ELEIÇÕES 2024: Candidatos a prefeito no segundo turno acionam religião para marcar posição ideológica

Candidatos a prefeito em quinze capitais que disputam o segundo turno nas eleições municipais de 2024, utilizam as mídias digitais para abordar temas religiosos em suas publicações, em busca de apoio de diferentes grupos. Eles se posicionam em questões como a relação entre religião e política, valores familiares e temas morais.

Reprodução: Facebook: Emilia Corrêa (PL-Aracaju) e Abilio Brunini (PL-Cuiabá)

O Bereia identificou três padrões: um grupo que adota postura mais combativa e ideológica associada a pautas conservadoras; outro que mantém abordagem institucional focada em parcerias com organizações religiosas; e um terceiro que busca equilíbrio entre sua identidade religiosa e propostas de gestão plural.

Publicações dos candidatos nas redes

O levantamento feito pelo Bereia verificou as páginas pessoais dos candidatos ao segundo turno no Facebook, Instagram, X e YouTube durante o ano de 2024 até 22 de outubro, considerando termos como “religião”, “Deus”, “fé”, “igreja”, “evangélico”, “católico” e registros de participação em eventos religiosos. 

O levantamento incluiu postagens, vídeos e transmissões ao vivo nas plataformas oficiais de campanha dos 30 candidatos que disputam o segundo turno nas quinze capitais. A seguir, apresentamos os principais destaques por cidade.

ARACAJU – SE:

– Emilia Correia (PL) se identifica como cristã evangélica e denuncia que igrejas evangélicas estariam espalhando mentiras sobre seu posicionamento. Mostra presentes recebidos de católicos e evangélicos e participou de eventos na Igreja Internacional da Graça.

– Luiz Roberto Dantas (PDT) fez uma única menção religiosa sobre o Domingo de Ramos, que caracteriza o laço católico.

BELÉM – PA:

– Delegado Éder Mauro (PL) promoveu evento evangélico na Igreja Lagoinha com Michelle Bolsonaro. Recebeu apoio em vídeo do deputado federal Pastor Marco Feliciano (PL-SP) direcionado especificamente à “Comunidade Evangélica de Belém”.

– Igor Normando (MDB) reuniu-se com lideranças evangélicas, os pastores Philip Câmara e Samuel Câmara, e celebrou Corpus Christi, feriado católico.

BELO HORIZONTE – MG:

– Bruno Engler (PL) ataca cristãos que votaram em candidato adversário afirmando que têm “sangue nas mãos”. Acusa a prefeitura de promover “ideologia de gênero” por incluir campo de nome social em formulário escolar. Declara defender “valores cristãos” e participou de culto na Igreja Paz e Vida.

– Fuad Noman (PSD) dialogou com lideranças batistas, incluindo o Pastor Ramon Márcio da Convenção Batista Mineira. Declara devoção católica a Padre Eustáquio e visitou a Igreja Batista Getsêmani.

CAMPO GRANDE – MS:

– Rose Modesto (União Brasil) participou da Marcha para Jesus em 2024. Compartilha vídeos cantando louvores e defende-se de ataques que chama de “fake news”, afirmando que “tem alguém que vê tudo, esse alguém é Deus”.

– Adriane Lopes (PP) declara 20 anos de atuação na Igreja Assembleia de Deus Campo Grande. Participou do lançamento da Marcha para Jesus 2024 e usa citações bíblicas em suas comunicações.

CUIABÁ – MT:

– Abilio Brunini (PL) faz publicações atacando o PT e a esquerda ao afirmar que “cristão não vota em petista” e que “não tem como ser cristão e defender a esquerda”. Declara que padres e pastores que defendem a esquerda são “falsos”. Reuniu-se com Dom Mário, arcebispo católico de Cuiabá.

– Lúdio Cabral (PT) divulgou carta enfatizando sua “formação familiar cristã”, defendendo-se de acusações sobre “ideologia de gênero”, o que classifica como  mentiras. Propõem parcerias com igrejas em projetos sociais.

CURITIBA – PR:

– Eduardo Pimentel (PSD) utiliza repetidamente o slogan “Curitiba é de Jesus” em suas publicações. Declara ser “a favor da vida” e “da inocência das crianças”. Participou de cultos na Igreja Batista Bom Retiro e Assembleia de Deus Vila Americana. Relaciona sua candidatura a “valores que defende como cristãos”, incluindo “defesa da família” e “contra as drogas”.

– Cristina Graeml (PMB) se intitula como cristã,”direita raiz”, e declara defender “valores inegociáveis” para aqueles que “tratam a fé de forma inegociável”. 

FORTALEZA – CE:

– André Fernandes (PL) identifica-se como “evangélico, filho de Pastor da Assembleia de Deus” e afirma contar com o  apoio de “mais de 200 pastores”Acusa a Prefeitura de promover “ideologia de gênero” por meio de exposição artística, usando termos como “criança viada”.

– Evandro Leitão (PT) declara-se “católico praticante” e afirma que “não usa a fé como palanque”. Participou de missas nas igrejas católicas Santo Antônio e Nossa Senhora de Fátima.

GOIÂNIA – GO:

– Frederico Rodrigues (PL) publicou texto contrapondo “Militante Esquerdista” e “Cristão”, sugerindo incompatibilidade entre cristianismo e posições de esquerda.

– Sandro Mabel (Republicanos) encontrou-se com lideranças evangélicas: pastor Aluizio Silva da Igreja Videira e Bispo Oídes. Declara que sua “gestão vai ser para todos”.

JOÃO PESSOA – PB:

– Cícero Lucena (PP) celebrou o dia de Nossa Senhora Aparecida e declarou que sua “fé em Deus sustenta seu trabalho”. Em vídeos, afirma que “a fé e a justiça venceram” e que “a fé em Deus demonstrou a justiça”.

– Marcelo Queiroga (PL) usa discurso religioso para se posicionar contra o aborto e dizer ter atuado “em defesa da vida desde sua concepção”, quando ministro (da Saúde do governo Bolsonaro) “de uma das maiores nações cristãs do mundo”. Recebeu apoio da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro, que declarou que ele “renunciou à sua vida porque Deus o chamou para mudar a realidade de João Pessoa”. Vincula sua candidatura à “defesa da família e valores cristãos”.

MANAUS – AM:

– David Almeida (Avante) declara-se “cristão conservador” e afirma dialogar com todas as religiões. Como atual prefeito, incluiu programação evangélica e católica no evento municipal “Sou Manaus”, com participação do Padre Fábio de Melo. Participou da Marcha para Jesus em 2024.

– Capitão Alberto Neto (PL) promoveu palestra “O Cristão e a Política” com o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). Compartilha versículos bíblicos e frequentou cultos evangélicos. Criticou os Jogos Olímpicos de Paris 2024 chamando de “profanação” a cena que aludia à Santa Ceia, já desmentida em publicação do Bereia.

NATAL – RN:

– Natália Bonavides (PT) denunciou distribuição de material  intitulado “13 motivos para os cristãos não votarem” em sua candidatura. Registra diálogos com diversas denominações: pastor Martim Alves (Assembleia de Deus), Dom João S. Cardoso (Igreja Católica), representantes de matriz africana e do Centro Islâmico.

– Paulinho Freire (União Brasil) visitou igrejas evangélicas Verbo e Vitória em Cristo. Como vereador, presentou Moção de Aplausos pelos 106 anos da Igreja Evangélica Assembleia de Deus na Câmara Municipal.

PALMAS – TO:

– Janad Valcari (Republicanos) realizou evento com Michelle Bolsonaro e a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) caracterizado como “louvor e mulheres virtuosas”. Utiliza termos religiosos como “abençoado” em publicações rotineiras.

– Eduardo Siqueira Campos (Podemos) tem como vice o pastor da Assembleia de Deus Nação Madureira, Carlos Velozo (Agir), que cita a Bíblia (Primeira Carta aos Coríntios) para vincular experiência pastoral à gestão pública.

PORTO ALEGRE – RS:

– Maria do Rosário (PT) declara-se cristã e apresenta-se como a “prefeita da fé”. Enfatiza origem em “família cristã” e vincula fé à “reconstrução da cidade”.

– Sebastião Melo (MDB) dialogou com o Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos e divulgou parcerias com instituições religiosas em ações sociais.

PORTO VELHO – RO:

– Léo Moraes (Podemos) obteve apoio formal da Comunidade Cristã Shalom, por meio dos pastores Francisco Luna e Israel Cavalcante. Participou de momentos de oração com a Entidade Beneficente Sabedoria de Salomão.

– Mariana Carvalho (União Brasil) é vinculada à Igreja Evangélica Assembleia de Deus de Porto Velho. Escolheu como vice o pastor Valcenir (União Brasil), presidente da Igreja Missionária Catedral da Família, que relaciona sua experiência pastoral à capacidade administrativa.

SÃO PAULO – SP:

– Guilherme Boulos (PSOL) encontrou-se com o pastor Ribamar Passos (Assembleia de Deus), que declarou buscar “quebrar muros” com o segmento evangélico. Recebeu apoio do pastor Uilian Corcino, que afirmou “não votar nele por ser de esquerda, mas por ser cristão”, e do católico  Frei Betto. 

  • Nesta semana houve reunião de evangelicos com Boulos. Houve outras.  Nao está nas redes dele? 

– Ricardo Nunes (MDB) é declaradamente católico mas fez apenas uma publicação com a participação da Marcha para Jesus em 2024. 

  • Nada nas redes dele sobre ida a igrejas? Foram muitas!

Distribuição dos padrões religiosos

A análise das redes digitais dos 30 candidatos que disputam o segundo turno em quinze capitais revela três padrões distintos no uso de temas religiosos durante a campanha eleitoral. 

O grupo mais expressivo, com nove candidatos (41%), adota postura combativa e ideológica, associando valores religiosos a pautas conservadoras. O segundo grupo, com sete candidatos (32%), mantém abordagem institucional focada em parcerias com organizações religiosas. Já o terceiro padrão, identificado em seis candidatos (27%), caracteriza-se pela busca de equilíbrio entre identidade religiosa e propostas de gestão plural. O levantamento indica predominância de candidatos do PL no primeiro grupo, enquanto o MDB tem maior presença no segundo e o PT no terceiro.

  • Bereia conclui que o acionamento da religião nas campanhas do segundo turno das eleições municipais de 2024 se apresenta de forma mais intensa entre candidatos autodeclarados conservadores. Estes utilizam predominantemente narrativas de confronto ideológico, associam valores religiosos a pautas específicas como “defesa da família” e combate à chamada “ideologia de gênero”.

A análise demonstra que candidatos alinhados a partidos de direita e extrema-direita tendem a adotar discurso mais combativo, que frequentemente sugere incompatibilidade entre o Cristianismo e posições de esquerda. Já candidatos de outros campos políticos optam por abordagem institucional, com privilégio ao diálogo inter-religioso e parcerias em projetos sociais.

Bereia alerta leitores e leitoras para a importância de distinguir entre o acionamento legítimo da identidade religiosa na política e a instrumentalização dela para fins eleitorais, com tom exclusivista-extremista. É fundamental verificar se as declarações sobre religião dos candidatos correspondem a propostas concretas de gestão e respeito à diversidade religiosa garantida pela Constituição Federal.

Referências de checagem:

Coletivo Bereia
https://coletivobereia.com.br/olimpiadas-paris-2024-polemicas-sobre-religiao-envolvem-surfista-brasileiro-e-cerimonia-de-abertura/ Acesso: 23 out. 2024

https://coletivobereia.com.br/eleicoes-2024-bereia-dedica-atencao-a-campanha-de-candidatos-as-com-identidade-religiosa-para-as-prefeituras-das-26-capitais/. Acesso: 19 out. 2024

Foto de capa: TRE-PE

Saiba como enfrentar a disseminação de desinformação na reta final do segundo turno das eleições

A poucos dias do segundo turno das Eleições Majoritárias para prefeito e vice no Brasil, a disseminação de material falso em mídias digitais de cristãos aumenta vertiginosamente. Bereia montou uma força-tarefa para verificar conteúdos e instruir os leitores a analisar criticamente os conteúdos que recebem.

Ganhou destaque essa semana a avalanche de fake news e propagandas negativas (propagandas contra candidatos) visando fins eleitorais. Em 57 municípios do Brasil haverá segundo turno e a disputa eleitoral incentiva uma panfletagem específica, direcionada contra alguns e em favor de outros. Durante a campanha, em 5.567 municípios, voltaram a circular boatos, acusações e “fake news” que já circularam na eleição de 2018, com objetivos eleitoreiros. O volume foi tão grande que o TSE criou um chatbot (um serviço automático de mensagens, com o endereço http://wa.me/556196371078) para desfazer boatos e criou a campanha com a hashtag #EuVotoSemFake com o mote: “se for fake news, não transmita”.

Como acontece em outras notícias falsas, os autores e aqueles que as repassam pedem para não serem identificados, para dificultar a apuração dos responsáveis pelos crimes eleitorais. Por isso, desconfie de notícias alarmistas, de suposta perseguição religiosa, vinculadas a uma suposta ideologia de gênero, ou “contra a Bíblia”.

Bereia recebeu folhetos de leitores com campanha difamatória e os tons alarmistas sem autor identificado – ou então com a autoria da peça ilegível. Por que isso acontece? Porque os verdadeiros autores sabem que se trata de um crime eleitoral – e passam adiante a responsabilidade, tentando dificultar o rastreamento de sua autoria.

Os eleitores deverão retornar às urnas no próximo dia 29 de novembro para escolha final do próximo prefeito ou prefeita das cidades. É importante tomar cuidado com as falsas acusações.

Fique atento! Há muita campanha no segundo turno fazendo uso de material falso não apenas para apoiar candidatos mas também para destruir a reputação de candidatos opostos.

Lembre-se que isto já ocorreu em 2018 e é objeto de investigação no STF, na Polícia Federal. E em comissão parlamentar mista de inquérito no congresso. No Rio de Janeiro, Espírito Santo, Recife e Fortaleza, Bereia recebeu material que busca manipular a população religiosa contra adversários políticos de alguns candidatos. A estratégia, como em 2018, é de pânico moral e terrorismo verbal para convencer pessoas pelo medo.

Mais uma vez, pela falta de provas e autoria duvidosa, Bereia verifica que quem cria o material busca fazer de quem o repassa cúmplice de um crime eleitoral e de uma campanha difamatória.

Seja prudente e fique alerta. Se você receber algum conteúdo alarmista e tem dúvidas se é falso ou verdadeiro, envie por e-mail para coletivobereia@gmail.com ou entre em contato pelo nosso WhatsApp – (38) 98418-6691 ou clique aqui e envie o seu conteúdo.

Confira gravação abaixo para o Jornal Brasil Hoje, da Rede Católica de Rádio (RCR), que vai ao ar esta semana: