Marcha Nacional das Mulheres Negras terá, pela primeira vez, comitê de evangélicas
Dez anos depois da primeira Marcha das Mulheres Negras, Brasília será novamente o ponto de encontro de milhares de mulheres negras do Brasil e de outros países. Em 25 de novembro de 2025, elas estarão nas ruas para cobrar reparação histórica e lutar pelo bem viver. A mobilização, articulada nos 27 estados, reforça o protagonismo das mulheres negras na luta por justiça social.
Nesta edição, a marcha marca um fato inédito: pela primeira vez, mulheres negras evangélicas contam com um comitê próprio dentro da marcha nacional, iniciativa que amplia o diálogo baseado na fé.
Quase dez anos depois, uma nova marcha
Em 2015, mais de 100 mil mulheres negras marcharam em Brasília contra o racismo, a violência e em defesa do bem viver. O ato, considerado um marco na história da luta antirracista no Brasil e na América Latina, consolidou uma nova etapa de organização política das mulheres negras no país.
Agora, o movimento retorna à capital federal com uma pauta ampliada. A 2ª Marcha Nacional das Mulheres Negras, marcada para novembro, na Semana da Consciência Negra, terá caráter internacional e trará como tema central a “Reparação e o Bem Viver”. A expectativa é reunir cerca de um milhão de participantes.
Diversidade e ancestralidade nas ruas
A marcha reúne mulheres negras de diferentes origens e territórios: quilombolas, ribeirinhas, urbanas, do campo, periféricas, acadêmicas, artistas, trabalhadoras, meninas, jovens, mães e anciãs, e agora, evangélicas. Unidas por histórias e ancestralidades, compartilham o compromisso com a justiça social e a superação das estruturas que historicamente negaram seus direitos.
Diferente de um ato isolado, a marcha é fruto de um processo coletivo de mobilização em todo o país. A organização ocorre por meio de Comitês Impulsores Estaduais, Municipais e Regionais, compostos por mulheres negras ligadas a coletivos, movimentos sociais ou atuantes de forma independente.
Esses comitês promovem encontros, escutas e articulações locais, e ampliam o alcance e a representatividade da marcha. O processo fortalece o protagonismo negro em comunidades de diversas regiões do país.
Comitê evangélico busca romper invisibilidades e estereótipos
Nesse contexto, surge a articulação das mulheres negras evangélicas, liderada por Andressa Oliveira, integrante do Movimento Negro Evangélico. Em parceria com outros coletivos, ela coordena a criação de um comitê específico dentro da marcha nacional. O Bereia ouviu a integrante sobre os detalhes da organização.
De acordo com Andressa Oliveira, o comitê nasceu para mostrar que há mulheres evangélicas comprometidas com os direitos das mulheres negras. “A ideia surgiu da necessidade de dar visibilidade à participação das mulheres evangélicas nos movimentos de mulheres negras. Muitas vezes estamos lá, mas não somos reconhecidas pela nossa pertença religiosa”, explica.

Ela destaca que a expressiva presença de mulheres negras evangélicas no Brasil representa um desafio para o movimento de mulheres negras, principalmente no diálogo com aquelas que ainda se afastam da luta por influência de discursos religiosos. “A narrativa dos púlpitos afasta muitas delas dos espaços de luta por direitos. É preciso dialogar com essas mulheres, e ver outras evangélicas na luta pode facilitar esse processo”, disse a ativista.
Entre os principais obstáculos para consolidar o comitê evangélico na marcha, a ativista aponta a dificuldade de alcançar mulheres nos territórios e nas igrejas, além da necessidade de reafirmar constantemente o compromisso com o respeito à diversidade. “É um trabalho constante de reafirmação do nosso compromisso com as diretrizes do espaço que ocupamos, com relação ao respeito à diversidade religiosa e afetiva. Ou seja, que as visões religiosas e doutrinárias não sejam usadas para retrocesso de direitos das mulheres”, afirma a integrante do Movimento Negro Evangélico.
Fortalecimento e diálogo com os territórios de fé
Mais do que marcar presença no evento, o comitê visa fortalecer as mulheres negras evangélicas que já atuam na base e ampliar o diálogo dentro das igrejas. “Queremos encorajar essas irmãs a entenderem que lutar por direitos não é pecado, pelo contrário: é um direito”, destacou Andressa Oliveira.
Entre as pautas específicas do grupo estão o combate à violência doméstica, a garantia do acesso à saúde e à segurança pública, além da ampliação da consciência racial nas comunidades evangélicas. “A baixa consciência racial ainda é um desafio entre nós. É preciso falar sobre isso”, reconhece a ativista.
A iniciativa também busca desconstruir estereótipos. “Existe uma ideia de que todas as mulheres negras evangélicas pensam da mesma forma, que não têm consciência de sua negritude ou que desprezam a luta por direitos. Isso não é verdade. Já estamos há muito tempo nesses espaços de luta, e seguimos contribuindo”, afirmou.

Expectativas e futuro da articulação
Para Andressa Oliveira, a participação das mulheres negras evangélicas na marcha nacional representa um momento histórico. “É a primeira vez que há uma articulação de evangélicas na marcha nacional. Esperamos que isso estimule outras irmãs a se juntarem a nós e que o movimento também nos reconheça como parte da pauta.”
A expectativa do grupo é transformar a articulação em uma rede permanente, com atuação nos territórios e fortalecimento dos coletivos evangélicos. “Queremos mais troca entre os coletivos evangélicos, estabelecer parcerias e criar estratégias para mudar a realidade das mulheres negras nos territórios. Isso fortalece toda a luta”, finaliza.
Referências:
Marcha das mulheres negras. https://marchadasmulheresnegras.com.br/. Acesso em 1 de outubro de 2025.
Fase. https://fase.org.br/pt/noticias/marcha-das-mulheres-negras-2025-reparacao-e-bem-viver-no-centro-da-luta/. Acesso em 1 de outubro de 2025.
Foto de capa: WikiCommons/Janine Moraes
