Candidata à Presidência da OAB-RJ faz campanha alarmista com líderes da Assembleia de Deus – Ministério Madureira
Notícia sobre uma palestra da candidata à presidência da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)-RJ Ana Tereza Basílio, em um encontro de líderes da igreja evangélica Assembleia de Deus Madureira, publicada em coluna do site Metrópoles, ocupou espaço em perfis de mídias sociais e de veículos de notícias, como a revista Fórum.
Imagem: Reprodução site Metrópoles
Imagem: Reprodução do site Fórum
Na matéria intitulada “Candidata à OAB-RJ critica taxação de templos em igreja evangélica”, o site Metrópoles informa que a candidata, que é a atual vice-presidente da entidade, falou no encontro com os religiosos, sobre “Isenção Tributária para as Igrejas”. O veículo reporta que no evento, ocorrido em 2 de julho, o líder do Ministério Madureira das Assembleias de Deus, também advogado e presidente da Comissão de Juristas Evangélicos e Cristãos da OAB Nacional, bispo Abner Ferreira, pediu votos para Ana Tereza Basílio, que concorre à eleição para a presidência da Ordem fluminense, que acontece em novembro.
O Metrópoles relatou as falas de Basílio e do bispo Ferreira. A nota ressalta ainda que a vice-presidente da OAB-RJ se filiou no ano passado à Associação Brasileira de Juristas Conservadores (Abrajuc) que, segundo o veículo, é formada em grande parte por aliados de Jair Bolsonaro no mundo jurídico.
O texto da nota destaca o pronunciamento do bispo Abner Ferreira na reunião: “Eu queria fazer um apelo aos amigos, principalmente às autoridades que estão aqui para não esquecer o nome da doutora Ana Basílio nas suas bases. Todo município tem a sua seccional. Não só recomendo, como estarei somando forças com o trabalho”.
Na repercussão da matéria do Metrópoles, a revista Fórum optou pelo título “Será o apocalipse? Evangélicos e conservadores querem dominar a OAB-RJ”. O texto é aberto com a avaliação “O que parecia ser uma assombração somente no campo da política brasileira alcançou os domínios da OAB-RJ, o uso eleitoral das igrejas evangélicas chegou na disputa pela presidência da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Rio de Janeiro”. A matéria da Fórum também destaca a fala do bispo Abner Ferreira, que pediu votos para Ana Basílio, classificando o encontro como “um comício”.
Com apuração mais ampla, a matéria da Fórum ouviu um pastor evangélico e juristas. O pastor e teólogo Zé Barbosa Jr, colunista da Fórum, rebateu a forma como a advogada tratou o tema. “A advogada em questão parece desconhecer que a maioria das obras de caridade das igrejas são feitas por ofertas destinadas exclusivamente para isso e, em sua maioria, executada através do voluntariado. Tributar ou não tributar as igrejas pouco afetaria o trabalho beneficente das instituições religiosas”, apontou Barbosa.
Entre os outros especialistas que falaram à Fórum está o jurista e professor de Direito Lenio Streck, que questionou a fala da candidata à presidência da OAB-RJ. “Imunidade tributária é matéria constitucional. O problema é fazer a interpretação correta. Hoje a imunidade já se alastrou até mesmo ao aluguel e ao carro dos pregadores. A imunidade começou com uma coceirinha e virou uma gangrena de recursos públicos. Ademais, ela ficou inserida numa autêntica confusão entre política e religião, o que representa um atraso”.
Bereia verificou a informação sobre o evento e comparou as abordagens das duas mídias sobre o fato.
Isenções fiscais para os templos
Bereia apurou que a atual vice-presidente da OAB-RJ e candidata à presidência da seccional fluminense da Ordem Ana Tereza Basílio divulgou a palestra para lideranças assembleianas, com trecho da gravação em vídeo, em seu perfil no Instagram. No extrato divulgado, ela afirma que “seria um grande embaraço para as obras de caridade, para os relevantes trabalhos da igreja, que ela tivesse ônus tributários”.
Ana Basílio, que também é sócia fundadora da Basílio Advogados, declarou ainda que estava no evento apenas na condição de vice-presidente da OAB-RJ para defender a Constituição, que no “artigo 150, inciso VI, alínea b, estabelece a isenção tributária para entidades e templos religiosos”. Ela destacou que apesar da isenção estar prevista na Constituição, há “denúncias de que alguns municípios (no RJ) têm descumprido a lei e cobrado IPTU de maneira irregular”.
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De fato, a isenção fiscal de igrejas e entidades religiosas está prevista na Constituição no artigo 150, da Constituição Federal de 1988. O texto garante que qualquer entidade de cunho religioso seja imune a impostos cobrados por estados, municípios e União. Uma das justificativas para a isenção das cobranças é a proteção da liberdade religiosa, já que o direito à imunidade tributária é igual para todas as entidades, independentemente da religião.
Entre os tributos isentos estão o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), Imposto de Renda (IR), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) – desde que os veículos estejam em nome da igreja.
O tom alarmista da vice-presidente da OAB-RJ destaca que municípios fluminenses têm cobrado Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) de forma irregular, contudo, não apresentou detalhes ou provas sobre essas denúncias. Em contrapartida, ações governamentais que ampliam as vantagens fiscais para entidades religiosas têm crescido nos últimos anos.
Em 2019, na cidade do Rio de Janeiro, o então prefeito, hoje deputado federal, Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), que é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, isentou 426 templos no Rio da taxa de IPTU.
No plano nacional, em fevereiro de 2022, foi aprovada no Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição 116/2022, que amplia a isenção tributária para imóveis alugados por entidades religiosas. Na prática, a emenda deixa claro na Constituição que qualquer instituição religiosa, mesmo que alugue o imóvel onde realiza as cerimônias, estará isenta do pagamento do IPTU. Sendo assim, imóveis alugados por igrejas ficam isentos do imposto. Segundo os parlamentares proponentes, apesar da Constituição já garantir a imunidade tributária aos imóveis usados para fins religiosos, havia vários casos em que o benefício era negado, especialmente se o local fosse alugado.
Em fevereiro deste ano, uma Comissão Especial na Câmara Federal (que acelera a tramitação de propostas, encaminhando-as direto ao plenário, caso aprovadas), decidiu pela ampliação da imunidade tributária para templos de qualquer culto. A PEC 5/2023, proposta por um grupo de parlamentares liderado pelo deputado Marcelo Crivella, foi aprovada na Comissão, e proíbe a cobrança de tributos sobre bens ou serviços necessários à formação do patrimônio, à geração de renda e à prestação de serviços de todas as religiões.
O entendimento é que as igrejas poderiam ficar isentas de pagar imposto até na energia elétrica usada e na compra de materiais de construção para templos, por exemplo. A regra também se aplica a instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos ligadas às instituições religiosas. O impacto estimado da ampliação da imunidade, de acordo com o relator deputado Fernando Máximo (União-RO), é de R$ 1 bilhão por ano. O texto poderá ser encaminhado ao plenário da Câmara para votação.
Na contramão das decisões anteriores, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 3050/2021, de autoria do ex-deputado Nereu Crispim (PSD/RS), que submete templos de qualquer culto às regras vigentes para as pessoas jurídicas, que determinam o pagamento de três contribuições para o financiamento da Seguridade Social (CSLL, Cofins e PIS/Pasep). A medida revogaria, assim, o tratamento tributário diferenciado hoje destinado às igrejas. “É possível verificar que algumas igrejas vão além do propósito espiritual e funcionam como empresas, concorrendo em condições desiguais. Este projeto de lei vem para tributá-las com tratamento semelhante ao das demais pessoas jurídicas”, afirmou o autor à agência Câmara em fevereiro de 2022. Entretanto, a matéria segue o trâmite das comissões regulares e está parada aguardando designação do relator na Comissão de Finanças e Tributação (CFT), desde maio de 2022.
Sobre o perfil político conservador na OAB-RJ
A estratégia de campanha eleitoral para a presidência da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no RJ, com líderes de uma das maiores igrejas do Estado e com tema apelativo ao perfil dos participantes, reflete o perfil construído pela direção da OAB-RJ no último mandato.
O Metrópoles já havia publicado desde o início do ano outras colunas escritas por Guilherme Amado que apontam, por exemplo, a tendência política conservadora da vice-presidente da OAB-RJ. Como principal ponto está sua associação à Abrajuc, em agosto de 2023.
A Associação Brasileira de Juristas Conservadores (Abrajuc), criada em 21 de agosto de 2021, é formada por advogados, juristas e juízes e se apresenta como “pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, apartidária” segundo nota oficial publicada em seu Instagram.
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Com integrantes com perfil mais alinhado à política de direita e de extrema direita, já realizou eventos com a presença do senador Flávio Bolsonaro (PL) e do ex-ministro do governo de Jair Bolsonaro (PL) e atual ministro do Supremo Tribunal Federal André Mendonça.
A adesão de Ana Basílio à Abrajuc, abordada pela imprensa, passou a evidenciar o quadro mais conservador na Ordem Fluminense. A última convenção anual da entidade, em 15 de março, contou com a participação de Ana Tereza Basílio.
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A filiação de Basílio à Associação tem sido interpretada como forma de impulsionar sua candidatura à presidência da Ordem. As eleições acontecem em novembro e a vice-presidente tem o apoio do atual presidente, Luciano Bandeira.
Em entrevista à revista Fórum a ex-conselheira da entidade Nadine Borges demonstrou espanto com a aproximação de Ana Basílio a religiosos. “O uso da estrutura da OAB-RJ pela atual direção é um risco para a advocacia fluminense. A entidade deve servir para melhoria das condições de trabalho da classe e não para um balcão de negócios voltado para a promoção pessoal de meia dúzia que domina o mercado e atua como puxadinho do Poder Judiciário. Usar as religiões como ferramenta eleitoreira é uma prática que atenta contra a democracia e os princípios da ordem dos advogados do Brasil.”
Desde o início do ano, outros acontecimentos, além da palestra de Basílio, chamaram a atenção para o alinhamento mais conservador na OAB. Em março deste ano, o tesoureiro e presidente da Comissão de Prerrogativas na OAB-RJ Marcello Oliveira, e o secretário-Geral da Ordem Álvaro Quintão, renunciaram aos cargos em protesto à atual administração da entidade. A decisão foi motivada pela reprovação pública, feita pelo presidente Luciano Bandeira, à Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, que planejava solicitar a reabertura de inquéritos relacionados ao delegado Rivaldo Barbosa, preso sob suspeita de envolvimento no caso Marielle.
Em março, Marcello Oliveira expressou que não aceitaria ser repreendido por exercer suas funções em defesa dos interesses da advocacia, especialmente quando se trata de exigir transparência nas investigações policiais e criticar práticas que considera prejudiciais ao sistema judiciário. “Não vamos aceitar ser repreendidos pelo presidente, a mando da candidata recém-lançada Ana Tereza Basílio, por exercer nossas funções, quando exigimos a reabertura dos inquéritos e criticamos a política do cafezinho com o TJRJ, em um momento em que a advocacia está sendo massacrada, penando com um mercado concentrado e uma Justiça cara e excludente”, disse o ex Tesoureiro ao portal Metrópoles. O presidente da OAB-RJ Luciano Bandeira, por sua vez, afirmou que os fatos “estão sendo distorcidos” e que “estão querendo fazer confusão devido à proximidade do processo eleitoral no final do ano”.
Em junho deste ano, Marcello Oliveira anunciou a candidatura à presidência da OAB-RJ, com o apoio do político do Estado Marcelo Freixo, hoje presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur),
A advogada Amanda Magalhães deixou a presidência da OAB Jovem e reforçou as críticas de Oliveira. Em sua conta no Instagram, Amanda Magalhães disse que deixou o cargo “sem [receber] nenhum reconhecimento e sequer um simples obrigado”, e alertou que ”determinados projetos de poder criaram uma verdadeira OAB paralela (e até uma OAB jovem paralela) e denotam o que está por vir”.
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Bereia verificou que é verdadeiro o conteúdo publicado pelo site Metrópoles, repercutido pela revista Fórum, sobre a reunião com líderes da Assembleia de Deus – Ministério Madureira para campanha eleitoral à Presidência da OAB-RJ da atual vice-presidente da entidade Ana Basilio, com base em discurso alarmista sobre cobrança de impostos para igrejas. De fato, a advogada fez uma palestra na sede da Assembleia de Deus Madureira e foi alçada à candidata do Bispo Abner Ferreira que pediu votos aos líderes fluminenses das igrejas filiadas ao ministério no estado, que têm direito A participar do pleito
Apesar do tom sensacionalista da chamada da matéria da Fórum, que reforça a ideia enganosa, também alarmista, da existência de uma (genérica) “ameaça evangélica” ao Brasil, sem ressaltar que um grupo específico foi alvo da reunião, o texto apresenta apuração mais densa do que o do site Metrópoles. A Fórum oferece aos leitores e leitoras palavras de especialistas contra o alarmismo enganoso da palestra da vice-presidente da OAB-RJ em campanha à Presidência do órgão, no que diz respeito a impostos, como Bereia apurou, e sobre o uso reprovável de espaços religiosos para campanhas políticas.
Bereia alerta leitores e leitoras para as campanhas eleitorais para quaisquer cargos, em especial as que visam às eleições municipais de 2024, que fazem uso de conteúdo enganoso alarmista, para convencer, por meio da imposição de pânico relacionado a temas que afetam os eleitores.
É importante também atentar para material informativo que faz uso de sensacionalismo, com generalização equivocada a respeito de grupos religiosos, que atribui a um todo inexistente uma ação ou postura, o que desinforma e é fonte de intolerância.
Referências de checagem:
Metrópoles.
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https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/vice-da-oab-rj-se-filia-a-associacao-de-juristas-bolsonaristas. Acesso em: 23 de julho de 2024.
https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/candidata-a-oab-do-rj-critica-taxacao-de-templos-em-igreja-evangelica. Acesso em: 23 de julho de 2024.
https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/diretores-da-oabrj-preparam-pedido-de-renuncia. Acesso em: 23 de julho de 2024.
https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/apos-racha-na-oab-rj-pelo-caso-marielle-diretor-lanca-candidatura. Acesso em: 23 de julho de 2024.
Revista Fórum. https://revistaforum.com.br/brasil/sudeste/2024/7/22/sera-apocalipse-evangelicos-conservadores-querem-dominar-oab-rj-162545.html Acesso em: 23 de julho de 2024
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https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/membros-de-comissao-da-oab-rj-anunciam-renuncia-coletiva-apos-tentativa-de-reabrir-investigacoes-policiais/. Acesso em: 23 de julho de 2024.
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/pec-da-imunidade-tributaria-a-igrejas-deve-sofrer-ajuste-apos-pedido-da-fazenda/ Acesso em: 29 de julho de 2024.
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https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/02/17/congresso-promulga-emenda-que-isenta-igrejas-e-templos-do-pagamento-de-iptu-em-imovel-alugado.ghtml Acesso em: 29 de julho de 2024
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UOL. https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/05/17/gestao-crivella-isenta-426-templos-de-iptu-no-rio-mas-nao-revela-quais-sao.htm. Acesso em: 29 de julho de 2024.
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Foto de capa: Sang Hyun Cho/Pixabay