“Congresso Americano” não enviou carta com cobranças a ministro do STF do Brasil

Parlamentares brasileiros e outros políticos alinhados ao extremismo de direita no País divulgaram, no final de junho, em viagem aos Estados Unidos, uma carta que denuncia supostas violações aos direitos humanos de brasileiros conservadores. Tal documento seria uma resposta ao apoio dado a eles pelo Congresso Americano. 

O grupo de brasileiros se articulou com parlamentares da direita estadunidense para denunciar as supostas violências contra quem denominam “cidadãos conservadores”. O grupo alega que brasileiros estariam sofrendo ataques aos direitos humanos, em grande escala, cometidos por autoridades brasileiras.  A carta, datada de 21 de junho passado, foi divulgada em perfis de mídias sociais no Brasil, e é dirigida ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, com a demanda que ele responda às perguntas feitas pelo autor, o  congressista estadunidense Chris Smith. 

Imagem: reprodução/X (antigo Twitter)

Imagem: reprodução/X

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A divulgação deste conteúdo provocou muitos debates nas redes em torno da validade de uma tentativa de ingerência do “Congresso Americano” em uma instituição do Estado brasileiro.  Bereia checou a informação. 

Quem é o deputado estadunidense Chris Smith 

Chris Smith é um deputado do Partido Republicano, representante do Estado de Nova Jersey, no Congresso dos Estados Unidos. Ele integra o Subcomitê de Direitos Humanos da Comissão de Relações Internacionais da Casa dos Representantes

Em 7 de maio, Smith recebeu uma comitiva de parlamentares e outras personagens políticas do Brasil, publicamente identificados com o extremismo de direita, do Brasil para uma audiência que promoveu em uma das comissões do Congresso. Na ocasião, foi discutido o relatório produzido no âmbito da Comissão a que Chris Smith pertence, com o título “O ataque à liberdade de expressão e o silêncio do governo Biden: o caso do Brasil”.

Nesse relatório, os governos do Brasil e dos Estados Unidos são acusados de buscar silenciar críticos nas redes sociais. O conteúdo foi divulgado logo após as críticas publicadas pelo proprietário da rede X, o megaempresário Elon Musk, com o questionamento das decisões do STF, localizadas apenas no  ministro Alexandre de Moraes. O STF havia determinado a suspensão de contas que promovem informações falsas, em especial contra o processo eleitoral brasileiro.

A carta enviada pelo deputado Chris Smith foi dirigida ao ministro do STF, responsável pelos inquéritos de ataques democracia desde 2020 (fake news e invasão dos prédios em Brasília em 8 de janeiro de 2023). 

Imagens: reprodução/X

Entre as questões levantadas na carta constam alegações de censura prévia a jornalistas e outras figuras públicas. Além disso, questiona ações governamentais que poderiam ter cerceado a liberdade de imprensa, como congelamento de ativos financeiros e outras restrições civis.

Smith contesta processos e medidas cautelares exigidas a membros do Parlamento brasileiro em função de suas responsabilidades legislativas. A carta também destaca o cumprimento devido ao processo legal em investigações e processos contra indivíduos, incluindo aqueles que residem nos Estados Unidos.

O documento, ainda, levanta questões sobre possíveis casos de punições transnacionais, em que agências dos EUA ou outras organizações internacionais estariam perseguindo indivíduos em território americano. 

A comitiva recebida por Chris Smith 

Nos meses de março e maio deste ano, uma comitiva de parlamentares e outras personagens políticos alinhadas à extrema direita no Brasil viajou aos Estados Unidos. O objetivo foi a busca de apoio de parlamentares afins, contra as investigações na Suprema Corte brasileira, a que alguns deles e apoiadores estão submetidos, nos casos de ataques à democracia no País. Em março, o grupo defendeu a existência de uma “ditadura de esquerda” no país e tentou convencer os parlamentares do Partido Republicano de que o Brasil não é mais uma democracia.

A comitiva propôs que os congressistas estadunidenses aprovem uma lei que penalize as autoridades brasileiras, o que seria justificado diante do que alegam ser uma violação dos direitos de conservadores. O grupo pediu, ainda, que o governo estadunidense aplique sanções ao Brasil, para que a suposta “ditadura de esquerda” seja derrotada.

Imagem: reprodução/UOL

Na nova visita da comitiva de brasileiros, em maio, ocorreu a audiência na Comissão de Relações Internacionais. Viajaram para os Estados Unidos a deputada federal Bia Kicis (PL-DF), os deputados federais Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Rodrigo Valadares (União-SE), Nikolas Ferreira (PL-MG), Gustavo Gayer (PL-GO), Marcos Pollon (PL-MS), Filipe Barros (PL-PR), Cabo Gilberto Silva (PL-PB),  Marcel van Hattem (Novo-RS), Messias Donato (Republicanos-ES) e Coronel Ulysses (União-AC), mais o senador Eduardo Girão (Novo-CE). 

Além dos parlamentares, participaram da audiência o ex-comentarista da TV Jovem Pan Rodrigo Constantino, o blogueiro foragido da Justiça brasileira Allan dos Santos e o ex-procurador Deltan Dallagnol (NOVO), eleito deputado federal pelo Podemos, em 2002, mas cassado em 2023, por irregularidades na campanha eleitoral.

O grupo também participou de reuniões mobilizadas pelo Conservative Caucus, uma fundação que reúne cidadãos alinhados ao conservadorismo político, para fazer “lobby” com congressistas americanos para aprovar leis e invalidar “gastos de iniciativas da esquerda”.  

Comitiva de oposição 

O objetivo inicial da comitiva de extremistas de direita do Brasil acabou sendo frustrado por articulações do deputado democrata Jim McGovern, que divide a presidência da Subcomissão de Direitos Humanos da Comissão de Relações Internacionais do Congresso estadunidense com o deputado republicano Chris Smith, e deu outro tom às discussões da audiência. 

McGovern não compareceu à audiência, mas enviou uma declaração. No texto, acessado pela Agência Pública, o deputado classifica a audiência como um “uso vergonhoso” do Congresso dos Estados Unidos pela extrema direita brasileira “para amplificar seu ataque à democracia no Brasil, auxiliado e encorajado por membros do Partido Republicano”. 

A contraofensiva por deputados do Partido Democrata deveu-se à visita de outra comitiva de brasileiros, de oposição à outra, esta de parlamentares de esquerda. A viagem ocorreu entre 29 de abril e 2 de maio,  formada pelos deputados federais Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Rogério Correia (PT-MG), Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) e Rafael Brito (MDB-AL), e pelos senadores Humberto Costa (PT-PE) e Eliziane Gama (PSD-MA). 

Eliziane Gama, líder do grupo, afirmou que a ida ao país teve como objetivo “desconstruir a ideia errada, que o campo da extrema direita no Brasil tem tentado pregar mundo afora, de que o Brasil está passando por uma censura e caminhando para uma ditadura”. A senadora considera que a ação alterou o rumo da audiência. “Acho que acabou sendo frustrante para eles [a comitiva da direita]”.

O senador Humberto Costa, explicou à Agência Pública que o grupo  “explicou pra eles que no Brasil [o conceito de liberdade de expressão] é diferente. Aqui no Brasil, por exemplo, você não pode fazer discurso a favor do racismo e dizer que é liberdade de expressão. Você não pode defender ideias nazistas. Você não pode defender crimes. Não dá pra fazer essa comparação da legislação brasileira com a legislação americana. Essas pessoas estão sendo processadas e estão tendo as suas redes sociais bloqueadas porque estão cometendo crimes no Brasil”.

A carta de Chris Smith tem valor jurídico?

Apesar da repercussão com a divulgação da carta de Chris Smith, por perfis extremistas de direita, o que serve de pressão sobre a Corte, o especialista em Direito Internacional Professor Guilherme Bystronski, ouvido pelo Bereia, esclarece que, ao contrário do que se quer parecer crer, o documento  não tem efeito prático algum. 

Segundo Bystronski, “na medida em que o Brasil é país soberano, nossos poderes constituídos não podem ser objeto de quaisquer atos de constrição determinados por agentes de outros países”.  Como os EUA não têm jurisdição sobre o Brasil ou sobre um agente público,  a carta de um congressista americano tem o mesmo valor de uma carta que qualquer outra pessoa enviasse para algum ministro do STF, e pode ser  prontamente desconsiderada pelo ministro do STF, ao qual foi dirigida, Alexandre de Moraes, explicou o professor.

O especialista em jurisprudência penal, professor Caio Paiva, também reforça que os EUA não são uma instância internacional e que o poder judiciário brasileiro não está submetido em nenhum sentido a autoridades deste país. Em publicação na rede X, que questionou a divulgação da carta por Deltan Dallagnol, como pessoa que conhece as leis, Paiva afirma:

“Na prática, a intimação de um congressista americano com questionamentos para o Ministro Alexandre de Moraes tem o mesmo valor que uma intimação de um vereador de Osasco: nenhuma. Os EUA não exercem qualquer jurisdição sobre o Brasil. O ministro Alexandre de Moraes não tem capacidade jurídica de pessoa internacional. O Estado brasileiro, sim, pode ser processado em instâncias internacionais (os EUA não são uma delas). Na história, associar os EUA como ‘polícia do mundo’ representa uma rendição ao imperialismo. Por fim, o entusiasmo de Deltan contradiz um princípio caro até mesmo para o conservadorismo-nacionalista: ceder a outro país poder sobre Poder Judiciário nacional.”

Imagem: reprodução/X

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Bereia classifica o conteúdo da divulgação da carta emitida pelo deputado dos Estados Unidos Chris Smith, em mídias de políticos alinhados ao extremismo de direita no Brasil, como enganoso. A carta é verdadeira e foi, de fato, enviada por Smith, porém, quem divulga o conteúdo atribui à carta  um valor simbólico ou legal que ela não tem e induz o público ao engano.

Bereia alerta leitores e leitoras para este tipo de ação nas redes. A repercussão da carta do congressista dos EUA  pode ser caracterizada como uma estratégia de ativismo político-judicial, ser instrumentalizada para fins políticos, para colocar pressão sobre o STF, para objetivos particulares serem alcançados. Isto já era praticado anteriormente, como Bereia já checou em várias matérias, o que envolve as mesmas personagens, e reforça o alerta para o que ocorre em ano eleitoral. 

Referências de checagem:

Uol Notícias

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2024/06/21/congressista-dos-eua-manda-carta-a-moraes-cobrando-por-abusos-apontados-por-bolsonaristas.htm Acesso em 28 JUN 24

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2024/05/27/camara-pagou-pelo-menos-r-528-mil-a-deputados-que-foram-aos-eua-denunciar-censura-de-moraes.htm

Acesso em 28 JUN 24

https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-publica/2024/04/11/como-eduardo-bolsonaro-e-comitiva-articulam-com-parlamentares-dos-eua-punicoes-ao-brasil.htm Acesso em 02 JUL 24

Carta Capital

https://www.cartacapital.com.br/politica/deputado-r epublicano-dos-eua-manda-carta-a-moraes-e-pede-resposta-em-ate-10-dias/ Acesso em 28 JUN 24

Aos Fatos

https://www.aosfatos.org/noticias/satira-congresso-eua-afastamento-alexandre-de-moraes/ Acesso em 28 JUN 24

Metrópoles

https://www.metropoles.com/colunas/paulo-cappelli/camara-estados-unidos-aciona-oea-sobre-decisoes-de-moraes Acesso em 28 JUN 24

https://www.metropoles.com/brasil/comite-da-camara-dos-eua-divulga-relatorio-que-acusa-moraes-de-censura Acesso em 28 JUN 24

Agência Pública

https://apublica.org/2024/04/como-eduardo-bolsonaro-e-comitiva-articulam-com-parlamentares-dos-eua-punicoes-ao-brasil/ Acesso em 01 JUL 24

https://apublica.org/2024/05/ditadura-de-esquerda-governistas-e-bolsonaristas-celebram-desfecho-de-audiencia-no-congresso-dos-eua/ Acesso em 01 JUL 24

Foreign Affairs Committe

https://foreignaffairs.house.gov/ Acesso em 01 JUL 24

https://chrissmith.house.gov/biography/ Acesso em 01 JUL 24

Brasil de Fato

https://www.brasildefato.com.br/2024/04/12/como-eduardo-bolsonaro-e-comitiva-articulam-com-parlamentares-dos-eua-punicoes-ao-brasil Acesso em  JUL 

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Foto de capa: Natalia FaLon/Pixabay

Ministra Cármen Lucia é acusada em mídias digitais de assinar carta pró-aborto

* Matéria atualizada às 11:31

Circulou nas mídias sociais e portais de notícias gospel a notícia de que ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármem Lúcia Rocha, participou de uma reunião fechada com ativistas feministas e assinou carta pró-aborto. Nas matérias vinculadas ao tema é apontado ainda que a reunião realizada pela ministra em seu gabinete contou com cerca de 30 mulheres ligadas a partidos de esquerda progressistas, como a ex-senadora Marta Suplicy, resultando em uma carta pública em defesa do aborto. 

Imagem: Reprodução portal Gospel Prime

De acordo com os sites de notícias, a reunião aconteceu em ambiente fechado e houve, por parte da ministra e de Marta Suplicy, a tentativa de “disfarçar” a defesa do aborto usando o termo “direitos sexuais e reprodutivos das mulheres”, criando assim uma “carta pró-aborto”, que legalizaria e incentivaria o procedimento.

Imagem: reprodução Twitter Gazeta do Povo

Bereia checou as informações. A carta assinada pela ministra se refere à Carta Aberta Brasil Mulheres, texto publicado pelo portal Brasil mulheres, fruto da reunião realizada em 28 de janeiro de 2022, organizada pela ex-senadora Marta Suplicy em sua casa. O encontro contou com a participação de 28 mulheres convidadas, dentre elas a ministra Cármen Lúcia, a escritora e filósofa Djamila Ribeiro, a líder do movimento Sem-Teto do Centro Carmem Silva e a secretária municipal de Cultura de São Paulo Aline Torres, além de outras. O debate durou pouco mais de dez horas, e aprovou 19 tópicos com demandas dirigidas aos futuros presidenciáveis. 

O texto final intitulado “Carta Aberta Brasil Mulheres” tem temas variados que se estendem, desde o pedido por políticas públicas para mulheres negras, afirmação de direitos à população LGBTQ+, direito à saúde reprodutiva feminina até propostas em prol dos direitos de mulheres sob custódia do sistema prisional. Em entrevista à Folha de São Paulo, Suplicy afirma que “são propostas para que a sociedade reflita sobre essas demandas que essas mulheres têm. Aqui são mulheres de várias áreas, de várias condições, com muito sofrimento, muita dor, muita alegria, muita superação, muito sucesso. Tem de tudo. É uma somatória de bagagens mil”, afirmou. A ministra Carmém Lúcia estava presente durante o processo de debate e escrita da carta, chegando a discursar durante a reunião. 

Pautas sobre a legalização e regulamentação do aborto foram apresentadas e dabatidas na reunião, e, por opção das mulheres presentes, o termo “aborto” foi tratado como tema geral referente à saúde reprodutiva feminina, não havendo nenhuma inferência direta na criação de um projeto pró-abortivo. 

Fonte: Captura de tela canal Brasil Mulheres no Youtube 

A carta 

A carta aberta dirige-se ao público geral e também aos futuros presidenciáveis, contando com 19 pontos. Leia na íntegra:

  1. Não aceitar qualquer retrocesso nas leis que garantam os direitos das mulheres. Não vetar avanços oriundos do Congresso Nacional aos direitos das mulheres;
  2. Paridade transversal de gênero e equidade de raça nas instituições públicas, políticas e privadas;
  3. Estímulo e facilitação de candidaturas femininas competitivas. Garantia de cumprimento da legislação eleitoral em relação às mulheres;
  4. Garantia da alocação de recursos para políticas públicas destinadas a meninas e mulheres nas leis orçamentárias (plano plurianual, lei de diretrizes orçamentárias e lei do orçamento anual) e ferramentas efetivas para acompanhamento da execução desses gastos;
  5. Desenvolvimento de macropolíticas econômicas e sociais com vistas à geração e manutenção de empregos e renda para mulheres. Acesso a crédito para mulheres empreendedoras; conexão com inovação, programas de educação empreendedora para geração de renda; acesso ao mercado por meio de cotas de compras de empresas públicas e privadas. Qualificação profissional, para autonomia financeira, de mulheres negras, indígenas, quilombolas e em situação de vulnerabilidade social;
  6. Implementação de uma política de renda básica universal capaz de mitigar a pobreza, a fome, as desigualdades socioeconômicas e violências decorrentes;
  7. Universalização da educação infantil, garantindo o atendimento aos indicadores nacionais de qualidade para esta etapa de ensino. Promoção da oferta educacional laica e gratuita e a ampliação da escolaridade. Cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação. Incentivo à educação em ciência, tecnologia e empreendedorismo para meninas e mulheres, com atenção à juventude negra. Priorização na educação em geral e na educação de jovens e adultos (EJA), possibilitando que as mães estudem no mesmo período que os filhos e/ou criando espaços de cuidado para crianças no local de estudo da mãe;
  8. Construção de um programa nacional de incentivo a formação de novas gerações de atletas femininas (cis e trans) em diversas modalidades, incentivando o investimento na manutenção das potências esportivas que atuam e representam o Brasil.
  9. Ampliação de políticas de ações afirmativas étnico-raciais reparatórias – educacionais, de paridade econômica e memória – visando a erradicação das desigualdades socioeconômicas existentes na sociedade;
  10. Promoção da saúde integral da mulher ao longo de todo o ciclo de vida, com especial atenção à mulher idosa. Manutenção e expansão dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Investimento em pesquisas científicas, campanhas preventivas e de estímulo à vacinação. Valorização e defesa do Sistema Único de Saúde (SUS);
  11. Reconhecimento do trabalho doméstico e de cuidados, como centrais à vida; reengenharia do tempo e fortalecimento da economia dos cuidados para melhoria das condições de vida e bem-estar das mulheres. Atenção ao tema da economia do cuidado (ou do trabalho reprodutivo) por meio de políticas públicas e arcabouço normativo que valorizem o trabalho, remunerado ou não, das mulheres que cuidam;
  12. Respeito e preservação dos direitos de todas as famílias em suas múltiplas manifestações. Ampliação da licença parental com equidade de gênero. Educação masculina para os cuidados. Políticas públicas que se guiem pela proteção das mulheres nas violências intrafamiliares. Garantia de vagas em creches de forma contínua, em período integral, para todas as crianças na condição de serviço público essencial. Iniciativas de amparo às crianças e adolescentes com mães presas, órfãos do feminicídio ou mães em situação de extrema vulnerabilidade;
  13. Enfrentamento ao discurso de ódio, violência política e institucional e cerceamento da liberdade de expressão de todas as mulheres, em especial proteção contra os ataques às mulheres jornalistas, políticas, artistas e defensoras de direitos humanos;
  14. Defesa da vida de meninas e mulheres, cis, trans e travestis. Enfrentamento ao feminicídio, às violências doméstica, política, física, psicológica, obstétrica, simbólica, moral e patrimonial. Estabelecimento de uma política integral de acolhimento e cuidado de mulheres e crianças em situação de violência. Desenvolvimento de um programa nacional de prevenção à violência sexual e de acolhimento às vítimas e às famílias de vítimas. Formulação de um marco civil de gênero;
  15. Adoção de uma abordagem pacífica para a reforma da política de drogas, com atenção às mulheres que respondem por delitos relacionados a drogas, cuidado pautado na redução de danos. Garantia de direitos e incentivo a produção de dados sobre o tema;
  16. Reforma no modelo de segurança pública – enfrentamento ao encarceramento em massa, aos índices de homicídio da população negra, efetiva implementação da lei de execuções penais (acesso aos autos do processo, remissão pela leitura e cultura, garantia de direitos sexuais, reprodutivos e saúde menstrual, trabalho decente, educação nas áreas tecnológicas e de cultura, estrutura adequada das cadeias e prisões, acesso ao direito de defesa), garantia de saúde mental para pessoas presas e seus familiares. Consulta a pessoas trans, travestis, não-binárias ou intersexo sobre a preferência pela custódia em unidade masculina, feminina ou específica, se houver, com a devida garantia de proteção em qualquer das unidades. Envolvimento dos três entes federados na inclusão e garantia de direitos de adolescentes em conflito com a lei, pessoas encarceradas e seus familiares e egressas;
  17. Recriação do Ministério da Cultura. Desenho e implementação de políticas de memória que valorizem as mulheres. Fomento à cadeia produtiva cultural nacional (leis de incentivo). Políticas de incentivo ao livro e à leitura, com formação de público leitor. Valorização de artistas e sua produção. Criação e manutenção de aparelhos de cultura. Retomada do vale cultura. Respeito à liberdade de expressão artística e cultural;
  18. Valorização dos saberes de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, na garantia da justiça climática e enfrentamento ao racismo ambiental, com implementação e cumprimento das normas ambientais de espectro local e global;
  19. Garantia da implementação de políticas intersetoriais para a proteção integral de mulheres refugiadas, migrantes legais e ilegais.

Bereia classifica a notícia como imprecisa, com título enganoso. A carta em questão existe e foi assinada pela ministra, porém o documento trata de um esforço coletivo de mulheres em prol de melhores condições de vida para este segmento da população, não havendo incentivo ou sinalização de legalizar o aborto, mas sim a defesa da manutenção e expansão dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. A ministra Cármen Lúcia é uma das mulheres que participaram do projeto, mas não sua principal argumentadora ou organizadora. A abordagem dada pelos veículos busca atribuir a ela um expressivo poder sobre a redação final do manifesto, não levando em consideração outras mulheres e pautas envolvidas no processo. 

Bereia avalia que este tipo de desinformação faz parte de um repertório que busca: 1) alimentar pânico moral em torno da afirmação de que grupos de esquerda e progressistas são defensores do aborto com vistas ao processo eleitoral 2022, repetindo o que ocorreu em pleitos anteriores para conquista de público religioso para propostas de cunho conservador, negadoras da manutenção e da ampliação de direitos para mulheres; 2) sustentar discursos anti-STF, que têm sido pauta de grupos bolsonaristas em mídias sociais, desde o primeiro ano do mandato do atual governo. Estes dois repertórios desinformativos vêm sendo verificados pelo Bereia e por outros projetos de checagem de conteúdo.

Foto de capa: Nelson Jr./SCO/STF

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Referências: 

Brasil Mulher. https://brasilmulheres.com.br/ Acesso em: 07 de fev. de 2022

Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=5D81js5L-K8&t=3s Acesso em: 07 de fev. de 2022

Folha de São Paulo. https://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2022/01/grupo-liderado-por-marta-suplicy-pede-direitos-as-mulheres-cis-e-trans-em-carta-a-nacao.shtml acesso em: 07 de fev. de 2022

Geledés. https://www.geledes.org.br/carta-aberta-brasil-mulheres/ Acesso em: 07 de fev. de 2022 

Twitter. https://twitter.com/gazetadopovo/status/1489294791397552133?s=20&t=mAgEwleRRGTOjzRVWVYI0Q cesso em: 07 de fev. de 2022

Site religioso repercute carta sobre suposta morte decorrente da vacina AstraZeneca

O site Pleno.News divulgou a seguinte matéria, em 19 de setembro: “Mãe que perdeu o filho após vacina escreve carta a Queiroga”. A mãe em questão é Arlene Ferrari Graf, e a carta que foi destinada ao Ministro da Saúde Marcelo Queiroga, chama atenção para os supostos perigos da vacinação contra a covid-19. Bruno Oscar Graf, 28 anos, faleceu no dia 24 de agosto deste ano, vítima de um Acidente Vascular Cerebral (AVC) decorrente de uma trombose. 

Reprodução da internet

Na carta, Arlene Graf acredita que a vacina da AstraZeneca, que combate a covid-19, é que pode ter causado o óbito do filho. Ele foi vacinado em 14 de agosto – dez dias antes da morte – no Centro de Vacinação do Parque Vila Germânica, Blumenau-SC. 

Arlene Ferrari publicou em sua conta no Twitter, em 14 de setembro, uma carta aberta endereçada ao Ministro da Saúde Marcelo Queiroga.  Arlene afirma que exames enviados à Espanha foram conclusivos ao afirmar que seu filho faleceu em decorrência da vacina AstraZeneca. O site Pleno News reproduziu o conteúdo publicado por Ferrari sem apuração do conteúdo. 

Reprodução da internet

Produção no Brasil e estudos científicos 

A vacina Oxford/AstraZeneca contra a covid-19  foi lançada no Brasil em 17 de janeiro de 2021, após aprovação de uso emergencial autorizado pela  da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A Agência concedeu o registro definitivo em 12 de março e é a vacina produzida no país pela Fundação Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro (Fiocruz). Entre os efeitos colaterais previstos e disponíveis para consulta no site da Fundação, estão dores de cabeça, enjoos (náuseas), dores nas articulações ou dores musculares. 

O imunizante não aumenta o risco de um distúrbio raro de coagulação sanguínea após a segunda dose, conforme mostra estudo publicado na revista científica Lancet

O estudo afirma que o distúrbio é raro e ocorreu em 2,3 por milhão em pessoas que receberam uma segunda dose da vacina, segundo a pesquisa, liderada e financiada pela própria AstraZeneca. O número é comparável ao que é encontrado em uma população não vacinada. O resultado do estudo foi amplamente divulgado nas mídias noticiosas como BBC, CNN Brasil, O Globo e Agência Brasil.e até pelo próprio Pleno.News, em matéria de 28 de julho de 2021. 

De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz,  um estudo de pesquisadores da Universidade de Oxford indica que o risco de ocorrer trombose venosa cerebral (CVT, no acrônimo em inglês) em pessoas contaminadas com Covid-19 é consideravelmente maior do que nas que receberam vacinas baseadas na tecnologia de RNA mensageiro (mRNA), como os imunizantes da Pfizer, Moderna e Oxford/AstraZeneca, produzida no Brasil pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). 

A Fiocruz – produziu um série de vídeos tirando dúvidas sobre a vacina contra covid-19 São perguntas e respostas a partir das principais questões recebidas nas redes. As dúvidas são respondidas pela pesquisadora da instituição Margareth Dalcolmo. 

Movimentos antivacina e teorias da conspiração

Movimentos organizados antivacina e grupos adeptos a teorias das conspiração têm se aproveitado de casos semelhantes para propagar a desinformação e gerar pânico. Sites sensacionalistas e “blogueiros” em busca de cliques e alcance embarcam em temas que possam gerar o maior engajamento possível. Desde o início da pandemia de covid-19, uma profusão de notícias falsas tomou conta das redes sociais digitais. 

Arlene Ferrari compartilhou diversas informações sem fontes ou sem qualquer embasamento científico, e suas publicações também foram reproduzidas milhares de vezes. Arlene participou de audiência pública na Câmara de vereadores de Goiânia  e lives em redes sociais digitais e o caso de Bruno Graf foi tema do  programas de debate 4 por 4, pró-governo federal brasileiro, comandado por Luís Ernesto Lacombe e participação de Guilherme Fiuza, Rodrigo Constantino e Ana Paula Henkel.

Reprodução do Twitter
Reprodução do Twitter
Reprodução do Twitter

Uma das pautas da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 no Senado Federal é a investigação da negação da eficácia de vacinas presente entre autoridades federais, como o Presidente da República, que levou a políticas como o retardo na aquisição de imunizantes e compras em número insuficiente.  

Pleno.News, mídia digital religiosa que atua no apoio ao governo federal,  produziu a matéria sem recorrer a qualquer estudo científico, declaração de especialista da área ou nota oficial de órgãos de saúde que sustentem as afirmações de Arlene Graf. O site gospel apenas reproduziu a carta aberta e utilizou de título para induzir leitores/as a concluírem que a vacina Oxford/AstraZeneca foi a responsável pela morte do jovem Bruno Graf. O fato do mesmo veículo já ter publicado matéria sobre o estudo que desconstrói a versão  de mortes decorrentes da vacina reforça a intencionalidade em desinformar no tocante a este caso. 

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Bereia classifica a matéria do site Pleno. News como imprecisa. O site toma como verdade o conteúdo divulgado pela mãe do jovem falecido sem realizar a básica demanda de apurar dados para dar forma à notícia. Além disso, faz uso de título que leva leitores/as a crerem que mãe perdeu filho após ele ter tomado a vacina contra covid-19 e cria pânico em torno da vacinação, sem oferecer dados comprovados, o que pode gerar rejeição à imunização da população. A pesquisa empreendida pelo Bereia leva em conta a dor da mãe que perdeu o filho e busca explicações, mas não encontrou elementos científicos que comprovem que um indivíduo tenha morrido em decorrência da vacina. Bilhões de pessoas já receberam vacinas pelo mundo e os casos de covid-19 têm caído drasticamente, demonstrando a eficácia esperada.

Referências:

Fiocruz. https://agencia.fiocruz.br/anvisa-autoriza-uso-emergencial-da-vacina-da-fiocruz Acesso em: 26 set 2021.

Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/saude/audio/2021-03/anvisa-aprova-registro-definitivo-da-vacina-de-oxford Acesso em: 26 set 2021.

Fiocruz. https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos/bula-vacina-covid19_bio.pdf Acesso em: 26 set 2021.

YouTube. https://www.youtube.com/playlist?list=PLQ_83_lsoGE6c2nkBKSCJhGpha6FDaYTs Acesso em: 26 set 2021.

The Lancet. https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(21)01693-7/fulltext Acesso em: 23 set 2021. 

Fiocruz. https://portal.fiocruz.br/noticia/risco-de-trombose-por-covid-19-e-maior-do-que-por-vacinas Acesso em: 23 set 2021.  

BBC. https://www.bbc.com/portuguese/internacional-56671034 Acesso em: 22 set 2021.

CNN. https://www.cnnbrasil.com.br/saude/segunda-dose-da-astrazeneca-nao-aumenta-risco-de-coagulos-sanguineos-diz-estudo/ Acesso em: 22 set 2021.

O Globo. https://oglobo.globo.com/saude/segunda-dose-de-vacina-da-astrazeneca-nao-aumenta-risco-de-trombose-mostra-estudo-25129939  Acesso em: 22 set 2021.

Agência Brasil. https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/saude/audio/2021-07/estudo-aponta-que-2a-dose-da-astrazeneca-nao-aumenta-risco-de-trombose Acesso em: 22 set 2021.

El Pais. https://brasil.elpais.com/brasil/2021-05-13/diretor-da-pfizer-escancara-atraso-letal-do-governo-bolsonaro-na-compra-de-vacinas.html Acesso em: 27 set 2021.

Pleno.News. https://pleno.news/saude/coronavirus/estudo-2a-dose-da-astrazeneca-nao-aumenta-risco-de-trombose.html Acesso em: 22 set 2021.

Programa 4 por 4. https://twitter.com/vejaocentro/status/1437404416752111623 Acesso em: 22 set 2021.