Desinformações praticadas pelos doutores da lei no meio evangélico

Não deveria ser assim, diria Jesus Cristo, mas infelizmente é. Alguns dos autointitulados intelectuais do meio evangélico, por falarem como doutores, cometem desonestidade intelectual. Ao longo das próximas semanas devo apresentar algumas delas, as quais selecionei ora pela importância da temática, ora por sua insistente repetição.

A primeira grande desonestidade é atribuir o fenômeno do pós-cristianismo europeu ao surgimento do chamado liberalismo teológico. Para estes intelectuais o declínio da fé cristã no continente europeu se deu por conta da crescente racionalização da fé, de um profícuo diálogo com a ciência. Ao contrário dos fundamentalistas que, quando muito, instrumentalizam a ciência, apropriando-se das partes que lhes interessam, os chamados teólogos liberais se propuseram a revisionar interpretações, incorporar métodos no fazimento teológico. A perspectiva era dialógica, e não ideológica como fazem os fundamentalistas, pelo simples reconhecimento que nem toda verdade estava na Bíblia.

Os que assim fazem esquecem o desgaste pela longevidade no continente (2000 anos), o que faz com que a institucionalidade ganhe expressões insuportáveis para quem quer viver a singeleza da fé. Em Estudos de Religião é recorrente a noção de as religiões possuem sua maior taxa de expansão justamente no seu início, período em que há mais espontaneidade e menos institucionalização. Ora, ao mesmo tempo que a institucionalização funciona como um foco de permanência, de resistência para um grupo religioso, ela também traz consigo o desgaste, que afasta a instituição da sua própria raiz, da sua crença primeira, como Dostoievski brilhantemente assinalou em O Grande Inquisidor.

Outro esquecimento que me parece seletivo é a ausência de menção das guerras de religião, que varreram o continente europeu, opondo católicos aos protestantes e produzindo milhares de mortes em nome da mesma fé, nos séculos XVI-XVIII. Voltaire chegou a comparar tal insanidade a um trovão irrompendo em pleno sol de meio dia. Ele também sarcasticamente assinalou, em uma de suas Cartas Inglesas, que a Bolsa de Valores de Londres produzia mais resultados em termos de tolerância religiosa e de respeito ao diferente, do que os templos religiosos, dos quais os participantes saíam com menos disposição ao diálogo. Estas estúpidas mortes pelo legado da Cristandade e não do Cristianismo, e muito menos do Cristo, marcaram profundamente a alma do europeu, tornando-o reticente a uma religião que discursa sobre o amor, mas que tem disposição de matar seu semelhante por divergência doutrinária.

Nesta mesma linha que conduz aos equívocos históricos, está o apoio de boa parte da Igreja cristã ao nazismo, bem como a insistência de certos grupos alienados da pesquisa histórica que sustentam que regime hitlerista foi de esquerda. Os que assim procedem esquecem que da invasão da URSS, e do apoio da elite alemã a Hitler para que freasse a escalada da simpatia alemã com a internacional socialista. Sim, minha prezada leitora, o nazismo sacrificou judeus e caçou comunistas. Uma vez desnudados os horrores praticados na 2ª Grande Guerra, a igreja cristã ficou adesivada com este selo da vergonha, deslegitimando sua pregação. Se para Paulo a questão era quem iria ouvir a mensagem do evangelho se não há pregadores que alcancem as diferentes etnias, após a passagem do nazismo a igreja se viu diante de uma atualização: quem vai QUERER ouvir sua pregação?

Por fim, em uma lista que não se esgota em si mesma, é preciso lembrar que parte do escanteamento da fé cristã se deu pela sua própria e inadequada pregação. Há um esquecimento do teor do querigma praticado que obsoletou Deus. Ora, se Deus é anunciado como o cirurgião do plantão eterno, ou como o Rei das melhorias sociais, quando a ciência avança encontrando novas formas, fármacos para a cura, ele se torna, como lembra Harry Emerson Fosdick, obsoleto. O mesmo procede com um governo antenado às necessidades do seu povo. Nesse caso a política traria respostas que antes eram buscadas no templo. Não foi por outro motivo que Ernst Troeltsch aventou a possibilidade da religião se substituída pela Ciência e pela Política.

Se os pregadores querem que Deus seja sempre atual, é preciso falar mais sobre Ele e menos sobre o que Ele pode fazer. Se os pregadores querem que Deus seja assunto do almoço em família, é preciso que eles dialoguem com esse tempo, com suas demandas, em suas prédicas. Caso contrário, seguirão confinando Deus ao passado e declarando sua obsoletização, sua perda crescente de importância, quanto mais respostas a Ciência e a Política fornecerem às pessoas.

Fica então a indagação: por que tais intelectuais evangélicos não abordam estes fatores ao explicarem o declínio cristão na Europa? Por que eles não mencionam que o fundamentalismo tem feito o principal estamento religioso dos Estados Unidos, a saber, a Convenção Batista do Sul, perder membros, entrar em declínio?

**Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia.

***Foto de capa: Imagem de Rudy and Peter Skitterians /Pixabay

Islamofobia e racismo no esporte: o caso do técnico do PSG

O mundo do esporte foi agitado no final de junho com a notícia de que o treinador do PSG (Paris Saint-Germain) Christophe Galtier estava sob investigação do Ministério Público francês por racismo e islamofobia (ódio a fiéis do Islam). Galtier teria comentado que não poderia ter “tantos negros e muçulmanos” na equipe do Nice, na época que foi técnico desse time, segundo declarações de Julien Fournier, seu ex-diretor de futebol. Tanto Galtier quanto seu filho John Valovic-Galtier foram detidos para interrogatórios sob alegação de “discriminação com base em suposta raça ou religião”. O PSG rescindiu o contrato com o treinador.

O racismo e a islamofobia não são recentes na Europa, muito menos na França. O primeiro teve seu ponto ápice, recentemente, com a situação vivenciada por Vini Jr na Espanha. O esporte, neste caso, o futebol, não tem escapado do racismo estrutural que está na base de sociedades brancas e colonizadoras. Um país como a França, que colonizou países africanos, faz agora a expulsão destes por intermédio  de discursos racistas e islamofóbicos. Muitos dos países africanos que foram colonizados por europeus são muçulmanos. Serviram para ser colônia, tiveram suas vidas expropriadas, violadas, mas não servem para gerarem homens e mulheres que escolham viver como cidadãos europeus, franceses e terem projeção social.

A racialização dos muçulmanos é um fenômeno global muito por conta da supremacia branca, consubstanciado por religiões de brancos como o catolicismo e protestantismo, mas também, a xenofobia escancara a violência contra migrantes fruto de orientalismo que se impregnam nos discursos e valores da sociedade europeia. As diversas reações à não presença islâmica vêm sendo sentida por meio de várias proibições: de construções de minaretes ao uso do véu. Apagar a presença islâmica na Europa virou uma nova “cruzada”.

A tentativa de defesa do treinador não é novidade quando se trata de pessoas racistas pois, em geral, tentam se defender daquilo que é indefensável: a violência contra pessoas negras e muçulmanas.  No entanto, ao contrário do que se pensa, a islamofobia não é um fenômeno novo. É um termo conhecido na França desde 1920, reaparecendo com força na década de 1970, termo esse que  deixa claro o repúdio aos muçulmanos e ao Islam.

O que podemos chamar de “medo do Islam” tem relação com os atentados do 11 de setembro de 2001. A “guerra ao terror”, termo usado pelo presidente americano na época, construiu uma forma violenta de rechaço às pessoas muçulmanas, estejam onde estiverem. A associação de homens muçulmanos ao terrorismo e de mulheres muçulmanas como pessoas oprimidas está no imaginário social, levando milhares a incorrer no apagamento de práticas religiosas e ao afastamento dessas pessoas da sociedade.            

O que acontece no futebol acontece em outros lugares de socialização como balneários, escolas, universidades. Compreender os aspectos que delimitam a islamofobia, como ódio e rechaço ao Islam e aos muçulmanos deve fazer parte da descolonização necessária de um pensamento branco e ultraconservador que permeia o universo europeu atual. Práticas racistas e islamofóbicas devem ser combatidas por uma Pedagogia antirracista e anti-islamofóbica que insira esses sujeitos na participação social, como qualquer cidadão com direitos e deveres.

**Os artigos da seção Areópago são de responsabilidade de autores e autoras e não refletem, necessariamente, a opinião do Coletivo Bereia.

***Foto de capa: AbouYassin/Pixabay

Ex-presidente Lula defende a regulamentação das redes sociais

  • Matéria atualizada em 25/11/2021 às 21:03

O portal de notícias evangélico Gospel Prime noticiou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em “excursão” pela Europa (termo colocado na matéria entre aspas, denotando questionamento), defendeu a regulamentação as mídias sociais, bem como a cobrança de impostos para as empresas proprietárias de plataformas. Segundo o Gospel Prime, Lula justificou a questão com o fato de o Brasil tem um presidente que  “conta cinco mentiras por dia em suas redes sociais”.

Imagem: reprodução do Gospel Prime

A entrevista 

Gospel Prime não indica a fonte da matéria que publicou. Bereia verificou que o site religioso se baseou na entrevista dada pelo ex-presidente, em 18 de novembro, ao grupo S&D (Socialista e Democrata) do Parlamento Europeu, durante o  evento “Global progressive forum 2021” (Fórum Global Progressista 2021), disponível em vídeo. Lula foi convidado a debater nesse evento sobre o futuro da democracia e seus riscos. Pautas como desigualdade social, questões climáticas, ecossustentabilidades e democratização das mídias foram debatidas na ocasião.

 Na entrevista, Lula defendeu que o futuro da democracia está na luta contra as desigualdades, “todos têm que ser tratados em igualdade e tenham as mesmas oportunidades”, defende. Quando questionado sobre o futuro da democracia na América Latina, o ex-presidente alegou a importância de defender um modelo político democrático em que os sujeitos tenham “igualdade” em setores como economia, educação, mercado de trabalho e meios de comunicação. A partir desse ponto da entrevista, foi iniciado o questionamento sobre comunicação e mídias sociais. Lula afirmou “os meios de comunicação têm que ser democráticos, todas as pessoas têm que ter direito a serem ouvidas pelos meios de comunicação; não é o dono do jornal, ou o dono da televisão, que é o sensor. É preciso que a sociedade tenha uma participação, nessa democratização dos meios de comunicação”.

A fala sobre “regulamentação das redes sociais”, como foi abordado pelo portal de notícias, se deu quando o ex-presidente mencionou as eleições de Donald Trump à Presidência dos EUA, bem como o uso das mídias sociais pelo presidente Jair Bolsonaro: “no Brasil, nós temos um presidente que conta cinco mentiras por dia, através das redes sociais, mas isso não nega a democracia”

Para Lula, a “regulamentação” se justifica como “empecilhos à maldade” circulante nas mídias sociais (crimes de ódio, manipulação de informações, fake news ou informações que possam vir a tentar contra a integridade humana), “uma coisa é você usar as redes de comunicação para informar, outra coisa é pra fazer maldade, outra coisa é pra contar mentira, outra coisa é pra causar prejuízo a sociedade”, disse. Um dos benefícios da regulamentação, apontado pelo ex-presidente, é a taxação de impostos para que os proprietários de plataformas possam operar no país. 

Lula e a regulamentação da mídia 

Esta não é a primeira vez que o ex-presidente Lula menciona a regulamentação das mídias. Apesar da pauta estar presente desde o seu primeiro mandato e retomado com a ex-presidente Dilma Rousseff, o debate permaneceu “dormente” até o lançamento do livro “Fascismo: ontem e hoje” (escrito por membros da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT), quando Lula retomou a discussão publicamente. Voltando a tocar no assunto em sua viagem realizada pelo Nordeste, no final de outubro, em entrevista concedida à Rádio Metrópole da Bahia, desta vez como uma promessa de campanha, caso venha a se candidatar para as eleições de 2022. Em entrevista Lula afirmou “a regulamentação dos meios de comunicação é do tempo que a gente conversava por carta, é de 1962, olha a evolução que houve nas comunicações, você não acha que a internet tem que ter uma regulamentação? Uma regulamentação que não seja censura, uma regulamentação que permita que a gente conduza a internet mais pro bem que para o mal”. Na mesma entrevista, Lula prometeu enviar para o jornalista José Eduardo, o projeto de regulamentação, para que assim ele possa debater publicamente sobre o projeto. 

Em sua conta pessoal no Twitter, o Lula defendeu seu desejo pela regulamentação da mídia em moldes britânicos

Imagem: reprodução do Twitter

O modelo britânico conta com dois órgãos reguladores da atividade de imprensa: o Press recognition panel (painel de reconhecimento da imprensa), um órgão de autorregulamentação voltado para jornais, revistas e sites; e o Ofcom, órgão voltado para a televisão, telefonia e internet. Dentre as responsabilidades dos veículos de comunicação está a garantia de resposta para aqueles que forem prejudicados pelos veículos, direito à correção de material vinculado, garantia de não exposição de material ofensivo, proteção à integridade pessoal e tratamento justo à pessoa, além da inviolabilidade da privacidade individual. 

Apesar de abordar o tema, o ex-presidente ainda não apresentou projeto público ou proposição quanto à regulamentação da mídia.

Regulamentação e censura

É preciso destacar que regulamentação da mídia não é o mesmo que censura. A Constituição de 1988, em seu artigo 5º, garante a liberdade de expressão e de imprensa, bem como o direito de manifestação individual (desde que não venha a ferir a vida e a dignidade do outro). A regulamentação da mídia é uma demanda que ultrapassa partidos e é defendida há muitos anos na sociedade civil por vários grupos que trabalham com direito à comunicação, incluindo a academia. Regulamentar não quer dizer  o controle ou a proibição de pautas e assuntos, quer dizer criar regras para que as empresas que dominam os meios de comunicação sejam mais inclusivas. A alegação crítica é que os veículos de comunicação brasileiros, há décadas, são dominados por poucas empresas midiáticas, o que enfraquece o debate democrático, privilegia políticos que se tornam donos de mídias, além de não conceder direito à liberdade de expressão para aqueles que estão fora das prioridades ou são avessos aos ideais dos proprietários e dos produtores de conteúdo

Sobre isto, são várias as perguntas colocadas pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) há alguns anos: 

Como o índio, o negro, as mulheres, @s homossexuais, o povo do campo, as crianças e a população das periferias aparecem na televisão brasileira? Como os cidadãos das diversas regiões, com suas diferentes culturas, etnias e características são representados? A liberdade de expressão não deveria ser para todos e não apenas para os grupos que representam os interesses econômicos e sociais de uma elite dominante? Existem espaços para a produção e veiculação de conteúdos dos diversos segmentos da sociedade na mídia brasileira? 

Em sua tese, o doutor em comunicação Camilo Vannuchi defende: 

Conceber o direito humano à comunicação implica entender os cidadãos que participam do sistema de comunicação como sujeitos de direitos. Neste sentido, é oportuno aprimorar o aparato de proteção, sobretudo em relação aos abusos cometidos pelas empresas de mídia: a violação do direito à privacidade, o crime de injúria ou difamação, a exploração da imagem de crianças e vulneráveis, entre outros. Ao mesmo tempo, é fundamental que instâncias jurídicas e organizações da sociedade civil estejam preparadas para lidar com o tema do direito à comunicação. Novas legislações virão se somar às ferramentas ora disponíveis e ajudarão a avançar no sentido de um modelo de comunicação que tenha como princípio a ampliação da esfera pública (ou esferas públicas, no plural) para um sistema que estimule a participação popular, a representatividade regional, econômica, racial e de gênero, e que possa influenciar mais fortemente as ações do Estado no sentido da democracia.

Dentre as propostas contidas no  Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática, criado pelo FNDC em 2013, com vistas à regulamentação da mídia estavam o pedido de veto à propriedade de emissoras de rádio e TV a políticos; criação do Conselho Nacional de Comunicação e do Fundo Nacional de Comunicação Pública; responsabilidade por possíveis danos pessoais e cíveis oriundos da vinculação de uma notícia falsa, dentre outros. O PL não alcançou o número mínimo de assinaturas (1,3 milhões) para garantir sua tramitação. O texto completo da PL pode ser encontrado na tese de doutoramento de Vannuchi.****

Bereia classifica a informação de Gospel Prime como enganosa por tratar-se de informações verdadeiras, cujo desenvolvimento fora distorcido a fim de levar o leitor à uma interpretação negativa da fala do ex-presidente (ideia de censura), suprimindo a natureza do evento em que ele concedeu a entrevista.  Não há elementos suficientes na trajetória de governo Lula e na gravação em vídeo em questão que sustentem que a afirmação significa censura ou uma ameaça à democracia.

Referências:

Youtube. 

https://www.youtube.com/watch?v=AC7lOuwyra0 Acesso em: [23 nov. 2021]

https://www.youtube.com/watch?v=9NAb4tDKvks Acesso em: [24 nov. 2021]

Partido dos Trabalhadores. 

https://pt.org.br/assista-ao-lancamento-do-livro-sobre-os-5-anos-do-golpe-com-lula-e-dilma/ Acesso em: [23 nov. 2021]

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação.

http://fndc.org.br/ Acesso em: [24 nov. 2021]

http://fndc.org.br/clipping/porque-a-regulacao-da-midia-nao-e-censura-952058/ Acesso em: [23 nov. 2021]

http://www.fndc.org.br/noticias/projeto-de-lei-preve-fim-dos-oligopolios-de-midia-no-brasil-924467/ Acesso em: [23 nov. 2021]

http://www.fndc.org.br/download/guia-de-mobilizacao-da-lei-da-midia-democratica-preto-e-branco/publicacoes/195/arquivo/guia-de-mobilizacao-lmd-final-pb-1.pdf  Acesso em: [23 nov. 2021]

Folha de São Paulo.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/09/lula-pressiona-pt-a-retomar-debate-sobre-regulacao-da-midia.shtml Acesso em: [23 nov. 2021]

Biblioteca USP.

https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/27/27164/tde-26022021-222743/pt-br.php  Acesso em: [23 nov. 2021] 

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Imagem de capa: frame de vídeo da entrevista de Lula / El Pais

Liberdade religiosa e Covid-19: uma reflexão das Igrejas europeias

Publicado no site IHU em 01/05/2020

O grupo temático sobre Direitos Humanos da Conferência das Igrejas Europeias refletiu sobre a liberdade religiosa ou de crença durante a luta contra a Covid-19.

Conferência das Igrejas Europeias (KEK) publicou um documento com 10 pontos no qual reflete e analisa a questão da liberdade religiosa e de culto à luz das restrições que estão sendo vividas, em nível mundial, após a pandemia do coronavírus.

“A proibição das celebrações pascais nas igrejas é apenas um exemplo das restrições de longo alcance ao exercício de muitos direitos humanos e liberdades civis em todo o mundo, que fazem parte de um esforço para garantir que a distância física evite eficazmente as infecções de pessoa a pessoa. Como não houve qualquer restrição comparável nos tempos modernos à liberdade religiosa ou a muitos outros direitos fundamentais, e como esses direitos geralmente são vistos como a espinha dorsal da nossa democracia e do Estado de direito na Europa, o Grupo Temático sobre os Direitos Humanos da Conferência das Igrejas Europeias examinou atentamente as questões em jogo”, afirma o texto, que relaciona as várias questões que atravessam as medidas de contenção das atividades sociais.

KEK parece encontrar um ponto de síntese em uma dialética capaz de manter um equilíbrio, por um lado, entre a salvaguarda da vida humana e a proteção das camadas mais frágeis da população, que “é um valor muito alto também do ponto de vista religioso e deve ser equilibrado com a necessidade de comunidade e de encontro”, e, por outro, a certeza de que as restrições dos direitos fundamentais têm uma base jurídica e são “necessárias, adequadas, razoáveis e geralmente proporcionais em relação ao objetivo a que servem e ao direito que limitam”.

Os 10 pontos propõem uma reflexão sobre o tipo de pandemia que estamos vivendo, sobre a limitação da liberdade religiosa ou de crença (Freedom of religion or belief – FoRB) cuja limitação está prevista em caso de emergências de saúde pública, sobre o caráter de salvaguarda da vida humana previsto pelas medidas de restrição que, nessa perspectiva, não deve ser “entendida como discriminação e perseguição religiosa” e sobre a “coerência na aplicação do ‘fechamento’, especialmente no que diz respeito à necessidade de tratar todos os atores do mesmo modo, de acordo com a suas comparabilidade objetiva”.

O documento conclui que, “embora seja sempre necessário, nos Estados democráticos baseados em regras, observar, discutir e controlar de perto as ações do governo, especialmente quando limitam os direitos fundamentais, este não é o momento para uma incompreensível “desobediência civil“, e convida os cidadãos e cidadãs, caso tenham dúvidas sobre a legalidade de qualquer procedimento, “a recorrer aos tribunais para avaliar e, se necessário, corrigir as medidas em questão”.

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Conferência das Igrejas Europeias  (CEC ) é uma irmandade de cerca de 116 ortodoxos, protestantes, anglicanas e antigas igrejas Católica de todos os países da Europa, além de 40 Conselho Nacional de Igrejas e Organizações em Parceria. A CEC foi fundada em 1959 e tem escritórios em Bruxelas e Estrasburgo.

Imagem de destaque: http://www.arquidiocesedepassofundo.com.br/formacao/liturgia/leitura-orante-da-palavra-de-deus