passar-o-virus.htm. Acesso em: 20 de outubro de 2020

“Movimento antivacina: como surgiu e quais consequências ele pode trazer”. Disponível em: https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/movimento-antivacina-como-surgiu-e-quais-consequencias-ele-pode-trazer/. Acesso em 20 de outubro de 2020

“Movimento antivacina e suas ameaças”. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/33659. Acesso em 26 de outubro de 2020.

União Pró-vacina. Disponível em: https://sites.usp.br/iearp/uniao-pro-vacina/. Acesso em 11 de outubro de 2020.

“Nota do Gabinete do Ministro Alexandre de Moraes”. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=444198&ori=1. Acesso em 26 de outubro.

Deputada católica Bia Kicis continua a publicar desinformação sobre covid-19

No dia 16 de agosto, a deputada federal católica Bia Kicis (PSL/DF) divulgou em sua página no Twitter uma postagem contendo relato do político evangélico Syllas Valadão (PSL/MG). Acompanhando a publicação em que Syllas Valadão descreve o falecimento de uma tia, de 84 anos, diagnosticada com Covid-19, apesar da causa da morte supostamente ter sido problemas pulmonares, a legenda do post de Bia Kicis salientou: “Esse tipo de relato preocupa. Conheço o Syllas Valadão, é uma pessoa real que conta a história da morte de sua tia de 84 anos, e as razões pelas quais muitas famílias acabam sendo induzidas a aceitarem um atestado de óbito de covid mesmo quando não corresponde de à realidade”.

Até a data de apuração da presente matéria, o tuíte contabilizava 93 comentários, 671 retuítes e 1.900 curtidas. De acordo com o relato compartilhado pela deputada federal, as prefeituras arcariam com o gasto de sepultamentos em casos de morte pela Covid-19, o que geraria interesse econômico das famílias das vítimas para constatação da doença em atestado de óbito.

Desde a instauração da pandemia no país, foram refutadas, por meio de agências de checagens, as alegações de que os estados e municípios recebem dinheiro do governo federal a cada notificação de morte por Covid-19. Nas mídias digitais, circularam desinformações segundo as quais os governadores estariam então superestimando o número de óbitos. À agência Aos Fatos, o Ministério da Saúde informou que não faz qualquer repasse em função do volume de mortes pelo novo coronavírus. Os recursos da União para estados e municípios são divididos com base em critérios como o tamanho da população e a complexidade do serviço prestado.

Ainda segundo o suposto relato de Syllas Valadão, postado por Bia Kicis, isso teria se tornado uma prática nos hospitais, e os próprios médicos se ofereceriam para colocar o Covid-19 como a causa da morte para que as famílias economizassem com o sepultamento.

O relato colocou em xeque os números evidenciados pela doença. “Então, não tivemos 100 mil mortes por covid no Brasil. Nem a metade disso. Tivemos sim, milhares de pessoas que economizaram no sepultamento. É o velho jeitinho brasileiro. O pobre ganha, o hospital ganha, a funerária ganha. É o cenário perfeito para formar uma quadrilha”, finaliza o depoimento.

Na mesma data, em seu perfil no Facebook, Syllas Valadão chegou a postar a arte contendo o relato, produzida por Bia Kicis.

Entenda a polêmica que envolve Bia Kicis e a disseminação de fake news

Em 22 de julho, Bia Kicis foi retirada da vice-liderança do governo na Câmara dos Deputados pelo presidente Jair Bolsonaro. A decisão foi publicada em edição extraordinária do Diário Oficial da União (DOU). De acordo com matéria publicada pelo jornal “O Tempo”, a decisão do presidente Jair Bolsonaro se deu após Kicis e outros seis deputados votarem contra a PEC que tornou o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) permanente. Foram 499 a favor. Sobre a polêmica acerca do voto, a parlamentar afirmou à jornalista Natuza Nery, do canal GloboNews, que agiu conforme sua consciência.

“Eu votei de acordo com a minha consciência. Aliás, eu segui o exemplo do presidente Jair Bolsonaro que, quando foi parlamentar, só votou de acordo com a confiança dele. Para mim, ele é um modelo e continua sendo um modelo”.

Bia Kicis integra a ala bolsonarista mais próxima do Planalto. Com frequência, defende as pautas do governo e manifesta apoio ao presidente, seja em atos públicos, seja nas redes sociais digitais.

Ela faz parte do grupo de parlamentares incluídos no inquérito que apura a organização e financiamento de atos antidemocráticos, que está no Supremo Tribunal Federal (STF). Houve, até mesmo, quebra de sigilo bancário dela e de outros nove deputados. Bia Kicis também é alvo no inquérito das fake news, que investiga ataques contra ministros do Supremo, bem como informações falsas a respeito dos magistrados.

De acordo com o levantamento do Radar Aos Fatos – um monitor de desinformação em tempo real –, Bia Kicis é a terceira congressista que mais disseminou notícias falsas sobre o novo coronavírus, atrás apenas dos deputados Osmar Terra (MDB-RS) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

A análise considerou os 1.500 tuítes sobre o assunto com mais interações (retuítes e curtidas) publicados por membros da Câmara dos Deputados e do Senado (incluindo suplentes e licenciados) entre 20 de fevereiro e 8 de abril. No total, foram encontradas 159 postagens com desinformação veiculadas por 22 parlamentares e que somavam cerca de 1,58 milhão de interações no período.

Fonte: Aos Fatos

Em março, ela relatou em suas redes sociais digitais sobre um porteiro que morreu em um acidente, mas em seu atestado de óbito a causa da morte tinha sido atribuída à Covid-19. A notícia, que circulou em redes sociais digitais e em grupos de WhatsApp, junto com o suposto atestado de óbito, foi considerada como parcialmente verdadeira. Uma versão anterior desse texto informava incorretamente que ela era falsa: de fato, ele não morreu em decorrência do novo coronavírus, mas sua morte não se deu por causa de um acidente com um pneu. Segundo apontado por matéria do UOL, a Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco esclareceu que a certidão de óbito do paciente foi preenchida com erro.

Em 4 de abril, a deputada federal publicou um banner afirmando que a Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador de medicamentos nos Estados Unidos, liberou a hidroxicloroquina para ser usada em pacientes com coronavírus, chamado na peça de divulgação de “vírus chinês”.

Na ocasião, a Agência Lupa realizou a checagem e mostrou que o órgão aprovou apenas o uso emergencial de alguns produtos com sulfato de hidroxicloroquina e fosfato de cloroquina no tratamento de pacientes com Covid-19. A agência categorizou a postagem como falsa, uma vez que o FDA não havia emitido parecer final sobre o assunto: a autorização seria temporária e para situações específicas.

Fumo, obesidade e Covid-19

Segundo a explicação do Instituto Nacional de Câncer (Inca):

“O tabaco causa diferentes tipos de inflamação e prejudica os mecanismos de defesa do organismo. Por esses motivos, os fumantes têm maior risco de infecções por vírus, bactérias e fungos. Os fumantes são acometidos com maior frequência por infecções como sinusites, traqueobronquites, pneumonias e tuberculose. Além disso, o consumo do tabaco é a principal causa de câncer de pulmão e importante fator de risco para doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), entre outras doenças. Pelo exposto, podemos dizer que o tabagismo é fator de risco para a Covid-19. Devido a um possível comprometimento da capacidade pulmonar, o fumante possui mais chances de desenvolver sintomas graves da doença”.

Em seu Programa Nacional de Controle do Tabagismo, o Inca, em texto informativo atualizado no dia 26 de agosto de 2020, explica também:

“Os riscos do tabagismo também estão relacionados ao contágio, pois o ato de fumar proporciona constante contato dos dedos (e possivelmente de cigarros contaminados) com os lábios, aumentando a possibilidade da transmissão do vírus para a boca. O uso de produtos que envolvem compartilhamento de bocais para inalar a fumaça — como narguilé (cachimbo d´água) e dispositivos eletrônicos para fumar (cigarros eletrônicos e cigarros de tabaco aquecido) — pode facilitar a transmissão do coronavírus. Há ainda o tabagismo passivo (não fumantes que convivem com fumantes na mesma casa ou em outros ambientes), que aumenta o risco de infecções respiratórias agudas. Por esses motivos, a Organização Mundial da Saúde (OMS), o INCA e diversos órgãos da saúde, encorajam as pessoas a pararem de fumar para minimizar os riscos associados à pandemia de Covid-19, tanto para os fumantes quanto para as pessoas expostas ao fumo passivo”.

Além disso, pesquisadores franceses do Instituto Lille Pasteur examinaram 124 pessoas internadas em virtude do Sars-Cov-2 de 27 de fevereiro a 5 de abril de 2020.

“Os resultados mostraram que 47,6% eram obesas (ou seja, apresentavam índice de massa corporal, o IMC, maior que 30) e 28,2% tinham obesidade grave (IMC maior que 35). Os cientistas notaram ainda que 85 pacientes (68,6% do total) utilizaram ventilação mecânica, e a proporção foi maior entre os obesos graves (85,7%)”.

De olho nos dados, eles concluíram que a seriedade da infecção aumenta à medida que o IMC cresce. No entanto, os cientistas não se debruçaram sobre os motivos por trás dessa relação. Mas pesquisadores da Universidade de Nova York avançaram nessa questão e relataram que os casos mais graves eram aqueles com maior número de marcadores inflamatórios no corpo. Identificaram também que as lesões provocadas por essa inflamação exacerbada levaram à formação de coágulos, culminando em quadros de trombose e embolia pulmonar. Segundo o trabalho, a doença crônica com a associação mais forte a essa cascata de eventos é a obesidade.

Em entrevista ao Bereia, a médica Dolores Souza, do Rio de Janeiro, declarou que a idade avançada, o tabagismo e a obesidade podem prejudicar a saúde do ser humano, levando a maior predisposição a doenças que podem levar à morte, incluindo Covid-19.

Sendo assim, apesar de não ser possível afirmar que essa doença tenha sido a causa do óbito da tia de Syllas Valadão, a presença dessas comorbidades não exclui a possibilidade de Covid-19 como causa de óbito; mais ainda, elas aumentam o risco de mortalidade pelo coronavírus, uma vez que a infecção ocorre em um organismo com imunidade baixa.

Prefeituras e sepultamentos

Bereia não encontrou nenhuma informação a respeito de prefeituras arcarem com os custos de sepultamento de vítimas da Covid-19. O que existe é uma flexibilização para o registro do atestado de óbito. No município do Rio de Janeiro , por exemplo, o registro do atestado de óbito em cartório não precisa ser feito no mesmo dia do sepultamento Segundo matéria da Isto É, “A medida consta na resolução publicada no dia 27 de abril de 2020 pela Secretaria Municipal de Infraestrutura, Habitação e Conservação e é válida apenas durante o período da pandemia da Covid-19. O objetivo é dar mais agilidade ao serviço de enterro ou cremação”.

Syllas Valadão e fake news

Em 2018, Syllas Valadão, mineiro, primo do fundador da Igreja Batista da Lagoinha, concorreu ao cargo de deputado federal (PSL) por Minas Gerais, recebendo mais de três mil votos, mas não foi eleito. Em 2012 e em 2016, ele disputou uma vaga de vereador, pelo DEM, e recebeu 193 e 154 votos, respectivamente.

Fundador do Instituto Patriotas Direita Nacional, afirma em seu site que foi o primeiro a realizar uma palestra contra a ideologia de gênero no Brasil.

No dia 18 de julho de 2020, Valadão compartilhou uma notícia falsa no Facebook, afirmando que a vacina contra a Covid-19 era armadilha para a população.

Não foi a primeira notícia falsa que Syllas Valadão compartilhou em seu Facebook. No dia 27 de junho, também foi encontrada situação semelhante em uma de suas publicações:

O mesmo ocorreu no dia 13 de junho de 2020 com outra postagem:

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Diante do que foi apresentado, Bereia conclui que a postagem da deputada Bia Kicis, com o relato de Syllas Valadão, é enganosa, por indicar que uma pessoa idosa, tabagista e obesa não possa morrer por Covid-19. Outro engano identificado é o de afirmar que prefeituras estariam custeando os sepultamentos de vítimas do novo coronavírus. Assim, tanto Syllas Valadão quanto a deputada Bia Kicis apresentam informações para confundir o público.

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Foto de capa: Câmara dos Deputados/Reprodução

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Referências de checagem

Twitter de Bia Kicis. https://twitter.com/Biakicis/status/1295130687767486467/photo/1. Acesso em: 02 set 2020

Aos fatos. https://www.aosfatos.org/noticias/e-falso-que-estados-recebem-verba-federal-cada-obito-registrado-por-covid-19/. Acesso em: 24 ago 2020.

Cotado para Saúde, Osmar Terra é o congressista que mais publicou desinformação sobre Covid-19 no Twitter. https://www.aosfatos.org/noticias/cotado-para-saude-osmar-terra-e-congressista-que-mais-difundiu-desinformacao-sobre-coronavirus-no-twitter/ Acesso em: 2 set 2020

O Tempo, https://www.otempo.com.br/politica/afastada-da-vice-lideranca-por-bolsonaro-bia-kicis-diz-que-seguiu-consciencia-1.2363226 Acesso em: 24 ago 2020.

Agência Lupa,https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2020/04/13/verificamos-fda-liberou-hidroxicloroquina-todos-pacientes-covid-19/ Acesso em: 24 ago 2020.

UOL,https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/03/29/deputada-do-psl-divulga-fake-news-do-borracheiro-sobre-coronavirus.htm Acesso em: 24 ago 2020.

INCA (Instituto Nacional do Câncer),https://www.inca.gov.br/perguntas-frequentes/quem-fuma-faz-parte-do-grupo-de-risco-para-o-coronavirus-covid-19 Acesso em: 27 ago 2020.

INCA (Instituto Nacional do Câncer),https://www.inca.gov.br/programa-nacional-de-controle-do-tabagismo/tabagismo-e-coronavirus Acesso em: 27 ago 2020.

Veja Saúde, https://saude.abril.com.br/medicina/obesidade-fator-de-risco-covid-19-coronavirus/ Acesso em: 27 ago 2020.

IstoÉ Dinheiro, https://www.istoedinheiro.com.br/prefeitura-do-rio-de-janeiro-flexibiliza-registro-do-atestado-de-obito/ Acesso em: 27 ago 2020.

Biografia resumida de Syllas Valadão, http://syllasvaladao.com.br/biografia/ Acesso em: 25 ago 2020.

Facebook de Syllas Valadão, https://www.facebook.com/syllasvaladaoBH/posts/3054331494614507 Acesso em: 25 ago 2020.

Facebook de Syllas Valadão, https://www.facebook.com/syllasvaladaoBH/posts/2996020377112286 Acesso em: 25 ago 2020.

Facebook de Syllas Valadão, https://www.facebook.com/syllasvaladaoBH/posts/2958235044224153 Acesso em: 25 ago 2020.