Lamento de cativeiro e de libertação

Neste dia, 20 de novembro de 2020, quando celebramos o dia da consciência negra, dia de reflexão contra o racismo e de reconhecimento da dignidade da população negra no Brasil (mais da metade da população), foi covardemente assassinado, a pancadas e sufocado até à morte, o negro João Alberto Freitas, de 40 anos, por dois seguranças e um policial num Carrefour de Porto Alegre. As cenas mostram inominável brutalidade e covardia e revelam todo o racismo presente em setores da sociedade e o quanto desumanos e cruéis podemos ser.

Em homenagem a João Alberto Freitas republico um texto lançado tempos atrás, mas que guarda permanente atualidade.

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A Paixão de Cristo continua pelos séculos afora no corpo dos crucificados. Jesus agonizará até o fim do mundo, enquanto houver um único de seus irmãos e irmãs que esteja ainda pendendo de alguma cruz, à semelhança dos bodhisatwas budistas (os iluminados) que param no umbral do Nirvana para retornarem ao mundo da dor – samsara – em solidariedade com quem sofre, pessoas, animais e plantas. Nesta convenção, a Igreja Católica, na liturgia da Sexta-feira Santa, coloca na boca do Cristo estas palavras pungentes:

”Que te fiz, meu povo eleito? Dize em que te contristei! Que mais podia ter feito, em que foi que te faltei? Eu te fiz sair do Egito, com maná de alimentei. Preparei-te bela terra, tu, a cruz para o teu rei”.

Celebrando a abolição da escravatura a 13 de maio de 1888, nos damos conta de que ela não foi completada ainda. A paixão de Cristo continua na paixão do povo negro. Falta a segunda abolição, da miséria e da fome. Ouvem-se ainda os ecos dos lamentos de cativeiro e de libertação, vindos das senzalas, hoje das favelas ao redor de nossas cidades. A população negra ainda nos fala em forma de lamento:

“Meu irmão branco, minha irmã branca, meu povo: que te fiz eu e em que te contristei? Responde-me!

Eu te inspirei a música carregada de banzo e o ritmo contagiante. Eu te ensinei como usar o bumbo, a cuíca e o atabaque. Fui eu que te dei o rock e a ginga do samba. E tu tomaste do que era meu, fizeste nome e renome, acumulaste dinheiro com tuas composições e nada me devolveste.

Eu desci os morros, te mostrei um mundo de sonhos, de uma fraternidade sem barreiras. Eu criei mil fantasias multicores e te preparei a maior festa do mundo: dancei o carnaval para ti. E tu te alegraste e me aplaudiste de pé. Mas logo, logo, me esqueceste, reenviando-me ao morro, à favela, à realidade nua e crua do desemprego, da fome e da opressão.

Meu irmão branco, minha irmã branca, meu povo: que te fiz eu e em que te contristei? Responde-me!

Eu te dei em herança o prato do dia a dia, o feijão e o arroz. Dos restos que recebia, fiz a feijoada, o vatapá, o efó e o acarajé: a cozinha típica do Brasil. E tu me deixas passar fome. E permites que minhas crianças morram famintas ou que seus cérebros sejam irremediavelmente afetados, infantilizando-as para sempre.

Eu fui arrancado violentamente de minha pátria africana. Conheci o navio fantasma dos negreiros. Fui feito coisa, peça, escravo. Fui a mãe preta para teus filhos. Cultivei os campos, plantei o fumo e a cana. Fiz todos os trabalhos. Fui eu que construí as belas igrejas que todos admiram e os palácios que os donos de escravos habitavam. E tu me chamas de preguiçoso e me prendes por vadiagem. Por causa da cor da minha pele me discriminas e me tratas ainda como se continuasse escravo.

Meu irmão branco, minha irmã branca, meu povo: que te fiz eu e em que te contristei? Responde-me!

Eu soube resistir, consegui fugir e fundar quilombos: sociedades fraternais, sem escravos, de gente pobre, mas livre, negros, mestiços e brancos. Eu transmiti apesar do açoite em minhas costas, a cordialidade e a doçura à alma brasileira. E tu enviaste o capitão do moto para me caçar como bicho, arrasaste meus quilombos e ainda hoje impedes que a abolição da miséria que escraviza, seja para sempre verdade cotidiana e efetiva.

Eu te mostrei o que significa ser templo vivo de Deus. E, por isso, como sentir Deus no corpo cheio de axé e celebrá-lo no ritmo, na dança e nas comidas. E tu reprimiste minhas religiões chamando-as de ritos afro-brasileiros ou de simples folclore. Invadiste meus terreiros, jogando sal e destruindo nossos altares. Não raro, fizeste da macumba caso de polícia. A maioria dos jovens assassinados nas periferias, na idade entre 18 e 24 anos são negros, pelo fato de serem negros ou suspeitos de estarem a serviço das máfias da droga. A maioria deles são simples trabalhadores.

Meu irmão branco, minha irmã branca, meu povo:que te fiz eu e em que te contristei? Responde-me!

Quando com muito esforço e sacrifício consegui ascender um pouco na vida, ganhando um salário suado, comprando minha casinha, educando meus filhos, cantando o meu samba, torcendo pelo meu time de estimação e podendo tomar no fim de semana uma cervejinha com os amigos, tu dizes que sou um negro de alma branca diminuindo assim o valor de nossa alma de negros dignos e trabalhadores. E nos concursos em igual condição quase sempre tu decides em favor de um branco.

E quando se pensaram políticas que reparassem a perversidade histórica, permitindo-me o que sempre me negaste, estudar e me formar nas universidades e nas escolas técnicas assim melhorar minha vida e de minha família, a maioria dos teus grita: é contra a constituição, é uma discriminação, é uma injustiça social.

Meu irmão branco, minha irmã branca, meu povo: Que te fiz eu e em que te contristei? Responde-me!”

Meus irmãos e irmãs negros, nesse dia 20 de novembro, dia de Zumbi e da consciência negra quero homenagear todos vocês que conseguiram sobreviver porque a alegria, a música e da dança está dentro de vocês, apesar de toda a via-sacra de sofrimentos que injustamente lhes são impostos.

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Foto de capa: Pixabay/Reprodução

Tamanho da arrogância

No início de julho, um fiscal da Vigilância Sanitária exigiu que um casal do Rio seguisse os protocolos de prevenção à Covid-19. Disse “Cidadão…”. A mulher reagiu: “Cidadão não, engenheiro civil, melhor do que você!” E se recusaram a adotar os procedimentos exigidos.

A arrogante senhora foi demitida, no dia seguinte, da empresa na qual trabalhava. Se o fiscal Flávio Graça, que ali cumpria o seu dever, retrucasse no mesmo tom, diria com autoridade que é formado em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Fluminense, doutorado pela Universidade Federal Rural do RJ, coordenador de cursos de pós-graduação e superintendente de Inovação, Pesquisa e Educação em Vigilância Sanitária, Fiscalização e Controle de Zoonoses da Prefeitura do Rio.

Poucos dias depois, em Santos (SP), o desembargador Eduardo Almeida Prado Siqueira foi multado por caminhar na praia sem máscara, contrariando decreto da prefeitura. Chamou o guarda municipal de “analfabeto”, ligou para o secretário de segurança do município para intimidar o responsável pela multa, rasgou-a e jogou-a no chão.

Em Catalão (GO), no final de junho, um comerciante de 76 anos foi agredido ao alertar um cliente da exigência de usar máscara na loja. Fraturou o fêmur e ficará seis meses em cadeira de rodas.

Em abril, em Araucária (PR), um homem foi impedido pelo segurança de entrar sem máscara no supermercado. Discutiram e houve o disparo de um tiro, que matou uma funcionária do estabelecimento.

Essa arrogância entranhada em muitos brasileiros tem raízes históricas. Foram 380 anos de escravatura em nosso país, durante os quais os brancos tratavam os negros com um desrespeito que jamais repetem ao lidar com seus animais de estimação. E, hoje, temos um presidente da República que viola todos os protocolos de prevenção sanitária, dando péssimo exemplo à nação.

Entre os vários sintomas do complexo de superioridade, segundo o psicólogo Alfred Adler, criador da Psicologia do Desenvolvimento Individual, manifestam-se o autoconvencimento, a atitude de considerar os outros inferiores e apontar defeitos, a inveja, a busca de reconhecimento, a excessiva preocupação com a opinião alheia, a falsa autossegurança.

“Educação vem do berço”, dizia minha avó. Uma criança que dá ordens à faxineira, humilha a cozinheira por não gostar de uma comida, desrespeita a professora, está fadada a ser infeliz e fazer os outros infelizes. Porque todo prepotente é amargo, irascível, preconceituoso.

Uma senhora branca saía do supermercado em Brasília (DF) e, ao avistar um negro, pediu que ele empurrasse o carrinho de compras até o estacionamento. Ele aquiesceu. Colocado tudo no porta-malas, ela lhe estendeu uma gorjeta. Ele rejeitou com um sorriso: “Agradeço, senhora. Fiz por gentileza.” Aconteceu com Vicentinho, deputado federal (PT-SP).

Quando eu me encontrava na Inglaterra, em 1987, um sobrinho da rainha Elizabeth II foi parado pela polícia rodoviária ao dirigir em alta velocidade. “Sabe com quem você está falando?”, disse ao guarda. “Quem você pensa que é?”, retrucou o policial. Por não trazer carteira de habilitação, foi multado, e o carro, apreendido. Mais tarde, o juiz exigiu que ele pedisse desculpas ao guarda.

Para Jesus, poder é servir: “O maior seja como o mais novo, e quem governa, como aquele que serve” (Lucas 22,24). Mas estamos longe de nos impregnar dessa cultura. Em um país com abissais desigualdades sociais, os privilegiados tendem a se considerar muito superiores aos marginalizados. As pessoas não importam. Importam os bens materiais que as emolduram.

Em 2007, o violinista Joshua Bell deu um concerto no Teatro de Boston, lotado de apreciadores que pagaram, no mínimo, 100 dólares por ingresso. Dias depois, o jornal Washington Post decidiu testar a cultura artística do público. Levou o violinista para a estação de metrô da capital americana. Durante 45 minutos, ele tocou Bach, Schubert, Ponce e Massenet.

Eram oito horas de uma manhã fria. Milhares de pessoas circulavam pelo metrô. Quatro minutos após iniciar o concerto subterrâneo, o músico viu cair a seus pés seu primeiro dólar, atirado por uma mulher que não parou. Quem mais lhe deu atenção foi um menino. Porém, a mãe o arrastou, embora ele mantivesse o rosto virado para o violinista enquanto se distanciava.

Durante todo o tempo do concerto, apenas sete pessoas pararam um instante para escutar. Cerca de vinte jogaram dinheiro sem deter o passo. Ao todo, 32 dólares e 17 centavos a seus pés. Quando cessou a música, ninguém aplaudiu.

Bell é considerado um dos melhores violinistas do mundo. Mas nessa sociedade neoliberal hegemonizada pelo paradigma do mercado, ele ali era um “produto” colocado na prateleira errada. Como se o fato de estar em local público tornasse sua música de menos qualidade. Estivesse um músico medíocre no palco do Teatro de Boston com certeza teria sido ovacionado.

Como disse Molière, “devemos olhar demoradamente para nós próprios antes de pensar em julgar os outros.”

Foto de Capa: TV Globo/Reprodução

Como Sérgio Camargo transformou a Fundação Cultural Palmares em reduto ideológico de extrema-direita

Entre tantas figuras polêmicas e controversas que integram o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o jornalista Sérgio Nascimento de Camargo, atual presidente da Fundação Palmares, chama a atenção por ter um histórico e atuação que destoam do cargo ocupado.

A equipe Bereia fez um levantamento dos principais fatos que envolvem Sérgio Camargo e sua atuação polêmica frente à Fundação Palmares.

Sérgio Nascimento de Camargo foi nomeado presidente da Fundação Palmares, em 27 de novembro de 2019, pelo então secretário Especial da Cultura, Roberto Alvim. Segundo o Portal da Transparência, sua remuneração líquida é de R$19.503,94.

A fundação Palmares foi criada em 1988 para promover e preservar a cultura negra no país, com ações de inclusão e sustentabilidade das comunidades remanescentes de quilombos, por exemplo. Entre os objetivos, está o de “apoiar e desenvolver políticas de inclusão dos afro-descendentes no processo de desenvolvimento político, social e econômico por intermédio da valorização da dimensão cultural”.

Muito antes da nomeação, Camargo já era conhecido por suas declarações controversas em redes sociais. Um dia após sua nomeação foi criado um abaixo-assinado na internet contra a sua permanência no cargo. Mais de 80 mil pessoas já endossaram o abaixo-assinado. O Coletivo por um Ministério Público Transformador – TRANSFORMA MP, associação formada por membras e membros do Ministério Público dos Estados e da União, publicou uma nota de repúdio à nomeação de Camargo.

Camargo é contra o sistema de cotas, defende a extinção do “Dia da Consciência Negra”, diz que a escravidão foi benéfica para os descendentes e que o racismo não existe no Brasil. 

Em seu perfil na mídia social Twitter, Sérgio Camargo se define como “negro de direita, contrário ao vitimismo e ao politicamente correto”. Entre suas publicações mais polêmicas, Sérgio afirmou que a escravidão foi terrível, mas “benéfica para seus descendentes” uma vez que, segundo ele, os negros no Brasil vivem em melhor situação que os negros da África.

Camargo também defende abertamente o fim do Dia da Consciência Negra, que, em suas palavras, “é uma data que a esquerda se apropriou para propagar vitimismo e ressentimento racial”.

(Reprodução/ Twitter)

Camargo causou reações por menções a ex-vereadora assassinada Marielle Franco, ao escrever “Marielle jamais será heroína legítima dos negros brasileiros, exceto para os esquerdopatas, os que estão nas biqueiras e nos presídios”.

(Reprodução/ Facebook)

Embora se diga um negro conservador de direita, Sérgio Camargo é filho de escritor ativista Oswaldo Camargo, especialista em literatura negra e militante do movimento negro. O autor é um dos mais importantes representantes do gênero literário no Brasil.

O irmão de Camargo também é contra seus posicionamentos. Waldico Camargo, que é músico e produtor divulgou um abaixo-assinado contra a nomeação do irmão, para presidir a Fundação Palmares no mesmo dia do anúncio da nomeação.

O anúncio gerou diversas reações populares contrárias, tanto que em 04 de dezembro o juiz Emanuel José Matias Guerra, da 18ª Vara Federal do Ceará determinou a suspensão de sua nomeação em ação movida por advogado. Guerra afirmou que havia diversas publicações do jornalista que tinham o “condão de ofender justamente o público que deve ser protegido pela Fundação Palmares”.

Após a determinação do juiz, o governo Bolsonaro suspendeu a nomeação de Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares, decisão que foi publicada em edição extra do “Diário Oficial da União”, no dia 11 de dezembro de 2019.

Em 12 de fevereiro de 2020 o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) derrubou a liminar da Justiça Federal e autorizou a nomeação de Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares. Em uma de suas primeiras ações à frente da Fundação, Camargo excluiu sete órgãos colegiados: o Comitê Gestor do Parque Memorial Quilombo dos Palmares; a Comissão Permanente de Tomada de Contas Especial; o Comitê de Governança; o Comitê de Dados Abertos; a Comissão Gestora do Plano de Gestão de Logística Sustentável; a Comissão Especial de Inventário e de Desfazimento de Bens e o Comitê de Segurança da Informação.

Em 13 de maio, data que relembra a promulgação da Lei Áurea no Brasil, os perfis institucionais da Fundação Palmares nas mídias sociais divulgaram textos que propunham o revisionismo da figura de Zumbi dos Palmares, que coloca em xeque informações sobre a figura de Zumbi. A justiça federal determinou em ambos os artigos – “Zumbi foi um herói?”, da professora Mayalu Felix, e “Zumbi e a Consciência Negra – Existem de verdade?”, do professor Luiz Gustavo dos Santos Chrispino,- fossem retirados do ar, sujeito `multa de 1000 (mil) reais por dia em que o conteúdo ficasse visível na página.

No dia 18 de maio, deputados do PT e Psol apresentaram à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão uma representação contra o jornalista Sérgio Camargo. Os parlamentares pediam denúncia criminal do jornalista por declarações incompatíveis com o cargo que ocupa.

No dia 19 de maio, o advogado Hélio Silva Júnior, atuante na defesa do patrimônio afro-brasileiro, protocolou uma ação popular na 22ª Vara Cível Federal de São Paulo, que pedia a suspensão de peças publicitárias veiculadas nas mídias sociais e no site oficial da Fundação Cultural Palmares.

As publicações dos perfis institucionais da Fundação Palmares causaram reações em coletivos em diversos estados do Brasil que em 20 de maio organizaram um abaixo-assinado em repúdio às postagens.

No dia 02 de junho, surgiu outra polêmica relacionada a Camargo. Em áudio vazado de uma reunião a portas fechadas, Sérgio Camargo declarava, novamente, seu posicionamento contra o movimento negro, que chamou de “escória maldita que abriga vagabundos”, além de atacar mais uma vez a memória do herói negro Zumbi dos Palmares, a quem se referiu como: “filho da puta que escravizava pretos”.

No áudio, obtido pelo jornal O estado de S. Paulo, o presidente da Fundação se refere à mãe de santo Adna dos Santos como “macumbeira”. “Tem gente vazando informação aqui para a mídia, vazando para uma mãe de santo, uma filha da puta de uma macumbeira, uma tal de Mãe Baiana, que ficava aqui infernizando a vida de todo mundo”, afirmou ele.

No dia 03 de junho a religiosa citada na gravação procurou a Polícia Civil do Distrito Federal para prestar queixa por discriminação religiosa cometida por Sérgio Camargo. O caso foi registrado como injúria racial e discriminação racial.

A fundação Palmares foi criada para preservar a cultura africana e entre ela as religiões de matriz africana como a Umbanda e o Candomblé, no entanto, segundo levantamento, essas são o principal alvo de discriminação religiosa no Brasil 

No dia 04 de junho, a cantora Teresa Cristina fez um show ao vivo com músicas de umbanda via Instagram do qual a cantora Alcione participou. No show, Alcione fez um comentário sobre Sérgio Camargo: “Hoje eu vi aquela matéria do Zé Ninguém lá da Fundação Palmares. Ainda dou na cara dele para parar de ser um sem noção”, disse ela.

Camargo usou seu perfil no Twitter para rebater o comentário da cantora: “Alcione, vê se enxerga! Admiro Jessye Norman, umas das maiores cantoras de ópera da história da música, não uma barraqueira que incita ao crime e à violência contra um negro que tem opiniões próprias. Desprezo suas declarações, assim como sua insuportável ‘música’!”

Desde a semana do dia 8 de junho algumas páginas do site da Fundação Palmares que tratavam da história de vários ativistas do movimento de igualdade e justiça racial brasileiro foram retiradas do ar. Artigos sobre Zumbi dos Palmares, que dá nome à Fundação, dos abolicionistas Luís Gama e André Rebouças são algumas das biografias que não podem mais ser encontradas no site.

Sérgio disse em seu Twitter que mandou excluir do site da Fundação artigos sobre o que chamou de ícones da esquerda vitimista. “Determinei, quando tomei posse, a retirada de lista de personalidades que homenageia, entre outros, Benedita da Silva e Marielle, ícones da esquerda vitimista. A lista retornará após revisão. “Personalidades negras” destituídas de mérito e nobreza não serão homenageadas na minha gestão”.

Devido à sua ação de remover os artigos, a Rede Sustentabilidade entrou com um pedido de liminar para afastar Sérgio Camargo do cargo. No pedido houve a alegação de que Camargo não poderia permanecer na presidência do órgão por “ostentar publicamente opinião contrária às finalidades da instituição”. Na segunda-feira, 15 de junho, a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Regina Helena Costa, negou o pedido.

Sobre o apagamento de artigos, Sérgio Camargo voltou a se pronunciar em seu Twitter na segunda-feira (15): “A Fundação Cultural Palmares não pertence ao movimento negro, conjunto de escravos ideológicos da esquerda, ínfima minoria dos negros brasileiros“. “A Fundação pertence ao povo brasileiro, de todos tons de pele, sem qualquer distinção”.

Esta afirmação é desinformativa uma vez que, oficialmente, a Fundação Palmares é uma “instituição pública voltada para promoção e preservação dos valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira”.

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Referências de Checagem

Matéria da Folha.uol revela que Sérgio Camargo é filho de ativista. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/11/nomeado-para-palmares-que-ataca-movimento-negro-e-filho-de-escritor-ativista.shtml

Ministra do STJ rejeita liminar para afastar Sérgio Camargo da presidência da fundação Palmares. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/11/nomeado-para-palmares-que-ataca-movimento-negro-e-filho-de-escritor-ativista.shtml

Sérgio Camargo ataca movimento negro. Disponível em: https://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2020-06-16/ministra-do-stj-rejeita-liminar-para-afastar-presidente-da-fundacao-palmares.html

Sérgio Camargo exclui sete órgãos da fundação palmares. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/06/16/movimento-negro-e-conjunto-de-escravos-diz-camargo.htm

Waldico Camargo repúdia nomeação do irmão para presidência da fundação. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/politica/presidente-da-fundacao-palmares-exclui-orgaos-e-passa-a-concentrar-decisoes-1.2220573

Sérgio Camargo exclui biografias do site oficial da fundação. Disponível em; https://oglobo.globo.com/cultura/biografias-de-icones-do-movimento-negro-desaparecem-de-site-da-fundacao-palmares-1-24481027

Jornal O estado de São Paulo divulga áudio no qual Sérgio Camargo ataca novamente o movimento negro. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,presidente-da-fundacao-palmares-chama-movimento-negro-de-escoria-maldita-ouca-audio,70003322554

Abaixo-assinado contra a permanência de Sérgio Camargo na presidência da Fundação Palmares https://secure.avaaz.org/po/community_petitions/Presidente_da_Rep_1/?lDDfjpb

Remuneração de Sérgio Camargo no Portal da Transparência http://www.portaltransparencia.gov.br/servidores/170316696 

Nota de Repúdio à nomeação de Sérgio Camargo https://www.ajd.org.br/noticias/2511-nota-de-repudio-a-nomeacao-de-sergio-nascimento-de-camargo-para-presidente-da-fundacao-cultural-palmares

É verdade que brancos se ajoelham em oração pedindo perdão a negros por anos de racismo

O site CPAD NEWS divulgou, em 3 de junho, matéria com o título “Brancos se ajoelham em oração pedindo perdão a negros por anos de racismo”. Segundo o site, ato ocorreu em 31 de maio no bairro Terceira Ala, na cidade de Houston, no Texas (EUA), durante protestos após a morte de George Floyd, homem negro que foi asfixiado por policial branco em 25 de maio durante ação policial em Minneapolis (EUA).

O ato solidário contra o racismo reuniu um grupo de pessoas brancas, que ajoelhadas diante de pessoas negras, pedia perdão por anos de preconceito.

Em vídeo gravado pelo canal KPRC 2 Click2Houston um dos homens brancos afirma durante oração:

Deus Pai, pedimos perdão a nossos irmãos e irmãs negros por anos e anos de racismo.”

Desde o início dos protestos, iniciados em 26 de maio, ficar de joelhos têm sido um gesto global para mostrar respeito pelos pedidos de justiça e pelo fim do racismo policial.

Fonte: Reuters/Jonathan Ernst

Além de sinal pela luta por justiça social, dobrar um dos joelhos faz referência à imagem de terror que mostra George Floyd sendo asfixiado por um policial. Floyd foi detido após o funcionário de uma mercearia chamar a polícia e acusar o homem de tentar pagar as compras com uma nota falsa de US$ 20.

Fonte: AFP/Facebook/Darnella Frazier

Atos em protesto contra o racismo aconteceram em escala global após a morte de Floyd. Milhares de pessoas saíram às ruas para dizer

basta de racismo, fascismo e violência policial”. 

Houve manifestações pelo mundo. As mais numerosas aconteceram nos Estados Unidos, Austrália, Reino Unido e na França. Em Paris, inclusive, um ato com mais de 15 mil pessoas também relembrou a morte do jovem francês Adama Traoré.

O Coletivo Bereia verificou as imagens e vídeos de ato de perdão e confirma a veracidade das informações destacando o conteúdo como VERDADEIRO.

Inúmeras manifestações, inclusive nas mídias sociais, continuam a protestar contra séculos de racismo. Bereia reafirma que a publicação de informação responsável é fundamental para reforçar e legitimar a luta social e evangélica em favor do direito à vida e à justiça de todos os negros e negras do Brasil e do mundo.

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Referências de Checagem:

CPAD NEWS. Brancos se ajoelham em oração pedindo perdão a negros por `anos de racismo´. Disponível em: http://www.cpadnews.com.br/universo-cristao/50545/brancos-se-ajoelham-em-oracao-pedindo-perdao-a-negros-por-anos-de-racismo.html

Diário do Povo. Relatório de autópsia independente de George Floyd indica morte por asfixia. Disponível em: <http://portuguese.people.com.cn/n3/2020/0602/c309808-9696697.html>

G1. Por que as pessoas se ajoelham durante os protestos contra racismo policial nos EUA?. Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2020/06/04/por-que-as-pessoas-se-ajoelham-durante-os-protestos-contra-racismo-policial-nos-eua.ghtml>

G1. Duas novas autópsias afirmam que George Floyd foi morto por asfixia. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2020/06/01/duas-novas-autopsias-afirmam-que-george-floyd-foi-morto-por-asfixia.ghtml

O Impacto. Houston, cidadãos brancos se ajoelham perante negros e pedem perdão. Disponível em: https://oimpacto.com.br/2020/06/01/houston-cidadaos-brancos-se-ajoelham-perante-negros-e-pedem-perdao/. Acesso em: 06 jun. 2020.

Youtube. White people kneel, ask forgiveness from the black community in Third Ward. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?time_continue=8&v=fdX6aVzPgHs&feature=emb_logo