CESE lança Campanha Primavera para a Vida 2022

A CESE (Coordenadoria Ecumênica de Serviço) lança no dia 27 de setembro com a 22ª edição da Campanha Primavera para a Vida. Neste ano, a campanha abraça o tema “Andar com Fé pelos caminhos da Democracia: Vivam como pessoas livres, mas não usem a liberdade como desculpa para fazer o mal; I Pedro 2.16a”, trazendo a discussão sobre o momento político vivido pelo Brasil de ataques constantes contra suas instituições democráticas e o compromisso da organização com a sua radicalidade.

Junto da campanha também será lançado o livro “As igrejas evangélicas na ditadura militar: dos abusos do poder à resistência cristã”, uma obra que sintetiza a atuação de grupos evangélicos durante a ditadura militar (1964-1985) e traz reflexões sobre o enfrentamento aos desafios do tempo presente para incentivar processos de renovação crítica da relação igreja e sociedade. O público poderá conhecer por meio da sistematização a experiência de como grupos evangélicos atuavam no período de repressão, como subsídio de reuniões e articulações interessadas em refletir sobre os significados, avanços e limites dos processos socioculturais, políticos e eclesiais nas décadas de 60 e 70. Uma oportunidade de olhar curso da história para denunciar as consequências dos abusos de poder, e ao mesmo tempo, animar a esperança que torna possível novos caminhos para a construção democrática.

A publicação encontrou calendário e ambiente fértil para realização da sua primeira divulgação, a campanha da primavera e tem como responsáveis pela obra a editora-geral do Bereia, Magali Cunha, Anivaldo Padilha, Luci Buff e Jorge Atílio Iulianelli (in memoriam). Além da CESE, o livro “As igrejas evangélicas na ditadura militar: dos abusos do poder à resistência cristã” conta com o apoio do Coletivo Memória e Utopia, Instituto Vladimir Herzog e KOINONIA – Presença Ecumênica e Serviço.

Indígenas Truká destroem obra de igreja em suas terras após fala de pastor

Circula nas redes sociais um vídeo em que indígenas do povo Truká aparecem demolindo as obras de uma igreja construída em seu território na Ilha de Assunção, em Cabrobó (PE), no dia 24 de abril. Em outra postagem, a página do Facebook “Assembleianos de Valor” classificou a ação dos Truká como intolerância religiosa.

Foto: Print do Facebook

Expressões de intolerância

A construção do templo na terra indígena Truká estava sendo realizada pela Igreja Evangélica Assembleia de Deus Pernambuco, filial Cabrobó, dirigida pelo pastor presidente Ailton José Alves e pelo pastor local Jabson Avelino. 

Em um vídeo de transmissão ao vivo do culto de 9 de abril de 2021 publicado pelo canal da Igreja no Youtube, o pastor Jabson Avelino aparece zombando da religião tradicional do povo Truká. “Ore pelos nossos irmãos índios. Estamos novamente precisando de um socorro de Deus, o pajé foi lá falar com os presbíteros junto com os caciques, basicamente proibiram o culto novamente lá. O pajé disse que o espírito de luz deles não está descendo, acho que cortaram a energia deles lá (risos). É porque eles tão orando lá e o espírito de luz não está descendo. E não desce mesmo não, porque maior é o que está conosco”, afirmou, no trecho a 1:05’53’’ da transmissão.

Foto: Youtube

Sentindo-se desrespeitados pelas falas do pastor e pela falta de diálogo da igreja com as lideranças, os indígenas do Povo Truká realizaram um ato de derrubada da construção da igreja no local invadido

“Nós não fomos às redes sociais difamar a religião de ninguém, pelo contrário, fomos nós que tivemos nosso sagrado desrespeitado pelo pastor. Imaginem se fôssemos nós indígenas que tivéssemos difamado a religião do pastor e achando pouco, fôssemos construir uma aldeia na sua igreja, digo, dos irmãos. Talvez não desse tantos comentários, sem fundamentos, sabe por quê? Porque vivemos em uma sociedade hipócrita, onde as minorias são tratadas às margens da sociedade”, afirmou em nota o Cacique Bertinho, liderança do povo Truká.

Ele destaca ainda que, em nenhum momento, os pastores consultaram as lideranças da aldeia sobre a construção do templo no local, e que há algum tempo a população local enfrentava desrespeito e abuso por parte dos evangélicos que invadiram a aldeia sem permissão. “Para construir ou fazer qualquer obra no território indígena, faz-se necessário a consulta prévia para saber se as lideranças indígenas aceitam ou não determinada ação. Em nenhum momento as lideranças foram procuradas pelo pastor para dar anuência para referida construção, por diversas vezes os representantes da Assembleia aqui na Ilha de Assunção foram procurados para conversar, mas mesmo diante da decisão da organização interna, os mesmo continuaram a insistir na construção de uma igreja”, declarou. 

A nota relembra ainda que a construção da igreja em terra indígena foi feita sem autorização: 

A Constituição Federal Brasileira (Art. 231 e 232) reconhece o respeito às formas de organizações próprias dos povos indígenas, além de suas crenças, costumes, usos e tradições bem como os direitos originários dos povos indígenas sobre suas terras.
O Decreto 5051/04 (Convenção 169 da OIT) reafirma o reconhecimento desses direitos constitucionais e ressalta o direito de autonomia dos povos indígenas, no sentido de garantir o respeito às formas diferenciadas de vida e organização de cada povo indígena, seus anseios, planos de vida, de gestão e de desenvolvimento de seus territórios, afastando-se antigos ideários de assimilação e sua superioridade ou dominação frente aos povos indígenas.

Trecho da nota da liderança do povo Truká

Procurado pelo Coletivo Bereia, o pastor da IEADPE de Cabrobó Jabson Avelino emitiu a seguinte nota:

“O que tenho a esclarecer é que a estrutura demolida que segundo os indígenas era construção da instituição Assembleia de Deus não procede. O que se trata é de uma construção de um espaço que estava sendo feita (não templo) com recursos dos próprios índios que são evangélicos, já que estavam fazendo o culto embaixo de uma árvore e não tinham nem um local adequado para realizar suas necessidades fisiológicas. Tendo em vista a quantidade razoável de índios que participam dos cultos, tiveram a iniciativa de construir um lugar minimamente adequado para realização dos cultos. É bom deixar claro que o trabalho lá tem um presbítero e três diáconos que são índios, sendo assim, dirigidos pelos próprios índios. 
Desejo também externar o meu sentimento de apreço e consideração pelo povo indígena. Nunca tive intenção de denegrir e nem propagar intolerância religiosa, o que se tratou foi uma fala mal colocada por mim em uma live o qual repassei o que me falaram, reconheço a minha infelicidade e aproveito o momento para me retratar e pedir desculpas com os amigos indígenas ao qual sempre respeitei, até porque minha esposa é descendente direta de índios. Quem me conhece sabe que não houve dolo na minha fala. Deixo claro o nosso sentimento de cordialidade, aprendemos com o nosso Mestre Jesus Cristo a amar uns aos outros.”

Nota do Pr. Jabson Avelino

Direitos ameaçados

Ao site Marco Zero Conteúdo, o Cacique Bertinho afirmou que notificou a Fundação Nacional do Índio (Funai) e que pretende pedir a abertura de investigação no Ministério Público Federal sobre o caso. A Funai tem um Programa de Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas que inclui a vigilância e a proteção de terras desses povos, que formam mais de 200 grupos étnicos em todo o Brasil.  

Estudos diversos têm mostrado como a cada dia, surgem casas, igrejas evangélicas, bares, restaurantes, oficinas e ganha força o mercado ilegal de lotes dentro das terras indígenas, o que não tem sido devidamente fiscalizado e punido pelos órgãos governamentais responsáveis..

Histórico do povo indígena Truká

Os Truká vivem na Ilha da Assunção desde o século 18I e a fundação data de aproximadamente 1722, segundo o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade (Nepe) da Universidade Federal do Pernambuco (UFPE). Desde então, o povo indígena travou disputas pela terra com autoridades de Cabrobó. Os Truká passaram a reivindicar a terra em 1940 , por meio do Serviço de Proteção do Índio (SPI) e conseguiram uma Ação de Nulidade de Venda e Reintegração de Posse. Mesmo assim, o Estado de Pernambuco voltou a comprar parte da ilha de Assunção para estabelecer um núcleo de Colonização.

O povo Truká voltou a reivindicar o direito à terra por meio da Fundação do Índio (Funai). De acordo com a base de dados Terras Indígenas no Brasil, do Instituto Socioambiental (ISA), o território dos Truká foi declarado em portaria de 2002. Desde então,faltam o processo de demarcação física pela Funai, a homologação pela Presidência da República e o  registro na Secretaria de Patrimônio da União (SPU). No site da Funai, há três registros referentes à terra Truká. Todas estão na modalidade “tradicionalmente ocupada”. O registro “Truká-Reestudo” é o mesmo encontrado na plataforma Terras Indígenas no Brasil do ISA.

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Bereia conclui que as postagens da página Assembleianos de Valor são enganosas. Embora a destruição da construção tenha de fato ocorrido, não se trata de “a mais pura intolerância religiosa”, como o grupo classificou e quer levar seus leitores a crerem. A ação foi uma forma de repúdio dos indígenas contra uma declaração intolerante do pastor Jabson Avelino, que se sucedeu à construção de uma obra ilegal em seu território, sem autorização da liderança Truká, informações que foram omitidas pela página religiosa e pela declaração do pastor ao Coletivo Bereia.

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Referências

IEADPE Cabrobó, https://youtu.be/aPrmtUw1XSg?t=3953. Acesso em 29 de abril de 2021

Mídia 1508 – YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=ENoNeEjvpps. Acesso em 28 de abril.

Nota de esclarecimento do Cacique Betinho https://www.didigalvao.com.br/cacique-bertinho-em-nome-da-comunidade-truka-emite-nota-de-esclarecimento-sobre-os-fatos-ocorridos-em-24-04-21/. Acesso em 28 de abril de 2021.

Marco Zero Conteúdo, https://marcozero.org/demolicao-de-obra-de-templo-em-aldeia-truka-expoe-ofensiva-evangelica-nos-territorios-indigenas/. Acesso em 29 de abril de 2021.

Funai, http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cgmt/pdf/Vigilancia_e_Protecao_de_TIs.pdf. Acesso em 29 de abril de 2021.

Folha de São Paulo, https://temas.folha.uol.com.br/amazonia-sob-bolsonaro/renascer-para-quem/desmate-invasoes-e-garimpo-se-alastram-por-terras-indigenas-perto-do-rio-xingu.shtml?origin=folha. Acesso em 29 de abril de 2021.

Instituto Socioambiental, https://www.socioambiental.org/pt-br. Acesso em: 28 de abril de 2021.

Terras Indígenas, https://terrasindigenas.org.br/pt-br/terras-indigenas/3777. Acesso em: 28 de abril de 2021.

Funai, http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/terras-indigenas. Acesso em: 28 de abril de 2021.

Família pede denúncia de vídeo que mostra morte durante batismo em rio

Um vídeo em que um homem é levado pela correnteza durante um batismo às margens do Rio Guandu viralizou nas mídias sociais. A gravação tem pouco mais de três minutos e a partir de dois minutos e treze segundos, uma corrente no rio interrompe a cerimônia, que conta com cinco participantes na água. Eles tentam voltar para margem do rio, mas nos últimos segundos do vídeo o celebrante fica debaixo d’água enquanto pessoas que assistiam ao batismo em terra correm em socorro dos participantes. 

Família pede que vídeo seja denunciado

Diante da viralização, posts em mídias sociais e portais de notícias oferecem relatos conflitantes sobre qual igreja teria realizado o batismo registrado em vídeo e onde a cerimônia teria acontecido. Há menções de que as congregações seriam localizadas nos bairros do Campo Grande, na capital fluminense, ou Santa Cruz da Serra, em Duque de Caxias. 

Bereia contatou uma pessoa próxima da família da vítima e confirmou que, na verdade, trata-se de igreja da denominação Casa da Bênção na cidade de Seropédica (RJ). No último 28 de março, a igreja realizava um batismo no Rio Guandu quando o pastor foi arrastado pela correnteza e veio a falecer. O fato marcou a comunidade, que pede que não se compartilhe o vídeo. “Eles [a família da vítima] desejam que parem de postar o vídeo, porque nesse momento de perda é muito difícil falar, já que não tem quem culpar, foi uma fatalidade. Esse rio é perigoso. Do nada, dá o redemoinho e puxa”, explicou uma pessoa próxima da família. 

Em um grupo do Facebook, a reportagem encontrou um post relacionado ao vídeo em que uma das pessoas da família da vítima pede ajuda para denunciar a gravação. Bereia optou por não citar nomes para preservar a identidade da família e de conhecidos atingidos pelo ocorrido.

Foto: Facebook/Reprodução

Rio Guandu é perigoso e constantemente usado para batismos

O Rio Guandu tem grande importância para o Estado do Rio de Janeiro, sendo responsável pelo abastecimento de água do Grande Rio. A Estação de Abastecimento de Água da Cedae no Rio Guandu tem passado por reformas após o aparecimento de geosmina, substância que deixa a água das residências da região com gosto e odor ruins. 

O processo de tratamento de água, somado à correnteza natural do rio, tornam o Guandu um local arriscado e impróprio para banho, apesar da aparência tranquila. O local, entretanto, atrai banhistas e pescadores, sendo um dos poucos lugares considerados de lazer por moradores da região. O rio também é constantemente local de batismos realizados por igrejas evangélicas. O guia Edson Monteiro alerta para os perigos da correnteza e dos buracos no local, que podem causar acidentes. “Na Prainha temos um buraco com três metros de profundidade. Para uma mãe que não conhece o local, um minuto é o tempo de a criança afundar e a correnteza a arrastar. E vai descer o rio”, afirmou em entrevista ao G1.  

Em 2020, após o afogamento de Guilherme Souza, 10 anos, o grupo Mulheres da Lagoinha, realizou uma ação voluntária para sinalizar trechos do Rio Guandu em Nova Iguaçu quanto aos riscos de afogamento. Elas também cobram do poder público a fiscalização e a construção de uma área de lazer como um piscinão para que as crianças não vão para as áreas de correnteza.

Diretrizes de comunidade no Facebook e no Youtube

A gravação do ocorrido espalhou-se por mídias sociais como Facebook e Youtube. Ambas têm diretrizes de comunidade para tratar de conteúdos sensíveis, como é o caso do vídeo verificado nesta reportagem. O Facebook tem uma política de perfil memorial que afirma o seguinte: “Para apoiar o enlutado, em algumas instâncias podemos remover ou alterar certo conteúdo quando o contato herdeiro ou os membros da família fizerem uma solicitação nesse sentido.” A rede pede que vídeos de morte prematura não sejam postados.

Já o Youtube tem regulação acerca de conteúdo violento ou explícito. A plataforma pede que não sejam postadas, entre outras coisas, feridos ou mortos em um acidentes, acompanhados de título como “Acidente inacreditável” ou “Aviso: muito sangue”. A plataforma reafirma que esta não é uma lista completa e tem canais para denúncia.

Por outro lado, o aplicativo de mensagens Whatsapp – outro ambiente por onde o vídeo pode viralizar com facilidade – tem criptografia de ponta a ponta. Isso significa que apenas quem manda e recebe as mensagens conhece seu conteúdo. O aplicativo não tem acesso a elas. Na seção de Avisos Legais e Isenções, os Termos de Serviço do Whatsapp dizem o seguinte: 

“NÃO CONTROLAMOS E NÃO NOS RESPONSABILIZAMOS PELO CONTROLE DE COMO OU QUANDO NOSSOS USUÁRIOS UTILIZAM OS NOSSOS SERVIÇOS OU OS RECURSOS, OS SERVIÇOS E AS INTERFACES FORNECIDAS POR ESSES SERVIÇOS. NÃO NOS RESPONSABILIZAMOS E NÃO NOS OBRIGAMOS A CONTROLAR AS AÇÕES OU AS INFORMAÇÕES (INCLUINDO O CONTEÚDO) DE NOSSOS USUÁRIOS OU DE TERCEIROS.”

Termos de Serviço do WhatsApp

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Bereia conclui que o vídeo da tragédia durante um batismo da Igreja Casa da Bênção, de Seropédica (RJ), é verdadeiro. O caso ocorreu em 28 de março de 2021. Entretanto a imagem foi compartilhada sem o consentimento da família da vítima, que pede que se interrompa a circulação do conteúdo por respeito à dor desse momento. Bereia recomenda a leitores e leitoras que nunca compartilhem vídeos, imagens ou qualquer outro conteúdo de acidentes sem autorização das pessoas envolvidas e sem o objetivo de prestar um serviço com a informação. Além de desrespeitoso com as vítimas e familiares, o artigo 212 do Código Penal Brasileiro define como crime vilipêndio ao cadáver, o que segundo juristas inclui tirar e compartilhar fotos e vídeos de acidentes. 

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Foto de Capa: Print do Vídeo/ACGNews

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Referências

G1. https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/10/12/guia-alerta-para-correntezas-em-praias-no-rio-guandu-tres-pessoas-se-afogaram-em-um-mes.ghtml. Acesso em 07 de abril. 

IBPM Boaventura. http://ibpmboaventura.com.br/site/index.php/grupos/g-jovem-rosa-de-sarom/grupo-de-danca-siloe/25-eventos/6-batismo-um-dia-inesquecivel. Acesso em 07 de abril.

Extra. https://extra.globo.com/noticias/rio/mulheres-se-unem-sinalizam-areas-perigosas-no-rio-guandu-em-nova-iguacu-24649756.html. Acesso em 07 de abril. 

Facebook, https://www.facebook.com/communitystandards/memorialization. Acesso em: 07 de abril.

Youtube, https://support.google.com/youtube/answer/2802008?hl=pt-BR#zippy=%2Cconte%C3%BAdo-violento-e-chocante. Acesso em: 07 de abril.

Youtube, https://support.google.com/youtube/answer/2802027. Acesso em: 07 de abril.

Whatsapp, https://faq.whatsapp.com/general/security-and-privacy/end-to-end-encryption/?lang=pt_br. Acesso em: 07 de abril.

Whatsapp, https://www.whatsapp.com/legal/updates/terms-of-service/?lang=pt_br. Acesso em: 07 de abril.

Jus Brasil, https://jus.com.br/artigos/77222/atencao-tirar-fotos-de-acidentes-e-crime-e-pode-dar-cadeia. Acesso em: 07 de abril.

Assembleia de Deus perde muitos líderes no Mato Grosso mortos pela Covid-19

Uma publicação no Twitter, em 22 de julho, motivou mais uma checagem do Coletivo Bereia: “Aqui em Mato Grosso morreram toda a alta cúpula da Igreja Assembleia de Deus. Morreram 5 pastores que comandavam a igreja em todo estado. Todos morreram por coronavírus”.

Com 5,2 mil curtidas, 414 comentários e 1,1 mil retuítes, até 27 de julho, quando esta matéria foi redigida, a mensagem gerou embates e divergiu as opiniões dos usuários engajados na postagem. Alguns solicitaram ao autor que inserisse o link dos sites e notas oficiais que confirmassem as mortes (o que foi feito), outros questionaram o número de óbitos, enquanto alguns atribuíram os falecimentos ao fato de que muitas igrejas evangélicas boicotaram as medidas de prevenção e decretos de restrições impostas ao estado desde o início da pandemia no país.

Segundo matéria publicada no portal UOL, a Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) não informou o número exato de mortes, mas teria dito que entre dezenas de líderes mortos estariam pessoas de idades variadas. A instituição é a maior organização de igrejas evangélicas, com mais de 100 mil pastores associados e cerca de 25 milhões de fiéis.

Ao site Hipernotícias, do Mato Grosso, o secretário-geral da Convenção dos Ministros das Assembleias de Deus naquele estado, Pastor Juvanir de Oliveira, informou, em 21 de julho, que seis líderes da igreja faleceram no estado com a Covid-19, confirmando, com um registro a mais, a postagem do Twitter que motivou esta matéria do Coletivo Bereia. O Pastor Juvanir de Oliveira citou que os mortos foram: o presidente da Convenção Local, Pastor Sebastião Rodrigues de Souza, 89 anos, o filho dele, vice-presidente da Convenção, Pastor Rubens Siro de Souza, 68 anos, os Pastores José Geraldo dos Anjos, 76 anos, Jânio Corrêa Leite, 66 anos, Pedro Ezídio (idade não identificada), e Reginaldo Pereira de Jesus, 53 anos.

O Pastor Sebastião Rodrigues de Souza faleceu cinco dias depois do filho, Rubens Siro de Souza, morto pela Covid-19, em 3 de julho. O Pastor Sebastião Souza era também vice-presidente da CGADB desde 1995. Souza ficou reconhecido por ter construído em Cuiabá um dos maiores templos evangélicos do país, com capacidade para 20 mil fiéis.

Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro publicou uma nota de pesar pela morte de Souza, mas sem citar a Covid-19. A mensagem, originalmente disponibilizada no perfil da rede social do Planalto foi repostada no perfil do Instagram da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil. O texto diz:

No Salmo 116:15 lemos que “Preciosa é à vista do SENHOR a morte dos seus santos”. Hoje, mais uma vez, isto ocorreu com a partida para o Senhor do saudoso pastor Sebastião Rodrigues, da Igreja Assembleia de Deus. A terra perde valoroso obreiro, mas o Senhor abraça um filho que venceu!
Meus sinceros sentimentos a toda a comunidade cristã e à família do querido pastor Sebastião! Oremos pelo conforto do Senhor na vida dos familiares!
Em Cristo,
Jair Messias Bolsonaro
Presidente da República Federativa do Brasil.

Nota de pesar pela morte de pastor com Covid-19 em Mato Grosso

Caso destacado foi também o do pastor José Geraldo dos Anjos, 76 anos, que faleceu no dia 21 de julho, após uma semana internado no hospital Santa Rita, no município de Várzea Grande, no Mato Grosso. Ele liderava a Assembleia de Deus, no Parque do Lago, no município varzea-grandense, onde estava há 36 anos. Segundo matéria do G1 publicada no dia da morte, ele era casado e deixou filhos, netos e bisnetos.


Foto: Facebook/Reprodução

No dia seguinte à declaração do secretário-geral das Assembleias de Deus no Mato Grosso, Juvanir de Oliveira, houve a sétima morte de liderança da Assembleia de Deus no mesmo mês. Ela se deu em Nobres (MT), a 151 km de Cuiabá. A vítima foi o pastor José Damasceno de Castro, 60 anos. Ele era casado e tinha quatro filhos.


Foto: Instagram | Reprodução

A Secretaria de Estado de Saúde (SES) do Mato Grosso registrou, até a tarde de 27 de julho, 45.155 casos confirmados da Covid-19 no estado, sendo registrados 1.664 óbitos em razão da pandemia. Havia ocorrido 48 mortes e 1.518 novas confirmações nas 24 horas anteriores ao relatório. Dentre os dez municípios com maior número de casos de Covid-19, estão Cuiabá (9.940), Várzea Grande (3.466), Rondonópolis (2.949), Lucas do Rio Verde (2.560), Tangará da Serra (1.899), Sorriso (1.775), Primavera do Leste (1.652), Sinop (1.627), Nova Mutum (1.257) e Pontes e Lacerda (875). Os pastores das Assembleias de Deus que perderam a vida pela doença eram da capital Cuiabá, de Várzea Grande, Tangará da Serra, Barão de Melgaço e Nobres.

O Coletivo Bereia contatou a sede da Convenção dos Ministros da Assembleia de Deus no Mato Grosso. A Convenção preferiu destacar o falecimento do Pastor Presidente, Sebastião Souza, pois era liderança da igreja no estado e na Convenção Geral e foi a perda mais repercutida de líderes das Assembleia de Deus por Covid-19.

A rejeição à gravidade da pandemia por parte de evangélicos

Desde o início daquilo que se transformaria em uma pandemia mundial, em consequência do novo coronavírus, grupos evangélicos têm colaborado a diminuir, deturpar e enganar a população através de inúmeras fake news sobre a pandemia. O Coletivo Bereia tem trabalhado intensamente com verificações dos sites de notícias religiosos e com perfis de lideranças vinculadas às igrejas, além de atender a diversos pedidos de checagem de notícias encaminhados por leitores/as.

Pastores evangélicos já prometeram unção imunizadora contra o coronavírus e já houve casos líderes políticos e religiosos minimizando e espiritualizando ação do coronavírus por meio das quais, matérias com títulos como “Goiânia é protegida por Deus e não será atingida pelo coronavírus”, eram propagadas pela própria prefeitura de Goiânia.

A cantora gospel Fabiana Anastácio publicou: “o coronavírus não atingirá a sua casa, porque quem guarda a sua casa é Jesus”. Infelizmente, Anastácio acabou falecendo por complicações devidas ao novo vírus. Houve desinformação atrelada à cantora, sobre ela ter revisto sua posição enquanto estava internada. O Coletivo Bereia apurou e explicou a verdadeira situação.

Em vários conteúdos desinformativos disseminados por grupos religiosos havia interesse em mostrar que as estatísticas eram falseadas, como a de que um borracheiro tinha morrido em um acidente com pneu, mas foi diagnosticado com Covid-19. Ainda nesse sentido, conteúdos falsos foram criados afirmando que a Polícia Federal e o Ministério da Saúde estariam auditando o número de óbitos por Covid-19 e, como consequência dessas ações, o número de óbitos teria caído.

Bereia também identificou conteúdo enganoso que dizia que “o Sol forte poderia matar coronavírus em 34 minutos”.

Toda esta desinformação foi produzida e compartilhada por grupos evangélicos, inclusive lideranças. O Coletivo Bereia produziu matéria para explicitar de onde partem as notícias falsas que circulam em grupos religiosos. Neste levantamento tornou-se nítida uma certa resistência por parte destes grupos religiosos, não apenas em admitir a gravidade da pandemia, mas, também, em seguir os protocolos internacionais de prevenção. Além do dogmatismo religioso, há o aspecto político que motiva essa postura. Muitos desses grupos e líderes apoiam irrestritamente o governo federal na liderança do Presidente Jair Bolsonaro e terminam por seguir sua postura relativizadora da doença e negadora das orientações da Organização Mundial de Saúde e de outras autoridades da área no país.

A situação entre católicos romanos

O novo coronavírus também fez vítimas no cenário católico. Segundo informações da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) cresceu também o número de padres do Brasil acometidos pela Covid-19. O último levantamento realizado pela Comissão Nacional de Presbíteros (CNP), divulgado em 29 de maio no portal da CNBB, apresenta a confirmação de 117 infectados e 14 mortes. Um novo relatório está sendo produzido pela Comissão e deverá ser divulgado em breve.

Com base nesta verificação, o Coletivo Bereia afirma ser verdadeira a informação divulgada por postagem no Twitter sobre alto número de mortos por Covid-19 entre lideranças das Assembleias de Deus em Mato Grosso. No levantamento, Bereia atualizou o número divulgado na postagem, de cinco para sete mortes até 27 de julho. O Coletivo reafirma a importância de as igrejas assumirem sua responsabilidade cristã com as medidas de prevenção e orientação de sua membresia quanto aos riscos impostos pela pandemia, que permanece grave no país dados os altos índices de infectados e mortes que vigoram.

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Foto de Capa: Reprodução/Convenção das Assembleias de Deus Mato Grosso

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Referências de checagem

Igrejas perdem pastores e padres para covid-19 e divergem sobre estratégias de reabertura. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2020/07/igrejas-perdem-pastores-e-padres-para-covid-19-e-divergem-sobre-estrategias-de-reabertura.shtml. Acesso em 27 de julho de 2020.

Morre mais um pastor da Assembleia de Deus vítima de covid-19. Disponível em: https://www.hnt.com.br/cidades/morre-mais-um-pastor-da-assembleia-de-deus-vitima-de-covid-19-sexto-obito-em-um-mes/178348 Acesso em 27 de julho de 2020.

Pastor da Assembleia de Deus morre quatro dias após ter recebido diagnóstico da Covid-19 em MT. Disponível em: https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noticia/2020/07/21/pastor-da-assembleia-de-deus-morre-4-dias-apos-ter-recebido-diagnostico-da-covid-19-em-mt.ghtml Acesso em 27 de julho de 2020.

Pastor da Assembleia de Deus de Nobres morre por Covid-19. Disponível em:

https://www.hnt.com.br/cidades/pastor-da-assembleia-de-deus-de-nobres-morre-por-covid-19/178532 Acesso em 27 de julho de 2020.

É verdade que apóstolo de igreja em Porto Alegre promete unção imunizadora contra o coronavírus. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-verdade-que-apostolo-de-igreja-em-porto-alegre-promete-uncao-imunizadora-contra-o-coronavirus/ Acesso em 27 de julho de 2020.

É verdade que líderes políticos e religiosos minimizam e espiritualizam ação do coronavírus. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-verdade-que-lideres-politicos-e-religiosos-minimizam-e-espiritualizam-acao-do-coronavirus/ Acesso em 28 de julho de 2020.

É verdade que Fabiana Anastácio negou o risco de ser infectada pela Covid-19. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-verdade-que-fabiana-anastacio-negou-o-risco-de-ser-infectada-pela-Covid-19 Acesso em 28 de julho de 2020.

É falsa a notícia que borracheiro morreu em acidente com pneu mas foi diagnosticado com Covid-19 para inflar estatísticas do coronavírus. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-falsa-a-noticia-que-borracheiro-morreu-em-acidente-com-pneu-mas-foi-diagnosticado-com-Covid-19-para-inflar-estatisticas-do-coronavirus Acesso em 28 de julho de 2020.

É falso que números por Covid-19 caem no Brasil por ações da Polícia Federal e do Ministro da Saúde. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-falso-que-numeros-por-Covid-19-caem-no-brasil-por-acoes-da-policia-federal-e-do-ministro-da-saude/ Acesso em 28 de julho de 2020.

É enganoso que sol forte pode matar coronavírus em 34 minutos. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/e-enganoso-que-sol-forte-pode-matar-coronavirus-em-34-minutos/ Acesso em 28 de julho de 2020.

Sites religiosos e ativistas digitais que propagam desinformação. Disponível em: https://coletivobereia.com.br/sites-religiosos-e-ativistas-digitais-que-propagam-desinformacao/ Acesso em 28 de julho de 2020.

Covid-19: “a Igreja, como um todo, se entristece com cada morte: de bispos, padres, diáconos e de cada batizado”, afirma dom Joel. Disponível em: https://www.cnbb.org.br/Covid-19-a-igreja-como-um-todo-se-entristece-com-cada-morte-de-bispos-padres-diaconos-e-de-cada-batizado-afirma-dom-joel Acesso em 27 de julho de 2020.

Liberdade religiosa e Covid-19: uma reflexão das Igrejas europeias

Publicado no site IHU em 01/05/2020

O grupo temático sobre Direitos Humanos da Conferência das Igrejas Europeias refletiu sobre a liberdade religiosa ou de crença durante a luta contra a Covid-19.

Conferência das Igrejas Europeias (KEK) publicou um documento com 10 pontos no qual reflete e analisa a questão da liberdade religiosa e de culto à luz das restrições que estão sendo vividas, em nível mundial, após a pandemia do coronavírus.

“A proibição das celebrações pascais nas igrejas é apenas um exemplo das restrições de longo alcance ao exercício de muitos direitos humanos e liberdades civis em todo o mundo, que fazem parte de um esforço para garantir que a distância física evite eficazmente as infecções de pessoa a pessoa. Como não houve qualquer restrição comparável nos tempos modernos à liberdade religiosa ou a muitos outros direitos fundamentais, e como esses direitos geralmente são vistos como a espinha dorsal da nossa democracia e do Estado de direito na Europa, o Grupo Temático sobre os Direitos Humanos da Conferência das Igrejas Europeias examinou atentamente as questões em jogo”, afirma o texto, que relaciona as várias questões que atravessam as medidas de contenção das atividades sociais.

KEK parece encontrar um ponto de síntese em uma dialética capaz de manter um equilíbrio, por um lado, entre a salvaguarda da vida humana e a proteção das camadas mais frágeis da população, que “é um valor muito alto também do ponto de vista religioso e deve ser equilibrado com a necessidade de comunidade e de encontro”, e, por outro, a certeza de que as restrições dos direitos fundamentais têm uma base jurídica e são “necessárias, adequadas, razoáveis e geralmente proporcionais em relação ao objetivo a que servem e ao direito que limitam”.

Os 10 pontos propõem uma reflexão sobre o tipo de pandemia que estamos vivendo, sobre a limitação da liberdade religiosa ou de crença (Freedom of religion or belief – FoRB) cuja limitação está prevista em caso de emergências de saúde pública, sobre o caráter de salvaguarda da vida humana previsto pelas medidas de restrição que, nessa perspectiva, não deve ser “entendida como discriminação e perseguição religiosa” e sobre a “coerência na aplicação do ‘fechamento’, especialmente no que diz respeito à necessidade de tratar todos os atores do mesmo modo, de acordo com a suas comparabilidade objetiva”.

O documento conclui que, “embora seja sempre necessário, nos Estados democráticos baseados em regras, observar, discutir e controlar de perto as ações do governo, especialmente quando limitam os direitos fundamentais, este não é o momento para uma incompreensível “desobediência civil“, e convida os cidadãos e cidadãs, caso tenham dúvidas sobre a legalidade de qualquer procedimento, “a recorrer aos tribunais para avaliar e, se necessário, corrigir as medidas em questão”.

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Conferência das Igrejas Europeias  (CEC ) é uma irmandade de cerca de 116 ortodoxos, protestantes, anglicanas e antigas igrejas Católica de todos os países da Europa, além de 40 Conselho Nacional de Igrejas e Organizações em Parceria. A CEC foi fundada em 1959 e tem escritórios em Bruxelas e Estrasburgo.

Imagem de destaque: http://www.arquidiocesedepassofundo.com.br/formacao/liturgia/leitura-orante-da-palavra-de-deus