Uma vez mais, a ministra do Meio Ambiente e Crise Climática Marina Silva, travou embate com parlamentares ligados ao agronegócio, durante reunião da Comissão de Agricultura, Pecuária e Abastecimento da Câmara dos Deputados, neste 2 de julho passado. O confronto entre governo e oposição já era esperado, mas o novo episódio repetiu cenas de ofensas pessoais vistas em audiências anteriores, com tentativas de desestabilizar a ministra.
Na abertura da audiência, Marina Silva apresentou resultados de sua pasta, entre eles, o menor número de alertas de desmatamento para um mês de junho desde 2018 e queda de 32 % em relação a 2022. Ela reiterou que as ações ocorreram a partir do diálogo com todos os segmentos da produção, sem isolar nenhum.
Contudo, a ministra foi interrompida pelo deputado federal Evair Vieira de Melo (PP-ES) que a acusou de ser ‘adestrada’ e ‘mal-educada’, além de usar “táticas terroristas como as do Hamas e do Hezbollah”. O parlamentar acrescentou que a ministra evangélica, eleita deputada pela Rede-SP, “nunca trabalhou”, deslocando o debate do mérito das políticas ambientais para ataques pessoais.
Adepto ao lema Deus, Pátria e Família, Evair de Melo é vice-líder da oposição e figura próxima de expoentes da direita extremista no Congresso, como Eduardo Bolsonaro e Carla Zambelli. No seu histórico legislativo, o deputado do Partido Progressistas votou a favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff em 2016, apoiou o teto de gastos que restringe políticas públicas (PEC 55/2016), e a diminuição de direitos de trabalhadores com a reformulação a CLT de 2017 (chamada de Reforma Trabalhista) e a redução de direitos de aposentadoria (a chamada Reforma da Previdência) de 2019. Melo é católico e integra a Frente Parlamentar Evangélica da Câmara dos Deputados.
Não é a primeira vez que Marina Silva é alvo de violência política de gênero. Bereia cobriu diversos ataques semelhantes à ministra no período de um ano e identificou um padrão: o parlamentar agressor pertence a partido da direita política, abandona o estilo de manifestação de divergência (o que seria natural em uma discussão política) e personaliza a crítica destruindo a dignidade da autoridade governamental que considera sua oponente. Com isso, atribui-lhe preconceituosamente adjetivos que lhe diminuem a dignidade. No caso mais recente, ao chamar a ministra de “adestrada”, Evair Melo fica sujeito à representação junto ao Conselho de Ética da Câmara
Bereia ouviu a socióloga da religião Maria José do Rosado Nunes, uma das fundadoras da ONG Católicas pelo Direito de Decidir sobre a postura de parlamentares como Evair Melo, nos ataques contra a ministra Marina Silva. Para a professora e pesquisadora, o que acontece no parlamento “é uma decorrência de uma masculinidade tóxica que se dissemina nas relações entre homens e mulheres reproduzidas dentro da família, da igreja e da sociedade como um todo”.
Rosado Nunes explica que “o feminismo entende que a luta por direitos não é setorializada; ela se dá pela perspectiva do bem viver envolvendo todas as relações humanas. Isso inclui o econômico, o social e o cultural”. Por isso se pode avaliar, segundo a socióloga católica, que “a revolta desses machistas tóxicos se dá ainda mais quando a mulher ousa ocupar o lugar que eles não consideram ser o lugar delas, daí a frase já dirigida a Marina Silva pelo senador [Marcos Rogério, PL-RO]:’ponha-se no seu lugar!’”.
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Bereia recomenda a leitura e a aplicação da Cartilha Desinformação: uma das dimensões da violência de gênero e coloca seus canais de contato à disposição para o envio de materiais a que leitores e leitoras tenham acesso e devam ser confrontados com checagem e denúncia de violência de gênero contra pessoas com identidade religiosa.