Conflito armado Israel x Palestina: Brasil na berlinda da desinformação
Desde 7 de outubro de 2023, o antigo e grave conflito entre Israel e Palestina ganhou nova versão. Depois de um ataque, classificado por várias autoridades públicas como terrorista, pelo braço armado do partido político palestino Hamas (“Movimento de Resistência Islâmica”) contra civis israelenses que participavam de um festival de música, Israel respondeu com força desproporcional, como também avaliam diversos agentes das relações internacionais. Ainda em 2023, em pouco mais de um mês de ações de resposta de Israel sobre a região palestina da Faixa de Gaza, sobre a qual exerce controle, já eram contabilizados 15 mil palestinos mortos e 35 mil feridos, com maioria de mulheres e crianças, frente a cerca de 1.500 israelenses que perderam a vida nas ações.
Durante visita à Etiópia, em 18 de fevereiro passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se pronunciou sobre o conflito . Durante a fala, ele comparou a resposta de Israel aos ataques promovidos pelo Hamas, ao extermínio de milhões de judeus por nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
A declaração foi feita em uma entrevista, enquanto participava da 37ª Cúpula da União Africana e de reuniões bilaterais com chefes de Estado, em Adis Abeba, na Etiópia. As reações contra e a favor do pronunciamento foram imediatas. O governo israelense logo se pronunciou em suas redes digitais e nas de seus representantes. Parlamentares brasileiros de oposição também fizeram duras críticas à declaração e logo a internet foi invadida com postagens indignadas sobre o tema.
Entre críticos brasileiros observou-se excessos nas abordagens. Por exemplo, houve até quem defendesse Israel por ser um país cristão sob ataque e, por isso, o apoiava incondicionalmente, como aconteceu na manifestação organizada por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro , em 25 de fevereiro. O que é falso, já que o país tem apenas 1,9% de cristãos, de acordo com o Escritório Central de Estatísticas de Israel (equivalente ao IBGE do país).
Imagem: reprodução do Instagram
A declaração de Lula na Etiópia e as repercussões
Ao responder jornaistas, na entrevista coletiva na Etiópia o presidente Lula afirmou:, “O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu: quando o Hitler resolveu matar os judeus”.
Em muito pouco tempo, o noticiário político nas grandes mídias estava carregado de chamadas com a afirmação de que Lula havia comparado as ações de Israel com o Holocausto, o que provocou não apenas críticas mas comoção, como nos exemplos a seguir.
Imagem: reprodução do site BBC News Brasil
Imagem: reprodução do site CNN Brasil
Imagem: reprodução site Senado Federal
Imagem: reprodução de sites de Veja, O Globo, Folha de S. Paulo e Aos Fatos
Ainda que o presidente não tenha citado diretamente o Holocausto (genocídio cometido pelos nazistas ao longo da Segunda Guerra Mundial, que vitimou aproximadamente seis milhões de pessoas entre judeus, ciganos, homossexuais, testemunhas de Jeová, deficientes físicos e mentais, opositores políticos entre outros), mas, sim, as ações do governo alemão, por meio de Adolf Hitler que levaram a ele, a história contada pelos jornalistas no Brasil foi o que viralizou.
Autoridades israelenses, como o Primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o ministro das Relações Exteriores Israel Katz, se manifestaram publicamente pelo X, antigo Twitter, e usaram a palavra “holocausto” para criticar a fala do líder brasileiro. Netanyahu disse que as palavras de Lula são “vergonhosas e graves” e que banalizam o Holocausto.
Imagem: reprodução do X
Lula fez a afirmação na Etiópia, quando questionado sobre a decisão de alguns países de suspender repasses financeiros à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA), após funcionários do órgão terem sido acusados pelo governo de Israel de envolvimento com o Hamas. Os funcionários foram afastados e a organização está passando por uma investigação, mas, até o fechamento desta matéria, nada havia sido comprovado, nenhum envolvimento da agência ou de seus funcionários.
Criada em 1949, a UNRWA fornece assistência humanitária aos refugiados palestinos registrados na área de atuação da agência (Cisjordânia, Faixa de Gaza, Jordânia, Líbano e Síria). As atividades humanitárias incluem serviços de educação, assistência médica, serviço social, infraestrutura, entre outros. Apenas em Gaza, a entidade conta com cerca de 13 mil funcionários, de acordo com checagem do Bereia.
A UNRWA acusou Israel de deter e torturar alguns de seus funcionários, coagindo-os a fazer confissões falsas sobre a suposta ligação da agência com o Hamas. “Alguns dos nossos funcionários transmitiram às equipes da UNRWA que foram forçados a [fazer] confissões sob tortura e maus-tratos. Estas falsas confissões foram em resposta ao questionamento sobre as relações entre a agência e o Hamas e o envolvimento no ataque de 7 de outubro contra Israel”, disse a porta-voz da UNRWA Juliette Touma, em comunicado.
Países como Estados Unidos e Itália suspenderam o financiamento após a demissão, pela própria agência, dos funcionários. O montante total congelado chega a US$ 450 milhões (R$ 2,2 bilhões), o equivalente à metade dos fundos que a Unrwa recebeu em 2023.
No âmbito diplomático, a fala de Lula na Etiópia levou o governo israelense a convocar o embaixador brasileiro no país Frederico Meyer para um encontro com o chanceler israelense Israel Katz, no Museu do Holocausto, em Jerusalém. Em momento, considerado pela chancelaria brasileira e por analistas como constrangedor e inaceitável, ele ouviu testemunhos de familiares que foram perseguidos pelos nazistas, pronunciados em hebraico, língua que Meyer não domina.
Reprodução do X com tradução automática do hebraico para o português pelo Google Translate
Na ocasião, Lula foi declarado “persona non grata” por Israel – medida utilizada para indicar que um representante oficial estrangeiro não é mais bem-vindo no país em questão. O anúncio também foi feito pelo ministro em seu perfil no X. O governo brasileiro em reação imediata às ações de Israel, consideradas inaceitáveis pela diplomacia, chamou Meyer de volta para consulta.
O impasse diplomático entre Brasil e Israel foi criado e movimentou as redes digitais de lideranças e políticos cristãos, além de personalidades de diferentes espectros políticos não só no Brasil como no exterior.
Políticos de oposição ao governo federal enxergaram no caso, uma oportunidade de capitalizar apoios. A deputada federal Carla Zambelli imediatamente articulou e protocolou, em 22 de fevereiro, um pedido de impeachment contra Lula, com 139 assinaturas, fundamentalmente de parlamentares da direita (classificada como Centrão) e da extrema direita. O texto alega que o presidente infringiu o artigo 5º da Constituição Federal, que prevê como crime de responsabilidade “cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade”
Uma avalanche de falsidades e enganos
Além das críticas, informações falsas sobre o tema também foram divulgadas nas redes, como uma charge racista que retrata Lula como macaco. A charge foi divulgada como tendo sido publicada pelo jornal The New York Times, em ilustração de reportagem sobre a fala polêmica do presidente. A imagem que segue compartilhada nas redes não consta em qualquer texto publicado pelo jornal dos EUA.
Imagem: reprodução do Instagram
O desenho é de um caricaturista israelense que se apresenta no Instagram como J. Majburd e é responsável por outras publicações que alimentam redes de extrema direita.
Imagem: Uma das postagens do cartunista J. Majburd. Fonte: Instagram
Lideranças evangélicas ultraconservadoras também se pronunciaram sobre o caso. Em vídeo publicado nas redes, o pastor Silas Malafaia chamou o presidente da República de mentiroso e chegou a negar a morte de mais de 20 mil palestinos no conflito iniciado em outubro do ano passado. Embora os números de mortos e feridos sejam fornecidos por autoridades de saúde de Gaza, controladas pelo Hamas, eles são considerados e divulgados pela ONU, checados por agências de notícias internacionais e por organizações humanitárias.
Imagem: reprodução do Instagram
De acordo com o assessor especial da Presidência da República e ex-chanceler Celso Amorim, a fala do presidente Lula teve efeitos positivos e pode até ajudar na solução do conflito. “A fala do Lula sacudiu o mundo e desencadeou um movimento de emoções que pode ajudar a resolver uma questão que a frieza dos interesses políticos foi incapaz de solucionar, disse ele em entrevista à coluna da jornalista Mônica Bergamo, no jornal Folha de São Paulo.
Imagem: reprodução do Instagram
Grupos judaicos no Brasil estão divididos no tratamento do tema. A Confederação Israelita do Brasil (CONIB), que representa e coordena a comunidade judaica no país, repudiou a fala de Lula e pediu moderação do governo federal ao tratar do conflito. “O governo brasileiro vem adotando uma postura extrema e desequilibrada em relação ao trágico conflito no Oriente Médio, abandonando a tradição de equilíbrio e busca de diálogo da política externa brasileira. A CONIB pede mais uma vez moderação aos nossos dirigentes, para que a trágica violência naquela região não seja importada ao nosso país”, afirma a nota. Entretanto, assim como o governo israelense e parte da imprensa, a CONIB se equivocou ao dizer que Lula usou a palavra Holocausto.
Já outros grupos como o Coletivo Vozes Judaicas por Libertação, integrado por cerca de 30 pessoas, entre professores, educadores, ativistas e empreendedores judeus, saiu em defesa do presidente Lula, com uma nota pública. “A contradição do povo judaico ser ora vítima e agora algoz é palpável, tenebrosa e desalentadora. Lula externou o que está no imaginário de muitos de nós. Apoiamos as colocações do presidente Lula e cobramos que a radicalidade de suas palavras seja colocada em prática”, diz a nota.
“Enquanto a ONU e diversas organizações internacionais falham em acabar com a ofensiva israelense, é de suma importância a posição e a coragem de líderes internacionais ao denunciarem o genocídio do povo palestino. É nesse contexto que reiteramos nosso apoio ao presidente Lula”, continua o texto.
O que aconteceu em 7 de outubro?
Na manhã de sábado, 7 de outubro de 2023, milhares de israelenses e estrangeiros estavam em um local no deserto de Negev, no sul de Israel, para o festival de música, conhecido como Nova, que marca o feriado judaico de Sucot (Também conhecida como Festa dos Tabernáculos). Homens fortemente armados do Hamas lançaram centenas de foguetes, romperam a fronteira entre Gaza e Israel e seguiram em direção ao festival que havia durado toda a noite. Os radicais bloquearam quase todas as vias de fuga, encurralando a multidão, ao mesmo tempo que visavam abrigos onde as pessoas se escondiam, matando-as em massa e fazendo de alguns reféns. Segundo autoridades israelenses, 260 pessoas morreram no ataque, e outros foram levados reféns. O evento de música eletrônica, organizado pelo Universo Paralello, contava com três mil pessoas.
“Os ataques foram um passo necessário e uma resposta normal a todas as conspirações israelenses contra o povo palestino”, disse o Hamas em um comunicado de 16 páginas em inglês e árabe, divulgado no dia seguinte ao ataque, no site oficial do grupo islâmico.
Imagem: comunicado divulgado pelo Hamas em seu site oficial que no momento está fora do ar. Documentos disponibilizados em árabe e português no site Poder360.
Em 21 de janeiro, o Hamas divulgou mais um comunicado oficial, em inglês e árabe, admitindo que “talvez tenham ocorrido alguns erros durante a operação” devido ao colapso rápido da segurança israelense e do sistema militar, e ao caos nas áreas fronteiriças com Gaza. “Se, em algum caso, civis foram tomados como alvo, ocorreu acidentalmente e no transcurso do enfrentamento com as forças de ocupação”, afirmou o movimento islamita no documento.
“Muitos israelenses morreram nas mãos do exército israelense e da polícia devido à sua confusão”, acrescentou. O movimento islâmico também exigiu o fim imediato da ação agressiva israelense em Gaza, dos crimes e da limpeza étnica contra toda a população do país e rejeitou todo projeto internacional ou israelense destinado a decidir o futuro da Faixa de Gaza. “Insistimos que o povo palestino tem a capacidade de decidir seu futuro e gerenciar seus assuntos internos”, assinalou.
O Hamas destacou ainda no documento as origens históricas do conflito, afirmando que “a batalha do povo palestino contra a ocupação e o colonialismo não começou em 7 de outubro, mas se iniciou há 105 anos e que pretende responsabilizar legalmente a ocupação israelense pelo sofrimento infligido ao povo palestino.
Como foi destacado pelo Hamas, a atual situação é apenas uma fase de um antigo conflito, que remonta ao período posterior à Segunda Guerra Mundial, e contabiliza muitas mortes e deslocamentos.
Após o Holocausto, a comunidade internacional, a partir da recém-criada Organização das Nações Unidas, decidiu organizar um Estado para abrigar o povo judeu. Assim, foi constituído, em 1948, o Estado de Israel. Representantes internacionais também defendiam a criação do Estado Palestino, entretanto, a proposta ficou apenas no campo das discussões.
Após a chegada do Hamas ao poder, em 2007, Israel e Egito impuseram um bloqueio terrestre, aéreo e marítimo sobre a Faixa de Gaza. E, apesar dos pedidos das Nações Unidas e dos grupos de direitos humanos, Israel mantém o bloqueio desde então, o que causou efeitos devastadores para os civis palestinos, que enfrentam severas restrições de movimentação.
Leia mais sobre a história do conflito na Faixa de Gaza na segunda parte desta reportagem que será publicada em breve.
De vítima a vilão
O direito de defesa de Israel passou a ser questionado internacionalmente, especialmente pela ONU, com a intensificação dos ataques que atingem civis, escolas e hospitais com alto número de mortes, em especial de crianças. Avalia-se que Israel está cometendo crimes de guerra em Gaza, por conta das inúmeras perdas contabilizadas entre a população civil.
Quase dois milhões de pessoas – a maior parte da população do território – deixaram suas casas na Faixa de Gaza desde o início da ofensiva militar, em 7 de outubro. Segundo autoridades das Nações Unidas, o território “se tornou simplesmente inabitável”. A escalada de violência do conflito passou a atingir hospitais, escolas e abrigos de refugiados em Gaza, ferindo e matando os civis mais vulneráveis, entre mulheres e crianças.
O embaixador palestino na ONU Riyad Mansour denunciou Israel no Conselho de Segurança, acusando-os de buscar o “deslocamento forçado de nosso povo ao tornar Gaza inabitável”.
A filósofa estadunidense de origem judaica. Judith Butler classificou o ataque do Hamas a Israel como uma revolta e uma “resistência armada”. “Podemos ter pontos de vista diferentes sobre o Hamas como partido político, mas acho que é mais honesto e historicamente correto dizer que o levante de 07 de outubro foi um ato de resistência armada. Não um ato terrorista”, afirmou Butler.
Mais conhecida no Brasil por seus estudos sobre gênero, Butler é referência também em questões de ética, poder e política. Para ela, não foi um ato antissemita, foi um ataque contra israelenses. “Eu não gostei desse ataque, eu fui a público dizer isso, e tive problemas por dizer isso, foi angustiante para mim, foi terrível. No entanto, eu seria muito tola se eu decidisse que a única violência na cena, foi a violência feita ao povo israelense. A violência contra palestinos acontece há décadas. Esta foi uma revolta que vem de um estado de subjugação, e contra um aparato estatal violento”. A declaração foi feita no espaço associativo do Relais de Panti, em Paris, na França.
Imagem: reprodução do Instagram
De acordo com o professor de Teologia e doutorando em Filosofia pela PUCSP Wallace Góis o discurso do governo Israelense de vitimização causa um temor na população de seu país de que há um novo holocausto em andamento. “Muito se fala em antissemitismo, o medo de que vai haver uma nova situação crítica envolvendo os judeus por razões raciais. É a mesma estratégia usada pela extrema direita no Brasil com o fantasma do comunismo, claro guardadas as devidas proporções, não se trata da mesma coisa”, explica o professor, comparando as estratégias e não os fatos, em entrevista ao Bereia.
O professor cita o documentário Difamação (2009), do cineasta Yoav Shamir, que examina se o antissemitismo se tornou um rótulo abrangente para qualquer um que critique Israel. “Eles estão se organizando para denunciar o antissemitismo com números bastante absurdos e a partir disso mobilizar a opinião pública, políticos, imprensa à favor de Israel. No próprio documentário alguns deles confessam que muitas vezes exageram no uso dessas informações com discurso de perseguição o governo Netanyahu tem feito isso”.
A questão de um estado Palestino constituído é levantada pelo professor. Para ele, as ações na Faixa de Gaza tem o propósito de expansão territorial e não vingativa. “Durante os últimos anos o governo de Israel tem feito muitas provocações ao povo palestino, as expansões dos assentamentos seguiram firmes, operações com bombas na Esplanada das Mesquitas, desrespeitando simbolos religiosos, eles não conseguem viver um clima de normalidade, há sempre um risco contra a população Palestina”, conta.
Góis integra a coordenação brasileira do Programa de Acompanhamento Ecumênico na Palestina e Israel, do Conselho Mundial de Igrejas, e viveu por quatro meses, de julho a outubro de 2015, na região. “Israel já está se tornando um país um pouco mais isolado do que antes. O apoio inicial que foi dado pela comoção (em torno do ataque de 7 de outubro), e toda a propaganda que foi feita da vitimização de Israel por causa disso, já começou a esfriar e a sociedade começou a perceber que tem muitos limites a serem analisados antes de apoiar Israel”.
Para o professor que é cristão anglicano e leciona Teologia em cursos de tradição batista, metodista e pentecostal, o mundo acompanha atônito o massacre da população Palestina com a justificativa de que se pretende desmantelar o Hamas. “Entretanto, esse ‘Hamas’, com muitas aspas, já passa de 30 mil pessoas da sociedade civil que foram mortas. As estruturas do Hamas estão sendo destruídas e junto com elas toda a sociedade Palestina, que já tinha uma situação bastante crítica”, lamenta.
Wallace Góis ressalta ainda que há interesses escusos por trás da ofensiva israelense. “O presidente Benjamin Netanyahu pediu para que os palestinos deixassem Gaza antes de bombardeá-la, para muitos um sinal de compaixão, mas será mesmo? Com a terra vazia, fica mais fácil a ocupação. Já tem, por exemplo, empresa israelense de construção fazendo, digamos assim, projetos computadorizados de pequenos loteamentos de casas, com a frase ‘Morar na praia não é mais só um sonho’”.
Além da indústria imobiliária, o professor denuncia outro setor interessado nas terras palestinas. “A indústria de combustível também quer explorar essa região, porque já se sabe que tem bastante gás e petróleo lá, algo na ordem dos bilhões que vão aos poucos se somando ao motivo do porquê Israel está fazendo o que faz”, constata o professor.
Até mesmo o sólido apoio dos EUA está dando sinais de desgaste diante das atrocidades em Gaza. Para o presidente dos Estados Unidos Joe Biden, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu está “prejudicando mais do que ajudando” Israel com a postura na Faixa de Gaza. A declaração foi feita durante uma entrevista à emissora de TV MSNBC, no dia 9 de março.
“Ele tem o direito de defender Israel, o direito de continuar perseguindo o Hamas, mas ele precisa prestar mais atenção às vidas inocentes que estão sendo perdidas como consequência das ações tomadas”, disse
Apesar da afirmação, Biden disse que não vai deixar Israel e afirmou que não pretende cortar o fornecimento de armas ao país.
Imagem: reprodução do site BBC Brasil
Como está Gaza hoje?
O Comissário Geral da UNRWA Philippe Lazzarini, em discurso na sede da ONU, em Nova York, em 4 de março, denunciou os horrores aos quais o povo palestino está passando diante dos ataques israelenses na Faixa de Gaza, que já duram cinco meses incessantes.
Lazzarini pediu em discurso que o Estado de Israel tome todas as medidas ao seu alcance para impedir a prática de atos no âmbito do Artigo II da Convenção sobre Genocídio, o que inclui permitir a prestação de serviços básicos e assistência humanitária urgentemente necessários.
“Em um período de apenas cinco meses foram mortas mais crianças, jornalistas, profissionais de saúde e funcionários das Nações Unidas do que em qualquer outro lugar do mundo durante um conflito. O número de mortos em Gaza é impressionante. Mais de 30 mil palestinos teriam sido mortos em apenas 150 dias”, disse o comissário e continuou denunciando os excessos do conflito em Gaza.
“É impossível descrever adequadamente o sofrimento em Gaza. 5% da população está morta, ferida ou desaparecida. Os médicos estão amputando crianças feridas sem anestesia, a fome está em toda parte. Mais de 100 pessoas foram mortas há poucos dias enquanto procuravam desesperadamente por comida”, falou Lazzarini se referindo ao ocorrido em 29 de fevereiro, durante uma distribuição de comida e ajuda humanitária na Faixa de Gaza. De acordo com o governo palestino, os soldados israelenses, que intermediavam a distribuição, abriram fogo contra a população. Em nota, as Forças Armadas de Israel disseram apenas que houve “empurrões e correria”, com mortos e feridos.
O duro discurso do comissário geral da agência da ONU levantou questões que o governo Israelense não dá sinais de que pretende responder, ou levar em consideração. “Qual é o destino de cerca de 300 mil habitantes de Gaza isolados no norte, sem acesso ao abastecimento humanitário? Quantas pessoas permanecem soterradas sob os escombros em toda a Faixa de Gaza? O que acontecerá às cerca de 17.000 crianças que estão órfãs, abandonadas num lugar cada vez mais ilegal e perigoso?, indagou.
Lazzarini denuncia ainda que, apesar de todo esse horror passado, a gana do governo sionista sobre a Faixa de Gaza não está perto de acabar. “O pior ainda pode estar por vir. Parece que um ataque a Rafah, onde se concentram cerca de 1,4 milhões de pessoas deslocadas, é iminente. Não há lugar seguro para eles irem”.
O ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023 matou 1.200 pessoas, e fez 253 reféns, segundo cálculos israelenses. Desde então, a campanha militar de Israel matou mais de 30 mil palestinos e feriu quase 73 mil, segundo as autoridades de saúde de Gaza, até o fechamento da matéria.
Apesar da pressão internacional, Israel nega a possibilidade de encerrar os bombardeios na Faixa de Gaza e condiciona um cessar-fogo à libertação de todos os reféns pelo Hamas.
As equipes humanitárias da ONU alertam que 160 crianças estão sendo mortas todos os dias em Gaza. O que representa uma morte a cada 10 minutos. Em 4 meses de guerra, de outubro de 2023 a fevereiro de 2024, O número de crianças mortas na Faixa de Gaza superou o total de crianças mortas em todas as guerras no mundo durante 4 anos, de 2019 a 2022. Os quatro primeiros meses do conflito em Gaza tirou a vida de 12.300 crianças, equanto todas as guerras combinadas de 2019 a 2022 mataram 12.193 crianças, Se acrescentarmos as mortes computadas em março, o número de crianças palestinas mortas ultrapassou os 13 mil, de acordo com o Ministério de Saúde palestino.
Israel sofre pressão de diversos países do mundo para suspender as ações militares na região. Além disso, O governo israelense responde na Corte Internacional de Justiça (CIJ), pela acusação de genocídio em Gaza. Apresentado pela África do Sul, a denúncia foi endossada pelo Brasil.
Israel nega as acusações de genocídio, diz que respeita a lei humanitária internacional e promete continuar as ações militares até destruir totalmente as capacidades militares do grupo Hamas.
Imagem: reprodução do site BBC Brasil
Reféns
O Hamas ainda mantém cerca de 130 reféns capturados no levante de 7 de outubro, segundo o governo de Israel. Em Tel Aviv, centro financeiro do país, milhares de pessoas, entre familiares das vítimas, de soldados mortos e israelenses inconformados com a reação do governo Netanyahu, saíram às ruas no dia 9 de março para protestar contra o governo e pressioná-lo a firmar um acordo com o grupo extremista. As negociações por um cessar-fogo, que prevê a troca de reféns por prisioneiros palestinos.
A ONU divulgou no dia 11 de março, um relatório que apontou que os reféns mantidos em Gaza foram submetidos à violência sexual. A representante especial da ONU sobre Violência Sexual em Conflitos Pramila Patten e uma equipe de especialistas encontraram “informações claras e convincentes” de estupro e tortura sexualizada cometida contra reféns capturados durante os ataques do Hamas.
A missão realizou 33 reuniões com representantes israelenses, examinando mais de 5 mil imagens fotográficas e 50 horas de filmagens em vídeo. Foram realizadas 34 entrevistas confidenciais, inclusive com sobreviventes e testemunhas dos ataques de 7 de outubro, reféns libertados, socorristas e outros. O relatório afirma que as autoridades israelenses enfrentaram vários desafios na coleta de dados.
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