
Circula nas redes digitais que os Estados Unidos (EUA) poderiam bloquear o sinal de GPS (acrônimo para Global Positioning System – Sistema de Posicionamento/Geolocalização Global) no território brasileiro e deixar o país sem condições de navegação por satélite (vôos, navios e barcos e logística). O conteúdo parte de apoiadores do ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL) que dizem, em tom de terror verbal, “ter sido informados por membros do Departamento de Estado dos EUA que a revogação de vistos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) seria “apenas o começo”.


Imagens: reprodução/X
A medida seria uma forma de retaliação ao governo federal e ao STF por terem não apenas respondido às exigências ao Brasil, em carta divulgada na internet pelo presidente dos EUA Donald Trump, dirigida ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 9 de julho passado, como também imposto medidas cautelares sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, com tornozeleira eletrônica. Entre as exigências consta, principalmente, a anistia a Bolsonaro dos crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado em 2022 e 2023, que lhe foram atribuídos por investigação da Polícia Federal do Brasil e estão em processo de julgamento pelo STF.
Esta informação é falsa. A ideia de que os EUA podem “desligar” o GPS no Brasil é tecnicamente inviável e infundada. O GPS é transmitido por uma constelação de cerca de 32 satélites que cobrem todo o planeta. Não existe um “botão Brasil” que permita aos EUA bloquear o serviço de forma seletiva em nosso território.
Mesmo que houvesse tentativa de interferência, isto só poderia ocorrer de forma muito limitada e localizada, afetando áreas de, no máximo, 12 km² — o que é completamente insuficiente para comprometer o funcionamento do GPS em um país continental como o Brasil, com 8,5 milhões de km².
Ainda que houvesse restrições ao GPS no Brasil, existem outros sistemas disponíveis, e a maioria dos celulares, aviões, navios e equipamentos modernos já são compatíveis com eles. Em outras palavras, o GPS não é mais o único sistema disponível e caso ele pare de operar já há alternativas a ele. O GPS foi desenvolvido para uso militar, pelo Departamento de Defesa dos EUA nos anos 1960, no contexto da Guerra Fria. Com a digitalização do mundo nos anos 2000, esta tecnologia passou a ser aplicada em diversas áreas da vida civil como navegação, rastreamento e mapeamento. Ao longo dos anos outros sistemas similares ao GPS foram desenvolvidos, têm cobertura global e estão preparados para serem utilizados no Brasil.
Além do GPS, dos EUA, existem o Glonass, da Rússia, o Galileo, da União Europeia em parceria com a Agência Espacial Europeia (ESA), e o Beidou (também conhecido como BDS), da China. Todos estes sistemas estão disponíveis no Brasil e são utilizados por aqui, mesmo que com menor incidência do que o GPS. Ainda que o sistema dos EUA tenha se tornado padrão em muitos países, por conta da influência tecnológica deste país, a maioria dos celulares modernos são equipados com receptores GNSS (Sistema Global de Navegação por Satélite), que pode receber sinais de satélites de todos os sistemas de geoposicionamento.
Portanto, ainda que o GPS “caísse” no Brasil, automaticamente os outros sistemas disponíveis seriam acionados e o país permaneceria coberto com esta tecnologia de geolocalização.
Estratégia
A mentira sobre o GPS é parte de uma estratégia promovida por grupos extremistas de direita que espalham pânico e desinformação nas mídias sociais, como Bereia já mostrou em diversas matérias. Estas mentiras se articulam com uma conspiração política que tem se configurado, segundo várias análises, e envolve influenciadores brasileiros e interesses estrangeiros.
As recentes ameaças e sanções dos EUA fazem parte de um movimento mais profundo de pressão geopolítica, segundo estas avaliações mais amplas do caso. O governo Trump estaria usando o caso do julgamento de Jair Bolsonaro para buscar interferir nas eleições de 2026, favorecer candidatos alinhados aos interesses estratégicos estadunidenses e pressionar as instituições brasileiras por um alinhamento às políticas de controle econômico-financeiro daquele país.
Leitura recomendadas:
BBC – https://www.bbc.com/portuguese/articles/cr5v0q6p43mo
https://www.bbc.com/portuguese/articles/c8xv9yygx9po
InfoMoney
The Intercept Brasil
https://www.intercept.com.br/2025/07/15/tarifaco-trump-eua-atacam-ameaca-poder-imperialista/