Aumento da isenção do Imposto de Renda com taxação de super-ricos gera desinformação e dúvidas nas redes digitais cristãs

Durante o primeiro trimestre de 2025 circularam nas redes digitais diversos casos de desinformação em torno de temas ligados à economia, como Pix, taxação de transações financeiras e Imposto de Renda. Entre os mais debatidos, destaca-se a proposta do governo federal apresentada neste março de 2025, que prevê a ampliação da faixa de isenção tributária para contribuintes com renda de até R$ 5 mil mensais

Além disso, a medida estabelece uma taxação de 10% para aqueles considerados super-ricos, com renda anual superior a R$ 1,2 milhão, ou, pelo menos, ganhos de 100 mil por mês (entre R$ 600 mil e 1,2 milhão anuais, haverá um imposto mínimo com um percentual crescente, de zero a 10%). Estas medidas já estavam previstas na plataforma de campanha do então candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022.

Parlamentares de oposição ao governo federal, contrários à taxação dos contribuintes de maior renda, têm apresentado alternativas, com alegação de buscarem compensar o impacto financeiro da proposta. Entre elas está o corte de gastos (com incidência em políticas públicas que respondem à pauta de direitos) como forma de evitar a elevação da tributação sobre os super-ricos. A discussão tem gerado controvérsias e diferentes interpretações nas redes digitais, além de dúvidas na população sobre quem será envolvido nas mudanças. 

Diante da disseminação de informações imprecisas ou enganosas sobre o tema em espaços digitais religiosos, Bereia realizou uma checagem criteriosa para esclarecer os fatos e garantir que o debate público seja pautado pela transparência e precisão.

Oposição: isenção maior? governo anterior com impostos reduzidos? 

A deputada federal Bia Kicis (PL-DF), em entrevista à CNN Brasil, disse que os parlamentares de oposição querem, na verdade, R$10 mil reais de isenção. “Olha, eu acho que esse projeto tinha que ser distribuído para mim, eu quero relatar. Já me ofereço aqui. E vou apresentar logo, no meu relatório a proposta do projeto do líder do meu partido, do Sóstenes, que é colocar essa isenção até 10 mil reais. Nós queremos não cinco, queremos 10 mil reais de isenção”, disse a deputada em trecho compartilhado em seu perfil e replicado na conta do deputado Sóstenes Cavalcante no Instagram. O vídeo tinha, até o fechamento desta matéria, mais de 39 mil curtidas e quase 1.300 comentários. 

No video, Kicis reconhece que a tabela do Imposto de Renda não foi corrigida durante o governo Bolsonaro, mas ressaltou que essa defasagem ocorre há décadas. Ela argumenta que, apesar disso, a gestão reduziu impostos, o que teria aliviado a carga tributária da população. Além disso, durante a entrevista,  a parlamentar criticou o governo Lula pelos altos gastos e prejuízos de estatais (desinformação já checada pelo Bereia), e defendeu que a compensação poderia vir da redução de despesas e afirmou que, de acordo com Bolsonaro, a contenção de desvios poderia garantir recursos suficientes.

Sobre a demanda da oposição de aumento na faixa de isenção para 10 mil, tão logo governo federal anunciou a apresentação do projeto de isenção até R$ 5 mil,  o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) protocolou em fevereiro deste ano o Projeto de Lei 400/2025, que propõe ampliar a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 10 mil. O PL de Cavalcante, porém, não considera compensações para as contas públicas que afetem os super-ricos. 

A proposta do grupo da extrema direita tramita junto com outro projeto que busca superação da desigualdade tributária. É o PL 141/2025, de um grupo parlamentar esquerda, três deputados do PSOL, proposto também em fevereiro,  que prevê isenção para rendimentos de até R$ 5 mil, porém com indicação de compensação para os cofres públicos, com novas faixas de tributação, chegando a 35% para ganhos acima de R$ 39,3 mil. 

Para avançarem, os projetos precisam ser aprovado pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça da Câmara. 

Sobre a comparação com o governo anterior em torno da diminuição da taxação fiscal, tomando-se em consideração  os anos de 2022 e 2023, é possível verificar que se trata de desinformação. No último ano do mandato de Bolsonaro, a carga tributária foi de 33,7%, maior nível desde 2011 (a série histórica foi iniciada em 1990). Em 2023, primeiro ano do governo Lula III, o percentual caiu para 32,44%, uma queda que corresponde a 0,64 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB). 

Imagem: Reprodução/Instagram
 

A proposta de isenção de  imposto de renda 

O Projeto de Lei (PL) 1.087/2025, proposto pelo governo federal, em tramitação no Congresso Nacional, propõe que, a partir de 2026, a isenção do Imposto de Renda (IR) seja ampliada de R$ 2.259,20 (faixa atual) para rendimentos de até R$ 5 mil mensais.  Para quem recebe entre cinco e sete mil reais, será aplicado um desconto progressivo, o que resulta numa redução gradual do imposto devido e aumenta a renda líquida desta parcela da população..

O anúncio foi feito pelo presidente Lula, em 18 de março, na cerimônia de assinatura do projeto, no Palácio do Planalto. Na ocasião, o ministro da Fazenda Fernando Haddad ressaltou que a proposta tem o foco na distribuição de renda e não representará prejuízo para as contas públicas pois terá impacto neutro sobre a arrecadação do governo.

“É um projeto equilibrado do ponto de vista fiscal e que busca a justiça social. Com ele, não se pretende arrecadar mais nem arrecadar menos. Com ele, se pretende fazer justiça, garantir que as famílias até essa faixa de renda possam ter até o final do mês um alento, um aconchego maior”, declarou o ministro.

A nova regra beneficiará 10 milhões de pessoas. Somando-se às isenções concedidas em 2023 e 2024, o total de brasileiros que deixarão de pagar o Imposto de Renda desde o início da atual gestão chegará a 20 milhões. Com isto, terão isenção total ou parcial nove em cada dez brasileiros, 90% dos contribuintes, e 65% dos declarantes do IR de Pessoa Física não precisarão mais pagar o tributo. 

O Ministério da Fazenda preparou uma cartilha digital para diluir as dúvidas sobre o projeto e demais ações que envolvem as mudanças no Imposto de Renda. 

Como será na prática?

A proposta valerá a partir de 2026, caso passe pelo Congresso. Além de beneficiar com isenção quem recebe até R$ 5 mil, o governo vai conceder um desconto parcial para quem ganha entre cinco e sete mil reais por mês. Acima de R$ 7 mil, a tabela progressiva do imposto será aplicada normalmente, como é hoje. Atualmente, está isento do Imposto de Renda quem ganha até R$ 2.824 por mês

“Essa é a primeira reforma da renda significativa do país porque mexe numa ferida social de longa data. A todo instante, lembramos que o Brasil figura entre as dez maiores economias do mundo, mas também figura entre as dez mais desiguais”, afirmou o ministro da Fazenda na cerimônia no Palácio do Planalto.

Imagem: reprodução do site da Agência Brasil – EBC

Taxação dos Super-ricos

A ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda proposta pelo PL 1.087/2025, prevê uma medida compensatória para garantir o equilíbrio fiscal: a tributação mínima para altos rendimentos. Apenas 141,4 mil contribuintes (0,13% do total) passarão a pagar o patamar mínimo, o que representa 0,06% da população brasileira. Esse grupo é formado por pessoas que recebem mais de R$ 600 mil por ano (com ganhos a partir de R$ 50 mil por mês) e que atualmente não contribuem com alíquota efetiva superior a 10%. 

A proposta vai gerar uma renúncia fiscal (cota que deixa de ser arrecadada pelo governo federal) prevista em R$ 25,84 bilhões. Com a tributação mínima das altas rendas, espera-se gerar uma receita adicional de R$ 25,22 bilhões, além de R$ 8,9 bilhões provenientes da tributação de 10% sobre dividendos enviados ao exterior, em qualquer valor e apenas quando o dinheiro for destinado a cidadãos estrangeiros.

Trata-se de uma questão de justiça tributária: Para compensar a perda de receitas que o aumento da isenção trará, o governo irá propor um imposto mínimo de até 10% para quem ganha mais de R$50 mil por mês, o equivalente a R$ 600 mil por ano”, explica a cartilha.

Segundo a professora de Ciências Contábeis da Faculdade Anhanguera Valéria Vanessa Eduardo, ouvida pela Agência Brasil, , contribuintes que optarem pelo recebimento via Pix e utilizarem a declaração pré-preenchida terão prioridade no pagamento. Essa preferência será maior do que a concedida a quem escolher apenas um desses critérios. No entanto, as prioridades legais permanecem inalteradas, beneficiando idosos, pessoas com deficiência, portadores de doenças graves e profissionais cuja principal fonte de renda seja o magistério.

Outras alterações incluem o fim da obrigatoriedade de informar o título de eleitor, além da exclusão dos campos referentes a códigos de consulado e embaixada para residentes no exterior e ao número da última declaração.

Para quem tem vínculo CLT, nada muda, porque o imposto é retido diretamente. A nova regra não afeta salários, honorários, aluguéis ou outras rendas já tributadas na fonte. A medida se aplica a quem recebe altos valores em rendimentos isentos, como dividendos de empresas. Se os rendimentos são salariais e o Imposto de Renda já é pago sobre eles, nada muda.

De acordo com o governo federal, a tributação mínima para altas rendas funciona de forma progressiva e explica: “Primeiro, soma-se toda a renda recebida no ano, incluindo salário, alugueis, dividendos e outros rendimentos. Se a soma for menor que R$ 600 mil, não há cobrança adicional. Se passar deste valor, aplica-se uma alíquota que cresce gradualmente até 10% para quem ganha R$ 1,2 milhão”.


Imagem: Reprodução da página do Planalto na internet

Como o benefício alcança igrejas?

No Brasil, a Constituição Federal garante imunidade tributária a templos de qualquer culto, e impede que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios cobrem impostos sobre essas entidades religiosas. Essa isenção abrange tributos relacionados ao patrimônio, à renda e aos serviços essenciais das organizações religiosas e inclui o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ).

A justificativa para essa imunidade está na proteção da liberdade religiosa, que assegura que todas as entidades, independentemente da crença, tenham o mesmo direito. No entanto, a isenção não se estende a todas as obrigações tributárias. Salários de líderes religiosos, como pastores, por exemplo, não estão contemplados pela imunidade e continuam sujeitos à tributação.

Além dos líderes religiosos, como pessoas físicas, a membresia das igrejas, fiéis que a elas são relacionados, serão os grandes beneficiados pela medida. Na pesquisa “Religiões no Brasil”, do Instituto de Estudos da Religião (ISER), com base nos dados do Censo de 2010 (que até o momento são números oficiais disponíveis) e em levantamento do Instituto Datafolha de 2020, que, segundo pesquisadores de Religião, tem amostra que permite um bom nível de precisão, há elementos que chamam a atenção para isto. 

A pesquisa mostra que no Censo 2010, entre os católicos, apenas 2% ganhavam mais de dez salários mínimos, enquanto apenas 1,02% dos evangélicos se encontravam nessa categoria. Na pesquisa Datafolha 2020, é possível perceber que evangélicos e católicos são bem equilibrados em todas as faixas de renda entre dois e cinco salários mínimos, justamente o grupo da população que receberá o benefício da isenção e da redução progressiva. Evangélicos possuem 48% da população nessa faixa e os católicos 46%. Já na faixa de cinco a dez salários mínimos, há apenas 9% dos católicos e 7% dos evangélicos. 

Referências: 

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/balanco-janeiro-2024-mentiras-sobre-o-pix-como-estrategia-de-oposicao-politica/. Acesso em 26 de março de 2025.

GOV. https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/receita-atualiza-regras-da-e-financeira-e-amplia-obrigatoriedade-para-novas-entidades. Acesso em 26 de março de 2025.

https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2025/03/perguntas-e-respostas-entenda-os-principais-pontos-do-pl-que-amplia-para-r-5-mil-a-faixa-de-isencao-do-imposto-de-renda. Acesso em 26 de março de 2025.

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https://www.gov.br/secom/pt-br/fatos/brasil-contra-fake/noticias/2025/01/novas-regras-para-pix-nao-criam-tributos. Acesso em 26 de março de 2025.

Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2025-03/ir-2025-veja-quem-precisa-declarar-o-imposto-de-renda. Acesso em 26 de março de 2025.

Medida Provisória 1288/2025.  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2025/Mpv/mpv1288.htm#:~:text=MEDIDA%20PROVIS%C3%93RIA%20N%C2%BA%201.288%2C%20DE,pelo%20Banco%20Central%20do%20Brasil. Acesso em 26 de março de 2025.

O Globo. https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2025/03/18/imposto-de-renda-isencao-vai-beneficiar-na-pratica-quem-ganha-ate-r-7-mil-entenda.ghtml. Acesso em 26 de março de 2025.

Instrução Normativa. http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=140539. Acesso em 26 de março de 2025.

Diacontec. https://www.diacontec.com.br/imposto-de-renda-para-igrejas-tudo-que-voce-precisa-saber. Acesso em 28 de março de 2025. 

Câmara dos deputados. https://www.camara.leg.br/noticias/1038542-COMISSAO-APROVA-AMPLIACAO-DE-IMUNIDADE-TRIBUTARIA-PARA-IGREJAS. Acesso em 28 de março de 2025. 

Estadão

https://www.estadao.com.br/estadao-verifica/bolsonaro-reduzir-impostos-enganoso/?srsltid=AfmBOopKm7U1_R8MyY3DvEqvrkuh0qRs8YVwCemGIoXK5XN2uIVrftrJ Acesso em 28 de março de 2025.

CNN Brasil. https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/haddad-defende-reforma-do-ir-e-afirma-nao-estamos-abrindo-mao-de-receita/. Acesso em 28 de março de 2025.

https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/por-que-as-igrejas-nao-pagam-impostos-no-brasil-e-como-funciona-em-outros-paises/. Acesso em 28 de março de 2025. 

Religião e Poder. https://religiaoepoder.org.br/artigo/a-influencia-das-religioes-no-brasil. Acesso em 31 de março de 2025. 

Gazeta do Povo. https://www.gazetadopovo.com.br/economia/bia-kicis-pl-imposto-de-renda-isencao-10-mil/. Acesso em 31 de março de 2025.

https://www.gazetadopovo.com.br/economia/lider-do-pl-da-camara-propoe-isencao-de-irpf-para-quem-ganha-ate-r-10-mil/. Acesso em 31 de março de 2025.

Projeto Câmara dos deputados. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2850133&filename=PL%20141/2025. Acesso em 31 de março de 2025. 
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2854309&filename=PL%20400/2025. Acesso em 31 de março de 2025.

Foto de capa: Joédson Alves/Agência Brasil

Escolas católicas e evangélicas querem acesso a verbas do Fundeb

A rede católica Canção Nova publicou, em 5 de outubro, matéria com título “Educadores católicos e evangélicos se reúnem com Presidente Bolsonaro”. Segundo a reportagem, o encontro teria acontecido naquele mesmo dia no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. 

Bereia consultou a agenda oficial do Presidente Jair Bolsonaro e verificou que em 05 de outubro, ele realizou uma viagem até São Paulo para participar de um “Culto em Ação de Graças pela vida do Pastor Wellington Bezerra da Costa, Presidente das Igrejas Evangélicas Assembleia de Deus do Brasil”. 

No culto, o presidente emitiu um discurso em homenagem ao pastor Wellington Bezerra da Costa, que é presidente da Convenção Geral das Assembleias de Deus, em que afirmou “[…] Eu assumi um compromisso com vocês, nossos irmãos. Vamos ter no Supremo Tribunal Federal um ministro terrivelmente evangélico. Agora, mais ainda, alguns um pouco precipitados, achavam que devia ser a primeira vaga que eu acabei de indicar. A segunda vaga, que será em julho do ano que vem, com toda certeza, mais que um terrivelmente evangélico, se Deus quiser nós teremos lá dentro um pastor”. 

Não consta na agenda oficial da presidência da República reunião com educadores católicos e evangélicos. No entanto, há um grande intervalo entre a chegada do presidente no aeroporto e o evento oficial seguinte, o que permitiria a realização do encontro. De acordo com filmagens e apuração de outros veículos como O Globo e Forum, pode-se inferir que o encontro com representantes de escolas de fato ocorreu. 

Segundo a Canção Nova, as lideranças de escolas confessionais se reuniram com o presidente Jair Bolsonaro e a ministra Damares Alves reivindicando acesso aos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), um fundo que direciona verba de impostos estaduais e federais para aplicação exclusiva na educação básica.

Regulamentado em 2007, o Fundeb é o principal fundo de financiamento à educação no Brasil. Ele foi criado para substituir o anterior Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), que foi extinto em 2006.

O Fundeb é formado a partir dos recursos pagos por estados e municípios à União. De todo o montante, a lei garante que 10% desse valor seja direcionado ao fundo, para que volte às localidades como forma de financiamento à educação básica.

Os recursos são divididos de acordo com o número de matrículas, conforme censo do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), principal órgão estatal de implementação de políticas educacionais. 

No entanto, por lei, o Fundeb vale até este ano. Por isso, há várias propostas tramitando no Congresso Nacional para a prorrogação do fundo ou, ainda, para criar um novo, nos mesmos moldes, mas com algumas diferenças. 

Aprovada na Câmara dos Deputados, no Congresso Nacional e já promulgada, a Emenda à Constituição 108, denominada de “novo Fundeb” tornou o fundo permanente e ampliou a destinação de recursos para 13% e criou faixas de participação do governo, que aumentam anualmente. 

“A emenda aumenta dos atuais 10% para 23% a participação da União no Fundo. Essa participação será elevada de forma gradual: em 2021 começará com 12%; passando para 15% em 2022; 17% em 2023; 19% em 2024; 21% em 2025; e 23% em 2026”, conforme afirma a Câmara dos Deputados. 

A proposta foi uma iniciativa da deputada Raquel Muniz (PSD-MG) e estabelece alguns critérios para a destinação dos recursos, como melhorias na gestão educacional, aumento no índice de aprendizagem e redução das desigualdades na educação básica. 

Sobre a destinação de recursos do Fundeb para escolas confessionais privadas, comunitárias ou filantrópicas, o Artigo 213 da Constituição Federal afirma o seguinte:

“Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:

      I –  comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes financeiros em educação;
     II –  assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao poder público, no caso de encerramento de suas atividades.”

§ 1º Os recursos de que trata este artigo poderão ser destinados a bolsas de estudo para o ensino fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos, quando houver falta de vagas e cursos regulares da rede pública na localidade da residência do educando, ficando o poder público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua rede na localidade.

A matéria da Canção Nova afirma que os educadores querem mudanças no artigo 7, inciso 1, do Projeto de Lei 4372/2020, que tramita no Congresso Nacional regulamentando o Novo Fundeb. O artigo citado permite distribuição de recursos públicos às instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o poder público nos seguintes termos:

I – na educação infantil oferecida em creches para crianças de até três anos;

II – na educação do campo oferecida em instituições reconhecidas como centros familiares de formação por alternância, observado o disposto em regulamento;

III – pelo prazo de 6 (seis) anos, das pré-escolas que atendam às crianças de 4 (quatro) e 5 (cinco) anos, observadas as condições previstas nos incisos I a V do § 2º deste artigo, efetivadas, conforme o censo escolar mais atualizado até a data de publicação desta Lei;

IV – na educação especial, oferecida pelas instituições com atuação exclusiva nessa modalidade. 

Os educadores religiosos reivindicam ao governo que verbas do Fundeb possam ser aplicadas no ensino confessional para além da educação infantil e outras modalidades como consta a lei, possibilitando a abrangência do ensino fundamental e médio. 

Segundo a doutora em Educação, Crislei de Oliveira Custódio, a demanda de escolas confessionais privadas por financiamento público não é uma questão nova no Brasil, mas aparece desde o contexto da discussão da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), promulgada em 1961. A professora lembra que a constituição garante a prioridade de destinação de recursos para a expansão do ensino público e que existe uma legislação que determina o que é uma entidade filantrópica sem fins lucrativos.

“As instituições privadas não-lucrativas são definidas na LDB como instituições de ensino de diferentes níveis. A Constituição diz que serão definidas por lei para essa destinação de recursos públicos sobre determinadas condições, mas é priorizado a expansão da rede pública, e [para instituições privadas não-lucrativas] só em caso de ausência de vagas”. 

Crislei de Oliveira Custódio, doutora em Educação

Em entrevista à Canção Nova, o diretor da Confederação Nacional da Família e da Educação Edivan Mota afirma que:

“esses recursos pudessem ser alocados nas nossas escolas, escolas de acordo com os nossos valores (…) o presidente acolheu de forma muito boa, nos colocou em contato com o ministro da educação e agora vamos seguir discutindo com o Ministério da Educação”. 

Edivan Mota, diretor da CNFE

Para a professora Crislei Custódio, a alocação de recursos públicos de acordo com valores confessionais ou religiosos fere o princípio do estado laico, prescrito na constituição brasileira. “A adoção de uma crença ou religião é algo de foro privado, que não pode ser garantido e mantido por meio de financiamento público”, defende. 

Com base nesta verificação, o Coletivo Bereia classifica a matéria publicada pela rede Canção Nova como verdadeira. Apesar de não ter constado na agenda do Presidente da República, há indícios da existência de uma reunião de dirigentes de instituições cristãs de ensino com Jair Bolsonaro, para abrir caminho para a obtenção de recursos públicos para subsidiar suas atividades.  

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Foto de capa: Pixabay/Reprodução

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Referências

Governo Federal. https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/agenda-do-presidente-da-republica/2020-10-05. Acesso em 09 out 2020.

Governo Federal. https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/discursos/2020/discurso-do-presidente-da-republica-jair-bolsonaro-no-culto-em-acao-de-gracas-pela-vida-do-pastor-wellington-bezerra-da-costa-presidente-das-igrejas-evangelicas-assembleia-de-deus-do-brasil-sao-paulo-sp. Acesso em 09 out 2020. 

Câmara dos Deputados. https://www.camara.leg.br/noticias/687499-conheca-o-novo-fundeb-que-amplia-gradualmente-os-recursos-da-educacao/. Acesso em 14 out 2020. 

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. https://www.fnde.gov.br/financiamento/fundeb. Acesso em 14 out 2020. 

Câmara dos Deputados. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2261121. Acesso em 09 out 2020. 

Senado Federal. https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_06.06.2017/art_213_.asp#:~:text=I%20%2D%20comprovem%20finalidade%20n%C3%A3o%20lucrativa,de%20encerramento%20de%20suas%20atividades. Acesso em 09 out 2020. 

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