Onda de desinformação sobre decisão do STF quanto ao uso da maconha invade redes religiosas

* Matéria atualizada em 03/07/2024 para acréscimo de informações

Políticos da Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional e líderes religiosos usaram as redes sociais para disseminar a falsa informação de que o Supremo Tribunal Federal (STF) havia descriminalizado o uso da maconha. O que motivou as publicações foi a decisão da Corte, na última terça-feira, 25 de junho, pela inconstitucionalidade do Artigo 28, da Lei nº 11.343/2006, conhecida como Lei de Drogas, que criminaliza o porte de maconha para uso pessoal. Por oito votos a três, os ministros decidiram pela descriminalização . 

“A maconha foi legalizada? Não. Ainda continua sendo crime o tráfico da cannabis. No entanto, a maioria formada é para que usuários não sejam mais fichados criminalmente ao serem pegos usando a planta”, explica a deputada federal pelo PSOL/SP Erika Hilton, em seu perfil no X, antigo Twitter

O senador evangélico Flávio Bolsonaro foi um dos que divulgaram falsidades sobre a decisão. Em sua conta, também no X, o político evangélico disse que a corte estava “praticamente liberando o tráfico de drogas. “Hoje o STF descriminalizou a maconha”, afirmou o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

Imagem: reprodução de publicação do senador Flávio Bolsonaro em sua conta no X

O senador espírita Eduardo Girão (Novo-CE) foi além. Em seu perfil no X, o político disse que a corte “formou maioria a favor de todas as drogas”. 

Imagem: reprodução de publicação do senador Eduardo Girão em sua conta no X

A deputada federal católica Bia Kicis também fez questão de emitir opinião sobre o assunto. Para ela, o STF desrespeita o Congresso Nacional com essa decisão. Mesmo não tendo registrado no texto da publicação, na imagem que acompanha sua postagem está escrito: “Supremo atropela o Congresso e libera Maconha”, o que não é verdade.  

Imagem: reprodução de publicação da deputada Bia Kicis em sua conta no X

Uma liderança que não se absteve de dar sua opinião foi o pastor presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia. Em  vídeo publicado em seu canal no YouTube  o pastor acusou o STF de legislar e descriminalizar a maconha. “Povo abençoado do Brasil em mais uma invasão de competência do Supremo Tribunal Federal eles legislam e descriminalizam a maconha, algo que não pertence a eles e sim ao poder legislativo, liberando a maconha para uso recreativos. Os traficantes agradecem”, disse o pastor na gravação.

Malafaia publicou o mesmo conteúdo no X  (ex-Twitter), no Instagram e demais redes digitais nas quais tem conta. Além de desinformar sobre o Supremo estar usurpando a competência do Poder Legislativo, o líder cristão mente sobre haver a “liberação da maconha para uso recreativo”.  Tal afirmação não procede, pois o STF determinou que usuários com até 40g da erva não sejam processados criminalmente pelo porte, entretanto, usar maconha continua classificado como comportamento ilícito.

Bereia checou as publicações.

Imagem: reprodução/YouTube

Entenda o caso

Na última terça-feira, 25 de junho, o STF decidiu, por oito votos a três, descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. Com a decisão, usar   maconha continua classificado como comportamento ilícito – permanece proibido fumar a droga em público, mas as punições definidas contra os usuários passam a ter natureza administrativa, e não criminal. Dessa forma, deixam de valer a possibilidade de registro de reincidência penal e de cumprimento de prestação de serviços comunitários. Também foi determinado um critério para diferenciar usuários de traficantes: para caracterizar o tráfico foi estabelecido porte de 40g ou seis plantas fêmeas,  até que o Congresso Nacional legisle sobre o critério. A quantidade foi definida em 26 de junho. 

“O plenário do STF, por unanimidade, considera que o consumo de drogas ilícitas é uma coisa ruim e que o papel do Estado é combater o consumo, evitar o tráfico e tratar os dependentes”, afirmou o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso ao anunciar o resultado por maioria pela descriminalização. O ministro disse ainda, que o julgamento sobre porte de maconha não foi escolha do Supremo. Ele explicou que se tratou de decisão sobre recurso apresentado à Corte contra a condenação por porte com pouca quantidade e que era necessário estabelecer critérios para diferenciar traficantes e usuários para processos na Justiça. A decisão é válida apenas para a maconha. O porte de outras drogas de consumo pessoal continua sendo crime.

Barroso se refere ao Recurso Extraordinário (RE 635659) movido pela Defensoria Pública de São Paulo, que pede a inconstitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343, de 2006. A lei manda punir o porte de maconha e outras drogas proibidas, “para consumo pessoal”, com medidas socioeducativas e prestação de serviços à comunidade. O mesmo vale para quem semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância, também para uso pessoal. 

A Defensoria de São Paulo entrou com o recurso  e questionou a decisão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema, em São Paulo, que manteve a condenação de um homem à pena de dois meses de prestação de serviços comunitários pelo crime de porte de drogas para consumo pessoal. O recurso teve por base na proteção do artigo 5º, X,  da Constituição Federal que torna inviolável a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, visando a decretação da inconstitucionalidade à pena a ele aplicada.

Bereia verifica, portanto, que os ministros do STF não liberaram a maconha, tampouco legalizaram outros entorpecentes, conforme alegou o senador Girão. Inclusive, outras condutas envolvendo a erva, que não o uso pessoal, podem ser configuradas como tráfico. Por exemplo, se uma pessoa for flagrada com maconha, ainda que em quantidade inferior a 40 gramas, e haja elementos de que ela estava vendendo a droga, poderá ser presa e responder pelo crime de tráfico.

De acordo com o pesquisador e assessor do Instituto de estudos da religião (ISER) Erivelto Melchiades, ouvido pelo Bereia, a decisão do STF não deve produzir efeitos imediatos e esperados de desencarceramento nas unidades prisionais, onde se encontram pessoas presas por conta da lei de drogas, porém outros dois efeitos poderão ser notados de imediato. “Pessoas que possuem em seus registros anotações criminais por porte de drogas devem ter seus registros limpos. Isto, de certa forma, tem um impacto significativo, já que grande parte das empresas verifica se há indícios de registros criminais, o que por si só impacta na empregabilidade da população mais vulnerável”, analisa o pesquisador. 

O assessor do ISER também vê um ponto negativo nessa questão. Para ele pode ocorrer uma espécie de “vingança” por parte da força policial, pois ainda que se estabeleceu a quantidade de 40g para definição de quem é usuário, fica a cargo da autoridade definir este critério para a diferenciação. “Como a palavra do policial tem a boa fé (súmula 70, do TJRJ), como se dará a prova da quantidade no momento da abordagem, sabendo-se que existem diversos casos em que houve o flagrante forjado para incriminar usuários? Isto ocorre principalmente nas favelas e periferias! Como será feita a pesagem da droga? Será que a mão do policial não vai pesar mais em determinados territórios, sabendo-se que este roteiro é mais corriqueiro nas regiões periféricas do que nas zonas nobres?”, questiona Melchiades.

Mal-estar com o Congresso

Outra informação que circula nas redes digitais e tem gerado confusão na interpretação das ações do STF é a acusação de que a corte está criando uma lei, legislando, o que é atribuição do Congresso Nacional. Entretanto, a decisão foi de caráter judicial, no contexto de um processo. Os ministros foram provocados a julgar dentro do recurso interposto pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, dentro de suas competências previstas na Constituição. Não aprovaram uma nova lei. 

De acordo com o presidente do STF, a discussão no Tribunal foi sobre o tratamento jurídico a ser dado ao porte de maconha para consumo pessoal e o estabelecimento de um critério para diferenciar traficantes de usuários, pois a Lei de Drogas  não estabeleceu parâmetros. “Não é o Supremo que escolhe decidir essa matéria, os recursos é que chegam aqui. As pessoas são presas e entram com habeas corpus aqui, e o Supremo não tinha como se furtar a essa discussão”, disse.

O presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por sua vez, discorda da decisão do STF. Para ele, a decisão invade a competência técnica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a competência legislativa do Congresso Nacional sobre o tema, além de gerar uma lacuna jurídica no Brasil. 

“Ou seja, a substância entorpecente na mão de quem a tem para fazer o consumo é um insignificante jurídico sem nenhuma consequência a partir dessa decisão do STF. E essa mesma quantidade dessa mesma substância entorpecente na mão de alguém que vai repassar a um terceiro é um crime hediondo de tráfico ilícito de entorpecentes. Há uma discrepância nisso”, avalia Pacheco que é autor da proposta de emenda à Constituição  45/2023, a chamada PEC das drogas, que  insere no art. 5º da Constituição a determinação de que é crime a posse ou porte de qualquer quantidade de droga ou entorpecente “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. A PEC foi aprovada no Senado, em 16 de abril de 2024, e tramita na Câmara dos Deputados. 

O deputado evangélico Sóstenes Cavalcante é um dos críticos da decisão do STF e considera o ato uma usurpação das competências do legislativo. 

Em sua conta no X, a deputada federal Erika Hilton discorda de Cavalcante e de Damares Alves. Ela explicou, de forma didática, a decisão do Supremo e as divergências levantadas pela extrema direita. “O STF está legislando no lugar do Congresso? NÃO. Ele cumpriu a sua função de analisar a validade do Art. 28 da Lei de Drogas, e, a maioria dos Ministros entendeu que é inconstitucional. a Lei não definir critérios objetivos para distinguir quem é usuário e quem é traficante, e penalizar os usuários criminalmente”, diz ela e continua. “Ao não definir um critério que leve em conta, por exemplo, a quantidade de maconha, a definição de quem é usuário e traficante fica por conta dos policiais e dos juízes: se é preto, pobre e periférico, então é traficante. Se é rico e branco, é usuário”, ressalta a parlamentar. 

A senadora evangélica Damares Alves também teceu duras críticas ao Supremo. “O STF mais uma vez tensiona com o Congresso Nacional e usurpa do Parlamento a função legislativa. Temas tão sensíveis como a liberação das drogas jamais deveria ser decidido por quem não é representante eleito pelo povo”, lamentou a senadora.  

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Bereia checou e verificou que o conteúdo publicado nas redes digitais dos políticos religiosos é FALSO. 

Não é verdade que o Supremo Tribunal Federal liberou a maconha, tampouco outras drogas. A decisão da corte é à favor do usuário que deve ser submetido a intervenção na área da saúde, e muitas vezes é encarcerado como se traficante fosse. Entretanto, os ministros deixaram claro em seus votos que  mantêm as bases da lei que determina que o consumo de drogas ilícitas é uma coisa ruim e que o papel do Estado é combater o consumo, evitar o tráfico e tratar os dependentes. 

Mais uma vez os parlamentares identificados como  religiosos  espalham falsidades pela internet e causam confusão e pânico entre os menos avisados que consomem as informações falsas sem checar, pois confiam na palavra de agentes públicos. 

Referências de checagem:

Folha de São Paulo

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/06/stf-deve-definir-nesta-quarta-26-quantidade-de-maconha-que-diferencia-traficante-de-usuario.shtml – Acesso em: 26 de junho de 2024.

Perfil no X – Deputada Federal Erika Hilton

https://x.com/ErikakHilton/status/1805673224472084687?t=9jQi_RsTKA8vXzXUBI-5VA&s=19 – Acesso em: 26 de junho de 2024.

https://x.com/ErikakHilton/status/1805731028784288076?t=G9BYXtmAByx6jbkOpxt3Jg&s=19 – Acesso em: 26 de junho de 2024.

Aos Fatos

https://www.aosfatos.org/noticias/falso-stf-liberou-maconha-brasil/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

Correio Braziliense 

https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2024/06/6885271-decisao-do-stf-sobre-maconha-gera-onda-de-desinformacao-entenda-o-que-muda.html – Acesso em: 26 de junho de 2024

STF

https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-forma-maioria-para-descriminalizar-porte-de-maconha-para-consumo-pessoal/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-define-40-gramas-de-maconha-como-criterio-para-diferenciar-usuario-de-traficante/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/presidente-do-stf-diz-que-julgamento-sobre-porte-de-maconha-nao-foi-escolha-do-supremo/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4034145 – Acesso em: 26 de junho de 2024

Jota

https://www.jota.info/stf/do-supremo/stf-forma-maioria-para-descriminalizar-o-porte-de-maconha-25062024#:~:text=Logo%20no%20come%C3%A7o%20da%20sess%C3%A3o,criminalizado%E2%80%9D%2C%20disse%20o%20ministro – Acesso em: 26 de junho de 2024

Uol

https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2024/06/25/maconha-foi-liberada-entenda-decisao-do-stf-sobre-descriminalizacao.htm – Acesso em: 26 de junho de 2024

Conjur

https://www.conjur.com.br/2024-jun-25/supremo-forma-maioria-para-descriminalizar-porte-da-maconha-para-consumo-proprio/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

G1

https://g1.globo.com/politica/noticia/2024/06/26/porte-de-maconha-para-uso-pessoal-entenda-como-ficou-apos-a-conclusao-do-julgamento-no-stf.ghtml – Acesso em: 26 de junho de 2024

Congresso em Foco

https://congressoemfoco.uol.com.br/area/justica/stf-retoma-as-14h-julgamento-sobre-descriminalizacao-do-porte-de-maconha/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

Agência Senado

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/03/04/drogas-girao-critica-stf-e-diz-que-barroso-tem-conflito-de-interesse – Acesso em: 26 de junho de 2024

https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/04/16/senado-aprova-pec-sobre-drogas-que-segue-para-a-camara – Acesso em: 26 de junho de 2024

Jus Brasil

https://www.jusbrasil.com.br/artigos/re-635659-a-descriminalizacao-do-porte-de-drogas/358561903 – Acesso em: 26 de junho de 2024

Alerj

http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/constfed.nsf/fc6218b1b94b8701032568f50066f926/54a5143aa246be25032565610056c224?OpenDocument#:~:text=X%20%2D%20s%C3%A3o%20inviol%C3%A1veis%20a%20intimidade,Crimes%20contra%20a%20honra%3A%20arts. – Acesso em: 26 de junho de 2024

EBC

https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2024-06/supremo-fixa-40g-de-maconha-para-diferenciar-usuario-de-traficante – Acesso em: 26 de junho de 2024

CNN

https://www.cnnbrasil.com.br/politica/pacheco-stf-senado-maconha/ – Acesso em: 26 de junho de 2024

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Foto de capa: Pixabay

Influenciador cristão propaga conteúdo enganoso no Youtube sobre descriminalização de pedofilia e drogas

Em 17 de abril, o músico e influenciador cristão Rafael Bitencourt publicou, em seu canal no YouTube, um vídeo em que afirma que a Organização das Nações Unidas (ONU) tem um novo projeto para que seus países membros descriminalizassem o uso de drogas e atos sexuais entre adultos e crianças. O conteúdo ultrapassou a marca de 75 mil visualizações em apenas 10 dias.

No vídeo, Rafael faz uso de imagens de captura de tela, de um site dos Estados Unidos, que teria publicado a notícia para sustentar sua afirmação. Outros veículos de comunicação, como Gazeta do Povo e Tribuna Nacional, repercutiram a polêmica.

Conteúdo e objetivo do vídeo 

O vídeo intitulado “Todo cristão e quem ainda tem alma, têm que ver isso! Novo Projeto da ONU (sic) traz como imagem de capa (“thumbnail”) o símbolo da Organização das Nações Unidas (ONU) com os dizeres: “pediu a legalização da ‘pedo’ e das drogas”.

Imagem: reprodução do Youtube



Segundo o youtuber, ele precisa “passar a informação e instar” os seguidores “a pensar e criticar sabiamente essa agenda global”. Na sequência, o músico afirma que a ONU lançou um relatório com orientações jurídicas para seus países membros com relação a descriminalização do uso de drogas e de atos sexuais entre adultos e crianças.

Ao longo do vídeo, o influenciador Rafael Bitencourt apresenta a cartilha supostamente publicada pela ONU e diz: “está aí, a ONU pede a liberação da ‘pê.do’, é isso que você está vendo”. Bitencourt não menciona a palavra “pedofilia”. Segundo ele, é constantemente perseguido e corre o risco de ter seus vídeos banidos da plataforma caso mencione determinadas palavras.

Um pouco adiante, o influenciador afirma que o documento da ONU usa “as terminologias utilizadas pela esquerda marxista, pelos socialistas do Brasil ou de vários lugares do mundo, a exemplo dos estados democratas radicais nos Estados Unidos, da Holanda, de outros países do mundo”.

O vídeo é marcado por indagações genéricas como “para quem a ONU trabalha?” e por omissões reiteradas de palavras que supostamente levariam à retirada do vídeo da plataforma. Uma clara necessidade de manter a constante mensagem de que algo oculto está sendo revelado pelo influenciador e que por isso há perseguição.

Imagem: reprodução do Youtube

Quem é Rafael Bitencourt

Rafael Bitencourt é músico, abertamente cristão, e foi membro da banda gospel Toque no Altar. Em 2011, rompeu com o grupo e seguiu carreira solo, tendo lançado três discos desde então, sempre no nicho gospel. As informações estão disponíveis na aba “sobre” da conta do cantor no Spotify.

Seu canal no YouTube, criado em 2011, mesma época em que o músico iniciou carreira solo, continha vídeos de cunho musical ou religioso até meados de 2019. Músicas autorais, pregações e testemunhos de fé podiam ser facilmente encontrados.

Com o início da pandemia de covid-19, porém, Bitencourt realizou uma mudança em sua presença digital. Em 23 de março de 2020, o youtuber publicou o vídeo “2020 A Igreja Nunca Mais Será a Mesma”, o primeiro em que é possível constatar uma nova forma de se apresentar para o grande público, deixando de lado a música e incorporando abordagens de temas de grande engajamento nas redes digitais.

No dia 28 do mesmo mês, Bitencourt publicou vídeo intitulado “Quarentena? É muito além disso! Entenda!!!”. A partir daí, observa-se o aumento na frequência de postagens, vídeos mais elaborados e a paulatina construção de um discurso conspiratório sobre política, finanças, ciência e religião.

Real origem do relatório apresentado por Rafael Bitencourt

O documento utilizado por Bitencourt para sustentar o argumento, segundo o qual a ONU gostaria de promover o consumo de drogas e a pedofilia, intitula-se, em tradução livre, “Os princípios de 8 de março para uma abordagem baseada em Direitos Humanos para a proscrição de uma condução de Direito Penal associada a sexo, reprodução, uso de drogas, HIV, falta de moradia e pobreza”.

Imagem: site da Comissão Internacional de Juristas

Ao contrário do que diz o youtuber, o documento em questão não foi publicado pela ONU. Trata-se de uma publicação da Comissão Internacional de Juristas (CIJ), organização não-governamental, fundada em 1952, que reúne 60 juristas de todas as partes do mundo com o objetivo de “garantir o desenvolvimento e a efetiva implementação dos direitos humanos internacionais e do direito internacional humanitário”.

A CIJ não tem o poder de implementar legislações, quer sejam internacionais ou nacionais. Suas publicações são orientações gerais, oferecidas por um grupo de juristas, que podem servir de inspiração para juízes, legisladores ou, até mesmo, para discussão em foros internacionais. No caso específico da publicação de 8 de março, a CIJ promoveu uma apresentação da abordagem na 52ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, no último Dia Internacional da Mulher, em Genebra, em conjunto com programas específicos da ONU, organizações não governamentais e governos nacionais.

Do que trata o relatório da CIJ

O documento foi lançado em 8 de março de 2023, Dia Internacional da Mulher, e aponta questões consideradas importantes para a preservação dos direitos humanos no mundo. Como o título informa, não apenas drogas e direitos sexuais e reprodutivos estão incluídos, mas também o cenário da pobreza, da falta de moradia e das condições de portadores do HIV.

O cerne da preocupação exposta no documento é a atual tendência crescente de Estados utilizarem o Direito Penal para lidarem com situações diversas, da pobreza a comportamentos sexuais, resultando em um processo de excessiva criminalização de indivíduos e, às vezes, de comunidades inteiras. 

O documento ressalta que, embora o Direito Penal esteja disponível como forma mais dura de controle estatal, muitas vezes é utilizado em sua função meramente expressiva, sem levar em conta aspectos como dissuasão e reabilitação dos indivíduos.

Ao contrário do que afirma o influenciador cristão, não se trata de propor que países adotem legislações exageradamente permissivas. O que o documento propõe é que haja, primeiro, uma abordagem não-penal dos fenômenos descritos, para que os direitos humanos sejam preservados.

Conduta sexual consensual

O documento da CIJ afirma que o sexo com consentimento não deve ser criminalizado, independentemente de quem esteja envolvido. Fica clara a preocupação dos juristas com perseguições à comunidade LGBTQIA+ e com a criminalização, que ocorre em alguns países, do sexo (mesmo que consensual) feito por mulheres antes do casamento.

A respeito da idade de consentimento, aspecto alarmado pelo youtuber, os juristas consideram que a aplicação da lei penal deve considerar as capacidades evolutivas de pessoas menores de 18 anos, tendo em conta sua idade, maturidade, autonomia e, primordialmente, garantindo a não discriminação de indivíduos e comunidades historicamente perseguidas.

Não se busca, como afirma Bitencourt, autorizar a pedofilia ou “aliviar a barra dos criminosos”.  O que se quer é garantir que indivíduos plenamente capazes que, por livre e espontânea vontade, tenham praticado atos sexuais, não sejam considerados criminosos. 

A agência de notícias The Associated Press (AP) desmentiu a informação enganosa, que também circulou fora do Brasil.

Drogas para uso pessoal

Sobre o uso de drogas, os juristas recomendam que não sejam criminalizadas pessoas que tenham sob sua posse drogas para uso pessoal, que distribuam bens ou informações relacionadas ao uso pessoal de drogas, que estejam envolvidas em esforços científicos para prevenir danos associados a drogas e que busquem receber informações sobre serviços de saúde para pessoas que usem drogas.

Apesar de não explorar muito o tema das drogas no vídeo em questão, Bitencourt afirma que “já estão fazendo muita pressão (…) para aprovar a descriminalização”, e então mostra um papel em que é possível ler a palavra “drogas”, em mais uma referência à suposta perseguição promovida contra si na plataforma de vídeos.

Conforme publicado anteriormente por Bereia, tanto o tema da pedofilia quanto o tema das drogas têm sido frequentes em narrativas desinformativas veiculadas por grupos e indivíduos religiosos.

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O conteúdo checado por Bereia é considerado enganoso. O vídeo oferece a informação de que há um documento, lançado por ocasião do Dia Internacional da Mulher, que trata sobre descriminalização de alguns comportamentos. No entanto, a verdadeira autoria do documento é apresentada de forma a confundir os interlocutores e sua verdadeira substância é manipulada.

A apresentação do conteúdo é desenvolvida para confundir, com títulos e imagens que não correspondem à realidade, instigando julgamentos negativos de uma organização. Além disso, evoca sensacionalismo para conquistar audiência, ao tratar de forma sensacionalista temas de grande apelo popular.

Bereia incentiva que seus leitores e leitoras continuem alertas para conteúdos nas redes digitais que mesclam discurso religioso com pautas políticas pouco claras e que apresentem sinais clássicos de desinformação, como discurso vago, afirmações genéricas, terceirização de responsabilidades e apelo à pauta de costumes.

Referências de checagem:

The 8 March Principles for a Human Rights-Based Approach to Criminal Law Proscribing Conduct Associated with Sex, Reproduction, Drug Use, HIV, Homelessness and Poverty.

https://icj2.wpenginepowered.com/wp-content/uploads/2023/03/8-MARCH-Principles-FINAL-printer-version-1-MARCH-2023.pdf Acesso em: 27 abr 2023

ICJ. https://www.icj.org/icj-publishes-a-new-set-of-legal-principles-to-address-the-harmful-human-rights-impact-of-unjustified-criminalization-of-individuals-and-entire-communities/ Acesso em: 27 abr 2023

UNAIDS. https://unaids.org.br/sobre-o-unaids/ Acesso em: 27 abr 2023

Agência AIDS. https://agenciaaids.com.br/noticia/unaids-novos-principios-juridicos-lancados-no-dia-internacional-da-mulher-para-promover-os-esforcos-de-descriminalizacao/#:~:text=Os%20’%20princ%C3%ADpios%20de%208%20de,falta%20de%20moradia%20e%20pobreza. Acesso em: 27 abr 2023

AP News. https://apnews.com/article/fact-check-united-nations-report-consent-772818741019 Acesso em: 27 abr 2023

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Imagem de capa: reprodução do Youtube

Influencer católico desinforma a respeito do caso da menina de 11 anos

Entre os dias 22 e 24 de junho, o influenciador digital católico e editor de opinião do site Brasil Sem Medo (BSM) Bernardo P. Küster fez diversas publicações em sua página no Twitter com críticas à abordagem do caso da criança violentada e impedida de realizar o procedimento de interrupção da gestação. 

Imagem: reprodução do Twitter

Bernardo Kuster foi citado na CPI da Pandemia como um dos influenciadores digitais de perfil religioso que atuaram na propagação de notícias falsas e desinformação a respeito do tema

O influenciador católico é um conhecido propagador de fake news e suas declarações foram checadas pelo Coletivo Bereia em diversas oportunidades. Kuster desinforma e distorce informações em diversos temas, como: a conduta do Governo Federal em relação à pandemia da Covid-19,  vacinação, teorias da conspiração relacionando “esquerda” e pedofilia e até um suposto atentado contra Donald Trump. 

Bereia checou as informações e mais uma vez, Bernardo Kuster desinforma e manipula informações. 

Imagem: reprodução do Twitter

Kuster afirma que “norma técnica do Ministério da Saúde diz que não se pode abortar com 22 semanas de gestação”. O influenciador não apresenta a norma técnica mencionada, mas aparentemente menciona a cartilha “Atenção Técnica para Prevenção, Avaliação e Conduta nos casos de Abortamento”, produzida pelo Ministério da Saúde

A cartilha preconiza que “sob o ponto de vista médico, não há sentido clínico na realização de aborto com excludente de ilicitude em gestações que ultrapassem 21 semanas e 6 dias”. 

No entanto, Kuster omite que norma não tem força de lei e que a legislação brasileira permite o aborto em casos de estupro e não determina limite de tempo ou necessidade de autorização. Além disso, não menciona que a cartilha foi repudiada pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia – Febrasgo, por meio de nota oficial. 

De acordo com o Código Penal:

Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico:  

        Aborto necessário

        I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

        Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

        II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Kuster afirma, ainda, que a gestação estaria com 29 semanas, entretanto, mais uma vez omite a informação de que a criança foi impedida anteriormente de realizar a interrupção da gestação pelo hospital e por uma juíza que emperrou o processo que estava em curso, seguindo os trâmites legais. 

Por fim, ao afirmar que não houve estupro, o influencer católico desinforma mais uma vez. Em entrevista a reportagem televisiva sobre o tema, o delegado responsável pelo caso, Alison Rocha, da delegacia de Tijucas (SC), já investigava um suspeito de 13 anos que teria estuprado a menina, na época com 10 anos de idade. De acordo com o delegado,  “uma relação sexual com menor de 14 anos é estupro de vulnerável mesmo que o ato seja consensual e sem emprego de violência é considerado crime”.  

Durante a reportagem sobre o caso, a Defensora Pública do Estado de São Paulo e professora de Direito Constitucional da PUC-SP Mônica Melo, explicou que o “caso de Santa Catarina, a menina que engravidou é a única vítima, uma vez que como o menino apontado como autor tem mais de 12 anos, ele deve responder por ato infracional análogo à estupro de vulnerável. Nesse caso, o adolescente está sujeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente, não sendo enquadrado ao Código Penal, pois são medidas que variam conforme as circunstâncias, a gravidade e o histórico desse adolescente. Essas medidas podem variar desde uma medida mais grave que seria uma medida de internação até uma punição mais branda, que pode ser uma advertência, uma medida de comprimento em meio aberto como prestação de serviços, entre outras. É assim, uma responsabilização dentro de um outro sistema que opera para proteger a criança”.

Como grupos religiosos por direitos de mulheres tratam o tema

Bereia conversou com a Mestra em Ciência da Religião pela PUC/SP Tabata Tesser, integrante de Católicas pelo Direito de Decidir, uma organização de cunho internacional que se articula em 12 países pelo mundo. Formada por mulheres católicas, a organização propõe um questionamento sobre determinadas leis eclesiásticas da instituição, em especial aquelas relacionadas ao aborto, direitos reprodutivos e à autonomia das mulheres sobre o próprio corpo.

Segundo Tabata Tesser:

“A publicação do influencer católico Bernardo Kuster é considerada enganosa. É considerado estupro de vulnerável, ainda que o ato sexual tenha sido cometido por uma criança 13 com outra criança de 11 anos. Pelo fato do menino que cometeu a violência ter menos de 18 anos, ele se torna inimputável; porém, continua caracterizado enquanto estupro de vulnerável. Outra informação enganosa da publicação é a de que ‘não existe base legal para a realização de aborto no Brasil’. Trata-se de uma afirmação farsante, já que o Código Penal Brasileiro prevê o aborto em três casos: 1) quando há risco de vida para a pessoa gestante causado pela gravidez, 2) quando a gestação é fruto de um estupro e 3) se o feto for anencefálico (má formação cerebral do feto). A menina de 11 anos, vítima de estupro de vulnerável, se enquadra no permissivo, pois toda gravidez de criança é decorrente de estupro. A menina violada pode (e teve) acesso ao aborto legal, já que o seu corpo biológico não estava preparado para uma gestação segura. Levar adiante a gestação colocaria em risco a vida da criança estuprada e teríamos mais um índice de mortalidade infantil. Crianças não são mães”.

Bereia também entrevistou a ativista e pesquisadora do tema da “justiça reprodutiva”  na Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca/Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz) Mônica Louza, integrante da Frente Evangélica pela Legalização do Aborto. A pesquisadora diz que “o caso da menina de 11 anos vítima de estupro é mais um que desvela a triste realidade de muitas meninas brasileiras. Trago dois documentos para nos ajudar a pensar sobre o caso. De acordo com o ECA, artigo 2, considera-se criança aquelas com até 12 anos incompletos e adolescentes de 12 a 18 anos.  Além disso, de acordo com o Código Penal, artigo 217a, o estupro de vulnerável é configurado como prática libidinosa com menor de 14 anos. Em ambos os casos, a menina de 11 anos se enquadra, ou seja, ela é criança e vítima de estupro. Crianças não possuem formação corporal para serem mães nem são capazes de consentir com uma relação sexual”. 

De acordo com Mônica,

“soma-se às informações do caso a suspeita de que o autor do estupro é um adolescente de 13 anos, o que, segundo o ECA, se a suspeita for confirmada ele pode ser considerado autor de ato infracional não sendo inimputável. Entretanto, nesse caso, uma entre tantas outras coisas que mais me saltaram aos olhos é a voracidade que aqueles contrários ao abortamento em qualquer circunstância se utilizam da suspeita de que o autor seja adolescente em detrimento da criança que não tem condições de consentir com a relação sexual, isto é, ela continua sendo vítima de estupro e tendo direito ao aborto.  Isto me faz pensar o quanto é importante que crianças e adolescentes tenham acesso à educação sexual! Como diz um importante lema feminista: “Educação sexual para prevenir, contraceptivo para não engravidar e aborto legal e seguro para não morrer!”. Assim, a partir da investigação, caso o adolescente seja o autor, deveria ser pensado cuidadosamente os próximos passos já que também precisa estar sob uma rede de proteção social tendo a garantia de acompanhamentos médicos, psicológicos, das suas condições de vida, entre outros”.

A Frente Evangélica pela Legalização do Aborto compreende a criminalização do aborto como um atentado aos direitos humanos, que, além de não dar conta de impedir que os abortos sejam realizados, impõe ainda, sobre as mulheres, dor, violência e morte.

Como mulheres cristãs, o grupo que compõe a frente acredita na sacralidade da vida, e, por isso, luta por uma política pública de redução de danos, que repense o modelo punitivo de sociedade, garantindo às mulheres direitos, e não encarceramento. Em 2019, o SUS registrou, por dia, uma média de 5 internações de crianças de 10 a 14 anos por aborto (tantos os abortos previstos em lei quanto os espontâneos). Em um mês, são 150 crianças internadas por aborto – número suficiente para encher cinco ônibus escolares pequenos. Estima-se que, no Brasil, uma gravidez é interrompida voluntariamente por minuto, e que o aborto clandestino é a quinta maior causa de mortalidade materna no país.

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Bereia conclui que as publicações do influencer católico Bernardo Kuster são enganosas. O influencer conservador, além de expor mais uma vez o caso da criança violentada, desinforma, omite e deturpa informações. Não apresenta fontes e ignora as estatísticas de morte por abortos clandestinos e o número de crianças internadas oficialmente a cada ano para realizar este procedimento.

Procura, desta maneira, com sua retórica político-religiosa, mobilizar a audiência que se coloca contra a temática do aborto como direito, presente especialmente em espaços religiosos,   para criar uma onda de desinformação num caso de relevância nacional.  

Bereia reafirma o direito de expressão de grupos religiosos que, em sua doutrina, orientam contra a prática do aborto, porém, defende que este processo deve se dar por meio de informação coerente e digna e não com recurso ao enganoso que desinforma, cria pânico e reforça o ódio contra mulheres que querem fazer seus direitos e contra seus apoiadores.. 

Referências de checagem:

The Intercept Brasil. https://theintercept.com/2022/06/20/video-juiza-sc-menina-11-anos-estupro-aborto/ Acesso em: 21 jun 2022. 

Coletivo Bereia.

https://coletivobereia.com.br/relatorio-da-cpi-da-pandemia-aponta-autoridades-e-influenciadores-de-perfil-religioso-na-rede-de-desinformacao/ Acesso em: 21 jun 2022.

https://coletivobereia.com.br/influenciador-catolico-desinforma-em-entrevista-para-jornal/ Acesso em: 21 jun 2022.

https://coletivobereia.com.br/youtuber-catolico-omite-informacoes-sobre-vacina-contra-a-covid-19-para-propagar-medo-de-efeitos/ Acesso em: 21 jun 2022. 

https://coletivobereia.com.br/grupos-evangelicos-e-olavistas-ajudaram-a-espalhar-fake-news-de-bolsonaro-sobre-esquerda-e-pedofilia/ Acesso em: 21 jun 2022.  

https://coletivobereia.com.br/donald-trump-nao-foi-vitima-de-envenenamento/  Acesso em: 21 jun 2022.  

Código Penal. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm Acesso em: 21 jun 2022.

Ministério da Saúde: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_prevencao_avaliacao_conduta_abortamento_1edrev.pdf Acesso em: 21 jun 2022.

Febrasgo. http://www.febrasgo.org.br/pt/noticias/item/1466-nota-sobre-o-documento-atencao-tecnica-para-prevencao-avaliacao-e-conduta-nos-casos-de-abortamento-ministerio-da-saude-2022 Acesso em: 21 jun 2022. 

Fantástico. https://globoplay.globo.com/v/10704503/?s=0s Acesso em: 27 jun 2022. 

Católicas pelo Direito de Decidir. https://catolicas.org.br/ Acesso em: 27 jun 2022.  

Frente Evangélica pela Legalização do Aborto. https://www.facebook.com/frenteevangelicapelalegalizacaodoaborto/ Acesso em: 27 jun 2022.  

Piauí. https://piaui.folha.uol.com.br/os-abortos-diarios-do-brasil/ Acesso em: 27 jun 2022. 

EBC. https://memoria.ebc.com.br/noticias/saude/2015/05/aborto-clandestino-e-quinta-maior-causa-da-mortalidade-das-maes Acesso em 2Acesso em: 27 jun 2022.  

Foto de capa: frame do YouTube