Eleições 2024: religiosos e políticos usam falsa perseguição a igrejas no Brasil como tema de campanha durante Marcha para Jesus de SP

Circulam em espaços digitais religiosos postagens que repercutem o discurso de Estevam Hernandes, apóstolo da Igreja Renascer em Cristo, proferido na 32ª edição da Marcha para Jesus, da qual é líder, realizada na cidade de São Paulo, em 30 de maio passado. 

Organizado pela Igreja Renascer em Cristo, o evento contou com um público estimado em dois milhões de pessoas, que lotou as ruas da capital paulista para acompanhar uma série de atividades, incluindo shows e discursos de destacados nomes do cenário evangélico e político brasileiro.

Além disso, a marcha também serviu como palco para discursos políticos e demonstrações de apoio a Israel. 

Em uma das manifestações dirigidas à multidão, o pastor Estevam Hernandes mencionou que, apesar do que ele considera “uma perseguição às igrejas no Brasil”, ainda foi possível reunir um grande número de fiéis para o evento, segundo a perspectiva do pastor sobre a comunidade evangélica no país.

Imagem: reprodução/X

As alegações de Estevam Hernandes foram reproduzidas pela página oficial da Marcha para Jesus na rede X (antigo Twitter), em reafirmação à suposta “perseguição à igreja”. Os vídeos reproduzem um pequeno trecho das falas do pastor, em que ele se dirige à multidão e conclama o respeito 

“à luta das gerações passadas ao defenderem o evangelho no país” o que resulta na dimensão do aglomerado de “pessoas cantando os louvores a plenos pulmões”.  

As declarações do líder da Igreja Renascer em Cristo foram endossadas por figuras políticas, como a vereadora evangélica paulistana Sonaira Fernandes (PL), que está em campanha para as eleições municipais 2024,  e repercutiu a fala de Estevam Hernandes em suas mídias sociais.

Imagem: reprodução/X

Bereia tem verificado que o discurso em torno de uma suposta perseguição aos fiéis evangélicos no país tem sido muito repetido e reafirmado por lideranças cristãs, especialmente em períodos eleitorais. Nesta matéria, Bereia retoma o assunto com foco nas palavras do apóstolo da Igreja Renascer e da vereadora do PL em São Paulo, e busca localizá-lo no contexto eleitoral de 2024.

A cada edição da Marcha para Jesus, observa-se a intensificação dos discursos e apelos políticos. Em 2024, observa-se uma grande presença de representantes eleitos, como os governadores do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do Estado de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), o prefeito da cidade de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e mais de uma dezena de prefeitos, deputados estaduais e federais. 

Mesmo convidado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não participou do evento e, assim como em 2023, enviou o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU) Jorge Messias, evangélico, que leu uma carta enviada pelo presidente. 

A participação do chefe do Poder Executivo na Marcha para Jesus ocorreu apenas durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Ele marcou presença no evento como candidato em 2018 e, após eleito, compareceu às edições de 2019 e 2022. Na edição seguinte à sua eleição como presidente da República, Bolsonaro foi fotografado ao simular um gesto de fuzilamento, imagem que se tornou emblemática. Ele foi o único presidente da República a participar da Marcha para Jesus. 

Imagem: reprodução/X

Sobre a suposta perseguição a igrejas e a cristãos

Bereia já realizou checagens de diversas publicações sobre o tema, dentro e fora do país, entre elas: o falso vídeo que atribuía ao Superior Tribunal Federal (STF) o cerceamento da pregação da palavra de Deus no Brasil; a notícia sobre a prisão de pastores na Nicarágua como forma de repressão religiosa; a utilização de um relatório das Nações Unidas em prol do respeito a diversidade da comunidade LGBTQIA+ que foi manipulado para levar a crer que coibiria a liberdade religiosa. 

Imagem: reprodução/Bereia

Em 14 de março passado, Bereia contribuiu para um artigo na revista  Carta Capital que traz um panorama político e social do discurso da perseguição aos cristãos no Brasil e como ele está intrinsecamente ligado ao período eleitoral de 2018, com a eleição de Jair Bolsonaro (PL) à Presidência do país. Bolsonaro e correligionários do espectro da direita brasileira, desde a extrema-direita até os de centro-direita, utilizaram essa estratégia como plataforma para alcançar a parcela evangélica do eleitorado, que totaliza cerca de 30% da população brasileira.  

A ideia se tornou lema de campanha e foi assimilada por grupos cristãos, devido ao apelo emocional que ela acionou, com disparos em mídias sociais e abordagens em pregações religiosas pelo país afora. Nas eleições subsequentes, as municipais de 2020 e as nacionais em 2022, não foi diferente, o discurso foi retomado e volta a aparecer como tema de campanha para o próximo pleito municipal de 2024.

Em levantamento realizado pelo Bereia, em 2022, os temas que mais circularam nas checagens realizadas, em 12 meses, pelo coletivo, foram o discurso de perseguição religiosa e os tópicos relacionados às eleições, ou seja, foram os conteúdos que mais circularam em espaços digitais segundo acompanhamento da equipe.

A partir destas checagens e pesquisas, Bereia afirma que é falsa a afirmação de que haja perseguição aos cristãos no Brasil, e que as alegações de fechamento de igrejas e perseguição são estratégias de desinformação usadas por políticos e líderes religiosos para manipular o medo e influenciar o eleitorado, distorcendo a realidade e criando uma falsa sensação de vitimização. 

A pesquisadora em Religião e Política Brenda Carranza, em texto para o Bereia, desmistifica o termo “cristofobia”, apontando que o termo é inadequado, visto que o Cristianismo é a religião dominante e goza de ampla liberdade no país. As alegações de fechamento de igrejas e perseguição são estratégias de desinformação usadas por políticos e líderes religiosos para manipular o medo e influenciar o eleitorado, distorcendo a realidade e criando uma falsa sensação de vitimização.

Por que Estevam Hernandes e Sonaira Fernandes repercutem o falso discurso da perseguição a cristãos? 

De acordo com as checagens do Bereia, líderes religiosos e políticos repercutem o falso discurso da perseguição a cristãos para mobilizar a comunidade evangélica e fortalecer apoios. Esse discurso aumenta a visibilidade e o apoio de figuras políticas, como o caso de Sonaira Fernandes, que é apontada para compor a chapa de eleições municipais de São Paulo. 

Com o avanço e a democratização do acesso à internet, as mídias sociais se tornaram instrumentos chave de marketing político. Desde 2018, pesquisadores observam o recurso à desinformação para alavancar candidaturas. Dessa forma, durante o período eleitoral,  há um crescente número de políticos que propagam desinformação como forma de autopromoção em época de eleições, de todos os níveis da administração pública. Essa prática pode ser considerada como uma nova forma de “convencer e fazer política” em ambientes religiosos com lideranças políticas de um grupo específico. 

De acordo com universidades dos Estados Unidos, a Universidade de Nova Iorque (NYU) e a da França, a Universidade Grenoble Alpes (UGA),  a desinformação gera seis vezes mais engajamento do que as notícias embasadas em fatos reais. Esse é o resultado de uma pesquisa realizada entre 2020 e 2021, com a análise de mais de 2,5 mil páginas de notícias no Facebook.  

Quando o tema é religião, é possível compreender que, ao compartilharem de uma mesma perspectiva, de confiarem em seus irmãos de fé e de seus mentores espirituais, o senso de comunidade e união refletem uma semelhança no modo de pensar, agir e de se comportarem, conforme pesquisa do Instituto NUTES/UFRJ, que gerou o projeto Bereia. Mesmo quando há questionamentos sobre autenticidade, dúvidas se o conteúdo de fato é plausível, a tendência é de adotar o que é mais alinhado com seus valores, suas crenças e a comunidade que as cercam. 

A Marcha de Jesus como palco político

A Marcha para Jesus é avaliada em círculos religiosos como o “maior evento popular cristão do mundo”. Ela demonstra claramente a capacidade de mobilização e a força da comunidade evangélica no país. No Brasil, a primeira Marcha para Jesus aconteceu em São Paulo, em 1993, e reuniu 350 mil pessoas. É um evento que, a cada ano, se torna mais palco político e campo de disputa dominado por lideranças religiosas ultraconservadoras e políticos extremistas de direita. 

Segundo a pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF) Christina Vital, a esquerda ainda falha na comunicação com esse público. Enquanto a direita tem trabalhado diariamente dedicando tempo, recursos e criado iniciativas para engajar os evangélicos, a esquerda encontra uma grande dificuldade em firmar diálogo e parcerias com esses grupos religiosos.

É nesse sentido que temas como a falsa perseguição sistemática a cristãos no Brasil passa a ser utilizado como estratégia eleitoral no evento. A publicação da vereadora paulistana Sonaira Fernandes é um exemplo.

Quem é Sonaira Fernandes?

Sonaira Fernandes de Santana (PL-SP) é, desde 2020, vereadora na Câmara Municipal da cidade de São Paulo. Eleita pelo Republicanos, desde 2014 atua no apoio ao deputado federal de Eduardo Bolsonaro (PL-SP), em campanhas e em cargos comissionados no gabinete dele. Foi eleita como “a vereadora da família Bolsonaro” e das pautas que defende estão a liberdade e defesa da família, da fé e dos princípios cristãos. 

De vinculação confessional não identificada, a vereadora evangélica define-se, em seus perfis de mídias sociais, como cristã, conservadora, pró-vida, defensora da família e da liberdade. Em 2023 foi nomeada pelo governador Tarcísio Freitas (PL) como secretária de Políticas para a Mulher do Estado de  São Paulo. Deixou o cargo em  abril passado, quando reassumiu o mandato de vereadora, tendo em vista as eleições municipais de 2024. O noticiário alinhado à direita extremista tem divulgado que o ex-presidente Jair Bolsonaro trabalha nos bastidores para indicar a vereadora para compor como vice a chapa da reeleição de Ricardo Nunes (MDB) à prefeitura de São Paulo.

Imagem: reprodução/X

Comparada à ex-ministra e senadora Damares Alves, Sonaira Fernandes usa sua página pessoal nas mídias sociais para críticas duras ao governo federal, à esquerda, ao feminismo e para defender a pauta antiaborto. Suas ações na Câmara Municipal e nas redes, indicam que a política segue o modus operandi da direita extremista no país, que, desde as eleições de 2018, utiliza da propagação de conteúdos falsos e enganosos dirigido a grupos religiosos, com referências ao fechamento de igrejas no Brasil, ao cerceamento da fé cristã e à ameaça aos valores tradicionais da família em campanhas eleitorais. 

Imagem: reprodução/Desinformante

Classificada como demasiadamente extremista até mesmo pelo prefeito paulistano Ricardo Nunes para compor com ele a chapa de reeleição à Prefeitura capital, Sonaira Fernandes marcou presença na edição 2024 da Marcha para Jesus. Na página pessoal do X (antigo Twitter), a ex-secretária repercutiu o discurso do apóstolo Estevam Hernandes no evento e  apregoou que, mesmo numa ‘época em que a igreja está sendo perseguida’, o evento ficou marcado como um dos maiores da história.

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Bereia reafirma, o que já desenvolveu em outras matérias de checagem e análises, que o tema da perseguição aos cristãos no Brasil é uma falsa alegação, usada mais intensamente como campanha de convencimento eleitoral, desde as eleições de 2018, com recurso ao medo como principal estratégia política. 

A Marcha para Jesus, evento evangélico com milhões de participantes, ao consolidar-se como veículo de propagação política da direita e da direita extremista do país,  promove e dá espaço a discursos que lançam mão de conteúdo desinformativo e propagador de medo e insegurança com fins eleitorais. 

Bereia chama leitores e leitoras para a importância da postura crítica frente ao uso da religião e dos fiéis, suas crenças e emoções, em campanhas eleitorais. Todo e qualquer discurso que faça uso de temas e símbolos relacionados à fé neste ano de eleições, da parte de líderes religiosos, de candidatos e seus apoiadores,  deve ser verificado antes de ser assimilado e compartilhado.

Referências de checagem:

ABI. http://www.abi.org.br/desinformacao-e-problema-de-desigualdade-social-diz-jornalista-premiada/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

Agência Pública. https://apublica.org/web-stories/grupos-da-igreja-no-whatsapp-sao-usados-para-disseminar-desinformacao/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

Bereia. https://coletivobereia.com.br/a-mentira-que-nao-quer-calar-sobre-perseguicao-a-cristaos-no-brasil /. Acesso em: 3 jun. 2024.

https://coletivobereia.com.br/cristofobia-perseguicao-a-cristaos-e-fechamento-de-igrejas-estao-entre-os-temas-com-mais-desinformacao-em-espacos-religiosos-nestas-eleicoes/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

https://coletivobereia.com.br/montagem-que-denuncia-perseguicao-do-stf-a-cristaos-tem-conteudo-falso/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

https://coletivobereia.com.br/portal-de-noticias-propaga-condenacao-de-pastores-na-nicaragua-como-perseguicao-religiosa/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

https://coletivobereia.com.br/site-desinforma-contra-relatorio-apresentado-a-onu-sobre-abusos-da-liberdade-de-religiao-contra-direitos-lgbt/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

https://www.brasildefato.com.br/2024/05/27/bolsonaro-quer-sonaira-fernandes-para-vice-de-nunes-mas-prefeito-de-sp-resiste-ao-nome-por-ser-bolsonarista-demais . Acesso em: 4 jun. 2024.

Câmara Municipal de São Paulo. https://www.saopaulo.sp.leg.br/vereador/sonaira-fernandes/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

CNN Brasil. https://www.cnnbrasil.com.br/politica/fake-news-sobre-eleicoes-geram-mais-engajamento-que-noticias-legitimas/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

Le Monde Diplomatique. https://diplomatique.org.br/fake-news-nas-igrejas-uma-epidemia-a-ser-curada/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

Gazeta do Povo. https://www.gazetadopovo.com.br/sao-paulo/sonaira-fernandes-preferida-jair-bolsonaro-chapa-prefeitura-de-sao-paulo/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

Marcha para Jesus. https://www.marchaparajesus.com.br/ . Acesso em: 3 jun. 2024.

Nós, Mulheres da Periferia. https://nosmulheresdaperiferia.com.br/sonaira-fernandes-conheca-a-secretaria-de-politicas-para-mulheres-sp/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

O Globo. https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2024/05/30/em-marcha-para-jesus-nunes-diz-a-fieis-paulistanos-eu-amo-jesus.ghtml . Acesso em: 3 jun. 2024.

Olhar Digital. https://olhardigital.com.br/2021/09/03/internet-e-redes-sociais/fake-news-geram-mais-engajamento-que-noticias-verdadeiras-diz-pesquisa/ . Acesso em: 4 jun. 2024.

Publica. https://apublica.org/2024/05/em-ano-eleitoral-marcha-para-jesus-e-terreno-politico-em-disputa. Acesso em 06 de junho de 2024.

Carta Capital. https://www.cartacapital.com.br/politica/na-marcha-para-jesus-bolsonaro-admite-tentar-reeleicao-em-2022/. Acesso em 06 de junho de 2024.

UOL.

https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2019/06/20/jair-bolsonaro-marcha-para-jesus.htm. Acesso em 06 de junho de 2024.

https://noticias.uol.com.br/colunas/observatorio-das-eleicoes/2020/12/05/fake-news-em-2020-repetem-2018-misoginas-e-reforcando-a-polarizacao.htm. Acesso em 06 de junho de 2024.

Gazeta do povo. https://www.leiaisso.net/wl9fs/. Acesso em 06 de junho de 2024.

Poder 360. https://www.poder360.com.br/poderdata/55-dos-catolicos-e-27-dos-evangelicos-aprovam-lula-diz-poderdata/. Acesso em 06 de junho de 2024.

Criador da Marcha Para Jesus, Estevam Hernandes foi preso com dólares na Bíblia

* Matéria atualizada às 19:40 para correção de referência de checagem

Bereia recebeu pedido de checagem da notícia dada pelo site de notícias Diário do Centro do Mundo em 9 de julho, que informou sobre a realização da Marcha Para Jesus/2022, em São Paulo, e disse que o criador do evento no Brasil, bispo da Igreja Renascer em Cristo,  Estevam Hernandes, foi preso em 2007 por tentar entrar em Miami com dólares não declarados, escondidos na Bíblia.

O site publicou: “no dia 14 de janeiro de 2007, a caminho de Miami, Sônia, Estevam, dois filhos e três netos embarcaram na primeira classe de um voo levando US$ 56.467 em dinheiro. Ao pousar, tentaram passar pela alfândega americana sem declarar o valor. Acabaram presos, admitiram a culpa e cumpriram pena de reclusão em regime fechado e semi-aberto”.

A Revista Fórum também publicou sobre o tema e informou que Estevam Hernandes e a esposa Sônia foram condenados e ficaram presos nos EUA por tentarem entrar com dinheiro não declarado. “Estevam e sua esposa, a bispa Sônia, foram presos e condenados nos Estados Unidos quando tentaram, em 2007, ir para Miami com mais de 56 mil dólares não declarados.  Parte, por ironia, escondida numa Bíblia”.

Também a revista Carta Capital  declarou que “na época do crime internacional, em 2007, Estevam e Sônia Hernandes foram condenados a 140 dias de cadeia, outros cinco meses em prisão domiciliar e dois anos de liberdade vigiada […]. No Brasil, já foram acusados de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e estelionato, mas acabaram absolvidos pelo Supremo Tribunal Federal em 2012”.  

O boletim jurídico ConJur também noticiou o fato em agosto de 2007, quando o casal Hernandes  recebeu sentença pelo crime: “O casal de bispos da Igreja Renascer em Cristo, Estevam e Sônia Hernandes, deve cumprir cinco meses de prisão em regime fechado e mais cinco meses de prisão domiciliar nos Estados Unidos. A sentença foi proferida, nesta sexta-feira (17), pelo juiz Federico Moreno do Tribunal Federal do Sul da Flórida”.   

O caso foi notícia de destaque na grande imprensa da época. O casal chegou a aparecer por vídeo na Marcha pra Jesus de 2007 e 2008, porque cumpria prisão domiciliar nos EUA, e por isso não pode viajar para estar no evento no Brasil. Sonia Hernandes foi enviada no dia 21 de janeiro de 2008 para prisão em Talhahasee, na Flórida, EUA, onde cumpriu pena intercalada à do marido, Estevam Hernandes que ficou preso “do início de agosto até o dia 29 de dezembro de 2007. Eles foram condenados a cumprir cerca de cinco meses de prisão em regime fechado e mais cinco meses de prisão domiciliar nos Estados Unidos”, conforme noticiou o site G1, à época.

Outros problemas com a Justiça

Este não foi o único problema da Igreja Renascer em Cristo e de seus líderes com a justiça. Também em 2007, Estevam e Sônia Hernandes  foram denunciados pelo Ministério Público Federal à Justiça Federal de São Paulo, acusados de “sonegação de Imposto de Renda, PIS e contribuições sociais da empresa RGC Produções. A denúncia foi recebida pelo juiz Hélio Egydio Nogueira, da 9ª Vara Federal Criminal de São Paulo. O casal consta como administrador da empresa RGC Produções Ltda. O argumento do MPF é o de que, em 1998, Sônia e Estevam Hernandes omitiram de sua declaração fiscal depósitos bancários de origem não comprovada, reduziram o valor de tributos a serem pagos no IR de pessoa jurídica, do PIS e das contribuições sociais da companhia.

A Marcha em 2022

No início de julho os organizadores da Marcha para Jesus – 2022, em São Paulo, reuniram milhares de seguidores  para mais um evento que apresenta artistas famosos da música gospel no Brasil, além da caminhada com orações e discursos políticos. No palco estavam líderes evangélicos e o criador e presidente do evento no Brasil, o apóstolo Estevam Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo. O presidente Jair Bolsonaro esteve mais uma vez presente e fez discurso na abertura.

Os participantes da Marcha percorreram cerca de 3,5 km em caminhada até a Praça Heróis da Força Expedicionária Brasileira, na Zona Norte da capital. A Marcha Para Jesus completou 30 anos e voltou a ser presencial depois da interrupção em 2020 por causa da pandemia da Covid-19.

Data Oficial

A Marcha para Jesus já é reconhecida como data oficial no calendário de celebrações no Brasil, e em 2009 o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei nº 12025 de 03/09/2009, que instituiu o Dia Nacional da Marcha para Jesus e determinou que o evento deveria acontecer anualmente, no primeiro sábado 60 dias após o feriado de Páscoa.

A Marcha para Jesus também tem sido tema de vários trabalhos acadêmicos que objetivam estudos sociológicos e antropológicos sobre as igrejas evangélicas no Brasil e sua atuação política, a partir do evento que ganhou visibilidade nos últimos 30 anos. 

Um artigo publicado em 2014 pela antropóloga Raquel Sant’Ana apresenta dados sobre a origem da Marcha para Jesus em Londres, no Reino Unido: “A Marcha para Jesus é herdeira direta da City March, realizada em Londres em 1987, em resposta às diferentes formas de manifestação a que os grupos descontentes com o governo Thatcher, especialmente os de juventude, herdeiros da “contracultura” estavam vinculados”. 

Conforme a doutoranda, “A March for Jesus, como passou a ser chamada, se tornou um evento internacional, realizado em mais de uma centena de cidades de todo o mundo”. Segundo Sant’Ana, a versão brasileira da Marcha para Jesus, diferente da marcha em outros países, que procura unir protestantes e católicos, aqui “passa a ser realizada em 1993 através de esforços da Igreja Renascer em Cristo, que busca uma maior visibilidade aos ‘evangélicos’ no país”.

O artigo mostra que “o centro do evento, desde seu surgimento, era a utilização da música como forma privilegiada para o evangelismo, extrapolando ‘as paredes dos templos’[…]”, e que no Brasil, a Marcha para Jesus foi articulada com importantes setores da indústria fonográfica                A Igreja Renascer em Cristo teve importante papel na “formulação do que veio a ser chamado de música gospel no Brasil, termo que foi inclusive patenteado pela bispa Sônia Hernandes, líder dessa denominação”. 

Sant’Ana faz uma análise da questão do exorcismo presente nos cultos de igrejas pentecostais e neopentecostais que participam da Marcha para Jesus no Brasil e afirma que “em lugar de exorcismos que combatem a ‘possessão’ individual com técnicas que incluem um repertório imagético da violência urbana transformada em espetáculo da mídia, a Marcha produz uma espécie de exorcismo da cidade” utilizando-se do modelo de megashow.

O artigo cita o crescimento quantitativo e qualitativo da Igreja Evangélica no Brasil, nas últimas décadas, que foi acompanhado de “grandes transformações também nos modos de atuação evangélica no espaço público”. Em sua análise a antropóloga afirma que “o crescimento pentecostal e neopentecostal teria influenciado de maneira marcante as demais denominações, tanto no modo de ocupar a política institucional quanto na produção midiática”.  Sant’Ana traz então a questão levantada por outros pesquisadores sobre a possibilidade de existir um modo evangélico de fazer política apontando uma disposição para que “a prática de estimular votos em candidatos apoiados pela denominação, por exemplo, uma marca da entrada da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) na política institucional, influenciasse a maneira de lidar com a política parlamentar das demais denominações”.

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Bereia conclui que é verdadeiro que o criador da Marcha Pra Jesus e bispo da Igreja Renascer em Cristo, Estevam Hernandes, foi preso em 2007 por tentar entrar em Miami com dólares não declarados, escondidos na Bíblia.  

Referências de checagem:

Carta Capital. https://www.cartacapital.com.br/politica/casal-de-pastores-amigo-de-bolsonaro-ja-foi-preso-com-dolares-na-biblia/. Acesso em 23 jul 2022

Conjur.

https://www.conjur.com.br/2007-ago-17/casal_renascer_condenado_prisao_eua. Acesso em 27 jul 2022

https://www.conjur.com.br/2007-abr-09/justica_aceita_denuncia_casal_renascer

Diário das Leis. https://www.diariodasleis.com.br/legislacao/federal/212165-dia-nacional-da-marcha-para-jesus-institui-o-dia-nacional-da-marcha-para-jesus.html

Diário do Centro do Mundo. https://www.diariodocentrodomundo.com.br/criador-da-marcha-para-jesus-pastor-amigo-de-bolsonaro-foi-preso-com-dolares-na-biblia/?fbclid=IwAR10wugvvzp3K6tqGpoRE7mR1p_Rl5EubdRzrGW2IoABc2lpCPrAzudxK_s. Acesso em 15 jul 2022

G1.

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/07/09/marcha-para-jesus-reune-milhares-de-fieis-em-sao-paulo-neste-sabado.ghtml. Acesso em 26 jul 2022

https://g1.globo.com/Noticias/Politica/0,,MUL1291943-5601,00-LULA+SANCIONA+LEI+QUE+CRIA+O+DIA+DA+MARCHA+PARA+JESUS.html. Acesso em 26 jul 2022

https://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL533422-5605,00-APOSTOLO+HERNANDES+NAO+CITA+PRISAO+DURANTE+MARCHA+PARA+JESUS.html. Acesso em 02 ago 2022

Revista Fórum. https://revistaforum.com.br/brasil/2017/6/15/pastor-que-foi-preso-nos-eua-abre-marcha-para-jesus-pregando-contra-corrupo-21335.html. Acesso em 27 jul 2022

Marcha pra Jesus. https://www.marchaparajesus.com.br/ Acesso em 26 jul 2022 

O Som da Marcha: evangélicos e espaço público na Marcha para Jesus. Raquel Sant’Ana. Museu Nacional/UFRJ – Rio de Janeiro Rio de Janeiro – Brasil.  https://www.scielo.br/j/rs/a/qpg6SH3RX3sQ9yGChY74jjr/?lang=pt&format=pdf Acesso em 26 jul 2022 

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Foto de capa: frame de vídeo no YouTube

7 de setembro é marcado por convocações e desinformação de religiosos em todos o país

*Com a colaboração de Luciana Petersen, André Mello e Viviane Castanheira

Uma característica dos atos promovidos pelo presidente Jair Bolsonaro para o dia 7 de setembro foi a circulação de vídeos de líderes religiosos convocando fiéis para as manifestações. Eles também se pronunciaram em suas redes durante e após os atos, e também compartilharam desinformações.

Antes

De forma geral, o discurso de pastores e padres estava alinhado com as pautas defendidas pelo presidente da República: críticas e oposição ao Supremo Tribunal Federal (STF) e a defesa da liberdade de expressão diante do que julgam abuso da corte na desmonetização dos canais que divulgam fake news e em uma suposta perseguição a perfis conservadores. A defesa do presidente Jair Bolsonaro e a insatisfação com os políticos do Congresso também apareceram nos pronunciamentos.

Reprodução de vídeo compartilhado em WhatsApp

Outras lideranças e igrejas apresentaram “palavras de profecia” a respeito do 7 de setembro. Parlamentares evangélicos de São Paulo também manifestaram apoio aos protestosEsta lista de tweets reúne os pronunciamentos em mídias sociais de líderes e igrejas em favor das manifestações. 

Reprodução do Instagram

No entanto, grupos de algumas denominações evangélicas fizeram “desconvocações” para os atos, como o Movimento Batista por Princípios. A Igreja Metodista, em comunicado institucional, não mencionou as manifestações mas afirmou: “Como cristãos e cristãs metodistas acreditamos na separação entre Estado e Igreja, e que nenhuma forma de governo e pessoas, alçadas à condição de governantes, podem ser consideradas como legítimas representantes de uma Teocracia instaurada aqui na terra.” A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) pronunciou-se por meio de seu presidente Dom Walmor Oliveira de Azevedo. Ele pontuou que participação em manifestações é um direito que deve estar relacionado com as instituições que defendem a democracia. “Não se deixe convencer por quem agride os poderes Legislativo e Judiciário. A existência de três poderes impede a existência de totalitarismos”, declarou Dom Walmor.

Durante

Diversas lideranças religiosas estiveram com Jair Bolsonaro nos bastidores e no palanque da Avenida Paulista  em que o presidente proferiu seu discurso reafirmando as ameaças de não cumprir ordens do STF. Como o deputado federal Marco Feliciano (Republicanos-SP); o pastor presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Silas Malafaia; o líder da Igreja Renascer em Cristo, Estevam Hernandes e o da Igreja Fonte de Vida, César Augusto,  dentre outros.

No Rio de Janeiro, várias pessoas tiraram fotos com Fabricio Queiroz, apontado como operador do esquema das rachadinhas. Dentre elas, o deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ), pastor da Assembleia de Deus, da Bancada Evangélica na Câmara Federal, que teve suas contas em redes sociais bloqueadas por ordem do STF por disseminação de falsidades e ódio. Durante o ato ele voltou a desafiar o STF.

Reprodução da Globonews

Após

Alguns líderes compartilharam imagens das manifestações incorrendo em desinformação. Silas Malafaia falou em “milhões na Avenida Paulista”, enquanto a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo calculou em torno de 125 mil manifestantes

Reprodução do Twitter

Oswaldo Eustáquio, um dos blogueiros de perfil religioso que são investigados no inquérito das fake news, e que já esteve preso por isso, voltou a atacar o STF em live e foi novamente preso após encontrar-se com o caminhoneiro Zé Trovão, foragido. Ambos incitaram grupos pelas mídias a promoverem ataques ao STF

O alinhamento mútuo entre Jair Bolsonaro e determinadas lideranças religiosas passa pela estratégia de melhorar a imagem do presidente, desgastada em 2021 pelo quadro geral do país na economia e na gestão da pandemia, chegando a fazer concessões ao chamado Centrão – do qual Bolsonaro sempre fez parte como deputado mas que atualmente critica. As manifestações do 7 de setembro são mais um episódio nesse enredo, visando a reeleição de 2022 enquanto mantém sempre requentadas as ameaças à democracia.   

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Referências:

UOL. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2021/09/04/profecia-7-de-setembro-pastores-religiosos-evangelicos-cristaos.htm Acesso em: [09 set 2021]

UOL. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2021/09/03/evangelicos-bancada-cristaos-religiosos-catolicos-ato-7-de-setembro-sp.htm Acesso em: [10 set 2021]

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R7. https://noticias.r7.com/brasil/atos-pro-e-contra-governo-reunem-140-mil-pessoas-em-sao-paulo-07092021 Acesso em: [09 set 2021]

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