A mais recente edição da pesquisa Latam Pulse, realizada pela AtlasIntel em parceria com a Bloomberg, revela uma mudança significativa no cenário pré-eleitoral brasileiro. Entre maio e julho de 2025, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ultrapassou Jair Bolsonaro (PL) nas intenções de voto para a presidência, apesar de o ex-presidente constar na lista dos institutos de pesquisas mesmo estando inelegível, depois de condenado em processo no Tribunal Superior Eleitoral.
Na pesquisa de maio, Bolsonaro aparecia à frente com 46,7%, contra 43,9% de Lula. Dois meses depois, Lula assumiu a dianteira, alcançando 47,8%, enquanto Bolsonaro oscilou para 44,2%. A virada se dá fora da margem de erro, que é de um ponto percentual, e reflete um reposicionamento do eleitorado em diferentes segmentos.
Imagem: Coletivo Bereia
O recorte por religião é um dos principais destaques desse movimento. Entre os evangélicos, Bolsonaro mantinha em maio um amplo domínio, com 65,6%, enquanto Lula registrava apenas 27,2%. Na pesquisa de julho, Bolsonaro oscilou três décimos positivamente, para 65,9%, mas Lula subiu dois pontos e meio, para 29,7%, o que indica um avançado pela preferência no atual presidente nesse segmento historicamente mais resistente ao seu nome.
Imagem: Coletivo Bereia
Entre os católicos, Lula ampliou sua vantagem. Em maio, ele tinha 46,2%, contra 44,5% de Bolsonaro. Já em julho, a diferença aumentou: Lula passou a 51,7% em preferência, enquanto Bolsonaro caiu para 41,1%.
A análise dos demais cenários testados pela pesquisa AtlasIntel/Bloomberg de julho passado confirma a vantagen de Lula no primeiro turno. Contra o governador Tarcísio de Freitas (PL), Lula tem 48,5% contra 33%; contra Michelle Bolsonaro (PL), o placar é de 48,5% a 29,7% para o atual presidente da República.
Em eventual segundo turno, a vantagem também é mantida: Lula venceria Tarcísio por 50,4% a 46,6%, Michelle por 50,6% a 45,9% e Bolsonaro (inelegível) por 50,1% a 46,3%.
Aprovação de governo e avaliação de desempenho
A mudança nas intenções de voto também se espelha nos índices de aprovação do governo. Segundo a pesquisa de julho, 50,2% dos brasileiros aprovam o desempenho do presidente Lula, enquanto 49,7% desaprovam e apenas 0,2% não souberam ou não responderam. Quando o recorte é feito por religião, as diferenças se acentuam:
- Católicos: 52,8% aprovam / 47,1% desaprovam
- Evangélicos: 30,4% aprovam / 69,3% desaprovam
- Crentes sem religião: 51,1% aprovam / 48,9% desaprovam
- Agnósticos ou ateus: 75,5% aprovam / 23,5% desaprovam
- Outras religiões: 64,5% aprovam / 35,5% desaprovam
Imagem: Coletivo Bereia
Na avaliação do governo Lula de forma geral (sem considerar apenas a figura do presidente), 46,6% dos brasileiros classificam a gestão como “ótima ou boa”, enquanto 48,2% consideram “ruim ou péssima”, e 5,1% avaliam como regular. Entre os evangélicos, apenas 29,8% avaliam positivamente, enquanto 69,1% classificam como ruim ou péssima.
Ao comparar os dados de maio e julho no cenário de primeiro turno contra Bolsonaro, é possível identificar que a mudança positiva pró-Lula se deu principalmente pelo aumento da sua aprovação entre católicos, que passaram de 47,1% para 52,8%, e entre outros grupos religiosos, onde Lula também avançou.
Já entre os evangélicos, a oscilação foi pequena, mas significativa: Lula subiu de 27,2% para 29,7%. Estes dados apontam para novas avaliações de eleitores religiosos.
Alinhamentos internacionais e corte religioso
A pesquisa de Atlas Intel / Bloomberg de junho também investigou as preferências do eleitorado brasileiro em relação aos alinhamentos internacionais do país. Para 44,2% dos entrevistados, o Brasil deveria se alinhar mais com os BRICS, enquanto 36,9% preferem os Estados Unidos.
Imagem: Coletivo Bereia
O recorte religioso revela posicionamentos bem distintos:
- Evangélicos: 50,8% preferem os EUA / 28,1% preferem os BRICS
- Católicos: 45,7% BRICS / 33,1% EUA
- Crentes sem religião: 52,6% BRICS / 35% EUA
- Agnósticos ou ateus: 77,6% BRICS / 14% EUA
- Outras religiões: 49,2% BRICS / 32,7% EUA
Imagem: Coletivo Bereia
Os dados revelam que, assim como no comportamento eleitoral, os evangélicos formam o principal núcleo de apoio a uma política externa mais alinhada aos Estados Unidos, enquanto os demais segmentos tendem a apoiar a aproximação com os BRICS — articulação do Brasil com Rússia, Índia, China e África do Sul, priorizada no governo Lula.
Religião e polarização social
A religião como fator preponderante nas divisões políticas nacionais já havia sido apontada na edição de fevereiro de 2025 da pesquisa Latam Pulse, realizada pela AtlasIntel em parceria com a Bloomberg. Segundo o Índice de Polarização Social (Atlas-SPI), o Brasil liderava a América Latina em grau de polarização, com pontuação 60 em uma escala de 0 a 100. Segundo o Índice de Polarização Social (Atlas-SPI), o Brasil lidera, dentre os países analisados, em grau de polarização, com pontuação 60 em uma escala de 0 a 100.
Imagem: Latam Pulse Atlas & Bloomberg 02/2025
Entre os cinco vetores avaliados — polarização política, de classe, étnica, religiosa e urbano-rural — a dimensão religiosa surge como um dos focos de tensão mais perceptíveis: 55% dos brasileiros identificam conflitos entre grupos de diferentes crenças, sendo que 39% consideram esse conflito “muito forte”.
Imagem: Latam Pulse Atlas & Bloomberg 02/2025
A inclusão da fé como uma das dimensões do índice evidencia o quanto a religião tem sido instrumentalizada no Brasil contemporâneo, deixando de ser apenas uma expressão espiritual ou comunitária para se transformar em elemento ativo de disputa política e cultural. Essa reconfiguração tem impactos concretos sobre a coesão social, pois amplia antagonismos, fomenta ressentimentos e dificulta o diálogo entre diferentes grupos da sociedade.
A emergência da religião como vetor central da polarização ajuda a explicar tanto a importância estratégica do eleitorado evangélico nas eleições quanto às variações nos índices de apoio ao governo Lula observadas nos diferentes recortes religiosos. Em um cenário onde fé e política se entrelaçam de maneira cada vez mais explícita, compreender essas dinâmicas torna-se essencial para antecipar tensões e disputas futuras.
Referências:
Atlas Intel Latam Pulse: Brasil | Julho de 2025: https://atlasintel.org/poll/latam-pulse-brazil-july-2025-07-31
Atlas Intel Latam Pulse: Brasil | Maio de 2025: https://atlasintel.org/poll/latam-pulse-brazil-may-2025-2025-05-30 Atlas Intel Latam Pulse: Brasil |Fevereiro de 2025 https://www.atlasintel.org/poll/latam-pulse-brazil-february-2025-2025-02-07