Padre católico orienta fiéis a queimarem Bíblias da tradição cristã protestante

*com a colaboração de Luis Henrique Vieira. Atualizada às 17:26 para correção de redação.

Uma postagem do perfil “Notícias Paralelas”, no X (antigo Twitter), em 18 de setembro passado, viralizou em diferentes espaços digitais, depois de informar que “um padre bolsonarista” sugeriu a seguidores “queimarem Bíblia protestante”.

De acordo com o perfil identificado como espaço de “Notícias, Humor, Entretenimento”, o padre diocesano ordenado na Arquidiocese de Fortaleza, no Ceará, Leonardo Wagner, classificado como “bolsonarista”, depois de questionado por seguidores no Instagram sobre o que fazer com presentes que haviam ganhado, sugeriu queimar uma Bíblia Protestante e um Livro Mórmon.

Imagem: reprodução X

Leitores do Bereia enviaram a postagem com sugestão de checagem. Bereia verificou que o veículo de jornalismo digital Diário do Centro do Mundo (DCM), havia publicado matéria sobre o caso no mesmo dia, com título similar ao do “Notícias Paralelas”, com o oferecimento de mais elementos. Um deles foi a informação de que a afirmação do padre foi feita no Instagram em espaço nos stories em que ele respondia questões aleatórias do público. 

Segundo o DCM, o religioso foi “questionado por internautas sobre o que fazer com presentes que haviam ganhado. ‘Padre, o que fazer com uma Bíblia que ganhei?”, questionou um internauta, e “Padre, o que fazer com um Livro de Mórmon que ganhei?”, perguntou outro. O padre teria respondido às questões com duas imagens, conforme a matéria do DCM. Na primeira delas, ele respondeu com a foto de um acendedor de churrasco, e na segunda, o próprio padre aparece segurando um isqueiro, sugerindo com a foto, que se pusesse fogo no presente.

Bereia verificou que o DCM não recorreu à fonte original, ou seja, a conta do padre Leonardo Wagner, mas sim, de um terceiro, um seguidor do padre, que teria compartilhado as imagens em 14 de setembro. As publicações mostram os stories do padre com os fósforos e a imagem dele com o isqueiro, com elogios ao religioso (“Padre Leonardo é bom demais, não tem como”) e deboche contra mórmons (“Bom que ninguém é mórmon, não vai irritar ninguém”).

Imagens analisadas

Bereia buscou o perfil do padre no Instagram para identificar a veracidade das imagens e verificou que ele está suspenso, desta forma, não foi possível acessar as imagens ou quaisquer outras postagens que indicassem as abordagens comumente feitas pelo religioso. Porém, foi possível verificar que Leonardo Wagner criou outro perfil na mesma mídia, em 16 de setembro, que ele denomina ser alternativo, onde explica a seguidores que a conta foi derrubada devido a denúncias de muitas pessoas à plataforma. Desta forma, Bereia pode concluir que a suspensão da conta antiga ocorreu por aqueles dias de setembro.

Leonardo Wagner afirma no vídeo que o Instagram não explicou a causa das denúncias, ele conclui que foram feitas por “inimigos de Deus” e que a perda de mais de 300 mil seguidores seria uma “provação”. O padre ainda pede que seus seguidores espalhem que o perfil alternativo foi criado tendo em vista uma falsa denúncia e encerra com “glória a Deus!”. 

Bereia também teve acesso a vários vídeos no Youtube produzidos por seguidores para criticar a suspensão da conta de Wagner e denunciar o que chamaram de perseguição “a quem diz a verdade”.

Imagem de vídeo publicado no Instagram em 16 de setembro de 2023

Quem é o padre Leonardo Wagner?

Bereia consultou fontes da Igreja Católica e obteve a informação de que o padre, de fato, foi ordenado na Arquidiocese de Fortaleza. Atualmente ele não serve àquela circunscrição, mas à Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, em Campos (RJ). Wagner tem uma presença muito intensa nas mídias, com muitos vídeos de palestras, debates e oferecimento de cursos para católicos, com centenas de milhares de seguidores. O conteúdo é sempre baseado na tradição da religião, na apresentação do Catolicismo como “a verdadeira fé” e na convocação para que fiéis se tornem “católicos raiz”.

Reprodução da página de abertura de um dos sites do padre Leonardo Wagner 

Na pesquisa sobre as postagens do religioso em mídias sociais, Bereia identificou que ele já se envolveu em controvérsias por conta do conteúdo que divulga. Em outubro de 2021, ele transmitiu uma live pelo Instagram, possivelmente no perfil que está suspenso, pois ela não foi localizada, acompanhado de um médico clínico geral, para responder à pergunta “É pecado ser vegano”?

Imagem: reprodução do Instagram para divulgação da live em outubro de 2021

Na live, o padre e seu acompanhante afirmaram que o veganismo é uma seita e, em alguns momentos, fizeram afirmações de ataque à Igreja Adventista do Sétimo Dia, que, em sua doutrina, adota o vegetarianismo. O evento provocou reação indignada de pessoas veganas, incluindo católicas, que produziram uma carta aberta à Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), com mais de mil assinaturas, com questionamentos sobre a atitude ofensiva do padre e a exigência de um pedido de desculpas.  Tal ação não foi identificada pelo Bereia.

Em outubro de 2022, Leonardo Wagner publicou, em seu perfil no X (antigo Twitter), reforço à desinformação sobre vacinas contra a covid-19, que circularam durante o período eleitoral. O padre compartilha e reafirma uma postagem que se refere a um vídeo que circulou no TikTok, durante o segundo turno das eleições de 2022, no qual o advogado e político croata Mislav Kolakusic tira de contexto uma declaração dada por Janine Small, executiva da Pfizer, ao Parlamento Europeu para sugerir ineficácia da vacinação contra a covid-19. Para reforçar o discurso negacionista, o vídeo afirmava que a farmacêutica teria admitido um “crime mundial”. O Projeto Comprova verificou à época e várias mídias nacionais divulgaram o material enganoso.

Imagem: reprodução do X

Tanto a postagem do Notícias Paralelas, que o Bereia recebeu de leitores para checagem, quanto a matéria do DCM que a equipe encontrou, mencionam a opção política do padre Leonardo Wagner pela extrema-direita. Bereia verificou que matéria do jornal O Globo, publicada em 17 de outubro passado, durante as eleições de 2022, intitulada “Voto e religião: quem são os padres da Igreja Católica que declararam voto em Lula ou Bolsonaro”, inclui Leonado Wagner na lista de cinco nomes do mapeamento do jornal sobre os padres que declararam voto abertamente em Jair Bolsonaro (junto a outros cinco que declararam voto em Lula e mais quatro que não se posicionam). 

Imagens: Recorte da matéria de O Globo, de 17 out 2022.

De fato, em seu perfil no Twitter o padre publicou mensagens explícitas lamentando o resultado eleitoral e compartilhou outras de conhecidas lideranças extremistas.

Imagens: Reprodução do X

Queimar Bíblia Protestante e Livro Mórmon?

Bereia verificou que o novo perfil de Leonardo Wagner no Instagram manteve a mesma prática de responder perguntas aleatórias nos stories. Curiosamente, foi encontrada uma nova pergunta sobre o mesmo tema exposto no perfil que foi suspenso pelo Instagram após denúncias: “o que fazer com Bíblias protestantes?”. Desta vez, o padre não usa imagens, mas responde ser “melhor queimar” por “ser falta de respeito jogar no lixo”. 

Imagem do stories do perfil do padre Leonardo Wagner no Instagram, em 19 de setembro de 2023

Bereia fez, então, o registro de uma pergunta nos stories do perfil do Instagram do padre Wagner: “Padre, boa tarde. É verdade que o senhor mandou queimar Bíblia Protestante e Livro Mórmon?” A resposta foi dada quase que de imediato: “Essa é a orientação de São Pio X no Catecismo Maior. Parem de ser católicos ‘jujubas’! Sejam firmes e corajosos na fé!

Imagem do stories do perfil do Instagram do padre Leonardo Wagner, na tarde de 19 de setembro.


Uma nova postagem nos stories do Instagram deu continuidade à resposta, com uma citação do Catecismo de Pio X, no parágrafo 883, que responde à pergunta “Que deveria fazer um cristão, se lhe fosse oferecida a Bíblia por um protestante ou por algum emissário dos protestantes?”, com a resposta: “Um cristão a quem fosse oferecida a Bíblia por um protestante, ou por algum emissário dos protestantes, deveria rejeitá-la com horror, por ser proibida pela Igreja. E, se a tivesse aceitado sem reparar, deveria logo lança-la ao fogo, ou entrega-la ao próprio pároco”.

Imagem do stories do perfil do Instagram do padre Leonardo Wagner, na tarde de 19 de setembro

Estas respostas ao Bereia confirmam que o padre Leonardo Wagner, de fato, orienta fiéis para não deterem consigo Bíblias que não sejam a católica, e queimem os exemplares proibidos. Ele se refere a Bíblias da tradição protestante, diferentes da católica por admitirem a coleção sagrada com sete livros a menos, num total de 66 livros – 39 do Antigo Testamento e 27 do Novo. A Bíblia admitida na tradição católica tem 73 livros, sete livros a mais no Antigo Testamento, tendo o Novo Testamento a mesma quantidade que a versão dos protestantes. 

A orientação para que os fiéis católicos descartem Bíblias que não tenham a versão católica, está ancorada, como o padre Wagner indica, no Catecismo do Papa Pio X. Bereia pesquisou, orientada por uma fonte católica consultada, que o texto é 1905, portanto, são bases da Igreja Católica anteriores ao Concílio Vaticano II, marcadas pelo exclusivismo (a Igreja Católica como única verdade e fonte de salvação do ser humano) e pelo antimodernismo (característica do pontificado de Pio X).  

Os documentos mostram que ao seguir os passos do Concílio de Trento, o Catecismo de Pio X mantinha a compreensão de que protestantes eram inimigos da Igreja Católica. Com o Concílio Vaticano II (1962-1965), a Igreja Católica se abriu para as mudanças do mundo e para o diálogo com outros grupos cristãos, inserindo-se no movimento ecumênico, de unidade entre cristãos. 

Bereia levantou que, conforme os múltiplos registros da Igreja Católica, ela vive sob a orientação deste último grande Concílio, o Vaticano II, no qual estão baseados três principais aspectos, segundo o historiador católico Ney de Souza: a Igreja testemunha da misericórdia, a Igreja do diálogo e a Igreja do encontro. 

Uma fonte católica ouvida pelo Bereia, que preferiu não se identificar “para não reforçar polarizações”, afirma que lideranças tradicionalistas rejeitam os princípios do Vaticano II e preferem se ancorar no passado exclusivista e sectário da igreja. Na avaliação desta fonte, certamente a destruição de livros sagrados está fora dos princípios que regem a Igreja Católica, desde 1965.

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Bereia checou a postagem do perfil Notícias Paralelas, encaminhada por leitores, e confirma que é verdade que o padre Leonardo Wagner tem orientado seguidores a queimarem Bíblias protestantes. Porém, não foi possível verificar se são verdadeiras as imagens atribuídas as postagens do padre com o uso de fósforos e isqueiros, para indicar o que fiéis católicos devem fazer com Bíblias protestantes e com o Livro Mórmon. O perfil que conteria tais imagens no Instagram foi suspenso e não é possível comprovar que as imagens compartilhadas por seguidor do padre foram, de fato, retiradas do perfil do religioso, ou se tratam de montagem.

Bereia identifica nas orientações do padre a incitação à intolerância, o que pode ser verificado no compartilhamento do seguidor, publicado pelo DCM, e nos comentários ali registrados. Bereia pode observar que diferentes postagens de Leonardo Wagner, sobre temas diversos, em outras mídias sociais, também seguem a linha da intolerância. Tais práticas podem resultar em suspensão de conta em mídias sociais por infringirem regras da comunidade. 

Bereia indica a leitores e leitoras que conheçam as regras de postagens nas mídias sociais estabelecidas pelas plataformas, para que participem delas conscientes de que intolerância e incitação ao ódio são passíveis de punições nesses espaços e também de processos judiciais, caso pessoas atingidas acionem o Judiciário.

Referências

Avaaz, https://secure.avaaz.org/community_petitions/po/cnbb_retratacao_da_cnbb_a_postura_anti_crista_do_padre_leonardo_wagner_ao_falar_do_veganismo_1/Acesso em 19 set 2023

DCM https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/padre-bolsonarista-sugere-queimar-biblia-protestante/ Acesso em 19 set 2023

Projeto Comprova, https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-distorce-declaracao-de-executiva-da-pfizer-sobre-eficacia-da-vacina-contra-a-covid-19/  Acesso em 19 set 2023

O Globo, https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/10/voto-e-religiao-quem-sao-os-padres-da-igreja-catolica-que-declararam-voto-em-lula-ou-bolsonaro.ghtml

Paulus, https://www.paulus.com.br/portal/informacoes-gerais-sobre-a-biblia/  Acesso em 19 set 2023

IHU On Line, https://www.ihu.unisinos.br/?id=589567  Acesso em 19 set 2023

IHU On Line, https://ihu.unisinos.br/categorias/603351-vaticano-ii-historia-teologia-e-desafios Acesso em 19 set 2023

Religioso que rezou com Bolsonaro e clama por golpe militar é padre católico romano

Um padre foi destaque nas mídias de notícias em 12 de dezembro passado. Nesse dia, o religioso conduziu um momento de oração na frente do Palácio Alvorada, onde estava o atual presidente da República Jair Bolsonaro e apoiadores que não aceitam a derrota da reeleição nas urnas e demandam um golpe militar. O evento ocorreu no dia da diplomação, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin, respectivamente presidente e do vice-presidente da República eleitos em outubro passado

Vídeos e postagens de mídias sociais, inclusive as do próprio presidente Bolsonaro, mostram o padre ajoelhado diante do presidente, pedindo coragem aos militares dos quadros do governo federal para impedirem “um bandido safado” de comandar o país. 

Pessoas em uma praça

Descrição gerada automaticamente
Imagem: reprodução de vídeo publicado no perfil de Jair Messias Bolsonaro no Facebook

No discurso entremeado de orações, além de comparar Bolsonaro ao evangelista João Batista por “pregar no deserto”, o padre clamou: “Abençoai, Senhor, por estes dias de angústia e sobretudo o futuro da nossa Nação… O povo brasileiro, por 14 anos, foi roubado e estuprado por uma organização criminosa…. Abençoai, Senhor, o nosso capitão. Abençoai cada soldado da pátria, que aprendeu nas escolas que o filho não foge à luta… Aprendeu nas escolas que é independência ou morte. Nós confiamos no Bolsonaro”. 

Dirigindo-se ao presidente, o religioso proferiu: “Deus disse, vai lutar, eu estou com você… Pelo amor que o Senhor tem em Deus, não decepcione estas crianças”. 

Imagem: reprodução do Twitter

Vestido de forma tradicional, com batina e capelo, o religioso convocou quem está ao lado do presidente para “lutar com todas as forças e alma para que o nosso Brasil seja livre, independente”. 

Cada frase dita pelo padre era repetida pelas pessoas presentes. “Bolsonaro, eu estou aqui, o senhor me representa! Abençoai, Senhor, as nossas Forças Armadas, abençoai nossos soldados, oficiais, praças, suas famílias, dai coragem a eles e inteligência para que nunca prestem continência para um bandido safado”, gritava o sacerdote. 

O padre, que também rezou uma Ave Maria e um Pai Nosso, abençoou o Bolsonaro por não ter obrigado as pessoas a tomarem vacinas contra a covid-19. Nos agradecimentos, ele incluiu a eleição de bolsonaristas para diversos cargos em outubro e disse que “o povo brasileiro quer dizer, democraticamente, que não quer ser roubado”.

Os registros em vídeo mostram que Bolsonaro acompanhou em silêncio o religioso, que, ao final de sua intervenção, convocou apoiadores a prestarem continência ao presidente, e se declarou um “soldado da pátria”.

Padre ou um falso religioso?

Matérias na imprensa divulgaram o evento. Algumas delas mantiveram o padre anônimo, outras o identificaram como Genésio Lamounier Ramos, da Diocese de Anápolis (GO), da Igreja Católica.

Imagem: reprodução da Folha de S. Paulo

Imagem: reprodução do site da revista Veja

Ao acompanhar o caso, Bereia observou que comentários de leitores nas matérias jornalísticas e algumas publicações em mídias sociais questionavam a identidade do religioso ou afirmavam que ele seria um falso padre.

Imagem: reprodução de site da Folha de S. Paulo

Imagem: reprodução do Twitter

Imagem: reprodução do Twitter

Bereia fez contato com a Diocese de Anápolis para checar se Genésio Ramos é padre e se está vinculado à diocese e obteve a seguinte resposta por texto: “Sim. Ele é incardinado na Diocese de Anápolis”. 

A incardinação está prevista no Código de Direito Canônico da Igreja Católica, Cânones 265-272, e se refere à situação de um membro do clero (sacerdote ou diácono) colocado sob a jurisdição de um determinado bispo ou superiores eclesiásticos. 

Em consulta ao website da Diocese de Anápolis, sob a jurisdição do bispo Dom João Wilk, é possível ver o nome do Padre Genésio Lamunier Ramos, 48 anos, entre os clérigos, com o registro de sua ordenação como sacerdote, em 13 de maio de 2005, de ser residente na diocese e, atualmente, Administrador Paroquial da paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus, Terezópolis (GO).

Antigo apoiador de Jair Bolsonaro

Matérias jornalísticas posteriores ao evento de 12 de dezembro, no Palácio Alvorada, ofereceram mais detalhes sobre a atuação política do padre Genésio Ramos. Apurações mostram que ele já era conhecido entre bolsonaristas e em mídias que publicam materiais em favor do presidente da República, atuando como militante desde 2018, tendo sido “curado do PT”, como afirma nestes espaços. 

Naquelas eleições, circulou um áudio atribuído a Genésio Ramos, no qual ele ataca outro padre, Marcelo Rossi, depois que o religioso desmentiu que seria eleitor de Bolsonaro. Ramos teria chamado Rossi de funcionário da Rede Globo. Na época, uma gravação falsa divulgava uma fala de Marcelo Rossi em defesa do atual presidente, com críticas à esquerda. Esta gravação ainda circula periodicamente em espaços religiosos e já foi checada pelo Bereia.

Imagem: Ex-deputado estadual Delegado Francischini divulga em seu perfil no Facebook, em 2018, apoio ao padre Genésio Ramos à campanha de Jair Bolsonaro e a confusão entre o religioso e o Padre Marcelo Ramos 

Em outubro de 2022, foi divulgado um áudio do padre Genésio Ramos no qual ele afirmava que Deus desaprovava eleitores de Lula e pedia a excomunhão deles, com base em conteúdo desinformativo que atribui crimes ao PT: “Aquela pessoa que colaborou (com o pecado) é responsável por cada um deles. E quando chegar no tribunal de Deus vai falar ‘nunca matei e nem roubei’. Matou e roubou sim, matou crianças muito pequenas. Roubou sim, ajudou o seu país a ser assaltado. Você é responsável”.

Em 13 de dezembro, um dia depois da oração no Palácio Alvorada, ele gravou um vídeo que circulou amplamente na rede digital bolsonarista em que diz: “Todos aqueles, não só caminhoneiros, empresários, todo mundo que puder parar o Brasil e vir para as manifestações, agora é a hora”. 

O vídeo foi gravado em uma das bases de articulações antidemocráticas, na frente do Quartel General em Brasília, na denominada “Tenda Católica”. A gravação ocorreu horas depois dos atos de vandalismo ocorridos na capital, em protesto contra a diplomação de Lula e Alckmin no TSE. 

“Nos grupos, peçam que venham para Brasília, que venham para o QG. Padre, e se for muita gente? Se for tanta gente, que o QG derrame. Ocupemos todas as ruas de Brasília, o recado está dado. Fomos lá, motivamos o presidente, demos a ele alegria e ele nos deu também”, prosseguiu o padre Ramos na gravação.

Para o padre da Diocese de Anápolis (GO), as Forças Armadas são “última linha de defesa entre o comunismo e a sociedade de bem” para “colocar bandidos na cadeia”. “Se eu, padre, tiver que pedir bênção para bandido para viver no meu país, eu prefiro a morte”, afirmou na publicação em vídeo que ainda circula na internet.

Imagem: Vídeo com a convocação do padre Genésio Ramos, publicado em 13 de dezembro em perfil no Twitter

Um abaixo-assinado, intitulado “Carta Aberta ao bispo de Anápolis Dom Frei João Wilk”, de “cristãos de todos os cantos do Brasil”, com denúncias sobre a postura do padre Genésio Ramos, tem circulado na internet desde 15 de dezembro. A carta alega que o sacerdote faz uso de “aleivosias e mentiras explícitas, enganando, ludibriando e, pior, se utilizando da alto figura  sacerdotal, para estimular  pessoas  ao ódio, papel diverso e absolutamente contrário aos ditames fundantes e basilares do cristianismo” e pede que ele seja disciplinado. Veja a íntegra do documento

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Com base na pesquisa, Bereia classifica como verdadeiras as postagens e matérias jornalísticas que reconhecem Genésio Laurentino Ramos como padre católico romano, vinculado à Diocese de Anápolis (GO). O sacerdote é apoiador do presidente Jair Bolsonaro desde a campanha de 2018 e milita nas articulações antidemocráticas que demandam um golpe militar, depois da derrota do atual presidente nas eleições de outubro de 2022.

Referências de checagem:

Folha de S. Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/12/bolsonaro-faz-oracao-com-criancas-e-padre-apos-diplomacao-de-lula.shtml  . Acesso em 18 dez 2022

Folha de S. Paulo, https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/12/padre-que-rezou-com-bolsonaro-incita-atos-antidemocraticos.shtml  Acesso em 18 dez 2022

Veja, https://veja.abril.com.br/coluna/radar/no-alvorada-padre-se-ajoelha-diante-de-bolsonaro-e-faz-discurso-golpista/  Acesso em 18 dez 2022

Código de Direito Canônico da Igreja Católica,  https://bit.ly/3jTIAT4   Acesso em 18 dez 2022

Diocese de Anápolis (GO) , https://www.diocesedeanapolis.org.br/clerigo/pe-genesio-lamunier-roams  Acesso em 18 dez 2022

Metrópoles, https://www.metropoles.com/brasil/padre-que-orou-para-bolsonaro-defendeu-excomunhao-de-quem-vota-em-lula  Acesso em 18 dez 2022

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Foto de capa: reprodução do Facebook

Padre engana ao falar de “fraudemia” e cria pânico sobre vacinação

Tem circulado em grupos de WhatsApp um vídeo em que o padre católico de São Paulo, Carlos Maria de Aguiar, vice-presidente da Liga Cristã Mundial, espalha desinformação a respeito da vacinação contra o novo coronavírus. No vídeo, segundo o clérigo, alguns líderes estariam abusando de seus poderes e transgredindo a Constituição em vez de ajudar o presidente Jair Bolsonaro. 

Além disso, Aguiar diz que alguns chamam a pandemia de “Fraudemia”, porque ela seria uma manipulação ideológica do difícil momento que o Brasil vive. Nesse sentido, o padre traz a seguinte mensagem a respeito da vacinação:

O emprego é o único meio digno de alguém para manter sua sobrevivência e subsistência. Privar um ser humano disso é desumano e vai contra toda ordem moral, ética e do direito natural. Usar a ameaça de vacinar-se em garantia de cura sob a pena de perder o emprego é perverso e brutal. Isso, na verdade, é uma escravidão. Ou agimos de forma violenta porque eles são violentos conosco física e psicologicamente, ou iremos acabar em novo tipo de campo de concentração. É lutar para não morrermos. E se morrermos, vamos morrer lutando dignamente. E que Deus abençoe a todos.”

Carlos Maria de Aguiar, padre e vice-presidente da Liga Cristã Mundial

A obrigatoriedade constitucional da vacinação

No vídeo, o Padre menciona suposta ameaça de demissão por parte de um empregador a um funcionário que se recusa a tomar a vacina. No entanto, é preciso primeiro compreender qual é a situação da vacinação contra a covid-19.

Bereia já publicou uma matéria em dezembro de 2020 para explicar que a vacinação obrigatória é constitucional e já praticada no Brasil, isso porque a vacinação é uma estratégia de imunização coletiva capaz de erradicar doenças. Segundo a Fiocruz, doenças como varíola e poliomielite foram erradicadas no Brasil graças à vacinação. A obrigatoriedade da vacinação, como explica a reportagem, está prevista desde 1975 pela Lei 6.259 daquele ano, que estabelece o Plano Nacional de Imunização (PNI). Já em fevereiro de 2020, a Lei 13.979 listou a vacinação como uma das medidas para combater a pandemia. 

Por fim, foi em 17 de dezembro de 2020 que o STF firmou entendimento a favor da obrigatoriedade também da vacina contra a covid-19, como noticiou a revista Consultor Jurídico. A decisão também diz que pais sejam obrigados a levar seus filhos para vacinação, conforme o calendário de imunização, mesmo quando contra as suas convicções. Isso porque o direito à saúde coletiva das crianças e dos adolescentes não se sobrepõe à liberdade de pensamento dos responsáveis, defendeu o ministro Luis Roberto Barroso. A Corte considerou que a vacina pode ser também compulsória, situação na qual restrições são aplicadas a quem não se vacinar.

Vale lembrar que não cumprir o Calendário Nacional de Vacinações já implica sanções. A Portaria 597 de 2004 já estabelece que a não vacinação gera impedimento de se alistar no exército, receber benefícios sociais do governo ou se cadastrar em creches ou se matricular nas demais instituições de ensino. Também é importante reconhecer que a obrigatoriedade de vacinação é prática comum em outros países e nas relações internacionais, como por exemplo, a antiga exigência de comprovação de vacinação contra algumas doenças para permissão de entrada no território de vários países, como a da febre amarela e da da H1N1.

Vacinação e o ambiente de trabalho

O debate que se coloca é se empresas podem exigir a vacinação de seus funcionários e, se isso for permitido, se a recusa de um funcionário em vacinar-se contra a covid-19 poderia resultar em demissão com justa causa. A decisão do STF deixou o estabelecimento de limitações aos não-vacinados a cargo tanto da União quanto de estados e municípios. Isso significa que as restrições dependerão de cada localidade.

O portal de temas jurídicos JOTA ouviu especialistas na área trabalhista a respeito da questão. A professora do IDP e procuradora do Trabalho Lorena Porto considera que o empregador pode exigir a vacinação de seus funcionários para a volta do trabalho presencial, uma vez que o empregador é responsável por garantir um ambiente de trabalho saudável. Em entrevista ao portal, ela cita o exemplo de profissionais de saúde:

“Para o empregador cumprir todas essas exigências, ele teve de adotar uma série de medidas, como a implementação de equipamentos de proteção individual, os EPIs, o trabalho remoto, notadamente os de grupo de risco. Para os que estão trabalhando presencialmente, medidas sanitárias de controle interno. Neste contexto, para evitar o contágio de um trabalhador e a contaminação dos demais, se inseriria a vacina e podem ser estabelecidas restrições dos direitos”.

Lorena Porto, procuradora do Trabalho e professora do IDP

No entanto, para Porto, a demissão por justa causa não deveria acontecer, uma vez que essa forma de desligamento depende de requisitos definidos por lei para ser caracterizada. Ouvido pela mesma reportagem, o sócio do Bichara Advogados Jorge Gonzaga Matsumoto vai no sentido contrário:

“A empresa pode exigir a vacinação e demitir por justa causa, com certeza. Isto porque ela tem responsabilidade direta pela saúde dos empregados ao seu redor. É uma responsabilidade constitucional de zelar pela saúde, o que traz o direito de exigir que o trabalhador tome todas as medidas cabíveis”.

Jorge Gonzaga Matsumoto, sócio do Bichara Advogados

Por outro lado, a sócia responsável pela área trabalhista do Porto, Miranda e Rocha Advogados Karen Viero destaca a atual falta de definição sobre o assunto. “O empregador está desamparado neste momento, pois, se os empregados se recusarem a tomar vacina e o empregador desligá-lo sem justa causa, poderá configurar dispensa discriminatória. Se pensar em desligamento por justa causa, a recusa do empregado em tomar a vacina não se enquadra nas hipóteses do artigo 482 da CLT. Portanto, a meu ver, a empresa não pode em nenhuma hipótese desligar o empregado por este motivo”, afirma à revista Consultor Jurídico. 

Para ela, se a legislação municipal e estadual exigir vacinação obrigatória para o trabalho de determinado colaborador, a empresa pode deixá-lo em home office. Já em caso de novas contratações, a exigência da vacinação também dependerá da legislação local e da disponibilidade do imunizante.

Posicionamento do Ministério Público do Trabalho

No dia 8 de fevereiro, o Ministério Público do Trabalho (MPT) se pronunciou sobre o tema por meio do procurador-geral do órgão, Alberto Balazeiro. O procurador disse em entrevista ao Estadão Conteúdo publicada pelo jornal O Estado de São Paulo e reproduzida pela Revista Exame que as empresas devem investir em conscientização e seguir um roteiro de sanções que podem levar à demissão por justa causa como última alternativa, caso um funcionário se recuse a tomar a vacina sem apresentar razões médicas documentadas.

Balazeiro diz que um guia interno feito pela área técnica do MPT segue a decisão do STF. Ele também considera os argumentos de que o empregador tem a obrigação de garantir a segurança do ambiente de trabalho e da importância do interesse coletivo sobre o individual. “E sem uma recusa justificada, a empresa pode passar ao roteiro de sanções, que incluem advertência, suspensão reiteração e demissão por justa causa. A justa causa é a última das hipóteses. O guia do MPT não é um convite à punição, mas à negociação e à informação. O que não pode é começar com justa causa nem obrigar ninguém a trabalhar em condições inseguras”, afirmou o procurador-geral.

Fraudemia?

Segundo dados do Ministério da Saúde até o fechamento desta matéria, o Brasil já acumula mais de 230 mil mortos pela Covid-19 e mais de 9,5 milhões de casos da doença. No mundo inteiro, já são mais de 2,3 milhões de vítimas do coronavírus. Estes números e o caos na saúde pública por conta deles demonstram concretamente que não é verdade que a pandemia de coronavírus é uma “fraudemia” criada com fins ideológicos. Segundo o Panorama Humanitário Mundial da ONU, a crise causada pelo coronavírus fez com que a extrema pobreza e a fome aumentassem e projeções para 2021 indicam que cerca de 235 milhões de pessoas ao redor do mundo precisarão de ajuda humanitária neste ano. 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (Anvisa) já autorizou o uso emergencial das vacinas CoronaVac e Oxford-Astrazeneca no Brasil, que estão sendo produzidas pelo Instituto Butantan e Fiocruz e já começaram a ser aplicadas nos grupos prioritários. Outras vacinas estão em processo de avaliação. O país sofre, entretanto, com a falta de doses e insumos para a fabricação das outras necessárias, além das disputas políticas e ideológicas em torno da vacina. 

Quem é o Padre Carlos Maria de Aguiar?

Padre Carlos Maria de Aguiar se declara vice-presidente da Liga Cristã Mundial. Em uma página na internet, a Liga se descreve como “Instituição sem fins lucrativos que tem como objetivo combater o Terrorismo Islâmico, o Comunismo e promover permanentemente a defesa da Fé Cristã: defender os cristãos, seus direitos, símbolos e cultos”. 

A Liga Cristã Mundial participou da organização da 2ª Marcha Cristã pelo Brasil, em 15 de outubro de 2018. O ato teve inspiração na Marcha da Família com Deus pela Liberdade, ocorrida entre 19 de março e 8 de junho de 1964, manifestações de setores conservadores da sociedade em defesa da ditadura militar. 

Na ocasião, segundo a Revista Época, o padre Carlos Maria de Aguiar subiu em um trio elétrico e bradou: “Intervenção para salvar nossa nação!” e qualificou a ditadura militar como “gloriosa e querida”.

Em um perfil em rede social, o pároco se declara “incardinado como diácono” na Diocese de Santo Amaro, em São Paulo. Procurada por Bereia, a Diocese de Santo Amaro declarou:

“Informamos que o Sr. Carlos Valério Batista de Aguiar é clérigo incardinado na Diocese de Santo Amaro. Ele não tem uso de ordens e não exerce o seu ministério no território desta diocese. As suas declarações são de cunho exclusivamente pessoal”. 

Diocese de Santo Amaro

O termo “incardinado”, conforme o Pequeno Dicionário Católico, se refere à admissão de um clérigo (padre, bispo, etc.) em uma diocese diferente da qual ele foi ordenado.

Religiosos seguem criando pânico moral com desinformação sobre vacinas 

Em outro vídeo de cunho religioso com desinformação a respeito das vacinas, o padre Claudemir Serafim, pároco de Pedras Grandes (SC), afirma que a vacina contra a covid-19 é feita de fetos abortados. Esta informação é enganosa e já foi verificada pelo Coletivo Bereia.

Na verdade, as linhagens celulares desenvolvidas a partir de tecidos humanos servem como “pequenas fábricas” para que os vírus atenuados possam se multiplicar e não fazem parte da composição do produto final. Trata-se do uso de linhagens derivadas de tecidos de dois abortos legais realizados em 1972 e 1985. Postagens enganosas foram feitas sobre este assunto para induzirem pessoas a acreditarem que bebês foram abortados para que a vacina fosse produzida.O uso dessas células não provoca novos abortos. O próprio Vaticano aceita o uso de vacinas produzidas nessas condições diante da falta de alternativas. Para a Igreja Católica, o uso dessas vacinas não constitui legitimação da prática do aborto, mesmo que indireta.

O Bispo Diocesano Dom João Francisco Salm divulgou nota a respeito do vídeo do padre Claudemir Serafim, em que diz:

“A Diocese tem sido muita clara em suas orientações ao longo de toda a pandemia: sempre de acordo com as determinações das autoridades sanitárias e no melhor cuidado com a vida; A posição continua a mesma, em nada mudou; A vacina, pela qual esperamos tanto, é um dom em favor da vida . A recomendação da Diocese, com toda a Igreja, é que se acolha a vacina com a maior boa vontade e que se motivem as pessoas para isso. Quem tiver dificuldades, siga as orientações do seu médico. Não devem ser divulgadas notícias desvirtuadas ou falsas. Ninguém está autorizado a passar ao povo, em nome da Igreja, orientações diferentes, nem mesmo que seja um padre; O que o Pe. Claudemir Serafim disse é de sua responsabilidade pessoal. Foi repreendido e exortado a corrigir suas declarações e atitudes, o que se dispôs a fazer.”

Dom João Francisco Salm, bispo diocesano

O Coletivo Bereia avalia que é enganoso que o mundo esteja vivendo uma “fraudemia”, como indica o padre Carlos Maria Aguiar no vídeo amplamente disseminado pelas mídias sociais. A vacinação obrigatória está prevista há muitas décadas na lei brasileira e é muito importante para a erradicação de doenças, inclusive a covid-19. 

Sobre a obrigatoriedade em ambientes de trabalho, as restrições dependem de cada localidade e de cada empresa. O padre Aguiar, no entanto, tenta gerar um pânico moral em torno da vacinação e inferir que há um clima de perseguição sobre as pessoas que assumem postura antivacina. Mesmo com as diretrizes do MPT, a demissão por justa causa é a última alternativa de uma série de negociações.

Já a respeito da produção das vacinas contra a Covid-19, é também enganoso afirmar com utilização religiosa  que sejam usados fetos abortados para a produção dos imunizantes.  O próprio Vaticano não considera que vacinar-se com imunizantes que utilizam essas linhagens seja legitimação da prática do aborto. 

Referências

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/vacinacao-obrigatoria-nao-e-ilegal-e-ja-e-pratica-no-brasil/. Acesso em 03 de fevereiro de 2021. 

Fiocruz. https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/perguntas-frequentes/perguntas-frequentes-vacinas-menu-topo/69-perguntas-frequentes/perguntas-frequentes-vacinas/221-quais-doencas-foram-erradicadas-pela-vacinacao. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

LEI No 6.259, DE 30 DE OUTUBRO DE 1975. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6259.htm. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

LEI Nº 13.979, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2020. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l13979.htm. Acesso em 03 de fevereiro de 2021. 

ConJur. https://www.conjur.com.br/2020-dez-17/stf-decide-vacinacao-obrigatoria-constitucional. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Ministério da Saúde. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2004/prt0597_08_04_2004.html. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Portal Consular Itamaraty. http://www.portalconsular.itamaraty.gov.br/antes-de-viajar/saude-do-viajante. Acesso em 03 de  fevereiro de 2021.

Portal STF, https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=457462&ori=1#:~:text=O%20Plen%C3%A1rio%20do%20Supremo%20Tribunal,prevista%20na%20Lei%2013.979%2F2020. Acesso em 09 de fevereiro de 2021.

Jota. www.jota.info/tributos-e-empresas/trabalho/empresas-podem-obrigar-seus-funcionarios-a-se-vacinarem-contra-a-covid-19-22122020. Acesso em 09 de fevereiro de 2021. 

DECRETO-LEI Nº 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Revista Exame. https://exame.com/carreira/funcionario-que-recusar-vacina-pode-ser-demitido-por-justa-causa-diz-mpt/. Acesso em 09 de fevereiro de 2021.

Folha. https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/12/covid-19-deixa-235-milhoes-de-pessoas-dependentes-de-ajuda-humanitaria-diz-onu.shtml. Acesso em 09 de fevereiro de 2021.

Liga Cristã Mundial. http://ligacristamundialriodejaneiro.blogspot.com/2016/06/liga-crista-mundial-pela-protecao-do.html?m=1. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Revista Época. https://epoca.globo.com/sociedade/noticia/2017/10/marcha-crista-tem-pouco-de-religiao-e-muito-de-intervencao-militar.html. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Wikipedia, https://pt.wikipedia.org/wiki/Marcha_da_Fam%C3%ADlia_com_Deus_pela_Liberdade. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/vacina-contra-covid-19-nao-usa-celulas-de-bebes-abortados-como-afirma-site-gospel/. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Vatican News, https://www.vaticannews.va/pt/vaticano/news/2020-12/congregacao-doutrina-fe-vacina-anti-covid.html. Acesso em 09 de fevereiro de 2021.

Diocese de Tubarão, https://diocesetb.org.br/noticia/nota-oficial-vacina. Acesso em 03 de fevereiro de 2021.

Pequeno Dicionário Católico, https://apologeticacatolicasite.files.wordpress.com/2019/04/mk_pequeno-dicionario-catolico.pdf. Acesso em: 09 fev. 2021.

Júlio Lancelotti e a igreja samaritana

 Já lá se vão mais de seis meses desde que a pandemia foi reconhecida como flagelo universal que ameaçava a humanidade e o planeta.  Todos desde então foram instruídos a ficar em casa, sobretudo os idosos, por serem grupo de risco.  No entanto, em São Paulo, pelas ruas e praças onde os moradores de rua vivem e sofrem em meio à intempérie,  um senhor de 71 anos circula sem parar.  Todos os dias, a cada momento, dia útil, santo ou feriado. 

Trata-se do padre Júlio Lancelotti, da arquidiocese de São Paulo. Entrou já adulto no seminário. Após os estudos, ordenou-se e recebeu como missão do então cardeal Dom Paulo Evaristo Arns ser vigário episcopal do povo de rua da arquidiocese.  Desde então, assimilou plenamente em sua vida todo o significado da palavra vigário. Oriunda do latim vicariu, seu primeiro e principal significado é: aquele que faz as vezes de outro. Vigário episcopal, padre Júlio passou a ser e representar a Igreja de São Paulo, na pessoa de seu bispo, junto àqueles e àquelas que vivem nas ruas.

Ele não os chama moradores de rua, mas sim “irmãos” de rua.  Não diz tampouco que trabalha com eles, pois não são objetos.  Diz que convive com eles, como os irmãos convivem uns com os outros.  Diante das infinitas necessidades que apresentam os que fazem da rua sua casa, o sacerdote atende desde a fome, o frio, a nudez, até a carência afetiva, o medo, o desespero, a solidão. Olha nos olhos de todos e ali, segundo ele, vê Jesus que disse que tudo que se fizesse ao menor de seus irmãos, a ele mesmo se faria. 

Sem nenhum medo do contágio que o vírus pode trazer, padre Júlio toca a cada um, abraça, acaricia, examina suas feridas e os abençoa, impondo as mãos sobre suas cabeças. Cuida de todos, conseguindo bicas de água para que possam higienizar as mãos, dando-lhes máscaras e encaminhando-os aos serviços de saúde quando apresentam febre ou sintomas de doença. 

Mas o sacerdote, ao mesmo tempo em que é só ternura e cuidado para com o povo da rua, sabe falar forte e assumir sua vocação de profeta quando se trata de denunciar injustiças e expor as feridas da desigualdade obscena de uma sociedade que descarta pessoas.  De uma lucidez impressionante, padre Júlio sabe ler a realidade com olhos críticos, enxergando e denunciando a raiz das injustiças e incriminando os responsáveis pelas mesmas. 

Sempre foi criticado e discriminado por aqueles a quem seu discurso, mas sobretudo sua prática incomodava.  Recentemente passou a receber ameaças, insultos e agressões mais pesadas.  Isso fez com que o cardeal Dom Odilo Scherer, pastor de São Paulo, se solidarizasse publicamente com ele relembrando o Evangelho pelo qual ambos empenham a vida. “Eu estou com ele…quem cuida dos pobres, vai sofrer junto com os pobres também. Sempre foi assim”.

O prefeito Bruno Covas também é seu admirador e agradece que o religioso constantemente denuncie as injustiças na cidade, para que sua administração possa recordar que deve prioritariamente aos mais vulneráveis.  Foi oferecida escolta policial ao padre, que delicadamente a recusou, em coerência com a solidariedade aos irmãos de rua. “Então eu fico com a escolta e os moradores de rua ficam com o cassetete, com a tortura? ”

Uma rede de auxílio foi montada ao redor de Júlio Lancelotti. Voluntários o auxiliam em seu trabalho, seja transportando a ele ou aos irmãos de rua pelo trânsito engarrafado da cidade, seja providenciando alimentos, cobertores, roupas e calçados para os que se enfileiram às centenas às portas de sua paróquia, pedindo e esperando. Diante das ameaças por ele recebidas, listas foram passadas e receberam milhares de assinaturas. 

Padre Júlio não está sozinho.  Tem com ele o povo a quem serve, a Igreja à qual pertence, todos aqueles que hoje lutam por um mundo mais justo e assumem com ele os conflitos a isso inerentes. Sua fidelidade inquebrantável é a Jesus Cristo e ao povo da rua. E para ser fiel a esse compromisso maior, sua energia chega a ser impressionante.  Parece uma fonte que nunca seca e faz com que a cada dia, de manhã à noite se repita a cansativa rotina de estar perto dos últimos e dos vencidos, levando seu serviço e seu cuidado. Poucos jovens suportariam o ritmo que o sacerdote já idoso impõe a sua vida. 

A caridade de Cristo o constrange, como disse Paulo de Tarso de si mesmo e dos cristãos de Corinto. Nesses tempos de pandemia e em todos os tempos onde a justiça for pisoteada e os pobres estiverem sofrendo será assim.  Pois, como diz o Papa Francisco, a Igreja deve ser samaritana. Tal como o samaritano da parábola do evangelho de Lucas 10, 25-37, há que cuidar do ferido à beira do caminho.  É preciso curar as feridas, abraçar os sofredores, aquecer os corações, estar próximo… É necessário começar de baixo. Júlio Lancelotti, em nosso país e em nossos dias, é certamente uma testemunha luminosa dessa Igreja que Francisco deseja ardentemente que se faça realidade. 

Padre desejou a morte de fiéis que não vão à igreja durante a pandemia e se retratou

Em uma celebração neste último domingo (24/8), o padre Antônio Firmino da paróquia São João Batista, em Visconde do Rio Branco, Minas Gerais, desejou a morte dos fiéis que não estão indo à igreja durante a pandemia. O caso se tornou matéria publicada pelo portal de notícias evangélico Pleno News, em 25 de agosto de 2020, com o título “Padre deseja morte a fiéis que não vão à igreja na pandemia”.

No vídeo que circulou nas mídias sociais, o pároco dizia que os fiéis que não estão no grupo de risco e optaram por sair só quando houvesse a vacina deviam “morrer antes” que ela fosse entregue à população. Ele também relacionou a falta de presença na igreja como falta de fé dos fiéis.

“Aí a gente vai vendo quem realmente ama a eucaristia… Porque tem alguns católicos, engraçado, que têm saúde, têm tudo e dizem: ‘Eu só vou na Igreja quando tiver a vacina’. Tomara que não apareça vacina para essas pessoas. Ou que morram antes de a vacina chegar, não é?”, disse Antônio Firmino Lana, pároco da igreja.

Retratação

Em um vídeo publicado na terça-feira (25) no Instagram, o padre Antônio Firmino pediu desculpas pelo comentário, que classificou como “infeliz”, e disse que é conhecido por ser uma pessoa que “luta pela vida”. Ao final da fala, ele pediu orações e reconheceu o erro. Segue o link pelo Instagram:

“Eu venho pedir desculpas para aquelas pessoas que se sentiram ofendidas pelas minhas palavras. Espero que fique claro isto e tenho certeza que vocês, que tem o coração bom, hão de reconhecer o meu erro e me perdoar por isso, rezem por mim, também sou pecador”, finalizou.

A Diocese de Leopoldina (MG), republicou, em sua página no Facebook, o vídeo de retratação do reverendo.

O padre Antônio Aparecido Alves, da Diocese de São José dos Campos (SP), pároco da Paróquia São Benedito do Alto da Ponte, em declaração ao Bereia, afirmou “Essa é uma fala infeliz e moralista, que não representa o que pensa a Igreja sobre essa situação.”

Comentários nas mídias sociais

Alguns comentários dos usuários de mídias digitais sobre o ocorrido mostraram indignação perante a opinião do pároco.

“Não irei sair da minha casa pra ir ouvir uma barbaridade dessas. Ao invés de prosperar, evangelizar, pregar a palavra fica desejando morte das pessoas que ele nem sabe o motivo de não ir […] mas se ele me deseja isso eu desejo o bem pra ele e ele foi infeliz nesse comentário espero que ele reconheça e estude mais sobre a palavra de Deus porque tem muito a aprender. A gente só pode ensinar quando sabe”, escreveu uma usuária.

“Então eu vou morrer. Sou católico e por fobia não estou saindo da minha casa, medo de pegar essa doença e passar para os idosos ou familiares da minha casa (faço somente mandatos no meu bairro para familiares idosos). Não há importância padre!”, publicou outro.

No Twitter também houve repercussão.

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Bereia conclui que o conteúdo da matéria é verdadeiro, pois de fato, a declaração do padre existiu, assim como sua retratação após o ocorrido. A matéria de Pleno News destacou ambas as circunstâncias, incluindo espaço para os dois vídeos. O Coletivo Bereia reforça aos leitores que é importante ir além do título para ter compreensão geral do assunto abordado em qualquer matéria, bem como para compreender os vários posicionamentos e pontos de vista acerca de um determinado assunto.

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Referências

PLENO NEWS. Padre deseja morte a fiéis que não vão à igreja na pandemia. Disponível em: https://pleno.news/brasil/cidades/padre-deseja-morte-a-fieis-que-nao-vao-a-igreja-na-pandemia.html

CORREIO BRAZILIENSE. VÍDEO: Padre deseja morte de fiéis que não vão à missa por causa da pandemia. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/brasil/2020/08/4870766-video–padre-deseja-morte-de-fieis-que-nao-vao-a-missa-por-causa-da-pandemia.html.

UOL. Padre deseja morte a fiéis que não vão à igreja na pandemia. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2020/08/24/padre-deseja-morte-a-fieis-que-nao-vao-a-igreja-na-pandemia-confira-video.htm

É enganoso conteúdo do vídeo sobre feminismo publicado pela Canção Nova

Em 21 de julho de 2020, a Canção Nova publicou em seu canal do Youtube, na série de formação intitulada “The Church”, um vídeo de três minutos, do apologeta católico brasileiro professor Felipe Aquino, intitulado “o que a igreja diz sobre o feminismo”.

Na abertura do vídeo, Felipe Aquino afirma:

O que nós entendemos hoje como feminismo? Pelo menos as mulheres que assumem esse título, fazem coisas realmente muito feias. A gente já viu ai na internet, na própria televisão. As vezes invade (sic) uma igreja porque são favoráveis ao aborto, são favoráveis a outras coisas, então picham as igrejas. Eu já vi até caso, por exemplo, vi na internet, feministas que entraram numa igreja, defecaram dentro da igreja, pra mostrar o seu protesto, a sua repulsa a igreja, aos valores da igreja. Ora, esse tipo de feminismo realmente não tem cabimento, não precisa ser católico, cristão pra rejeitar um feminismo desse, é questão até de educação […]”

O Coletivo Bereia verificou que os exemplos usados pelo professor no início do vídeo para caracterizar o feminismo, estão relacionados a matérias e informações imprecisas ou falsas, divulgadas pela internet, a respeito do movimento feminista pelo mundo, que tentam deslegitimar as pautas levantadas nessas manifestações.

Em março de 2020, Bereia checou matéria do Gospel Prime com o título “Feministas vandalizam templos católicos durante protestos: fábrica de estupradores”, sobre episódios ocorridos no Chile, e concluiu que o conteúdo era impreciso. Apesar de o texto conter alguns fatos, omitia informações históricas importantes para contextualizar o sentido dos protestos em curso naquele momento e a relação da Igreja com as pautas das mulheres e o movimento feminista.

O site Boatos.org checou, em 2018, duas fotos que circulavam na internet, nas quais apareciam mulheres defecando dentro de igrejas durante protesto, sendo associadas a manifestações feministas. De acordo com o site, a informação era falsa e as fotos eram de protestos distintos. Um aconteceu no ano de 2011 em Oslo, Noruega. A outra foto foi tirada na Argentina, em 2015, em frente à Catedral Metropolitana de Buenos Aires, durante um protesto organizado por militantes kirchneristas, do grupo La Cámpora. Nenhum dos atos ocorreram durante manifestações do movimento feminista ou foram encabeçados por feministas.

A luta feminista contra o feminicídio

No minuto um do vídeo, o professor aborda o tema do feminicídio e afirma que não é necessário ser feminista para lutar contra este crime e que a igreja quer valorizar a mulher.

É claro que, a mulher tem que ser valorizada, e a igreja quer valorizar a mulher. Essa questão do feminicídio, por exemplo, não precisa ter um movimento feminista pra ir contra um feminicídio. Bater numa mulher, machucar uma mulher, matar uma mulher, é tudo de negativo que existe. Além de ser uma covardia, porque a mulher é fisicamente mais fraca do que o homem, é uma maldade muito grande em todos os aspectos”.

No entanto, a história tem mostrado como as teologias patriarcais predominantes nas igrejas cristãs negam e inferiorizam o papel da mulher nos ambientes religiosos e na Bíblia. A cultura da dominação do feminino, difunde a ideia de que Deus determinou o papel das mulheres para a reprodução e o cuidado do lar, afastando-as dos espaços de poder e liderança. A teóloga feminista católica, Ivone Gebara, na sua obra “Mulheres, religião e poder: ensaios feministas”, mostra como o poder do catolicismo constrói narrativas misóginas que garantem a manutenção da hegemonia masculina. Além disso, ela destaca a importância da teologia feminista, para a construção de uma nova perspectiva que dá voz e lugar as mulheres. “O feminismo teológico tem uma grande importância na transformação das culturas, na medida em que desobriga as mulheres de obedecerem à ordem estabelecida de certas crenças religiosas patriarcais” (p. 12).

Nos ambientes religiosos, os discursos reproduzem a lógica da cultura de dominação masculina que circula na sociedade e repetem o estereótipo de fragilidade feminina que contribuem com a romantização da violência doméstica. Muitas mulheres, sobretudo, dentro do cristianismo, são desencorajadas a denunciar violências, e aconselhadas a manter relacionamentos abusivos em nome de Deus. De acordo com a pesquisa desenvolvida pela pesquisadora da religião Valéria Vilhena, 40% das mulheres vítimas de violência doméstica de seus companheiros se declaram evangélicas.

Em 17 de julho, a gravadora gospel MK lançou um videoclipe com a nova canção da pastora e cantora Cassiane, influente no meio pentecostal, intitulado “A Voz”. A partir do conteúdo da canção, que fala do poder de Deus na superação de dificuldades da vida, a narrativa do clip deliberadamente incentivava as mulheres vítimas de violência doméstica, a sofrerem caladas.

No vídeo, uma personagem era agredida constantemente pelo companheiro, mas não o denunciava. Ela decide ir embora de casa, deixando um bilhete dentro de uma Bíblia, em que dizia que o perdoava e que orava por ele. O agressor, após receber a Bíblia, se converte e tem final feliz com a mulher. Após grande repercussão e inúmeras críticas, a gravadora lançou uma segunda versão do clipe com trecho em que a mulher liga para o Disque 180 para denunciar o companheiro agressor, ele é preso, depois encontra a Bíblia em casa com o bilhete, se converte e tem o mesmo final feliz com a agredida. Ao final foi inserida a indicação para que sejam denunciadas situações de violência.

Em suas mídias sociais, a editora-geral do Coletivo Bereia, jornalista Magali Cunha, publicou dois vídeos fazendo considerações a respeito do clipe da cantora Cassiane. No primeiro vídeo, ela afirma que a igreja precisa ajudar essas mulheres a saírem da condição de silenciamento. Ao citar os dados da pesquisa de Valéria Vilhena, indica que “muitas dessas violências como aponta a pesquisa, são praticadas por homens evangélicos, muitos deles líderes de igrejas. O fato de estar numa igreja não significa que a violência acabou. O perdão não significa sustentar impunidade”.

A religião contribui, em diversos aspectos, com a reprodução de diversas formas de violência de gênero, quando orienta mulheres a serem submissas, obedientes, silenciadas, a partir de uma interpretação patriarcal dos textos sagrados. Além disso, a conduta machista e sexista que exclui as mulheres da liderança das igrejas, reforça essa estrutura. Na celebração da primeira missa do ano de 2020, na Basílica de São Pedro, o papa Francisco reconheceu que a violência de gênero é a “profanação de Deus”, destacando a importância do papel da mulher na vida religiosa. “As mulheres são fontes de vida, mas ainda assim são continuamente ofendidas, agredidas, violentadas, induzidas a se prostituir e a tirar a vida que carregam no ventre”. Francisco vem sofrendo uma série de críticas no interior da Igreja Católica e uma das causas são suas posições de relativa abertura às questões de gênero.

O feminismo, como movimento político-social histórico, apesar das variações de vertentes e de seus recortes, se manifesta na luta contra violência e opressão sexista, perpetuadas pelo machismo estrutural e pela lógica patriarcal. A história revela diversas conquistas através dos anos de luta e mobilização das mulheres, desde direitos trabalhistas, ao direito à participação cidadã com o voto e legislação referente ao seu lugar na família e na sociedade

Em relação à situação mais dramática no Brasil, a violência contra mulheres, pelo fato de serem mulheres, foi sancionada, em 7 de agosto 2006 a Lei nº 11.340 conhecida como Lei Maria da Penha, que pune e combate a violência doméstica e familiar contra a mulher. Após ser vítima de duas tentativas de feminicídio, e outras violências pelo marido, Maria da Penha, que carrega no corpo e na cadeira rodas as marcas das agressões sofridas, vivenciou anos de luta contra a impunidade e falta de instrumentações legais na justiça brasileira em casos de violência de gênero. Essa conquista é resultado da luta feminista pela garantia dos direitos humanos para as mulheres. Em 2002, houve a criação de um consórcio de ONG’s feministas a fim de elaborar uma lei que combatia a violência contra a mulher. A Lei do Feminicídio sancionada em 2015, que é um agravante do homicídio ocorrido contra uma mulher em decorrência de discriminação de gênero, também nasce da pressão dos coletivos e organizações feministas.

Com base nestes elementos, é enganoso afirmar que não é necessário ser feminista para lutar pela vida das mulheres, uma vez que, a história evidencia a importância da organização e mobilização das mulheres por meio de coletivos, instituições, produções e reflexões teóricas, para a conquista e garantia de direitos. Considera-se que sem o movimento feminista muitos dos direitos e das leis de proteção à dignidade das mulheres não teriam sido alcançados ou teriam sido retardados no tempo.

O Coletivo Bereia classifica o conteúdo do vídeo do professor Felipe Aquino, publicado pela Canção Nova, como enganoso. O vídeo apresenta informações falsas e distorcidas que circulam na internet, outras inseridas de forma descontextualizada e imprecisa, para desqualificar o movimento feminista, silenciando sobre sua importância na história e presença na teologia cristã. O vídeo do grupo Canção Nova pode ser caracterizado como opinião, no entanto, isto não fica claro para a audiência, uma vez que, sob o rótulo “formação”, o conteúdo desinformativo simula o oferecimento de informações.

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Referências de checagem

BBC Brasil, https://www.bbc.com/portuguese/internacional-39210072

Boatos.org, https://www.boatos.org/politica/feministas-igreja-defecam-protesto.html

Canção Nova, https://formacao.cancaonova.com/series/the-church/o-que-igreja-diz-sobre-o-feminismo/

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/e-imprecisa-materia-sobre-vandalismo-em-protestos-no-chile/

Feministas ressignificando o direito: desafios para aprovação da Lei Maria da Penha, Revista Direito e Práxis, https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2179-89662017000100616

Huffpost Brasil, https://www.huffpostbrasil.com/entry/papa-francisco-violencia-domestica_br_5e0cb154e4b0b2520d1c5160

Instituto Maria da Penha, https://www.institutomariadapenha.org.br/quem-e-maria-da-penha.html

Lei do Feminicídio, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13104.htm

Lei Maria da Penha, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

Magali Cunha, Youtube, https://www.youtube.com/watch?v=8Voqe-XtA9g

Resultados da pesquisa: uma análise da violência doméstica entre mulheres evangélicas, http://www.fg2010.wwc2017.eventos.dype.com.br/resources/anais/1280156603_ARQUIVO_ValeriaCristinaVilhena.pdf

Veja, https://veja.abril.com.br/entretenimento/cantora-gospel-cassiane-altera-clipe-acusado-de-romantizar-a-violencia/

Áudio falso com apoio do Padre Marcelo Rossi a Jair Bolsonaro volta a circular

Voltou a circular nas mídias sociais de grupos católicos e evangélicos, um áudio atribuído ao Padre Marcelo Rossi, no qual ele declara apoio ao governo Jair Bolsonaro. O áudio é antigo, circulou durante a campanha eleitoral de 2018, e foi desmentido pelo próprio Padre Marcelo e verificado como falso por várias agências de checagem de notícias.

O Projeto Comprova publicou, em 15 de setembro de 2018, matéria sobre o áudio que o Coletivo Bereia reproduz aqui com adaptações.

Comprova: Padre Marcelo Rossi não divulgou áudio com apoio a Bolsonaro

É falsa a informação de que o padre Marcelo Rossi apoia o candidato à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro. Um áudio atribuído ao religioso que circula no WhatsApp e no YouTube diz que o candidato do PSL é “pró-família, pró-Deus e pró-valores”. “E quando vejo quem são os inimigos do Bolsonaro, eu falo ‘eu to escolhendo o cara certo para votar’”, diz o homem em trecho final do áudio. O padre Marcelo Rossi negou que a voz na gravação seja dele.

No WhatsApp, uma corrente com o áudio é compartilhada seguida de um texto que chama Marcelo Rossi de porta-voz da igreja.

O Comprova localizou versões do áudio que variam de 9 a 18 minutos —é possível ouvir aplausos em determinados momentos. A informação falsa da peça está no texto que acompanha o áudio, atribuindo o discurso a Marcelo Rossi. Em nenhum momento do áudio viral o dono da voz, também vítima da informação falsa, diz seu nome.

Nas suas mídias sociais, Marcelo Rossi pediu ajuda aos seus seguidores para encontrar o responsável por criar o boato. “Um áudio que está viralizando no WhatsApp, e eu nem tenho WhatsApp, com a minha voz falando sobre política, falando absurdos. Além de ser uma notícia mentirosa, eu jamais me meto em política, vocês me conhecem”, disse o sacerdote.

“Além do que não é a minha voz. Infelizmente foi viralizado. Eu não me meto em política. A minha função é orar pelo Brasil”

Padre Marcelo Rossi

Em comentários nas mídias sociais, internautas afirmaram que o autor da voz é Rinaldo Seixas Pereira, o Apóstolo Rina, da igreja Bola de Neve, que não faz imitações de Marcelo Rossi e que seria tão vítima do boato falso quanto Marcelo Rossi. O Comprova tentou contato com Rina pelo telefone da igreja, sem sucesso. Até a publicação deste texto, Rina também não tinha respondido às solicitações feitas por e-mail pelo Comprova.

O site Aos Fatos também fez a verificação deste boato.

O Projeto Comprova é uma coalizão de 24 veículos de imprensa que visa combater a desinformação durante as eleições presidenciais.

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Bereia alerta leitoras/es: não compartilhem conteúdo que chegue por Whatsapp e peça a quem recebe: “Repasse para seus contatos”, “Compartilhe, o país está nas nossas mãos”. Este tipo de mensagem é, frequentemente, falsa e o apelo é feito justamente para usar as pessoas como propagadoras de material falso.

Sempre desconfie; antes de compartilhar, verifique a veracidade do conteúdo. As agências e projetos de checagem de conteúdos como o Comprova, Aos Fatos, Lupa, Fato ou Fake?, Boatos.org, E-Farsas e o Coletivo Bereia, com sua especialidade em verificar conteúdo de cunho religioso ou que circula em mídias religiosas, fazem verificações de boatos que circulam na internet. Nosso WhatsApp está disponível para receber indicações de checagem: (38) 98418-6691.