Deputado Pastor Marco Feliciano infla lucro das estatais
O deputado pastor Marco Feliciano (PL/SP) publicou em seu perfil no Twitter um suposto balanço das estatais brasileiras em 2021. De acordo com o parlamentar, as estatais tiveram lucro de um trilhão de reais em 2021.
Como a publicação não cita fontes para os dados, Bereia checou as informações. O deputado Marco Feliciano publicou o conteúdo após o lançamento do Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais de 2021, pelo Ministério da Economia.
Empresas estatais são aquelas em que o governo detém parte ou todo o capital social. No Brasil, as empresas estatais são classificadas como empresas públicas (quando 100% do capital pertence ao Poder Público) e sociedades de economia mista (quando parte do capital é negociado por entes privados na forma de ações).
Bereia verificou que o deputado pastor Marco Feliciano publicou uma simplificação dos dados de um denso relatório, e de uma conjuntura complexa do país. Feliciano ainda apresentou uma informação enganosa sobre o lucro das estatais brasileiras. O que ele afirma ser lucro de 1 trilhão de reais, na verdade é a receita bruta destas companhias. Além disso, busca atingir políticos opositores de governos passados ao distorcer essas informações.
O que diz o Ministério da Economia
De acordo com o Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais de 2021, o resultado líquido das estatais federais no exercício de 2021 foi um lucro de R$187,7 bilhões, o triplo do valor apurado no exercício de 2020 (R$60,6 bilhões) e o maior desde 2008. Desse total, 98% é composto pelo resultado líquido dos grupos Petrobras (R$ 107,3 bilhões; 57%), BNDES (R$ 34,1 bilhões; 18%), BB (R$ 19,7 bilhões; 10%), Caixa (R$ 17,3 bilhões; 9%) e Eletrobras (R$ 5,7 bilhões; 3%).
No exercício de 2021, as empresas estatais brasileiras pagaram R$ 101 bilhões a título de dividendos, R$43 bilhões destinados à União e R$58 bilhões a outros acionistas.
Diversos fatores explicam o lucro das estatais, como a alta do preço do petróleo e a política de preços (dolarizada) praticada desde o governo de Michel Temer, no caso da Petrobras. Com a economia em crise, os bancos estatais abriram a torneira do crédito, especialmente para o agronegócio e a indústria. Mais empréstimos, com juros cada vez mais altos, mais crise e mais clientes – que significam mais retorno sobre o capital.
Função social das estatais
Constitucionalmente, as estatais brasileiras devem servir ao interesse da população, bem como respeitar os contratos e acordos comerciais, proporcionando segurança jurídica para fornecedores, colaboradores e investidores. Essas empresas englobam uma enorme cadeia produtiva em diversos setores econômicos e gera empregos, impostos e investimentos estratégicos em todo o país.
O capítulo terceiro da Lei das Estatais (N°13.303, de 2016) determina que toda estatal deve respeitar uma função social:
CAPÍTULO III
DA FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA PÚBLICA E DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
Art. 27. A empresa pública e a sociedade de economia mista terão a função social de realização do interesse coletivo ou de atendimento a imperativo da segurança nacional expressa no instrumento de autorização legal para a sua criação.
§ 1o A realização do interesse coletivo de que trata este artigo deverá ser orientada para o alcance do bem-estar econômico e para a alocação socialmente eficiente dos recursos geridos pela empresa pública e pela sociedade de economia mista, bem como para o seguinte:
I – ampliação economicamente sustentada do acesso de consumidores aos produtos e serviços da empresa pública ou da sociedade de economia mista;
II – desenvolvimento ou emprego de tecnologia brasileira para produção e oferta de produtos e serviços da empresa pública ou da sociedade de economia mista, sempre de maneira economicamente justificada.
§ 2o A empresa pública e a sociedade de economia mista deverão, nos termos da lei, adotar práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social corporativa compatíveis com o mercado em que atuam.
A política de desvalorização das estatais
Na direção contrária ao que publicou o deputado Marco Feliciano, a política econômica do atual governo não valoriza as estatais. O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) privatizou 36% das estatais brasileiras durante os então três anos e meio de mandato. Quando Bolsonaro assumiu a Presidência, a União controlava 209 empresas. Hoje, após a desestatização da Eletrobras, o número baixou para 133. Este número mostra que a quantidade de empresas controladas pelo governo federal caiu de 209 para 133 em quase quatro anos.
Os dados foram divulgados pelo secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, em 14 de junho de 2022, ou seja, são recentes. De acordo com Mac Cord, “a finalização da operação da Eletrobras vai fazer com que a gente atinja a marca de redução de um terço das estatais”.
Mesmo com o protesto de movimentos populares contra o avanço da privatização, o ministro de Minas e Energia Adolfo Sachsida classificou a desestatização da Eletrobras como um feito histórico.
Fato é que grande parte das ações da Eletrobras foram vendidas pelo governo para investidores. Assim, o governo deixa de ser acionista controlador da companhia. O controle da empresa, agora, é majoritariamente privado.
Por meio da Petrobras também foi vendida a TAG (Transportadora Associada de Gás), que agora opera alugando seus dutos à estatal, a Codesa (Companhia Docas do Espírito Santo) e outras companhias. O governo também tinha a intenção de privatizar os Correios, mas não conseguiu.
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Bereia conclui que o deputado Marco Feliciano divulgou informações enganosas. A publicação distorce as informações do Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais e apela para o ufanismo e ataque a adversários políticos no contexto da campanha eleitoral de 2022. O deputado associa o lucro das estatais a ações do governo federal, porém a política econômica em curso se baseia no descarte dessas empresas. ,
O deputado faz uso, ainda, dos dados sobre a receita das estatais e os expõe como o lucro líquido delas, omite os valores distribuídos aos acionistas e não menciona os fatores externos e internos, alheios às políticas governamentais, que proporcionaram o lucro das empresas.
Marco Feliciano também omite o sistema de preços praticado pela Petrobras (a empresa com maior lucro entre as estatais) desde o governo Temer, que proporciona o aumento dos lucros e redução do endividamento da companhia, ao custo do o aumento no preço dos combustíveis que afeta toda a economia do país, com peso sobre a população, com a elevação no preço dos transportes, alimentos, entre outros.
Referências de checagem:
Brasil de Fato. https://www.brasildefato.com.br/2022/06/14/bolsonaro-ja-privatizou-um-terco-das-estatais Acesso em: 11 jul 2022
Reconta aí. https://recontaai.com.br/opinaai/sergio-mendonca Acesso em: 11 jul 2022
Ministério da Economia. https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/empresas-estatais-federais/transparencia/publicacoes-2/raeef Acesso em: 12 jul 2022
Senado. https://www12.senado.leg.br/tv/programas/agenda-economica/2022/03/brasileiro-paga-a-preco-de-dolar-os-combustiveis-produzidos-com-petroleo-nacional Acesso em: 12 jul 2022
Isto é. https://www.istoedinheiro.com.br/estatais-entenda-por-que-o-lucro-extraordinario-no-ultimo-ano-nao-e-merito-do-governo/ Acesso em: 12 jul 2022
Lei das Estatais. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm Acesso em 12 jul 2022
Fundação Getúlio Vargas https://fgvenergia.fgv.br/noticias/alta-de-preco-do-petroleo-deve-impactar-combustiveis-no-pais Acesso em: 12 jul 2022
Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2021-08/ministro-defende-privatizacao-dos-correios-em-pronunciamento Acesso em: 13 jul 2022
O Estado de São Paulo. https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,privatizacao-correios-engavetada-eleicoes-ausencia-lideranca-governo-senado,70004030586 Acesso em: 13 jul 2022
Foto de capa: Wikicommons