Portal de notícias gospel divulga dados imprecisos sobre evangélicos na América Central

No último 28 de agosto, o portal de notícias Gospel Prime veiculou informações de uma pesquisa que apontou evangélicos como maioria na América Central, em matéria com o título “Evangélicos já são maioria na América Central, diz pesquisa”.

Sem apresentar detalhes sobre a metodologia utilizada, o site também divulgou informações sobre o comportamento da população religiosa e apresentou dados sobre liberdade religiosa na região.

Imagem: reprodução Gospel Prime

Bereia apurou informações sobre a pesquisa utilizada.

Dados apresentados pela pesquisa

O site religioso Gospel Prime traz, em manchete, a informação de que evangélicos já são maioria na América Central. No texto veiculado, o portal de notícias destaca que 42% dos habitantes da região identificam-se como protestantes, enquanto 39,9% identificam-se como católicos romanos.

Para reforçar o papel evangélico na composição social centro-americana, o site traz, ainda, dado segundo o qual a Igreja Católica teria perdido, entre 1950 e 2023, 60% dos fiéis na Nicarágua. Outro dado exposto é o de que cristãos evangélicos estariam mais comprometidos com atividades religiosas e com a leitura da Bíblia.

As informações utilizadas pelo site são da segunda edição da pesquisa “Afiliación, Participación y Prácticas Religiosas”, estudo conduzido na América Central durante o primeiro semestre de 2023 e que entrevistou mais de 3 mil pessoas. A pesquisa afirma que o nível de confiança de seus resultados chega a 95% e os dados apresentam margem de erro de 1.65% para mais ou para menos.

O estudo também apresenta diversos dados relacionados ao fenômeno religioso, sendo o primeiro deles a migração religiosa do catolicismo para o protestantismo na América Central. Entre os entrevistados, 58% disseram ter sido educados no catolicismo, sendo que mais de 10% teriam migrado para o protestantismo, 6,9% para correntes sem denominação, e 0,4% teriam simplesmente abandonado a religião.

Em todos os países contemplados pelo estudo – Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica e Panamá – houve diminuição do número de católicos e aumento do número de protestantes. Outras informações expostas pela pesquisa dizem respeito a práticas religiosas como frequência de orações, frequência de leitura da Bíblia, presença em cultos ou missas, contribuição com o dízimo, questões relativas à educação sexual e uso de contraceptivos, homossexualidade, aborto, entre outros.

Ao final, o estudo volta ao tema da proporção populacional de diversas correntes religiosas. A informação dá conta de que, especificamente na Nicarágua, observou-se, desde 1950, queda da população católica. A pesquisa não informa como os dados históricos foram obtidos ou coletados.

Informações sobre a instituição de pesquisa

A segunda edição da pesquisa sobre prática religiosa na América Central foi realizada pela M&R Consultores. Em seu site oficial, a instituição define-se como uma agência de inteligência de mercado da Nicarágua, fundada em 1991. A página informa, ainda, que a organização está em processo de expansão, já que, atualmente, realiza estudos na América Latina.

A M&R Consultores apresenta-se como membro da Sociedade Europeia para Pesquisa de Opinião e Marketing (Esomar, na sigla em inglês), fundada em 1947, e é dirigida pelo economista, psicólogo e declaradamente militante cristão Raúl Obregón Morales. Apesar dos alegados mais de 30 anos de atuação, o estudo mais antigo publicado no site da instituição é de 2020. Nas mídias sociais, o perfil da organização tem poucos seguidores e quase nenhuma interação.

Imagem: reprodução Instagram

Dentre as pesquisas realizadas pela M&R Consultores, há diversas edições sobre a aprovação do governo de Daniel Ortega (FSLN), presidente da Nicarágua desde 2006. Bereia identificou alguns questionamentos acerca da credibilidade destas informações. 

Reputação e credibilidade da M&R Consultores

O jornalista nicaraguense Miguel Mendoza contestou, em dezembro de 2019, as técnicas de pesquisa utilizadas pelo gerente geral da M&R Consultores Raúl Obregón Morales, em seu perfil do X, Twitter à época. Um dos comentários na publicação suscita a possibilidade de fraude nas eleições para corroborar os dados da pesquisa. 

Imagem: reprodução X (antigo Twitter)

Na mesma época, o advogado e cientista político Adolfo Miranda Sáenz, colunista do jornal nicaraguense La Prensa, escreveu sobre as falhas técnicas do estudo. “A última pesquisa de M&R Consultores, me surpreendeu porque tem, segundo o que se lê publicado por eles em sua página na web, várias falhas técnicas que prejudicam a credibilidade”.

Em 2021, o portal de notícias Geopolitical Economy publicou uma reportagem sobre a popularidade da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) na Nicarágua, e tomou como base a 9ª pesquisa pré-eleitoral, de novembro de 2021. O texto aponta a M&R Consultores como “a principal empresa de pesquisas na Nicarágua” e pontua que a instituição “costumava ser regularmente citada pelos principais meios de comunicação, como a Reuters”, mas passou a ser ignorada por questões políticas.

O portal de notícias Nicarágua Investiga, em matéria publicada em 2022, divulgou que a M&R Consultores havia apontado a aprovação do governo do casal Ortega em 71,2%, e afirmou que a consultoria CID Gallup revelou em outubro de 2021, antes mesmo das eleições, que apenas 8% da população era favorável a manutenção da FSLN no poder.

Ritmo de crescimento da população evangélica em países da América Central 

O professor da Universidad del Pacifico, no Peru, e vice-presidente do Instituto de Estudos Sociais Cristãos (IESC) José Luis Pérez Guadalupe, em entrevista ao Bereia, afirma que a tendência geral, desde os anos 1970, é de crescimento da população evangélica e diminuição da população católica, principalmente na América Central, mas há particularidades.

Segundo Pérez, é possível que, a partir de 2030, países como Nicarágua, Honduras e El Salvador passem a ter mais evangélicos do que católicos, realidade, porém, ainda não concretizada. Já em países como Costa Rica e Panamá, o cenário é diferente. O crescimento evangélico também é uma realidade, mas este segmento ainda representaria entre 20% e 25% das respectivas populações.

Outro aspecto que Pérez pontua é que a identidade religiosa, hoje, é cada vez mais fluida, o que torna comum que pessoas adeptas a diferentes religiões frequentem cultos de outras denominações, por exemplo. O professor destaca que, mais do que a mera identificação, o compromisso de cada comunidade com sua respectiva denominação é que constitui o dado mais importante.

Indagado sobre a qualidade da pesquisa divulgada pelo site Gospel Prime, Pérez afirma que, quando se trata de governos ditatoriais e autoritários, não se pode confiar em dados oficiais ou em supostos institutos de pesquisa. “Nas ditaduras, a primeira vítima é a verdade”, afirma.

Outros estudos sobre o assunto

Bereia buscou uma fonte relevante, não comprometida com o mercado, para comparar com os dados divulgados pelo Gospel Prime e chegou aos levantamentos realizados pelo Latinobarómetro, uma organização não-governamental (ONG) sem fins lucrativos com sede em Santiago do Chile. A ONG declara ter o objetivo de contribuir para o desenvolvimento da democracia, da economia e da sociedade como um todo, através de indicadores de opinião pública que medem atitudes, valores e comportamentos.

A Pesquisa Latinobarômetro é um estudo de opinião pública que aplica anualmente cerca de 20.000 entrevistas em 18 países latino-americanos, representando mais de 600 milhões de habitantes. Os resultados do Latinobarómetro são usados ​​por acadêmicos, agentes públicos e governamentais, produtores de mídias, meios de comunicação, entre outros atores sociopolíticos da região e internacionais.


Enquanto a pesquisa elaborada pela M&R Consultores, e repercutida pelo Gospel Prime, afirma que a população evangélica na América Central chega a 42%, dados da ONG chilena mostram números menos expressivos. O relatório Latinobarómetro de 2020 aponta que o número de evangélicos na América Central era de 31,3%, chegando a 34,7% quando consideradas as categorias “evangélicos sem especificar”, “batistas”, “metodistas”, pentecostais”, “adventistas” e “protestantes”.

Imagem: reprodução Latinobarómetro

Os números para a população católica também divergem. Enquanto M&R Consultores e Gospel Prime afirmam que os católicos representam 39,9% da população na região centro-americana, os dados do Latinobarómetro 2020 apontam representatividade de 46,1% deste segmento.

A discrepância entre as duas pesquisas chama mais atenção no caso da Nicarágua que, segundo M&R Consultores, tem 47,5% da sua população identificada como evangélica. O Latinobarómetro 2020 demonstra que a parcela deste segmento religioso representa 38,7% no país em questão.

Ainda a respeito da Nicarágua, a pesquisa divulgada pelo Gospel Prime apresenta um gráfico sobre a evolução da presença de católicos e não católicos no país, desde 1950. Afirma-se que a presença católica no país saiu de 95,8% em 1950 para 41,8% em 2020. Já o Latinobarómetro, afirma que os católicos representavam 44,9% da população nicaraguense em 2020.

Liberdade religiosa na América Central

Outro dado também apresentado pela pesquisa da M&R Consultores, que foi omitido pelo site Gospel Prime, diz respeito à liberdade religiosa na América Central. Segundo a pesquisa, 92,7% da população centro-americana considera que têm liberdade de religião. Entre os grupos religiosos, 91,3% dos católicos, 94,2% dos protestantes e 93,1% dos crentes sem denominação teriam afirmado que há liberdade religiosa na região.

A pesquisa traz, ainda, os dados sobre a percepção de liberdade religiosa em cada país. Excetuando-se a Nicarágua, que apresenta 82,6% de respostas afirmativas para a existência de liberdade religiosa, todos os outros países pesquisados pontuaram acima dos 90% (Guatemala: 95,9%; El Salvador: 95,8%; Honduras: 94,6%; Costa Rica: 90,9%; Panamá: 96,7%).

O relatório Informe 2021 elaborado pela Latinobarómetro revela que 68% dos cidadãos da América Latina percebem que têm garantias de escolher livremente a sua religião. O percentual está oito pontos percentuais abaixo do valor registrado em 2018 e 2017 (76%). A diferença é a mais elevada desde quando o indicador começou a ser medido, em 2007.

Imagem: reprodução Latinobarómetro

Além dos dados do Latinobarómetro, o Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo – 2023 publicado bienalmente, desde 1999, pela organização Aid to the Church in Need (ACN) – Ajuda à Igreja que Sofre –, ligada à Igreja Católica, revela dados diferentes sobre a liberdade religiosa na Nicarágua, país de origem da pesquisa elaborada pela M&R Consultores.

Enquanto na pesquisa da M&R Consultores o país aparece com 82,6% de liberdade religiosa percebida, o Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo, da ACN, destaca negativamente o país. A ACN salienta que, pela primeira vez, a Nicarágua foi incluída na categoria “perseguição”.

“Isso se deve à forte opressão que o governo Ortega continua a exercer sobre a Igreja Católica, cujas ações incluem, entre outras, a expulsão do núncio apostólico e das congregações religiosas, o exílio forçado de sacerdotes, a privação do estatuto jurídico de entidades e organismos religiosos, a perseguição aos sacerdotes, o cerco a igrejas, a detenção arbitrária de líderes e fiéis religiosos, o fechamento de um canal de televisão católico, ameaças explícitas e insultos a líderes religiosos”, afirma o relatório.

O levantamento Latinobarómetro 2020 Nicarágua apresenta a opinião da população nicaraguense sobre até que ponto a liberdade de professar qualquer religião está garantida no país. Apenas 39,2% disseram ter a liberdade religiosa completamente garantida, enquanto 12,5% afirmaram não ser nada garantida. Os outros 48,3% dos participantes da pesquisa responderam que tem alguma garantia, pouca garantia ou não responderam.

Imagem: reprodução Latinobarómetro


Perseguição religiosa na Nicarágua

Os desafios relacionados à liberdade religiosa são cada vez maiores na América Central e vêm sendo destaque na imprensa internacional. O caso da Nicarágua, em especial, tem chamado atenção pelas atitudes do governo de Daniel Ortega.

O Correio Braziliense divulgou, em setembro do ano passado, que Ortega acusou a Igreja Católica de ser uma “ditadura perfeita” e que a polícia havia proibido procissões religiosas naquele período. A notícia também informava que “as relações entre o governo e a Igreja Católica se deterioraram desde os protestos de 2018, que o presidente vinculou a uma suposta tentativa fracassada de golpe de Estado planejada pela oposição com o apoio de Washington”. O texto pontua que o conflito se agravou em agosto daquele ano, após a prisão domiciliar do crítico do governo, arcebispo de Matagalpa, Rolando Álvarez e que quatro padres e dois seminaristas também foram detidos sem que as acusações contra os religiosos fossem divulgadas.

Na mesma ocasião, o portal Nicaragua Investiga publicou texto que mostra a ligação de Ortega com pastores evangélicos e a perseguição aos líderes católicos no país. Em 2023, a revista Forbes divulgou que duas dioceses dirigidas por Álvarez, a essa altura condenado a mais de 26 anos de prisão por crimes considerados ‘traição contra a pátria’, e a diocese de Manágua tiveram as contas bancárias bloqueadas pelo governo Ortega. O texto também cita a prisão de outros três padres. Esta perseguição é sofrida pelas lideranças católicas que se expressam de forma crítica a ações autoritárias do governo Ortega, o que não ocorre em relação outras lideranças cristãs alinhadas com o poder nicaraguense. 

A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou, em março deste ano, que o relatório do Grupo de Peritos em Direitos Humanos sobre a Nicarágua apontou que a população do país sofre violações de direitos humanos que configuram crimes contra a humanidade.

Imagem: reprodução ONU News

Em artigo traduzido e publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos, o teólogo e padre italiano, professor da Universidade de Flensburg, na Alemanha, Marcelo Neri detalha como o governo da Nicarágua tem agido com a Igreja Católica por se posicionar contra o regime Ortega. “Entre os dias 5 e 6 de fevereiro, ocorreram dois julgamentos de farsa que condenaram o grupo de colaboradores de Dom Alvarez e outro padre detido também em agosto de 2022 a 10 anos de prisão sob a acusação de conspiração contra o Estado da Nicarágua”, diz o texto do teólogo.

Na última semana, a BBC News Brasil publicou matéria sobre a perseguição do governo Ortega a ordens religiosas na Nicarágua. Em entrevista por telefone à BBC, o teólogo e porta-voz oficial da Companhia de Jesus na Nicarágua José María Tojeira explica de que modo o governo Ortega vem perseguindo a Igreja no país.

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Bereia considera o conteúdo checado como impreciso. Os dados da pesquisa divulgada pelo portal de notícias Gospel Prime, de forma ufanista, não são comprováveis, principalmente por não haver informações sobre a metodologia utilizada para a coleta e processamento destes dados. Ainda, a fonte tem histórico que levanta dúvidas em relação a comprometimento mercadológico e político.

Afora isto, o levantamento apresenta características de desinformação quando não considera a perspectiva católica sobre liberdade religiosa na Nicarágua. A maneira que as informações foram apresentadas pode levar o público a julgamentos errôneos sobre determinados grupos e organizações. Portanto, carece de complementações e alguma contextualização, por isso Bereia recomenda recurso a instituições de pesquisa metodologicamente acreditadas.

Referências de Checagem:

X.

https://twitter.com/Mmendoza1970/status/1204817152433360897 Acesso em: 30 ago 2023


https://twitter.com/MYRConsultores/status/489432292784635904/photo/1 Acesso em: 30 ago 2023

https://twitter.com/Mmendoza1970/status/1204817152433360897 Acesso em: 4 set 2023

Forbes. https://forbescentroamerica.com/2023/05/27/gobierno-de-nicaragua-congela-cuentas-bancarias-de-iglesia-catolica-nicaraguense Acesso em: 2 set 2023

La Prensa. https://www.laprensani.com/2019/12/16/opinion/2621982-encuesta-con-fallas-tecnicas Acesso em: 30 ago 2023

Nicaragua Investiga.

https://nicaraguainvestiga.com/politica/82926-mr-nicas-apoyan-ortega-canasta-basica/ Acesso em: 30 ago 2023

https://nicaraguainvestiga.com/politica/96820-pastores-evangelicos-bendicen-a-candidatos-del-fsln/ Acesso em: 30 ago 2023

BBC – ‘Governo da Nicarágua tem ódio da Igreja e quer controlá-la’, diz sacerdote

https://www.bbc.com/portuguese/articles/cyd9n4d2d59o

Esomar.

https://esomar.org/about-esomar Acesso em: 30 ago 2023

https://esomar.org/code-and-guidelines/icc-esomar-code Acesso em: 30 ago 2023

M&R Consultores

https://www.myrconsultores.com/quienes-somos/ Acesso em: 29 ago 2023

https://www.myrconsultores.com/afiliacion-participacion-y-practicas-religiosas-2da-ola-primer-semestre-2023/ Acesso em: 29 ago 2023

Geopolitical Economy. https://geopoliticaleconomy.com/2021/09/04/nicaragua-support-sandinistas-poll/ Acesso em: 30 ago 2023

YouTube.

https://www.youtube.com/watch?v=6kTzNdi7dBQ&ab_channel=vivanicaragua13 Acesso em: 31 ago 2023

https://youtu.be/EITRjDtLKVQ?t=1485 Acesso em: 4 set 2023

BBC News Brasil. https://www.bbc.com/portuguese/articles/cyd9n4d2d59o Acesso em: 1 set 2023

Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2022/09/5040379-daniel-ortega-diz-que-a-igreja-catolica-e-uma-ditadura-perfeita.html Acesso em: 1 set 2023

Reuters. https://www.reuters.com/article/elecciones-nicaragua-sondeo-idLTAKCN12I29S Acesso em: 1 set 2023

ACN. https://www.acn.org.br/analise-regional-2023-america-latina-e-caribe/ Acesso em: 1 set 2023

Linkedin. https://www.linkedin.com/in/raul-obregon-morales-59b55129/?originalSubdomain=ni Acesso em: 4 set 2023

Latinobarometro

https://www.latinobarometro.org/latContents.jsp Acesso em: 6 set 2023

https://www.latinobarometro.org/lat.jsp?Idioma=724 Acesso em: 8 set 2023

https://media.elmostrador.cl/2021/10/Latinobarometro_Informe_2021.pdf Acesso: 6 set 2023

https://www.latinobarometro.org/latContents.jsp Acesso: 6 set 2023


ONU. https://news.un.org/pt/story/2023/03/1810687 Acesso: 7 set 2023

Unisinos. https://www.ihu.unisinos.br/categorias/626176-igreja-na-nicaragua-resistencia-e-perseguicao Acesso: 7 set 2023

Anajure. https://anajure.org.br/nota-publica-sobre-a-situacao-da-liberdade-religiosa-na-nicaragua/ Acesso: 7 set 2023

*** Foto de capa: reprodução Evangelical Focus

Por que o Brasil está no topo de ranking de países onde mais se acredita em Deus

* Texto originalmente publicado na BBC Brasil

Vai com Deus.

Graças a Deus!

Deus me livre.

Pelo amor de Deus!

Só Deus sabe.

Deus está sempre na boca do brasileiro, um povo que vive em um país de maioria cristã onde cultura e fé estão intimamente ligadas – das altas esferas de poder ao cotidiano do cidadão comum – e no qual a vida religiosa muitas vezes preenche lacunas deixadas pelo Estado.

Esses são alguns dos fatores que explicam porque o Brasil se destaca quando o assunto é espiritualidade.

Quase nove em cada dez brasileiros dizem, por exemplo, acreditar em Deus, segundo a pesquisa Global Religion 2023, produzida pelo instituto Ipsos.

O índice de 89% de crença em um poder superior coloca o Brasil no topo do ranking de 26 países elaborado pelo Ipsos, com base em uma plataforma online de monitoramento que coleta informações sobre o comportamento destas populações.

O Brasil aparece empatado com África do Sul, que teve os mesmos 89%, e Colômbia, com 86% – um empate técnico dada a margem de erro de 3,5 pontos percentuais da pesquisa.

Holanda (40%), Coreia do Sul (33%) e Japão (19%) foram os países onde a população menos crê em Deus ou em um poder superior, de acordo com a pesquisa.

A Global Religion 2023 é baseada em dados coletados entre 20 de janeiro e 3 de fevereiro, com 19.731 entrevistados, aproximadamente mil deles no Brasil. Não há países islâmicos na amostra, embora pessoas que seguem o islamismo tenham sido consultadas.

Entre os países pesquisados, o Brasil ficou 28 pontos percentuais acima da média na crença em Deus, que foi de 61%.

No cotidiano brasileiro, as pessoas falam em Deus o tempo todo, é algo comum e normal, e é estranho se alguém reage de forma negativa a isso , diz Ricardo Mariano, sociólogo da Religião e professor da Universidade de São Paulo.

Mariano ressalta que o Brasil costuma se destacar em pesquisas internacionais sobre religiosidade e fé porque a crença em Deus e a espiritualidade estão profundamente intricadas na nossa cultura, mesmo entre quem não tem compromisso com nenhuma religião específica.

De acordo com a pesquisa do Ipsos, 70% dos brasileiros disseram que acreditam em Deus como descrito em escrituras religiosas, como a Bíblia, o Alcorão, a Torá, entre outros, e 19% acreditam em uma força superior, mas não em Deus como descrito em textos religiosos.

Cerca de 5% dos brasileiros disseram não acreditar em Deus ou em um poder maior, 4% afirmaram que não sabem e cerca de 2% preferiram não responder.

São dados que estão de acordo com nosso histórico de um país onde a religião e a religiosidade têm uma predominância tanto na cultura e na vida cotidiana quanto nas esferas de poder , diz Helio Gastaldi, diretor de opinião pública da Ipsos no Brasil.

Vida religiosa

Mas acreditar em Deus não significa necessariamente ser religioso – e o caso brasileiro demonstra bem isso.

Enquanto 89% dos entrevistados no país disseram crer em Deus ou um poder superior, só 76% afirmaram seguir uma religião.

O índice nacional ficou novamente acima da média global, que foi de 67% neste caso, mas bem abaixo dos primeiros colocados: Índia (99%), Tailândia (98%) e Malásia (94)%.

Entre os brasileiros religiosos, 70% disseram ser cristãos (católicos, evangélicos e outras denominações) e 6% são filiados a outras religiões, enquanto 22% disseram não ter uma religião, sendo 16% ateus e 6% agnósticos.

Os dados da Ipsos mostram que a diferença na adesão dos jovens da geração Z (de até 23 anos) e do resto da população adulta a uma religião é bem maior entre os católicos do que entre os evangélicos.

Enquanto 38% dos adultos se declararam católicos, somente 23% dos jovens da geração Z dizem aderir à religião – uma diferença de 15 pontos.

Já entre os evangélicos e outros cristãos, o índice geral entre adultos é de 29% e entre os jovens é 26% – ou seja, além de existir uma diferença geracional menor, já há mais jovens evangélicos do que católicos no Brasil hoje, aponta o estudo.

O índice dos sem religião na medição da Ipsos ficou bem acima dos 8% registrados pelo último Censo, de 2010, que, por sua vez, detectou um aumento de 0,7 pontos percentuais em relação ao levantamento anterior (7,3%).

Apesar de sabermos que a proporção de pessoas sem religião no Brasil tem aumentado – dados do Datafolha de 2022 indicam 14% sem religião, dentre população em geral, e 34% sem religião entre os jovens -, o fato da pesquisa da Ipsos ser com painel online pode inflar um pouco este número, supondo que entre os mais pobres esta proporção dos sem religião seja um pouco menor , diz Gastaldi.

O Brasil acompanha, mesmo que timidamente, uma tendência global de aumento do número de pessoas que não tem religião, diz Mariano.

É preciso aguardar os dados do censo 2022, mas tudo aponta que esse número vai ter aumentado , diz.

Enquanto no Brasil a crença em Deus supera a religiosidade, em países como Índia e Tailândia, que lideram o ranking de religiosos, e também onde a filiação a uma religião é minoritária, como Coreia do Sul (44%) e Japão (40%), a situação se inverte e há mais pessoas religiosas do que aquelas que acreditam em um poder superior.

Isso acontece por causa das características particulares da fé nestes locais, segundo especialistas.

Religiões como o budismo e o xintoísmo – que são predominantes em alguns deles – são não teístas, ou seja, não têm um conceito de Deus ou de um poder superior como nas chamadas religiões abraâmicas, como o cristianismo, islamismo e o judaísmo, explica Gastaldi.

O xíntoísmo é uma reunião de tradições espirituais japonesas centradas no culto à natureza e aos antepassados. Já o budismo trabalha com a ideia de iluminação espiritual individual

Ao mesmo tempo, explica Mariano, o conceito de Deus não consegue captar bem as crenças de religiões politeístas (com múltiplas divindades) como o hinduísmo, que é majoritário na Índia, e as religiões afro-brasileiras.

O Brasil tem, porém, um índice alto de crença em Deus e de religiosidade mesmo se comparado a outros países em desenvolvimento – e isso tem a ver com a história do país.

A religião é uma força fundamental no Brasil desde a época da colonização dos portugueses. O catolicismo é a religião que nos foi imposta pelos portugueses e vai ter um papel central nas identidades nacionais , afirma a professora de sociologia da religião Nina Rosas, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Ausência do Estado

Helio Gastaldi, do Ipsos, explica que os dados da pesquisa de 2023 são consistentes com um fenômeno muito estudado.

Entre os países laicos, onde a religião é separada do Estado e não há uma religião oficial, a vida religiosa tende a ter maior importância para a população onde o PIB per capita (riqueza de um país em relação à quantidade de habitantes) é menor ou onde há grande índices de desigualdade, aponta Gastaldi.

São locais onde a religião de certa forma supre a ausência do Estado. Ela traz perspectiva, consolo, às vezes até assistência material – mas também pode ser usada como forma de manipulação e ferramenta do poder , diz Gastaldi.

Na pesquisa do Ipsos, por exemplo, 90% responderam que acreditar em Deus ou forças superiores ajuda a superar crises, como doenças, conflitos e desastres.

O catolicismo sempre operou no Brasil como uma espécie de extensão do Estado, mesmo depois da proclamação da República, afirma Rosas.

Ao mesmo tempo, havia uma forte perseguição a outras religiões, explica a pesquisadora – o Código Penal de 1890, por exemplo, criminalizava magia, espiritismo e curandeirismo. Havia resquícios disso na legislação até 1985, aponta Rosas.

Então as religiões mediúnicas, tanto espiritismo quanto as de matriz africana, tiveram que se adaptar a essas pressões tentando se enquadrar em algo que era considerado legítimo , diz Rosas.

Isso gerou o surgimento de um sincretismo religioso que ultrapassa as barreiras das religiões individuais.

Apesar da opressão da colonização ter vindo embutida com a religião para o Brasil, na forma da religião imposta, de certa forma o povo soube separar Deus do missionário e ficou com a figura de Deus , afirma Fernando Altemeyer, professor do departamento de Ciência da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Altemeyer avalia ainda que o alto índice de crença em Deus verificado pela pesquisa do Ipsos também é provavelmente influenciado pelo contexto imediato da vida pós-pandemia no Brasil, que foi especialmente atingido pela covid-19 e onde o governo foi criticado pela falta de resposta adequada ao problema.

Tivemos mais de 700 mil mortos, foram dois anos de depressão e sofrimento. E sabemos que depois de uma grande crise, as religiosidades e espiritualidades aumentam, têm uma explosão , diz ele.

Foi assim no Japão após a Segunda Guerra Mundial, após a bomba atômica, por exemplo.

A força da fé

Ricardo Mariano, da USP, explica que, historicamente, os movimentos que foram oposição ao poder ou governo do período nunca tiveram um caráter de combater a religião ou espiritualidade.

Nós não temos uma tradição iluminista, de movimentos políticos ideológicos anticlericais e seculares , afirma ele.

A secularização é o processo de afastamento de uma sociedade da religião.

Mesmo a classe média brasileira não é altamente secularizada , afirma o pesquisador.

Ele aponta que mesmo movimentos de esquerda não fizeram uma oposição à religião em si – o PT, o maior partido de esquerda do país, por exemplo, tem em suas origens o catolicismo da Teologia da Libertação, corrente católica que defende a atuação da Igreja em prol do combate à desigualdade social como prioridade.

No Brasil, movimentos por direitos de grupos que historicamente sofreram opressão religiosa – como mulheres e pessoas LGBT – não tendem a ser antirreligiosos, destaca Mariano.

Embora certos movimentos façam oposição à influência de grupos religiosos no Congresso, diz Mariano, raramente a oposição é em relação à ideia de religiosidade em si.

Mesmo quando a democratização do ensino superior avançou, isso não implicou na absorção de uma cultura que faça oposição à crença religiosa, não houve esse embate, diz Mariano.

** Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia

*** Foto de capa: Pixabay

Falsa narrativa da ameaça comunista continua circulando nas mídias sociais

Lideranças religiosas e políticos conservadores continuam engrossando o coro nas mídias sociais de uma presente ‘ameaça comunista’ no atual governo. A narrativa segue forte, principalmente em ambientes religiosos. É o que mostra uma pesquisa realizada em março pelo instituto Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) segundo a qual 39% dos católicos e 57% dos evangélicos entrevistados enxergam esta possibilidade para o país em decorrência do atual governo.

Diversas checagens realizadas por Bereia, desde de 2019, dão conta de que há vasto conteúdo desinformativo a respeito do comunismo no Brasil, com extensa disseminação de conteúdos enganosos, principalmente a partir do período eleitoral de 2018. No entanto, não é a primeira vez que a direita brasileira utiliza esta estratégia para alcançar mais adeptos.

Imagem: reprodução Twitter

Pesquisa Ipec

De acordo com a pesquisa realizada pelo Ipec neste março de 2023, sobre a avaliação do atual governo, 44% dos brasileiros acreditam que há alguma possibilidade do Brasil se tornar um país comunista. Destes, 39% dos católicos e 57% dos evangélicos entrevistados para este estudo enxergam o risco de uma “ameaça comunista” ao Brasil por conta do atual governo.

O levantamento trouxe ainda que 45% dos católicos avaliaram o atual governo como ótimo ou bom, 40% estão entre as pessoas sem ou de outra religião, enquanto que entre os evangélicos esse número foi de 31%. Já 33% dos evangélicos consideram a gestão ruim ou péssima, seguido de 21% dos católicos e 21% de outras religiões. Dentro deste âmbito, a avaliação do governo inclui também a nota regular e os índices de pessoas que não responderam ou não souberam responder. Outras perguntas do estudo sobre a gestão do atual presidente contemplam ainda aspectos como, confiança, apoio, posição do país no cenário mundial, defesa dos mais pobres e polarização política.

Imagem: reprodução Ipec

Ameaça comunista – um enredo antigo 

Em artigo intitulado As Formas Discursivas e a Ameaça Comunista, a doutora em linguística pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Bethania Mariani, ajuda  a entender que se trata, na verdade, de um fenômeno que remonta à década de 1920, ou seja, pouco tempo depois de iniciada a Revolução Russa, que instituiu o socialismo no que viria a ser a União Soviética.

Desde então, a narrativa da ameaça comunista volta à cena política de tempos em tempos, com mais ou menos força. Na década de 1960, por exemplo, a suposta ameaça foi utilizada pelos militares brasileiros para justificar a derrubada de um governo constitucional. O golpe militar de 1964 mergulhou o Brasil em um período de 21 anos sob regime de exceção e, hoje, há relativo consenso histórico, baseado em relatos e documentação oficial, de que nunca houve uma real ameaça comunista naquele contexto, conforme explicitado em matéria do UOL.

Imagem: reprodução Metrópoles

Conforme Bereia já publicou, o tema da ameaça comunista vem sendo amplamente explorado em contextos de desinformação, permeando todos os cinco temas mais presentes em checagens feitas entre 2021 e 2022: perseguição a cristãos, covid-19, “ideologia de gênero”/moralidade sexual, supostos feitos do presidente Jair Bolsonaro e tópicos específicos referentes às eleições.

Antes mesmo do período eleitoral, foram várias as checagens realizadas por Bereia envolvendo suposta ameaça comunista, desde a afirmação do então ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, de que havia um plano comunista sendo instalado no Brasil, até mensagens anônimas que circulavam em ambientes religiosos espalhando pânico moral associado às ideologias “de esquerda”. Os exemplos são muitos e, em todas as ocasiões, o ambiente religioso foi contaminado com a narrativa da ameaça comunista, que, como prova a História, nunca se concretizou.

Desinformação e conspiração

Em artigo de opinião recentemente publicado na revista Carta Capital, o pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais e PhD em Comunicação e Cultura Contemporâneas Camilo Aggio estabelece uma conexão entre o fenômeno da desinformação e o das teorias conspiratórias. “Não há desinformação sem conspiração”, afirma.

Aggio destaca que “temos um espectro vastíssimo de ofertas conspiracionistas à disposição de quem precisa negar a ciência e o conhecimento especializado para manter suas convicções. Não poderia, portanto, ser diferente quando estamos a falar de uma ampla indústria de produção de desinformação no mercado digital de crenças”.

A constatação do pesquisador parte do monitoramento realizado pela União Pró-Vacina, em 2020, que constatou a presença de teorias da conspiração na maior parte das informações falsas sobre vacinas. A interpretação, porém, estende-se ao fenômeno da desinformação amplamente compreendido, o que se relaciona com os conteúdos falsos e enganosos que circulam nos ambientes religiosos, sejam sobre vacina, gênero ou supostas ameaças comunistas.

Falsa ameaça comunista segue presente nas redes sociais digitais

Conforme a pesquisa realizada pelo Ipec revelou, a narrativa da ameaça comunista continua tendo resultados concretos, principalmente no segmento religioso. O termo comunista é muitas vezes usado por estes grupos para designar comportamentos considerados por eles como imorais. Também por isto, essa narrativa é fortalecida mesmo na ausência de fontes ou indícios confiáveis de que um regime comunista poderia vigorar no Brasil e muitos brasileiros seguem acreditando nessa possibilidade.

Imagens: reprodução do Twitter

Nas mídias sociais é possível enxergar o que a pesquisa levantou com dados, em que diversos perfis políticos,  católicos e evangélicos disseminam a narrativa da ameaça comunista, criando um ambiente em que vigora o pânico justificado apenas no próprio discurso propagado. O uso do termo “ameaça”, por si só, carrega um significado específico, que perpetua a noção de um perigo iminente.

A suposta relação da fé com o anticomunismo faz com que o tema esteja sempre presente nos ambientes religiosos, o que ajuda a compreender os resultados da pesquisa Ipec e acende um alerta para que todos estejam sempre vigilantes quanto aos fundamentos dos conteúdos compartilhados.

Referências de checagem:

UOL. https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/10/01/brasil-esteve-a-beira-do-comunismo-nos-anos-1960-historia-nao-mostra-isso.htm?utm_source=twitter&utm_medium=social-media&utm_campaign=noticias&utm_content=geral Acesso em: 23 mar 2023

O Globo. https://oglobo.globo.com/blogs/pulso/post/2023/03/pesquisa-ipec-brasil-vive-risco-de-comunismo-com-lula-quase-metade-da-populacao-ve-ameaca-comunista.ghtml Acesso em: 22 mar 2023

Carta Capital. https://www.cartacapital.com.br/opiniao/nao-ha-desinformacao-sem-conspiracao/ Acesso em: 22 mar 2023

Bereia.

https://coletivobereia.com.br/comunismo-e-ameaca-comunista-vs-patriotismo-e-argumento-que-embasa-temas-com-mais-desinformacao-em-espacos-religiosos-nas-eleicoes/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/mentir-e-pecado-os-cristaos-e-a-propagacao-de-fake-news/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/nao-ha-missionarios-comunistas-na-amazonia-nem-defesa-do-fim-da-conversao-religiosa-para-indigenas-por-catolicos/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/o-partido-comunista-chines-nao-avanca-no-brasil-mercado-chines-sim/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/e-enganosa-a-ideia-de-que-ha-um-plano-comunista-sendo-instalado-no-brasil/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/o-fantasma-do-marxismo-cultural/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/mensagem-anonima-panicomoral/ Acesso em: 22 mar 2023

https://coletivobereia.com.br/os-bichos-papoes-que-assombraram-os-eleitores-religiosos-em-2020/ Acesso em: 22 mar 2023

Pesquisa Ipec (arquivo). https://drive.google.com/file/d/1kE5DrJ9WVrQuSCLouvwnAEDt0G6t7gcj/view?usp=share_link Acesso em: 22 mar 2023

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Foto de capa: Jorge Gobbio/Flickr

Gênero, política e desinformação: as mulheres sob ataque

No Mês da Mulher (a propósito do 8 de março, Dia Internacional da Mulher), temos visto as novas formas de exaltação do feminino por toda parte, mostrando os importantes avanços conquistados. 

No entanto, é central entendermos o quanto há de se lutar ainda nos dias atuais. Hoje, a desinformação ganhou espaço e, quem a produz, tem utilizado o gênero para mentir, forjar e até mesmo manipular os discursos. Como parte de sua estrutura, grupos que promovem desinformação têm criado, quase que diariamente, novas maneiras de fazer circular a atuação das mulheres, ora fazendo juízo de valor, com poucos elogios, ora massacrando as mulheres.

Em 2016, acompanhamos o impeachment da presidente Dilma Rousseff, alvo de um levante que desaguou em sua saída do governo. Tal evento mostrou que há pavor quando uma mulher governa, fala, se coloca e decide, principalmente quando há muitos interesses envolvidos, que tangenciam os privilégios de muitos. 

Em abril de 2016, a revista Carta Capital publicou matéria criticando a reportagem da revista ‘IstoÉ’, que com postura sexista, coroou o momento em que a misoginia mostrava-se (e permanece) como a regra para atacar as mulheres na política. Os termos usados para descrever a presidente variavam de “perda de condições emocionais” a “irascível”. Em contrapartida, a esposa do vice-presidente Michel Temer, Marcela Temer, acumulava elogios e como disseram alguns, só ela já servia como justificativa para a saída de Dilma do governo. 

Como se não bastasse a pressão de governar o país, Dilma Rousseff chegou a receber, de um jornalista o conselho de “fazer mais sexo”, defendendo que esta seria a solução para as supostas crises emocionais de Dilma. 

Em 2020, o Coletivo Bereia publicou um artigo que deu o tom sobre o desafio de pensar as relações de gênero nos âmbitos público e privado. De acordo com o teólogo Leonardo Boff, é relevante dizer que o movimento feminista fez a crítica mais necessária à cultura patriarcal. 

Na chefia do Estado, nos demais cargos públicos, nas Forças Armadas, nas guerras, nas divindades, e nas histórias de heróis, a figura masculina, está e é o principal personagem, do início ao fim. Homens ocupam a vida pública. À mulher, é destinada a casa, refúgio especial onde o patriarcado se fortalece. 

Em 2023, observamos um novo enquadramento. Depois de quatro anos de um governo que promoveu opressão sistemática das mulheres, após as últimas eleições, as mulheres voltam a arena pública, e com isso, novamente tornando-se alvos de novos ataques. Elas estão por toda parte: nas câmaras legislativas, no Senado, no Supremo Tribunal Federal, nos ministérios. Estão ocupando os espaços da vida pública. 

Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

No entanto, é preciso acionar a memória e lembrar que quando todo o processo de mudança é visto como um avanço, há também um custo que a história nos mostra, que as mulheres precisam pagar. 

Mulheres na política: gênero em perspectiva

O levantamento realizado pela Escola de Comunicação, Mídia e Informação, da Fundação Getúlio Vargas (ECMI-FGV), que analisou publicações no Twitter, Facebook e Telegram, entre 13 de janeiro e 13 de fevereiro de 2023, mostra, entre outros assuntos, o protagonismo das mulheres na política, evidenciando a tendência da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, e da atual, Rosângela (Janja) Lula da Silva, como possíveis candidatas às eleições presidenciais de 2026. 

Mais do que isso, o levantamento analisou a constituição do que seria o perfil de “mulher ideal” para estar na política, associando a ex-primeira-dama à religiosidade, e simultaneamente, uma pessoa com altas capacidades políticas. Ao contrário, Janja aparece classificada como pouco “refinada” e com baixa influência política.

Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

De acordo com o levantamento, “de modo mais lateral, ambas são alvo de críticas generificadas, seja em comentários sobre a prótese mamária de Michelle, seja em postagens sobre as roupas de Janja”.

Fonte: Twitter | Elaboração: Escola de Comunicação, Mídia e Informação da FGV

As análises abarcam as ministras Marina Silva (Meio Ambiente), Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) – que aliás, tem sido colocada como antagonista ao presidente nas resoluções financeiras – , Nísia Trindade (Ministério da Saúde), Margareth Menezes (Cultura) e o suposto uso indevido da Lei Rouanet, Luciana Santos (Ciência, Tecnologia e Inovação), acusada de ser aliada do presidente venezuelano Nicolás Maduro. Em maior ou menor medida, os nomes de todas as ministras circulam pelas mídias, ora destacando criticamente suas atuações, ora com o registro de ataques.

Parece que, com o tempo, tudo muda, mas muitas coisas não. O ar que respiramos no fim de 2022 foi de esperança. Esperança para continuar, para lutar, para resistir e para avançar mas, como podemos constatar ainda há muito o que transformar.

Referências:

https://coletivobereia.com.br/o-dia-internacional-da-mulher-nos-desafia-a-pensar/

https://www.cartacapital.com.br/blogs/midiatico/quando-a-misoginia-pauta-as-criticas-ao-governo-dilma

https://lupa.uol.com.br/jornalismo/2023/03/07/posts-misoginos-janja-michelle-bolsonaro

https://a.storyblok.com/f/134103/x/f3555133e0/2023-02-15-ue002_mulheresgovernofederal.pdf?cv=1677852660403

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/28/impeachment-de-dilma-rousseff-marca-ano-de-2016-no-congresso-e-no-brasil

**Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia.

*** Foto de capa: reprodução site InternetLab

Site gospel publica pesquisa eleitoral com metodologia contestada e financiamento criticado

O site evangélico  Pleno News publicou, em 29 de setembro de 2022, pesquisa de intenção de votos realizada pelo Instituto Equilíbrio Brasil.  Nos dados oferecidos na matéria “Bolsonaro lidera em pesquisa mais ampla que Ipec e Datafolha”, Jair Bolsonaro teria 44% da preferência do eleitorado, contra 39% de Lula.

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Imagem: reprodução do site Pleno News

Equilíbrio Brasil: metodologia contestada 

Pleno News destaca que o levantamento realizado é mais amplo do que aquelas que têm sido apresentadas por institutos credenciados como o Ipec (formado por ex-executivos do Ibope) e o Datafolha. A matéria diz que o instituto Equilíbrio Brasil, ouviu 11.500 pessoas em 1.286 cidades, entre os dias 20 e 22 de setembro, com margem de erro de três pontos percentuais. 

Entretanto, a publicação não destaca a metodologia utilizada: a aplicação de questionário estruturado por meio de ligações automatizadas para telefones fixos e celulares. Esta metodologia é criticada pelo Conselho Federal de Estatística e por diversos institutos de pesquisa do país. Datafolha e Ipec abordam presencialmente seus entrevistados. 

O desconhecido Equilíbrio Brasil se coloca ao lado de outro, o controverso Brasmarket, até então o único instituto de pesquisa do país a apresentar Jair Bolsonaro na liderança da corrida presidencial. Brasmarket e seus métodos foram alvo de checagem do Bereia. 

Assim como Brasmarket, Equilíbrio Brasil não é filiada à Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa e não apresenta histórico de pesquisas eleitorais: apenas seis levantamentos estão disponíveis no site da instituição, todos no ano de 2022.

Pesquisa eleitoral: o que diz a legislação?

De acordo com o Art. 33 da Lei nº 9.504/1997 as entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, a registrar na Justiça Eleitoral, para cada pesquisa, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I –  quem contratou a pesquisa;

II –  valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III – metodologia e período de realização da pesquisa;

IV – plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro; 

V – sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI – questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII – nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal. 

Equilíbrio Brasil ou Multi Mercado LTDA: financiamento criticado

A pesquisa do Instituto Equilibrio Brasil está disponível no site do TSE, registrada sob o número BR-02018/2022, mas o nome da empresa no registro é Multi Mercado LTDA. Os dados da pesquisa foram divulgados também no próprio site do instituto, mas algumas informações foram omitidas. 

Numa pesquisa mais detalhada no site do Tribunal Superior Eleitoral, verificamos que o próprio instituto foi o “contratante” da pesquisa. e mesmo com elevado número de entrevistas feitas por telefone, 11.500 contatos, o levantamento custou R$ 28.000,00. 

Esta modalidade de financiamento, o “autofinanciamento” de pesquisas eleitorais, mesmo permitida por lei, levanta suspeitas, pois permite que institutos não divulguem a origem dinheiro que pagou as sondagens e a divulgação da nota fiscal não é obrigatória. Todas as pesquisas realizadas por Equilíbrio Brasil foram “autofinanciadas”.

Equilíbrio Brasil X Datafolha

Tomando-se um dos institutos citados pelo Pleno News em comparação, o levantamento do Instituto Datafolha realizou 6.800 entrevistas presenciais e o valor da foi de R$ 473.780,00. Quase dez vezes o custo da pesquisa do Instituto Equilíbrio Brasil (Multi Mercado LTDA)

A pesquisa Datafolha divulgada em 29 de setembro, está disponível para consulta no site do próprio instituto e no site do TSE, registrada  sob número BR-09479/2022. 

Seguindo a tendência dos principais institutos do país, o Datafolha mostra o ex-presidente na liderança. Lula oscilou de 45% para 47% das intenções de voto na disputa pela Presidência da República e ampliou a liderança sobre o segundo colocado, Jair Bolsonaro, que se manteve com a preferência por 33% dos eleitores brasileiros.

Este resultado se aproxima dos números do agregador de pesquisas do jornal Estado de São Paulo que leva em conta pesquisas sobre a corrida presidencial divulgadas nos últimos seis meses e tem atualização diária. O cálculo considera as linhas de tendência de cada candidato (se estão estáveis, subindo ou caindo) e atribui pesos diferentes às pesquisas segundo sua “idade” (a data de realização) e metodologia (na média, os resultados são mais precisos quando os eleitores são entrevistados de forma presencial, em vez de por telefone).

Imagem: reprodução site TSE

Bereia conclui que a pesquisa divulgada pelo portal Pleno News não pode ter seus dados corroborados, por isso a matéria desinforma por ser imprecisa. A metodologia utilizada no levantamento é contestada e o financiamento, mesmo não sendo ilegal, levanta dúvidas quanto à isenção dos dados.  

Um trabalho que envolve mais de 11 mil contatos com eleitores, mesmo por telefone, apresentaria um custo muito elevado. Já os institutos desqualificados pela matéria Pleno News, Ipec e Datafolha oferecem todas as informações exigidas para o credenciamento de uma pesquisa e têm os levantamentos registrados no TSE, como exigido por lei, além de executivos respeitados e histórico confiável de pesquisas eleitorais.

Referências de checagem: 

Equilíbrio Brasil.

https://www.equilibriobrasil.com/l/presidente-20-a-22-de-setembro-de-2022/ Acesso em 29 set 2022

https://www.equilibriobrasil.com/l/presidente-20-a-22-de-setembro-de-2022/ Acesso: em 29 set 2022

https://www.equilibriobrasil.com/pesquisas/ Acesso em: 29 set 2022

TSE.

https://www.tse.jus.br/eleicoes/pesquisa-eleitorais/consulta-as-pesquisas-registradas Acesso em: 29 set 2022

https://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/lei-das-eleicoes/lei-das-eleicoes-lei-nb0-9.504-de-30-de-setembro-de-1997#art33-35 Acesso em: 29 set 2022

Coletivo Bereia. https://coletivobereia.com.br/pesquisa-compartilhada-em-midias-e-sites-evangelicos-tem-metodologia-questionavel/ Acesso em: 29 set 2022

O Estado de São Paulo. https://www.estadao.com.br/politica/com-novas-pesquisas-media-estadao-dados-mostra-lula-com-52-dos-votos-validos-bolsonaro-tem-35/ Acesso em: 29 set 2022

Ipec. https://www.ipec-inteligencia.com.br/ Acesso em: 29 set 2022   

Datafolha. https://datafolha.folha.uol.com.br/ Acesso em: 29 set 2022   

Conselho Federal de Estatística. https://www.confe.org.br/pesquisa_eleitoral_por_telefone.pdf Acesso em: 29 set 2022   

Valor Econômico. https://valor.globo.com/politica/noticia/2018/06/04/pesquisas-por-telefone-despertam-polemica.ghtml Acesso em: 29 set 2022  

Terra. https://www.terra.com.br/noticias/eleicoes/mpf-investiga-fraudes-em-pesquisas-autofinanciadas-quase-23-das-registradas-no-tse,bda3ba07bb0878fd43a8582f16a5434ce95odsiy.html Acesso em: 29 set 2022    

ABEP. https://www.abep.org/diretorio-dos-filiados-abep Acesso em: 29 set 2022  

Imagem de capa: reprodução Pleno News

Pesquisa compartilhada em mídias e sites evangélicos tem metodologia questionável

Dezenas de sites e mídias digitais evangélicas divulgaram uma controversa pesquisa eleitoral realizada pelo Instituto Brasmarket sobre intenção de votos para a Presidência da República. A pesquisa é polêmica pois vai de encontro a todos os demais levantados dos principais institutos de pesquisa do país.

De acordo com os dados apresentados pelo Brasmarket, o presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria liderando a corrida eleitoral com 44,9% (37% no levantamento anterior), enquanto Lula teria 31%  (27%, no levantamento anterior). Além disso, quando o corte é por religião, os cristãos católicos e evangélicos rejeitaram em sua maioria o ex-presidente Lula (PT). A pesquisa foi registrada no TSE com o número BR-00580/2022. 

Instituto Brasmarket

O site do Instituto Brasmarket afirma que a empresa tem 40 anos de experiência com pesquisas, mas apenas nove pesquisas eleitorais estão disponíveis para consulta. De acordo com o site da Receita Federal, os proprietários da empresa são José Carlos Nogueira Cademartori e Felipe Fontes de Castro Cademartori. Ambos tornaram-se proprietários da empresa apenas em março de 2002. O Instituto Brasmarket não consta como afiliado à Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. 

Além das pesquisas eleitorais para presidente, três delas contratadas pela Associação de Supermercados do Rio de Janeiro, as demais foram custeadas pelo próprio Brasmarket. O Instituto realizou outras pesquisas este ano: para o governo de Goiás, contratado pela ASSOCIAÇÃO GOIANA DO NELORE, governo de Tocantins, custeada pela própria empresa, para o governo do Rio Grande do Norte, contratada pela CPF/CNPJ: 25450212000100 – BG MÍDIAS E ASSESSORIA DIGITAIS EIRELI, para o governo de Mato Grosso do Sul, contratada pela CPF/CNPJ: 03976495000187 – RADIO CAPITAL DO SOM LTDA / Origem do Recurso: (Recursos próprios). As pesquisas para os governos estaduais foram acompanhadas de pesquisa levantamento de intenção de voto para Presidente da República apenas naquele estado. 

Matéria da Revista Veja de janeiro de 2022 apresenta uma suposta pesquisa realizada ainda em 2021 pelo Brasmarket que chegou ao conhecimento público sem o devido registro no TSE e rapidamente inundou as mídias digitais de direita. De acordo com a matéria, o Instituto está envolvido em diversas controvérsias e mistérios.

Pesquisa Brasmarket

A pesquisa mais recente é que passou a circular em mídias digitais religiosas  foi realizada pelo Instituto Brasmarket e registrada no dia 17/09/2022 no TSE com o número de identificação: BR-00580/2022. Os resultados foram divulgados em 23/09/2022. A pesquisa foi realizada entre os dias 18 e 20 de setembro e foi custeada com recursos da própria empresa com o valor de R$ 32.000,00.

A metodologia de pesquisa utilizada foi a quantitativa, por meio de entrevistas telefônicas, com aplicação de questionários estruturados e padronizados junto a amostra representativa da população pesquisada. Foram 2.400 entrevistados de 116 municípios.

A pesquisa realizada pelo Instituto Brasmarket chama atenção por ser o único levantamento que aponta o presidente Jair Bolsonaro como favorito e pelo resultado bem diferente dos apresentados pelos Institutos mais conhecidos e renomados do país: Datafolha e Ipec (formado por ex-executivos do Ibope).  

O agregador de pesquisas eleitorais do Estadão usa dados dos levantamentos de 14 empresas, considerando suas peculiaridades metodológicas, para calcular a Média Estadão Dados e o cenário mais provável da disputa eleitoral. Lula aparece com 47% e Jair Bolsonaro fica com 33% na média de todos os levantamentos nos últimos seis meses. 

Resultados da pesquisa do Instituto Brasmarket

Imagem: reprodução site Instituto Brasmarket

Imagem: reprodução site Instituto Brasmarket

Datafolha: história e metodologia 

O Instituto Datafolha realizou 47 pesquisas neste ano, de acordo com a consulta realizada no site do TSE: tanto para corrida presidencial, quanto para governos estaduais. O Datafolha foi criado em 1983 e disponibiliza uma seção de perguntas e respostas para que os visitantes conheçam seus métodos e técnicas de pesquisa. Ele permite que os leitores/visitantes consultem centenas de pesquisas realizadas desde 1989. 

O Datafolha não faz pesquisas sob encomenda para políticos ou partidos. Todos os levantamentos são realizados para divulgação e uso público de grandes veículos de comunicação. Quando um meio de comunicação contrata uma pesquisa eleitoral do instituto, uma de suas obrigações é tornar público o resultado desse levantamento.

De acordo com a seção de perguntas e respostas disponibilizada no site, a validade de uma pesquisa eleitoral feita por telefone, como a realizada pelo Instituto Brasmarket, fica comprometida pois  “é inviável realizar pesquisas eleitorais telefônicas no Brasil que sejam representativas do total do eleitorado, já que apenas 40% dos brasileiros possuem linha telefônica fixa em casa. Por isso os institutos abordam os eleitores pessoalmente”.

A última pesquisa Datafolha para presidente foi divulgada em 22/09, dia anterior  à divulgação da pesquisa do Instituto Brasmarket, com o número de identificação no TSE  BR-04180/2022. O custo total da pesquisa foi de R$ 473.780,00. (o levantamento de Brasmarket custou R$ 32.000,00)

Contratantes: EMPRESA FOLHA DA MANHÃ e GLOBO COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A/TV/REDE/CANAIS/G2C+GLOBO GLOBO.COM GLOBOPLAY.  

A metodologia de pesquisa utilizada foi a pesquisa do tipo quantitativo, por amostragem, com aplicação de questionário estruturado e abordagem pessoal em pontos de fluxo populacional. O conjunto do eleitorado brasileiro foi tomado como universo da pesquisa. 6.734 entrevistados em 285 municípios. (Brasmarket entrevistou 2.400 pessoas de 116 municípios).

Resultado pesquisa Datafolha.

Imagem: divulgação Datafolha

Fonte: Datafolha

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De acordo com todas as informações levantadas, o Bereia considera que a pesquisa realizada por Brasmarket, que está sendo amplamente divulgada nas mídias digitais da extrema-direita, é enganosa. 

O instituto começou efetivamente suas atividades há quatro meses, e suas pesquisas são as únicas em todo o país a apresentarem resultados divergentes, e mesmo com o registro no TSE, apresenta disparidades em relação às demais pesquisas, como o custo muito baixo dos levantamentos, metodologia e pouco detalhamento de seus resultados. 

Desta maneira, esta pesquisa parece funcionar mais como uma ferramenta para batalhas discursivas na campanha política  neste pleito 2022, a fim de confundir eleitores.

Referências de checagem: 

Instituto Brasmarket.

https://www.institutobrasmarket.com.br/ Acesso em: 26 set 2022.

https://www.institutobrasmarket.com.br/_files/ugd/d5bd9b_e4dbf5bfbfc146849776fbdf54ee405e.pdf?index=true Acesso em: 26 set 2022.

://www.institutobrasmarket.com.br/_files/ugd/d5bd9b_1fcf826c094a47ae8fcdcdfae46163aa.pdf?index=true Acesso em: 26 set 2022. 

https://www.institutobrasmarket.com.br/_files/ugd/d5bd9b_e23650a6caba4e378556aa209b080da3.pdf?index=true Acesso em: 26 set 2022. 

https://www.institutobrasmarket.com.br/_files/ugd/d5bd9b_ee37cf4ef6a545bc959e873134ed602c.pdf?index=true Acesso em: 26 set 2022. 

https://www.institutobrasmarket.com.br/_files/ugd/d5bd9b_59c1f4aad2854cf5abbcfacbe11929d7.pdf Acesso em: 26 set 2022. 

TSE. https://www.tse.jus.br/eleicoes/pesquisa-eleitorais/consulta-as-pesquisas-registradas Acesso em: 26 set 2022.

Datafolha.

https://datafolha.folha.uol.com.br/ Acesso em: 26 set 2022.

https://datafolha.folha.uol.com.br/sobre/2022/07/historia-do-datafolha.shtml Acesso em: 26 set 2022.

https://datafolha.folha.uol.com.br/sobre/perguntas-e-respostas/pesquisas-eleitorais/ Acesso em: 26 set 2022.

https://datafolha.folha.uol.com.br/eleicoes/ Acesso em: 26 set 2022.

Ipec.

https://www.ipec-inteligencia.com.br/ Acesso em: 26 set 2022.

https://asserj.com.br/ Acesso em: 26 set 2022.

Veja. https://veja.abril.com.br/politica/a-unica-pesquisa-em-que-a-familia-bolsonaro-acredita/ Acesso em: 26 set 2022. 

Estado de São Paulo. https://www.estadao.com.br/politica/eleicoes/agregador-pesquisa-eleitoral-2022/?turno=&cargo=presidencial&modalidade=todas&regiao=todas Acesso em: 26 set 2022.  

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Foto de capa: Instituto Brasmarket

Pesquisa Ipespe: 78% não acreditam no boato de “fechamento de templos”

A pesquisa “Termômetro da Campanha”, do Ipespe, realizada em conjunto com a Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais, ouviu eleitores em diversos temas. Um deles foi o boato da possibilidade do fechamento de templos religiosos após o pleito. O tema foi especialmente associado à vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O resultado: 78% dos entrevistados dizem não acreditar que haveria fechamento de templos após as eleições para presidente da República.

O levantamento foi feito entre 30 de agosto e 1º de setembro com uma amostra nacional de 1.100 entrevistados. A margem de erro total é de três pontos percentuais para mais ou menos dentro de um intervalo de confiança de 95,45%. A pesquisa Abrapel/Ipespe está registrada no Tribunal Superior Eleitoral com o número 09344/2022.

Confira aqui a pesquisa completa.

Pesquisa investigou aderência a boatos sobre fechamento de igrejas  — Foto: Abrapel/Ipespe
À esquerda, a porcentagem total das respostas. À direita, o quanto os eleitores de cada candidato responderam SIM ou NÃO. Imagem: pesquisa Termômetro da Campanha.

Foto de capa: Brett Sayles /Pexels

Direita e esquerda no Brasil: o imaginário, o digital, o caos

Novas formas de ativismo passaram a compor o cenário político brasileiro, traduzindo as mudanças significativas na organização e mobilização política  na era das novas tecnologias, mídias sociais, influenciadores digitais, disparos de mensagens em massa etc, conferindo à esfera pública digital e à opinião pública um papel fundamental sobre as mediações que realiza entre os cidadãos e o Estado. 

A pesquisa “Cara da Democracia no Brasil” realizada pelo Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação fornece algumas pistas para tentar compreender estas e outras  importantes mudanças no comportamento, nas atitudes, nas crenças e valores dos cidadãos brasileiros com relação à democracia, temas que dominam o debate público desde a eleição de Jair Bolsonaro, como legalização do aborto, descriminalização das drogas e direitos das chamadas minorias. 

De acordo com a pesquisa, o dobro dos brasileiros se diz mais à direita do que  à esquerda no espectro político. Entretanto, devemos levar em conta que a compreensão do significado do que é pertencer à direita ou esquerda não alcança a maioria da população, e muitas percepções mudam ao longo do tempo. 

Direita e esquerda

Os termos direita e esquerda no campo político surgiram no turbulento período da Revolução Francesa de 1789. Durante os acalorados debates na Assembleia Constituinte a respeito do poder que o rei Luís 16 deveria ter a partir daquele momento, o grupo conservador, favorável à manutenção dos poderes da monarquia, ficaram à direita; enquanto os progressistas ou revolucionários, que defendiam diminuir os poderes do rei, sentaram-se à esquerda. 

Com o passar dos anos, as diferenças entre os grupos evoluíram para outros temas, além dos poderes da monarquia, que pouco tempo depois chegou ao fim. Com a direita em busca de uma república vinculada à Igreja e um Estado com mercado liberal e a esquerda lutando por um Estado laico e regulador na economia. Em alguns países os termos progressistas e reacionários, conservadores e liberais ou democratas e republicanos nomeiam esses espectros políticos opostos. No Brasil, mais de 200 anos depois das discussões na França,  os campos da esquerda e direita, com diversos tons entre os extremos de cada lado, continuam polarizando o debate político. 

A pesquisa “A Cara da Democracia”, para tentar compreender onde cada brasileira está posicionado neste debate, apresentou um questionário no qual os entrevistados deveriam marcar de 1 a 10, sendo 1 o máximo à esquerda e 10 o máximo à direita. 

Imagem: reprodução de O Globo

Entretanto, chama atenção na pesquisa – para além de uma direita sedimentada que convive com algumas opiniões progressistas pontuais – o grande número de brasileiros que acreditam em teorias da conspiração. Apresenta-se como um desafio compreender de que maneira essas bizarras teorias ocuparam o imaginário social, o conjunto de crenças, de parte da população.

É espantoso que 20% dos entrevistados acreditam que a Terra é plana, 21% que a cloroquina cura a covid-19, e 27%  não acreditam que o ser humano pisou na lua. No aspecto “ideológico” das conspirações, os números são ainda maiores,  49% acreditam que a China criou a covid-19 e uma das teorias mais difundidas pelo bolsonarismo, o globalismo (ideia de que  a globalização econômica passou a ser controlada pelo “marxismo cultural”), é acolhida por 44% dos entrevistados, que acreditam em uma conspiração global da esquerda para tomar o poder no mundo. O falecido guru do bolsonarismo, Olavo de Carvalho e o ex chanceler Ernesto Araújo difundiram o globalismo incansavelmente. 

Imagem: reprodução de O Globo

Como explica a jornalista e doutora em Ciências da Comunicação Magali Cunha, em seu artigo O lugar das mídias no processo de construção imaginária do “inimigo” no caso Marco Feliciano, “os seres humanos vivem de imagens, vivem de imaginação socialmente construída, o que forma e reforma suas crenças, sua linguagem e suas atitudes frente às demandas da vida e do outro”. 

Desta maneira, “o imaginário é, portanto, um componente da existência humana como experiência marcadamente social, que dá sentido à vida coletiva e é ressignificado por ela. Imaginário é a elaboração coletiva da coleção de imagens formada pelo ser humano, de tudo o que ele apreende visualmente e experencialmente do mundo.” 

O cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Leonardo Avritzer, afirma que Bolsonaro adota uma tática para (des)governar que está relacionada à ampla base constituída nas redes sociais e degrada as instituições a partir de uma rede impressionante de geração de fake news.   Especificamente a respeito da pesquisa “A Cara da Democracia” e número de brasileiros que acreditam em teorias da conspiração, Leonardo Avritzer destaca que há os dois caminhos para entender a adesão de brasileiros aos apelos conspiratórios: “Há, primeiramente, o nível baixo de escolaridade, especialmente em questões como se a terra é plana. Em outros temas, há um amplo processo de desinformação nas redes sociais, especialmente quando recebem informações das estruturas de confiança delas, como instituições religiosas, família, ou local de trabalho. 

Na campanha eleitoral de 2018, Jair Messias Bolsonaro reuniu os discursos conservador tradicional, neoliberal, populista e religioso em uma nova combinação e elaborou uma retórica sem precedentes no Brasil. Tal rearticulação discursiva materializa um projeto hegemônico para a constituição de uma nova base e agenda política, liberal na economia e conservadora nos costumes, que é uma das facetas de um projeto político mais amplo de reestruturação da hegemonia do bloco centrado na elite econômica e financeira do país em novas condições. 

De acordo com o sociólogo Jessé Souza, “distorcer o mundo social é parte do projeto das classes dominantes para subjugar os demais segmentos da sociedade e se apropriar da riqueza nacional e só a percepção adequada da dimensão cultural e simbólica da vida social nos permite uma compreensão mais profunda e verdadeira da vida que levamos como indivíduos”.  No Brasil de Bolsonaro, as pautas morais e o inimigo comunista alimentam o imaginário de grande parte da população. As mídias sociais são o caminho.

“Engenheiros do Caos”

Na obra “Os Engenheiros do Caos: Como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições, Giuliano da Empoli (2019) refaz os caminhos percorridos por figuras como Gianroberto Casaleggio _ cofundador do partido italiano Movimento Cinco Estrelas e um dos primeiros a utilizar a internet e as redes sociais para fazer política, Steve Bannon – guru de Donald Trump e um dos principais nomes da ultradireita no mundo, Milo Yiannopoulos – comunicador e “blogueiro” inglês, apoiador convicto da “liberdade de expressão” e crítico feroz do “politicamente correto” e Arthur Finkelstein – conselheiro de Viktor Orban, presidente ultraconservador da Hungria, que juntos “estão em vias de reinventar uma propaganda adaptada à era das selfies e das redes sociais, e, como consequência, transformar a própria natureza do jogo democrático”. Esses são os Engenheiros do Caos. 

O engajamento técnico: curtidas, comentários e compartilhamentos, tão buscados pelos executivos de marketing e publicidade das grandes empresas, é também o objetivo desses “profissionais” da esfera pública digital. Assim, colocam os algoritmos das redes sociais digitais ao seu favor, pois se os programadores do Facebook ou Instagram, por exemplo, trabalham para atrair e prender a atenção dos usuários pelo maior tempo possível, os algoritmos e ferramentas dos Engenheiros do Caos têm a mesma finalidade, capturar a razão dos indivíduos, neste caso, através da emoção, com iniciativas como o projeto Brasil Paralelo, produtora de conteúdo de extrema-direita, inspirado nas ideias de figuras como Olavo de Carvalho. Buscam “recontar” a História do Brasil,  e as teorias da conspiração são a matéria prima de suas produções e documentários. Um projeto que à primeira vista pode parecer independente e feito por alguns jovens conservadores com “uma ideia na cabeça”, é parte de um movimento bem orquestrado, organizado e muito bem financiado.                          

Não importa se as posições apresentadas são absurdas, mentirosas ou fantasiosas, pois estão pautadas em uma questão numérica de engajamento e não são baseadas em valores éticos. A meta é identificar e hackear as aspirações e os temores dos usuários das mídias sociais digitais e fazer com que interajam com outros que defendem as mesmas posições e com as páginas ou perfis que apresentam estes conteúdos.

Magali Cunha explica que exércitos precisam de inimigos e a Teologia de um Deus guerreiro e belicoso sempre esteve presente na formação fundamentalista dos evangélicos brasileiros, compondo o seu imaginário e criando a necessidade de identificação de inimigos a serem combatidos, através dos tempos estes inimigos foram, em maior ou menor grau, a Igreja Católica, as religiões afro-brasileiras, os comunistas e mais recentemente, a população LGBTQIA+. Parte das estratégias no quadro das disputas político-ideológicas baseadas no enfrentamento de inimigos estabelecidos simbolicamente é criar uma “guerra” pela visibilidade, que comumente envolve números e exposição nas mídias. 

As consequências na política nacional

 Jair Bolsonaro e os seus próprios Engenheiros do Caos deram ainda uma nova roupagem a esse discurso, unindo a ameaça aos valores tradicionais da família e da ameaça comunista. Esses temas não são novos, mas a utilização das redes sociais digitais é a novidade.

Jessé Souza afirma que “colonizar o espírito e as ideias de alguém é o primeiro passo para controlar seu corpo e seu bolso”.  De nada adianta os Engenheiros do Caos proclamarem as virtudes do governo atual e demonizar os governos de esquerda se ninguém acreditar nisso. E essa lavagem cerebral, ou melhor, privação sensorial, é turbinada pelas notícias falsas, teorias da conspiração, manipulação de dados e desinformação, turbinados pelas mídias sociais digitais e legitimadas por políticos, religiosos e influenciadores digitais. Algumas vezes, um indivíduo representa tudo isso, como o pastor presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia. 

Nessa bolha sinistra que comporta as mais inusitadas ideias e conspirações, os indivíduos em busca de acolhimento, reconhecimento e alguma explicação para seus anseios, parecem cada vez mais presos e hipnotizados. As teorias da conspiração, preconceitos e ódio sempre estiveram entre nós, no entanto, as redes sociais digitais conectaram pessoas com interesses em comum, inclusive os mais negativos. Os Engenheiros do Caos perceberam este poder das mídias sociais digitais e a utilizaram para manipulação da informação com fins políticos. 

Derrotar Jair Bolsonaro é, para muitos analistas, fundamental para estancar esse processo do que podemos chamar de privação sensorial. Temos o componente religioso e conservador, um grande número de evangélicos e católicos representados por líderes políticos e influenciadores digitais nada cristãos, além de um grande contingente, independentemente de classe social ou nível de escolaridade, que lê cada vez menos, escreve cada vez menos, interpreta cada vez menos e tem nas mídias sociais digitais sua única fonte de informação. 

Contudo, mesmo derrotando o atual presidente nas urnas, esse grupo extremista e seus métodos continuarão em atuação na esfera pública, buscando provocar uma ruptura no sistema democrático. Estes seres não estão mais nas sombras, são métodos e táticas são debatidos em artigos, livros e documentários, mas como um espectro sinistro, são difíceis de abalar ou capturar.

Imagem de capa: Gerd Altmann por Pixabay

Site religioso afirma que LEGO vai lançar brinquedos com “ideologia de gênero”

O site de conteúdo religioso Gospel Prime afirmou, em matéria publicada em 23 de outubro de 2021, que a  fabricante de brinquedos para crianças Lego anunciou novos projetos com “ideologia de gênero” e que a decisão foi tomada após pesquisa realizada por um “grupo ativista”.  

A matéria, baseada em conteúdo publicado pelo jornal britânico The Guardian, relata que a empresa irá atuar contra o “preconceito de gênero e estereótipos nocivos”, e que os brinquedos da Lego não terão mais personagens masculinos ou femininos. 

Imagem: reprodução do site Gospel Prime

Além disso,  trata do estudo realizado pelo Instituto Geena Davis de Gênero na Mídia, uma organização sem fins lucrativos, fundada em 2004 pela premiada atriz estadunidense, dedicada a pesquisar a representação de gênero na mídia e defensora da igualdade de representação das mulheres. Classificado na matéria como“grupo ativista subsidiou o novo projeto de LEGO”, o a organização teria mostrado na pesquisa, segundo o site de notícias, “que as brincadeiras e as carreiras futuras continuam desiguais, pois pais e meninos são fanáticos para rotular brinquedos de meninas”.

Por fim, Gospel Prime expõe dados da matéria do  The Guardian, que mostram que 71% dos meninos entrevistados relataram ter medo de serem ridicularizados caso brincassem com “brinquedos de meninas”, o mesmo foi compartilhado pelos pais.

Instituto Geena Davis e LEGO

O Instituto Geena Davis de Gênero na Mídia é colaborador de gigantes do entretenimento ao redor do mundo. Em 2019, os estúdios Walt Disney firmaram parceria com o instituto para utilização de um software de mapeamento dos roteiros e identificar se a participação de homens e de mulheres é equivalente.

Além disso, divulga uma série de pesquisas em parceria com outros institutos e organismos internacionais, como o estudo desenvolvido em conjunto com ONU Mulheres e a Fundação Rockefeller. Considerado o primeiro estudo global sobre personagens femininos em filmes populares, revelou uma profunda discriminação e uma estereotipagem generalizada de mulheres e meninas na indústria cinematográfica internacional. 

Bereia checou as informações que indicam que o que a Lego pretende, e consta na matéria do The Guardian, é combater estereótipos prejudiciais para meninos e meninas.  A companhia dinamarquesa de brinquedos solicitou o relatório ao Instituto Geena Davis para o Dia Internacional das Meninas, estabelecido pela ONU em 11 de outubro. A Lego afirmou ao The Guardian que trabalha para remover o preconceito de gênero em sua linha de produtos e  promover a nutrição e o cuidado, bem como a consciência espacial, o raciocínio criativo e a solução de problemas.

Desta maneira, a maior companhia de brinquedos do mundo pretende acabar com o estereótipo de profissões destinadas aos homens e às mulheres e mostrar que qualquer atividade pode ser exercida por ambos os sexos. 

A pesquisa do Instituto Geena Davis, realizada com 7 mil pais, mães e crianças de sete a 14 anos de sete países, descobriu que pais e mães de ambos os sexos classificavam os homens como “mais criativos”, tinham seis vezes mais probabilidade de pensar em cientistas e atletas como homens em vez de mulheres, e mais de oito vezes mais probabilidade de pensar em engenheiros como homens. Desta maneira, a Lego concluiu que seu trabalho é encorajar meninos e meninas a  brincarem com as peças oferecidas pela empresa que possam ter sido tradicionalmente vistas como feitas “não para eles e elas”. 

A Lego afirma que está de acordo com a visão de que os comportamentos associados aos homens são mais valorizados, até que as sociedades reconheçam que os comportamentos e atividades tipicamente associados às mulheres são tão valiosos ou importantes, que pais e filhos passem aadotá-los”.

Bereia checou a pesquisa publicada pelo Instituto Geena Davis e os resultados não revelam que os “ pais e meninos são fanáticos para rotular brinquedos de meninas”, como afirma Gospel Prime. Esta frase não corresponde aos conteúdos. A questão é, como indicado aqui, a valorização maior das famílias aos trabalhos supostamente dedicados aos homens, como engenharia ou atividades acadêmicas, além de alguns esportes, que, segundo a companhia de brinquedos precisa ser revista pois é uma visão que desvaloriza a capacidade das mulheres.

Manipulação de dados e desinformação

Portais de notícias religiosas estão entre os maiores propagadores de desinformação no país. A ideia elaborada em torno de uma“ideologia de Gênero”, uma estratégia discursiva e arma política,  tem espaço garantido nas mídias religiosas e nas declarações de políticos e líderes religiosos. Gospel Prime publica diversas matérias com a abordagem deste tema e algumas já foram checadas pelo Coletivo Bereia. 

Um levantamento da editora-geral do Bereia Magali Cunha, sobre os dois anos de atuação do coletivo, aponta que “ideologia de gênero”, pode ser classificada como a mais bem-sucedida concepção falsa criada no âmbito religioso. Ela indica que, surgido no ambiente católico e abraçado por distintos grupos evangélicos, que reagem negativamente aos avanços políticos no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, o termo trata de forma pejorativa a categoria científica “gênero” e as ações diversas por justiça de gênero, atrelando-as ao termo “ideologia”, no sentido banalizado de “ideia que manipula, que cria ilusão”. A “ideologia de gênero”, nesta lógica, é falsamente apresentada como uma técnica “marxista”, utilizada por grupos de esquerda, com vistas à destruição da “família tradicional”, gerando pânico moral e terrorismo verbal entre grupos religiosos. A matéria de Gospel Prime sobre os brinquedos Lego segue esta orientação. 

Bereia conclui, portanto, que a matéria publicada por Gospel Prime é enganosa, pois trata de um projeto de fato divulgado pela companhia dinamarquesa Lego e de um estudo publicado pelo Instituto Geena Davis. Entretanto, se baseia em matéria do jornal The Guardian, distorce dados, manipula informações e utiliza termos inexistentes.

Lego afirma buscar acabar com estereótipos prejudiciais para meninas e meninos. Diz que projeta incentivar meninas e pais a buscarem qualquer atividade e principalmente, mostrar aos meninos que não existem atividades destinadas unicamente às meninas e assim levar essas crianças a buscar atividades prazerosas que muitas vezes são abandonadas por vergonha ou medo da reprovação de pais e amigos. 

Referências:

The Guardian. https://www.theguardian.com/lifeandstyle/2021/oct/11/lego-to-remove-gender-bias-after-survey-shows-impact-on-children-stereotypes Acesso em 25/10/2021.

Geena Davis Institute.

https://seejane.org/ Acesso em 25/11/2021.

https://seejane.org/research-informs-empowers/lego-creativity-study/  Acesso em 25/11/2021.

Coletivo Bereia, https://coletivobereia.com.br/ideologia-de-genero-estrategia-discursiva-e-arma-politica/ Acesso em 02 nov 2021.

Agência Pública. https://apublica.org/2020/08/grupo-de-midia-evangelica-que-pertence-a-senador-bolsonarista-e-um-dos-que-mais-dissemina-desinformacao-afirmam-pesquisadores/ Acesso em 02 nov 2021. 

Tecmundo. https://www.tecmundo.com.br/cultura-geek/146589-disney-contrata-instituto-geena-davis-checar-vies-roteiros.htm Acesso em 02 nov 2021.

 ONU Mulheres. https://www.onumulheres.org.br/noticias/industria-cinematografica-global-perpetua-a-discriminacao-das-mulheres-aponta-estudo-da-onu-mulheres-geena-davis-institute-e-fundacao-rockefeller/ Acesso em 02 nov 2021.  

Coletivo Bereia.
https://coletivobereia.com.br/site-evangelico-diz-que-pediatra-defende-masturbacao-infantil/ Acesso em 11 nov 2021.ONU. https://www.un.org/en/observances/girl-child-day Acesso en 11 nov 2021.

Projeto Comprova, com participação do Bereia, ganha prêmio de Liberdade de Imprensa

O Prêmio Associação Nacional de Jornais (ANJ) de Liberdade de Imprensa 2021 foi dividido por duas iniciativas:  o Consórcio de Veículos de Imprensa e o Projeto Comprova, que contou com a participação do Bereia

O Consórcio, formado para reunir e divulgar dados confiáveis a respeito da pandemia no país, reuniu seis veículos de imprensa: O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, O Globo, Extra, UOL e G1. Já o Projeto Comprova realiza checagem de fatos para combate à desinformação, reunindo dezenas de jornalistas de mais de 30 veículos pelo país. 

Entre outubro de 2020 a março de 2021, o coletivo Bereia participou da iniciativa Comprova + Comunidades, que reuniu oito agências de jornalismo para fazer a verificação de conteúdos suspeitos sobre a pandemia e políticas públicas. 

Uma das representantes do Bereia nesta iniciativa do Comprova foi a jornalista e professora da UFRJ, Juliana Dias, que é também uma das fundadoras do coletivo.

Juliana participou da pesquisa “Caminhos da desinformação no Brasil: evangélicos, fake news e WhatsApp no Brasil”, que deu origem ao Bereia.  ”Esse prêmio vem reconhecer a atuação do Comprova no enfrentamento às fake news no contexto da pandemia de Covid-19 que gerou uma epidemia de informações falsas e duvidosas”, afirma Juliana. “Para nós, do Bereia, foi uma oportunidade rica de aprender a metodologia de trabalho do Comprova e realizar a verificação de conteúdos suspeitos em parceria com jornalistas de diversos veículos do Brasil. Certamente, a participação no Projeto colaborou para fortalecer nossas estratégias sobre verificação de informações no ambiente religioso. Parabéns ao Comprova e a toda equipe do projeto “Comprova + Comunidades”. 

O prêmio ANJ de Liberdade de Imprensa de 2021 será entregue a representantes do Projeto Comprova e do Consórcio de Veículos de Imprensa no dia 1º de dezembro.

Teorias QAnon ganham espaço em grupos antivacina no Facebook

* Publicado originalmente no site do IEA/Polo Ribeirão Preto/USP por Thaís Cardoso.

Conteúdos com teorias da conspiração QAnon que já haviam se espalhado em grupos com teor antivacina nos Estados Unidos estão ganhando espaço também no Brasil. Uma análise conduzida pela União Pró-Vacina com base em postagens ao longo de 2020 nos dois principais grupos antivacina brasileiros na plataforma confirmou essa disseminação.

O que é o QAnon?

O QAnon é um movimento que surgiu em fóruns de extrema-direita na deep web após a eleição de 2016 nos Estados Unidos. Ele se baseia em uma série de teorias da conspiração ligando políticos e personalidades a pedofilia e satanismo, mas também assume o perfil de um movimento social militarizado, incitando, inclusive, a violência em seus conteúdos. O FBI, departamento federal de investigação americano, chegou até mesmo a classificá-lo como ameaça terrorista doméstica.

As teorias do QAnon se espalharam pela internet e desde 2017 também invadiram as redes sociais. Somente em agosto de 2020, o Facebook anunciou que havia excluído páginas, grupos e contas diretamente ligados a ele, alegando que esse conteúdo viola suas políticas. No Brasil, a plataforma também realizou uma ação semelhante em setembro, derrubando grupos e páginas que totalizavam pelo menos 570 mil seguidores.

Com a demora em uma providência mais enérgica, o movimento foi capaz de se organizar e se espalhar por outros grupos com histórico em teorias da conspiração, como os de radicalismo político e comunidades antivacina. O Facebook agiu novamente e anunciou, em outubro, que removeria quaisquer páginas, grupos e contas do Instagram com algum tipo de ligação com o QAnon, mesmo que não fosse um conteúdo violento. Um dos resultados foi o recente banimento do maior grupo antivacina dos Estados Unidos nessa rede social, o Stop Mandatory Vaccination.

Apesar da situação ser a mesma nos grupos antivacina do Brasil, nenhuma medida foi tomada ainda. A União Pró-Vacina alerta que a demora do Facebook em adotar uma atitude assertiva pode produzir consequências desastrosas, principalmente pela associação dessas teorias da conspiração ao movimento antivacina no momento em que o País enfrenta novo crescimento na contaminação pela covid-19 e está às vésperas de uma vacinação que pode salvar milhões de vidas.

A pesquisa

Teorias QAnon ganham espaço em grupos antivacina no Facebook

A União Pró-Vacina vem monitorando as postagens dos dois grupos mais conhecidos com temática antivacina no Brasil desde o início de 2020. Os assuntos referentes ao QAnon começaram a aparecer em fevereiro e alcançaram picos em abril e julho. Ao todo, a análise encontrou 144 conteúdos, entre comentários e postagens incluindo vídeos, links, imagens e textos, que exibiam algum tipo de termo ligado ao movimento ou direcionavam os usuários para grupos ou sites específicos. Foram mapeados 16 termos tradicionalmente usados pelo QAnon nessas publicações.

No caso dos comentários – que representam 65% do conteúdo – os responsáveis incitam os usuários a pesquisarem sobre essas teorias conspiracionistas e fazem menções explícitas ao QAnon. Mesmo assim, não há qualquer tipo de moderação. Alguns perfis responsáveis por esses comentários também exibem imagens e conteúdos com clara ligação ao movimento e seguem ativos na rede. Apenas uma das publicações analisadas estava marcada pela plataforma como informação falsa. 

Assim como em outras análises realizadas anteriormente pela União Pró-Vacina, um padrão se repete: um número pequeno de usuários é responsável por um volume muito grande de postagens. Nesse caso, apenas 8 dos 73 autores das postagens geraram 55 publicações, mais de 38% do total.

Teorias QAnon ganham espaço em grupos antivacina no Facebook

O modus operandi do movimento pode produzir danos ainda maiores, pois, além de incitar os demais integrantes do grupo a pesquisarem termos relacionados ao QAnon na internet – o que acaba por direcioná-los a sites ligados a essas teorias da conspiração -, eles também agem de forma a sequestrar hashtags importantes e que fazem menção a assuntos reais. Em uma das postagens, por exemplo, são usadas as hashtags #fiqueemcasa, #usemascara, #vacinaréproteger, vinculadas a hashtags do movimento #QANONBRASIL e outras que incitam comportamentos de risco, como #filmeseuhospital.

Teorias QAnon ganham espaço em grupos antivacina no Facebook

Os pesquisadores da União Pró-Vacina destacam que esse tipo de ação direciona pessoas que buscam por esses termos e hashtags, procurando um conteúdo de confiança, para páginas e postagens conspiracionistas e recheadas de informações falsas. Um exemplo semelhante aconteceu nos Estados Unidos, quando o QAnon sequestrou a hashtag #SavetheChildren. Em vez de se referir à organização não governamental centenária que atua em prol dos direitos das crianças, o termo direcionava a uma das principais teorias da conspiração defendidas pelo QAnon, envolvendo o suposto sequestro e abuso de crianças por membros do Partido Democrata e celebridades de Hollywood.

Sobre a União Pró-Vacina

A União Pró-Vacina é uma iniciativa organizada pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) Polo Ribeirão Preto da USP em parceria com o Centro de Terapia Celular (CTC), o Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID), a Ilha do Conhecimento, a Vidya Academics, o Gaming Club da FEA-RP, o Instituto Questão de Ciência e o Pretty Much Science.

O objetivo é unir instituições acadêmicas e de pesquisa, poder público, institutos e órgãos da sociedade civil para combater a desinformação sobre vacinas, planejando e coordenando atividades conjuntas.

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Foto de capa: Pixabay/Reprodução

Grupo de divulgação científica da USP mostra anatomia das fake news

Publicado originalmente em Jornal USP – Universidade de São Paulo. 30/06/2020

Manual criado pelo Vidya Academics em parceria com o Pretty Much Science traz as principais fake news que estão circulando durante a pandemia e a explicação do porquê elas estão erradas

Reprodução /USP

Além de se proteger do novo coronavírus, é preciso também se prevenir das inúmeras informações e explicações erradas que circulam, principalmente pelas redes sociais. Para adquirir imunidade informativa o grupo de divulgação científica Vidya Academics, criada por alunos e docentes da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, em parceria com o Pretty Much Science, criou o Coronavírus – Manual das Fake News

A iniciativa começou com algumas postagens desmitificando mensagens e publicações no Facebook e no Whatsapp que desinformavam a população em suas redes sociais. “Havia muitas publicações que afirmavam que a doença não apresentava perigo aos jovens, que o vírus havia sido criado em laboratório e ensinavam inúmeras curas com chás e outras pseudociências” afirma Artur Acelino Queiroz, doutorando em Ciências pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP e colaborador do Vidya Academics. Após obterem um grande material, os organizadores decidiram compilá-lo em uma publicação, que é disponibilizada em duas versões, português e inglês. 

Além de oferecer os conteúdos checados, a produção reuniu alguns dos elementos mais encontrados nas fake news. Semelhantemente a um check-list, o material permite que os usuários observem se o conteúdo recebido em suas redes sociais se enquadra à estrutura que as informações falsas costumam ter. Caso se enquadre, existe uma grande possibilidade dele ser falso ou impreciso, conforme explica Queiroz.

Para o pós-graduando, que também é um dos autores do conteúdo, o manual pode ajudar no combate às fake news sobre diversos temas, não apenas sobre a covid-19. “A partir das dicas e etapas que listamos, fake news de outras áreas – como política e história – podem ser checadas ou pelo menos identificadas antes de serem disseminadas. Essa é mais uma ferramenta para instrumentalizar tanto a comunidade acadêmica quanto a população em geral sobre como combater a disseminação de notícias falsas.”

O que diz o Manual das Fake News

Manual do Vidya Academics (Reprodução/ USP)

O manual foi produzido por nove pessoas, Wasim Syed, Camila Magalhães, Artur Acelino Queiroz, Eduarda Moreira, Rayane Valez, Francisco Moro, Isabela Gonzaga, Vitor Serrão e Maurício Gardini, a maioria atuante na área da saúde.  Possui 15 orientações para a identificação de uma fake news, entre elas: não compartilhar imediatamente quando receber mensagens informativas; lembrar que as notícias inventadas são feitas para causar surpresas ou rejeição; suspeitar de conteúdos que causem reações emocionais fortes ou daqueles que dizem que a mídia quer esconder os fatos; ler sempre a matéria completa; descubra a fonte, ou seja, de onde se originou a notícia; confira dados e o contexto; e desconfie de experiências pessoais.  

O manual também traz as principais fake news que estão circulando sobre a pandemia e a explicação do porquê elas estão erradas, com as fontes que embasam os esclarecimentos, como por exemplo que o clima frio e neve matam o novo coronavírus. “Não há razão em acreditar que clima frio e neve poderiam matar o novo coronavírus, uma vez que o vírus tem se espalhado em países de clima muito frio, como a Noruega e Islândia, e o corpo humano sempre se mantém, em condições normais, entre 36.5°C e 37°C, independente da temperatura externa ou do tempo”, explica Wasim Syed, coordenador do Vidya Academics. Outra fake news citada pelos grupos é a que coloca o alho como uma boa opção para se prevenir do novo coronavírus. “O alho é um alimento saudável que pode ter algumas propriedades antimicrobianas. No entanto, não há evidências no surto atual de que comer alho tenha proteção para as pessoas contra o novo coronavírus”, destaca Syed. 

Confira a anatomia de 5 fake news abaixo ( deslize as páginas para o lado)

Sobre o Vidya Academics

O Vidya é uma plataforma de divulgação e educação científica criada por alunos e docentes da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP, com o objetivo de estreitar a interação entre a população e a ciência com uma linguagem mais popular e acessível e com artes mais atrativas. 

Entre as publicações do grupo está o roteiro sobre anticorpos e vacinas e uma série de três vídeos sobre o novo coronavírus. O primeiro traz a virologia do vírus, como é sua formação e o papel dos anticorpos. O segundo e o terceiro vídeos falam da biologia estrutural e os alvos terapêuticos do novo coronavírus. O texto e as imagens dos vídeos, de Wasim Syed, estão disponíveis no Youtube.  Saiba mais sobre o projeto no site.

Pretty Much Science é um projeto de divulgação científica que reúne cientistas de todas as partes do mundo para divulgar informações do universo da ciência de uma forma simples e compreensível.

Vídeo produzido pelo Vidya Academics com dicas para identificar fake news

Confira mais em:

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Twitter: @VidyaAcademics

Manual das Fake News 

© 2019 – Universidade de São Paulo

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Estudo identifica principais fake news relacionadas à Covid-19

Publicado originalmente no site oficial da Fio Cruz, 18/05/2020

Um recente estudo, conduzido pelas pesquisadoras da ENSP Claudia Galhardi e Maria Cecília de Souza Minayo, identificou as principais fake news relacionadas à Covid-19, recebidas pelo aplicativo Eu Fiscalizo, entre março e maio no país.

Segundo Claudia, além de colocar vidas em risco, a disseminação de notícias falsas relacionadas ao novo coronavírus contribui para o descrédito da ciência e das instituições globais de saúde pública, bem como enfraquece as medidas adotadas pelos governos no combate à doença. Daí a importância da realização de estudos sobre a temática.

Precisamos redobrar a atenção ao receber informações nas redes sociais que não apresentem a fonte oficial e fazer uma leitura crítica antes de compartilhar qualquer conteúdo”, alerta a pesquisadora.

A primeira etapa da pesquisa, que fez um balanço das denúncias de notícias falsas recebidas entre 17 de março e 10 de abril, revela que 65% delas ensinam métodos caseiros para prevenir o contágio da Covid-19, 20% mostram métodos caseiros para curar a doença, 5,7% se referem a golpes bancários, 5% fazem menção a golpes sobre arrecadações para instituição de pesquisa e 4,3% se referem ao novo coronavírus como estratégia política.

A segunda fase do estudo, realizada entre 11 de abril e 13 de maio, aponta que, entre as fake news notificadas pelo app, 24,6% afirmam ser a doença uma estratégia política, 10,1% ensinam métodos caseiros para prevenir o contágio do novo coronavírus, 10,1% defendem o uso da cloroquina e hidroxicloroquina sem comprovação de eficácia científica e 7,2% são contra o distanciamento social.

Os resultados referentes ao intervalo entre abril e maio também mostram que 5,8% das notícias falsas ensinam métodos caseiros para curar a Covid-19, 5,8% afirmam que o novo coronavírus foi criado em laboratório, 4,3% declaram o uso de ivermectina como cura para a doença, 4,3% são contra o uso de máscaras e 2,9% difamam os profissionais de saúde.

Ainda entre os meses de abril e maio, foi constatado que, entre as fake news denunciadas, 2,9% são contra o uso de álcool em gel, 2,9% declaram o novo coronavírus como teoria conspiratória, 1,4% são relacionadas à difamação de políticos, 1,4% declaram ter a causa do óbito de parentes alterada para Covid-19 e 0,4% consistem em charlatanismo religioso, com tentativa de venda de artefatos para a cura da doença. O estudo também aponta que 15,9% das fake news se referem à Covid-19 como uma farsa, durante todo o período analisado, entre 17 de março e 13 de maio.

Em abril, as pesquisadoras da ENSP realizaram estudo que identificou as mídias sociais mais utilizadas para a propagação de fake news relacionadas à Covid-19 notificadas pelo aplicativo.  

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Referências:

Imagem de destaque: https://futurism.com/the-byte/protesters-break-quarantine-calling-covid-19-fake-news / VICTOR TANGERMANN