Justiça mantém condenação de advogada por discurso de ódio contra muçulmanos
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) manteve a condenação da advogada Ana Paula Sanches, que foi obrigada a pagar R$ 20 mil por danos morais coletivos após fazer declarações ofensivas à pessoas de fé muçulmana. O caso foi julgado pela 7ª Câmara de Direito Privado, que entendeu que as falas da ré extrapolaram os limites da liberdade de expressão e incitaram o ódio religioso.
A ação, movida pela Associação Nacional dos Juristas Islâmicos (ANAJI), alegou que Sanches incitou ódio religioso contra muçulmanos. Em um dos vídeos publicados no Instagram, a advogada declarou:“se tem uma casta que não explode cristãos, não tem que se sentir ofendido porque eu não estou falando deles. Eu estou falando da casta, que em sua maioria, explode cristãos”. De acordo com o Tribunal, a utilização de expressões como “explosão” e “bomba” para insinuar pela violência contra cristãos caracteriza incitação ao ódio.
A defesa de Sanches argumentou que suas declarações estavam protegidas pelo direito à liberdade de expressão e que a condenação limitava esse direito fundamental. Contudo, o relator do caso, refutou essa alegação. Para o magistrado, a liberdade de expressão ou de pensamento não é ilimitada e não pode violar os direitos e a dignidade de outros grupos religiosos, reforçando a decisão de primeira instância.
“A insistência na ideia de explosão e bomba, a afirmação de que todos os muçulmanos matam ou torturam cristãos, a vinculação disso ao Alcorão e o deboche com um lenço como se fosse o véu do hijab, ultrapassam a liberdade de expressão e a possibilidade de crítica”, declarou o relator. A advogada ainda pode recorrer da decisão.
O caso de Ana Paula Sanches reacende a preocupação sobre a islamofobia no Brasil. No final de 2023, o II Relatório de Islamofobia no Brasil, produzido pelo Grupo de Enfrentamento à Islamofobia do GRACIAS, da USP, revelou crescimento significativo de atos islamofóbicos no país. O estudo destacou um aumento de 900% nas notificações de mensagens de ódio recebidas pela ANAJI, confirmando a intensificação da violência contra muçulmanos.
A decisão do TJ/SP vem num momento importante para o enfrentamento ao discurso de ódio, de acordo com a antropóloga professora da Universidade de São Paulo Dra. Francirosy Barbosa, coordenadora do Grupo de Pesquisa Gracias. A professora fez parte do grupo de trabalho, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, que produziu um relatório de recomendações para o enfrentamento ao discurso de ódio, em 2023. Ela comemorou a decisão da Justiça e alertou sobre a falta de conhecimento da população sobre a religião muçulmana. “Ela vem para demonstrar que o nosso país não tolera mais esse tipo de discurso. As pessoas precisam conhecer mais a comunidade muçulmana para não propagar esse discurso violento, cheio de estereótipos e estigmas”, concluiu.
Referências:
Migalhas https://www.migalhas.com.br/arquivos/2024/9/59021946D06BC0_doc_161044787.pdf Acesso em 11 set 2024
ISER. https://religiaoepoder.org.br/artigo/islamofobia-no-brasil-no-contexto-do-conflito-israel-palestina-em-2023/ Acesso em 11 set 2024
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